12 de fevereiro de 2008

Resposta aos missivistas do Globo

Hoje reservo mais um tempo para comentar algumas cartinhas enviadas para o jornal O Globo. Todas batem no Lula, naturalmente, nenhuma bate na imprensa. A única que fala sobre os cartões corporativos de São Paulo é, incrivelmente, uma nota da Secretaria de governo de SP, explicando uma matéria, terminando com essa pérola de isenção política: "O governo do Estado de SP rejeita a tentativa do PT de tratar questões diferentes como se fossem iguais. Não são."

Pois é. Não são. Claro. Cartão tucano é mais limpinho, geneticamente mais ético. As mãos peludas e suadas dos petistas sujam qualquer cartão.

Mas a babação de ovo global pelos tucanos não termina aí. Há ainda uma nota da redação, logo abaixo, explicando que nunca foi a intenção do jornal atacar a honradez do governo do PSDB de Sâo Paulo:

"Nota da redação: A reportagem publicou a resposta da Casa Civil sobre a compra de molduras e também, com destaque, a nota oficial do governo de São Paulo, que refuta qualquer irregularidade nos gastos."

Quer mais parceria que isso? Só faltava encerrar com um "beijos e boa sorte, companheiros. Estamos contigo!"


Às cartas.


1) (...) Com esta história dos cartões corporativos, não tem CPI que dê jeito! É só mais um holofote demagógico. Chamem a polícia! É roubo mesmo. Julio Pires Lopes

É, chamem a polícia. De preferência, a Polícia de São Paulo, claro. Aliás, nem precisa investigar. Nem julgar. O leitor, que é mais bem informado que todos nós, já investigou, já julgou e já condenou. Isso que é espírito democrático.


2 ) Por mandar reformar os jardins de uma casa chamada Dinda e por ganhar de presente um Fiat Elba, um presidente foi cassado (...) Os cara-pintadas foram para a rua e cassou-se um presidente. (...) Agora, nunca antes na História deste país tantos escândalos de desvio de dinheiro público vêm ao conhecimento de todos e nada se apura. Ninguém é punido. Ninguém é culpado. (...) Adelino B.de Figueiredo

3) (...) Estranha-me o fato de a oposição não ter pedido ainda o impeachment do nosso supremo mandatário. Por muito menos, ela encabeçou e conseguui o impeachment do presidente Collor. Luiz Cláudio Luz Ferreira

Vou responder aos dois num comentário só. Adelino, você acha que foi reforma de casa de dinda e fiat elba que derrubaram o Collor? Não foi a recessão profunda do país? O confisco da poupança? As revelações do irmão de Collor? PC Farias? Outra: não foi Veja, Globo, Estadão e Folha que elegeram Collor, criando a lenda do "caçador de marajás"? E depois não foram eles que romperam com sua criação, ao ver o desastre econômico que representou para o país?

Cláudio, a oposição está doidinha para pedir o impeachment do Lula. Aliás, esse escândalo do cartão tinha esse objetivo. Criar, novamente, uma atmosfera política favorável à derrubada do presidente. Acontece, prezado Cláudio, que é preciso encontrar prova de envolvimento do presidente em algum crime muito grave. Derrubar um presidente por causa de uma tapioca de R$ 8,30, não dá. Além do mais, os gastos com cartão corporativo do governo federal caíram de mais de R$ 200 milhões por ano, nos últimos 2 anos do governo FHC, para menos de R$ 150 milhões por ano, no governo Lula. A resposta vale também para o Adail. Repetindo: os gastos com cartão corporativo, segundo a Controladoria Geral da União, passaram de R$ 213,6 e R$ 233,2 milhões em 2001 e 2002, dois últimos anos da gestão FHC, para uma média de R$ 143,5 milhões nesses cinco anos de Lula. Com a diferença que, na época de FHC, esses gastos não eram transparentes. O Portal da Transparência começou a funcionar em novembro de 2004. O aumento do gasto com cartões, durante a era Lula, ocorreu simultâneamente à redução do uso das chamadas Contas B, que são muito mais difíceis de ser fiscalizadas e não possuem transparência. O uso de cartões é considerado, por diversos especialistas em gasto público consultados pelos jornais, como muito mais seguro para evitar eventuais desvios. Portanto, o aumento do uso dos cartões, a criação do Portal da Transparência e a queda do volume usado, representaram uma melhora expressiva, em todos os sentidos, da qualidade dos gastos públicos.

4) De onde foi que o general Félix tirou tanta coragem para nos dizer, pela TV, que a quantidade de bicicletas ergométricas e alteres, compradas por ele com cartão corporativo, deve ser mantida em sigilo para não revelar quantos seguranças há à disposição do presidente Lula (sic)? No mesmo momento, a guerrilheira aposentada Dilma Roussef - aquela mesma que, na ditadura militar, se arvorava salvadora da pátria sob inspiração de Fidel e Stalin - vociferava para tentar nos convencer que os gastos com cartão corporativo diminuíram no governo Lula! É, não se fazem mais generais e guerrilheiros como antigamente! Adail Coaracy de Aquino

Aquino, sobre a questão da segurança e do sigilo, reitero o que já disse para outros missivistas. É um procedimento antigo do Gabinete Institucional da Presidência da República. Os gastos de José Sarney, Fernando Collor de Melo, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, e suas respectivas famílias, eram mantidos sob sigilo por questão de segurança nacional. Não é invenção de Lula. Por que somente Lula e sua família seriam privados do direito ao sigilo e das regras tradicionais de segurança? Ele é menos presidente que os anteriores? Quanto às referências à Dilma Roussef, os nomes que inspiraram a hoje ministra certamente não se limitaram a Fidel Castro e Stálin, mas a todos os que lutaram um dia pela liberdade no Brasil e nas Américas, como Tiradentes, Zumbi dos Palmares e Abraam Lincoln. O missivista usa apenas os nomes de Fidel e Stálin para jogar a ministra contra os rancorosos da direita. Ela tinha 18 anos quando foi presa. Portanto, pode-se dizer que "aposentou-se" bem cedo como guerrilheira. Vale lembrar que Dilma foi torturada pelos órgãos de repressão militar. Quanto a não se fazerem generais e guerrilheiros como antigamente, graças a Deus! Sobretudo no concernente aos generais! Ou você tem saudades dos generais que decretaram o AI5?

*

Essas cartinhas do Globo, como eu ia dizendo, revelam claramente os objetivos da mídia ao produzirem mais esse escândalo artificial. Eles vêm criando corvos há tempos. E vão acumulando pontos. A cada novo ataque, há um processo de resgate de todos os problemas anteriores. Por exemplo, ainda falam em dólares na cueca, associando esse crime ao mensalão, quando sabemos que o tal assessor preso com dólares na cueca não tinha relação nenhuma com os problemas de Brasília. Tratava-se de um barnabézinho do nordeste que foi cooptado por um nababo da sua região para ajudar a aprovar uma licitação. Foi pego pela Polícia Federal. Particularmente, eu ainda desconfio de alguma armação, porque o escândalo surgiu num momento bastante conveniente, no auge da atmosfera golpista, quando havia no ar toda aquela perplexidade, com editorais lançando labaredas diárias de fúria ética. Assim como parece armação o lance do dinheiro achado com os aloprados, numa operação grotesca que só prejudicou Lula, levando a eleição para o segundo turno. Estamos cansados de saber que a política é suja, mas nunca encaramos a possibilidade de estarmos diante da sujeira.

1 comentário

Agostinho Rosa disse...

Miguel, respostas adequadas, educadas e inteligentes. São esclarecedoras, portanto educativas. Creio que outros "blogueiros" poderiam seguir o seu exemplo. Alguns leitores não tem culpa de nada. A falta de espírito crítico e a tendência em repetir o que a mídia publica massiva e diuturnamente contra um governo eleito legitimamente por 60% dos eleitores, leva estes incautos a escreverem estas barbaridades.

Postar um comentário