A gripe dos porcos e a mentira dos homens
Por Mauro Santayana
O governo do México e a agroindústria procuram desmentir o óbvio: a gripe que assusta o mundo se iniciou em La Glória, distrito de Perote, a 10 quilômetros da criação de porcos das Granjas Carroll, subsidiária de poderosa multinacional do ramo, a Smithfield Foods. La Glória é uma das mais pobres povoações do país. O primeiro a contrair a enfermidade (o paciente zero, de acordo com a linguagem médica) foi o menino Edgar Hernández, de 4 anos, que conseguiu sobreviver depois de medicado. Provavelmente seu organismo tenha servido de plataforma para a combinação genética que tornaria o vírus mais poderoso. Uma gripe estranha já havia sido constatada em La Glória, em dezembro do ano passado e, em março, passou a disseminar-se rapidamente.
Os moradores de La Glória – alguns deles trabalhadores da Carroll – não têm dúvida: a fonte da enfermidade é o criatório de porcos, que produz quase 1 milhão de animais por ano. Segundo as informações, as fezes e a urina dos animais são depositadas em tanques de oxidação, a céu aberto, sobre cuja superfície densas nuvens de moscas se reproduzem. A indústria tornou infernal a vida dos moradores de La Glória, que, situados em nível inferior na encosta da serra, recebem as águas poluídas nos riachos e lençóis freáticos. A contaminação do subsolo pelos tanques já foi denunciada às autoridades, por uma agente municipal de saúde, Bertha Crisóstomo, ainda em fevereiro, quando começaram a surgir casos de gripe e diarreia na comunidade, mas de nada adiantou. Segundo o deputado Atanásio Duran, as Granjas Carroll haviam sido expulsas da Virgínia e da Carolina do Norte por danos ambientais. Dentro das normas do Nafta, puderam transferir-se, em 1994, para Perote, com o apoio do governo mexicano. Pelo tratado, a empresa norte-americana não está sujeita ao controle das autoridades do país, nem às suas leis - somente às leis do país de origem.
O episódio conduz a algumas reflexões sobre o sistema agroindustrial moderno. Como a finalidade das empresas é o lucro, todas as suas operações, incluídas as de natureza política, se subordinam a essa razão. A concentração da indústria de alimentos, com a criação e o abate de animais em grande escala, mesmo quando acompanhada de todos os cuidados, é ameaça permanente aos trabalhadores e aos vizinhos. A criação em pequena escala – no nível da exploração familiar – tem, entre outras vantagens, a de limitar os possíveis casos de enfermidade, com a eliminação imediata do foco..
Os animais são alimentados com rações que levam 17% de farinha de peixe, conforme a Organic Consumers Association, dos Estados Unidos, embora os porcos não comam peixe na natureza. De acordo com outras fontes, os animais são vacinados, tratados preventivamente com antibióticos e antivirais, submetidos a hormônios e mutações genéticas, o que também explica sua resistência a alguns agentes infecciosos. Assim sendo, tornam-se hospedeiros que podem transmitir os vírus aos seres humanos, como ocorreu no México, segundo supõem as autoridades sanitárias.
As Granjas Carroll – como ocorre em outras latitudes e com empresas de todos os tipos – mantêm uma fundação social na região, em que aplicam parcela ínfima de seus lucros. É o imposto da hipocrisia. Assim, esses capitalistas engambelam a opinião pública e neutralizam a oposição da comunidade. A ação social deve ser do Estado, custeada com os recursos tributários justos. O que tem ocorrido é o contrário disso: os estados subsidiam grandes empresas, e estas atribuem migalhas à mal chamada “ação social”. Quando acusadas de violar as leis, as empresas se justificam – como ocorre, no Brasil, com a Daslu – argumentando que custeiam os estudos de uma dezena de crianças, distribuem uma centena de cestas básicas e mantêm uma quadra de vôlei nas vizinhanças.
O governo mexicano pressionou, e a Organização Mundial de Saúde concordou em mudar o nome da gripe suína para Gripe-A. Ao retirar o adjetivo que identificava sua etiologia, ocultou a informação a que os povos têm direito. A doença foi diagnosticada em um menino de La Glória, ao lado das águas infectadas pelas Granjas Carroll, empresa norte-americana criadora de porcos, e no exame se encontrou a cepa da gripe suína. O resto, pelo que se sabe até agora, é o conluio entre o governo conservador do México e as Granjas Carroll – com a cumplicidade da OMS.
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3 de maio de 2009
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# Escrito por
Miguel do Rosário
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domingo, maio 03, 2009
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1 de maio de 2009
A vingança da Mãe Natura
3 comentarios
Reproduzo abaixo um texto que recebi por email, e que diz exatamente o que eu pretendia sobre essa crise suína. É interessante (e assustador) ver como a natureza vem pressionando o homem a mudar seus hábitos. Acrescentaria ao texto abaixo que, na ânsia de alcançar produtividades recordes, os empresários estão destruindo o sistema imunológico dos animais, que se tornam, portanto, perigosíssimos criadouros de vírus e bactérias. Aconteceu com as vacas, com os francos e agora com os porcos. O custo disso será cada vez mais alto, até que a sociedade perceba que é mais fácil, barato e seguro, produzir seus alimentos em condições ecologicamente corretas.
http://www.anda.jor.br/colunaDetalhe.php?idColuna=372
Não, não vou falar de gripe suína
Marcio Bueno
Vou ter o prazer de não falar sobre gripe suína. Vou me abster de debater o assunto da moda, o tema das rodinhas que se formam à saída dos restaurantes, onde os grupinhos assopram seus cafezinhos e aguardam os colegas de trabalho que ainda não pagaram seus almoços. Vou fugir da pauta de todos os veículos que embaralham 'OMS', 'gripe suína', 'porcos', 'influenza', 'suspeita' e 'novos casos' em suas manchetes, ao lado das notícias sobre futebol e a foto de alguma beldade com novo namorado a tiracolo, ou vice-versa.
Vou manter silêncio hermético sobre uma questão que gerou reações tão díspares como a mudança do nome da doença - alguém aí se lembrou daquela piada do corno que tirou o sofá da sala? - e o corre-corre de parlamentares da bancada pecuarista, suando frio durante as entrevistas para não fazer feio nem desagradar quem lhe marca o lombo com ferro em brasa de quatro em quatro anos.
Não vou dizer nada sobre uma prática econômica que gera toneladas de cocô líquido e incrivelmente fedido para cada salaminho delicioso servido nos coquetéis de lançamentos de livros, exposições de artes e noites de confrarias, com médicos e empresários bem-sucedidos, e esposas com permanente no cabelo.
Não vou tecer comentários sobre o ato de roubar a liberdade, forçar a procriação e enjaular durante toda a vida animais sencientes como os porcos, confiná-los no concreto e metal, sem ar fresco, terra, lama, chuva ou Sol, fazê-los inchar - o termo é 'produtividade', nas publicações paga-pau do setor - e então enviá-los para o abatedouro, local que apropriadamente não possui janelas.
Não vou palpitar a respeito da criação intensiva de um animal para satisfazer o capricho culinário de uma ínfima parcela da população, contaminando riachos próximos dos chamados chiqueirões, desperdiçando água na limpeza das instalações, consumindo energia, derrubando florestas para dar lugar às plantações para produzir ração.
Vou ignorar o fato de que um porco passa sua vida inteira sem poder se mexer muito, já que seu casco não foi feito para andar sobre o estrado, e no concreto não é possível fuçar, ato natural de sua espécie - alguns ainda ganham um 'piercing' no focinho, para que desistam de vez dessa atividade, pois incomoda.
Vou esquecer que as fêmeas vivem imobilizadas, pois durante o período de gestação as instalações servem para deixá-las paradas - o medo do suinocultor é que elas rolem por cima de algum filhote, o que significa menos lucro, e mais grades de ferro por precaução.
Não direi que, independente do especismo e da ausência de ética, basta uma visita a uma criação tradicional de suínos, seguida de uma inspirada funda, daquelas que enche bem os pulmões, para perceber que fazer daquilo o seu alimento, mais tarde, é roleta russa.
Não se preocupe. Palavra alguma.
http://www.anda.jor.br/colunaDetalhe.php?idColuna=372
Não, não vou falar de gripe suína
Marcio Bueno
Vou ter o prazer de não falar sobre gripe suína. Vou me abster de debater o assunto da moda, o tema das rodinhas que se formam à saída dos restaurantes, onde os grupinhos assopram seus cafezinhos e aguardam os colegas de trabalho que ainda não pagaram seus almoços. Vou fugir da pauta de todos os veículos que embaralham 'OMS', 'gripe suína', 'porcos', 'influenza', 'suspeita' e 'novos casos' em suas manchetes, ao lado das notícias sobre futebol e a foto de alguma beldade com novo namorado a tiracolo, ou vice-versa.
Vou manter silêncio hermético sobre uma questão que gerou reações tão díspares como a mudança do nome da doença - alguém aí se lembrou daquela piada do corno que tirou o sofá da sala? - e o corre-corre de parlamentares da bancada pecuarista, suando frio durante as entrevistas para não fazer feio nem desagradar quem lhe marca o lombo com ferro em brasa de quatro em quatro anos.
Não vou dizer nada sobre uma prática econômica que gera toneladas de cocô líquido e incrivelmente fedido para cada salaminho delicioso servido nos coquetéis de lançamentos de livros, exposições de artes e noites de confrarias, com médicos e empresários bem-sucedidos, e esposas com permanente no cabelo.
Não vou tecer comentários sobre o ato de roubar a liberdade, forçar a procriação e enjaular durante toda a vida animais sencientes como os porcos, confiná-los no concreto e metal, sem ar fresco, terra, lama, chuva ou Sol, fazê-los inchar - o termo é 'produtividade', nas publicações paga-pau do setor - e então enviá-los para o abatedouro, local que apropriadamente não possui janelas.
Não vou palpitar a respeito da criação intensiva de um animal para satisfazer o capricho culinário de uma ínfima parcela da população, contaminando riachos próximos dos chamados chiqueirões, desperdiçando água na limpeza das instalações, consumindo energia, derrubando florestas para dar lugar às plantações para produzir ração.
Vou ignorar o fato de que um porco passa sua vida inteira sem poder se mexer muito, já que seu casco não foi feito para andar sobre o estrado, e no concreto não é possível fuçar, ato natural de sua espécie - alguns ainda ganham um 'piercing' no focinho, para que desistam de vez dessa atividade, pois incomoda.
Vou esquecer que as fêmeas vivem imobilizadas, pois durante o período de gestação as instalações servem para deixá-las paradas - o medo do suinocultor é que elas rolem por cima de algum filhote, o que significa menos lucro, e mais grades de ferro por precaução.
Não direi que, independente do especismo e da ausência de ética, basta uma visita a uma criação tradicional de suínos, seguida de uma inspirada funda, daquelas que enche bem os pulmões, para perceber que fazer daquilo o seu alimento, mais tarde, é roleta russa.
Não se preocupe. Palavra alguma.