5 de fevereiro de 2010

No friozinho do cinema

Alguns pensamentos que o Festival de Clermont-Ferrand 2010 me inspirou.

O problema de se escrever sobre cinema é o mesmo de qualquer tipo de literatura sobre outra arte. Você acaba falando de uma outra coisa, que não o filme em si. E tem que ser assim mesmo. Porque os textos que se pretendem puristas, ou seja, que pretendem abordar estritamente o filme, acabam se tornando artificiais, pedantes e enfadonhos. O cinema não merece isso. O cinema merece textos tão empolgantes quanto ele próprio.

Aliás talvez aí esteja uma chave para se entender o significado do cinema para o homem contemporâneo. O cinema é um arte que fomenta a interação coletiva de uma forma muito especial. De uma forma confortável. No cinema, conciliamos uma agradável solidão ao calor de estarmos juntos a outras pessoas, a outros personagens, a outras histórias.

O cinema é uma arte que diverte tanto como a música, mas de uma forma ainda mais complexa. Porque o cinema engloba a música. A música, porém, proporciona uma interação mais ativa entre as pessoas. As pessoas dançam juntas. Tocam juntas. Pulam juntas. A música, por isso mesmo, se contrapõe ao personalismo excessivo da modernidade. O cinema é o oposto. Dentro da sala, mantemos nossa privacidade e nosso individualismo intactos. Não precisamos interagir ativamente, e ao mesmo tempo sentimos a presença do outro, o que ajuda a suavizar a angústia da solidão e nos dá segurança. E não apenas a presença do outro físico, dos outros espectadores. O cinema nos traz a presença do outro nas telas, através de seus personagens. É a mesma função da literatura, mas de uma maneira mais acessível, mais direta. O cinema é o único remédio comprovadamente eficaz contra o desespero.

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Vamos ver se amanhã consigo escrever mais sobre os curtametragens que estou assistindo por aqui.

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