4 de julho de 2008

Conversando sobre filmes

Um dos problemas da crítica é que ela, na ânsia de se mostrar séria e profissional, esquece que é também uma simples opinião. O que não a diminui. Ao contrário. Uma opinião sincera vale mais que dez críticas. Outro problema é que ainda se superestima a erudição. Pior, as pessoas se acham eruditas muito facilmente. À sombra da internet, desenvolveu-se toda uma geração de nerds pedantes que acreditam piamente na sua superioridade cultural perante o comum dos mortais. No entanto, só a experiência produz verdadeiro conhecimento. Não falo de encher a cara, transar com meninos e meninas, arrumar briga no maracanã. A experiência que me refiro é VIVER a cultura. De que adianta ler um livro se não se o VIVENCIA. De que adianta ler Henry Miller como quem estuda o manual do Page Maker? Qual o sentido de ler Rimbaud se não for para perder os sentidos?

Por isso a ignorância é tão comum entre letrados. Eruditos, acadêmicos, especialistas, doutores, jornalistas, advogados, são títulos vazios. A cultura é algo muito superior, mais subjetivo, sacana, delicado, angustiante, estranho. Experiente.

Dito isto, queria dar minha opinião sobre Batismo de Sangue, dirigido por Helvécio Ratón e inspirado no livro homônimo, do Frei Betto. Trata-se de um filme horrível, que nega as regras mais básicas da ficção, como desenvolver o aspecto humano dos personagens. Não há personagens. São todos marionetes de um diretor preocupado exclusivamente em contar uma história convencional. É triste ver que os bravos religiosos que lutaram contra a ditadura tenham sido transformados em espantalhos de óculos, figuras óbvias, artificiais, que agem como franksteins desfibrados e sonsos.

Eu gosto de filmes políticos. Mas de filme bom. Eles não usam black tie, por exemplo, do Gianfracesco Guarnieri, é um dos mais belos filmes brasileiros. É um filme político do começo ao fim, a começar pelo tema, que é a greve entre os operários de uma fábrica do ABC paulista. Mas é, acima de tudo, um filme humano. Um filme universal. Onde os traidores e os covardes são tão humanos quanto os mocinhos. Batismo de Sangue, com seu maniqueísmo tosco, fradecos santos contra os demônios da ditadura, agride a complexidade moral do homem, da história, da política.

Semanas atrás, vi outro filme muito ruim. Brasília 18%. Clichê oportunista, barato. O diretor é um grande nome do cinema, o Nelson Pereira dos Santos, que possui trabalhos admiráveis. Não precisava desse filme para manchar sua carreira. Enfim, coisas da vida.

Bom mesmo é Ao Sul do Meu Corpo, um filme raro de se encontrar em locadoras e passar na tv, do grande Paulo Cesar Saraceni. Nuno Leal Maia faz o aluno, Paulo Cesar Pereio faz o professor. É um filme que também possui certo apelo político (foi um dos mais censurados durante a ditadura), mas é sobretudo poético, humanista e universal. O filme foi regravado em 2001, com o nome Duas Vezes com Helena, com Fábio Assunção no papel do aluno, e não possui 1% da graça e força dramática da primeira versão.

2 comentarios

Luiz Gonzaga disse...

O filme sobre Brasília, não seria Brasília 18%, do Nelson Pereira dos Santos ? Também achei muito ruim.

Miguel do Rosário disse...

É esse mesmo, 18%, do Nelson. Que filme tosco Deus meu. E olha que gosto muito do Nelson, como cineasta e cidadão.

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