9 de maio de 2009

Combatendo o pessimismo com fatos e números

Henri Cartier-Bresson

(Para vocês que chegam agora, pelo Google, comunico que há posts mais atualizados sobre a exportação brasileira, como esse, esse, esse e esse.


Compilei dados do Cadastro Geral de Emprego, do Ministério do Trabalho, e do IBGE. Confiram aí o resultado. Clique na imagem par ampliar.



Reparem que o nível de desemprego em março deste ano (9,0%), apesar de ligeiramente superior ao de março de 2008 (8,6%), está abaixo de todos os meses de março dos anos anteriores. O IBGE inicia a série em 2002.

Agora vejam os números do Caged, série estatística de responsabilidade do Ministério do Trabalho:



Observem que, também aí, há elementos bastante promissores. Em primeiro lugar, o emprego parou de cair. A crise bateu forte no Brasil em dezembro de 2008, mês em que, tradicionalmente, há um grande número de dispensas, e prosseguiu fazendo estragos em janeiro. Em fevereiro, porém, já se registra um saldo positivo; em março, este saldo se amplia.

É preciso, todavia, não apenas considerar os saldos, mas também a coluna de admissões, para detectar se a economia se mantém aquecida ou não. Em março deste ano, registrou-se a entrada de 1,419 milhão de empregos com carteira assinada, o que representa o segundo maior volume da série histórica. Repare, para efeito de comparação política, que em março de 2001, sétimo ano do governo FHC, o Ministério do Trabalho registrou a emissão de 923 mil contratos formais de emprego; ou seja, o número de empregos gerados em março deste ano é 154% superior ao registrado em março de 2001. Não creio que a população brasileira tenha aumentado tanto de lá pra cá...

O fato dos números permanecerem bastante elevados, em relação à média histórica dos últimos vinte anos, mostra que a economia brasileira continua atravessando, e superando, vigorosamente, a crise econômica mundial.

*

Entretanto, os números de comércio exterior, divulgados há pouco pelo governo federal, são os que mais revelam a pujança da economia brasileira, mesmo neste período de crise mundial.

Confiram a tabela (cliquem nela para ampliar):




Aprendi com meu saudoso pai, José Barbosa do Rosário, jornalista especializado em comércio exterior, um dos maiores do país (trabalhou em todos os grandes jornais, inclusive 15 anos no Globo, antes que este se tornasse um medíocre e tendencioso boletim partidário), que devemos usar, de preferência, períodos de 12 meses, para evitar sazonalidades mensais irrelevantes para uma análise mais conjuntural. De 1991 a 1999, trabalhei em parceria com meu pai, sempre aprendendo, até que um câncer o levasse precocemente aos 61 anos e eu tivesse que tocar a empresa sozinho. Já fechei e enterrei esta empresa, mas guardei algumas lições. Vamos lá.

Nos últimos 12 meses, as exportações brasileiras totalizaram 188,7 bilhões de dólares, o que representou crescimento de 13% sobre o período anterior. Considerando que o período anterior já havia registrado recorde, este número é excepcional; e se lembrarmos que o Brasil alcançou um novo recorde em plena crise financeira mundial - que já dura sete meses, aí encontramos a explicação para o entusiasmo que analistas estrangeiros sentem quando observam a nossa situação.

Quando se divulgou esses números, há poucos dias, a Folha de São Paulo manchetou: Piora perfil das exportações brasileiras. Não houve, contudo, uma piora que justificasse tamanho alarmismo! Houve o seguinte: as exportações de ferro e soja registraram um crescimento impressionante, em valor, para a Ásia, tanto em função do aumento do volume quanto por causa da alta nas cotações, e com isso ampliaram sua participação nas estatísticas. As exportações brasileiras de minérios, por exemplo, cresceram 66% em 12 meses, atingindo 20,13 bilhões de dólares! Ora, tudo bem que é muito mais chique exportar chips de computador do que minérios, mas não se pode esnobar nenhum tipo de atividade. É também certo que se o Fernando Henrique não houvesse privatizado a Vale, teríamos mais liberdade de ação para investirmos em políticas de agregação de valor, de forma a exportar menos minério bruto e mais produtos industrializados, como aço, chapas de aço, etc. Com isso, esses 20 bilhões de dólares poderiam quintuplicar para 100 bilhões. Agora Inês é morta e, de qualquer forma, é muito dinheiro, é dinheiro honesto, e é bem vindo, ainda mais em tempos de crise.

A exportação brasileira de soja, outro item bastante esnobado pelas elites letradas (não sei porque, já que nunca fizeram nada para melhorar a qualidade de nossas exportações; ao contrário, sempre patrocinaram campanhas contra investimentos do Estado em siderúrgicas, etc), também registrou um aumento expressivo nos últimos doze meses. O grupo de oleaginosos, grão, sementes, etc, cujo principal produto é o complexo soja, registrou uma exportação de 11,74 bilhões de dólares nos doze meses acumulados até abril deste ano, o que representou um crescimento de 57% sobre o período anterior.

Por fim, a exportação brasileira de combustíveis minerais (dentre os quais, o principal é o petróleo em estado bruto) totalizou 17,55 bilhões de dólares em Maio/Abril de 2009, aumento de 32% sobre o ciclo anterior.

Por outro lado, as exportações brasileiras de carros e autopeças caíram 9% neste período, totalizando 12,7 bilhões de dólares.

Esses são os fatos que levam um jornal a estampar, em letras garrafais, na primeira página de um dos jornais de maior circulação do país:

PIORA PERFIL DAS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS


Ora, ora, ora. As exportações de autopeças, embora tenham caído sobre o ano anterior, prosseguem em nível magnificamente superior à sua média histórica. Para vocês terem uma idéia, esse item, classificado dentro do grupo de número 87, registrou uma exportação de apenas 4 bilhões de dólares, e 868,90 mil toneladas, nos 12 meses de maio de 2000 a abril de 2001. Repetindo: nos últimos 12 meses, as exportações brasileiras do grupo 87 alcançaram 12,7 bilhões de dólares e 1.536.266 toneladas. Isso é piorar perfil da exportação? Já escrevi outros posts abordando essa questão - ver abaixo na lista de artigos relacionados.

Em função do salto verificado nas exportações de minérios, mesmo que as vendas externas de autopeças permanecessem estáveis, ou crescessem um pouco, o percentual de participação dos minérios na pauta comercial iria crescer. O que me parece desonesto, revoltantemente desonesto, é transformar isso no principal acontecimento, na manchete, quando estamos diantes de números extremamente positivos para a economia brasileira.

Confira a tabela abaixo, não esquecendo de clicar sobre ela para ampliar. Depois volte aqui.



Há um outro fator, muito importante, que NUNCA é abordado pelos jornais brasileiros. Tanto que a maioria dos brasileiros não sabem. Tenho um amigo, um jornalista, um rapaz que é extremamente bem informado, culto, ágil e antenado (mas não o suficiente, pelo jeito; pelo menos não até, modéstia à parte, ler esse post), que não acreditou em mim quando eu disse que a América do Sul compra mais produtos do Brasil do que os Estados Unidos. Ele me olhou desconfiado, e creio que, só agora, quando eu lhe enviar um email sugerindo a leitura desse post, é que irá acreditar plenamente no que eu disse. Então, é isso, meu chapa. Escute bem. As exportações brasileiras para a América do Sul somaram US$ 34,71 bilhões de dólares nos últimos 12 meses, até abril de 2009. Anote bem. As exportações brasileiras para a América Latina (que inclui mais países) somaram US$ 40,68 bilhões, no mesmo período. E, finalmente, as exportações brasileiras para a América Latina e Caribe totalizaram US$ 46,42 bilhões. Enquanto isso, as exportações brasileiras para os EUA somaram US$ 24,96 bilhões. De forma que a participação da América Latina e Caribe nas exportações brasileiras é hoje de 24,6%, com preço médio de US$ 1.149 por tonelada (o preço médio é indicativo do valor agregado dos produtos exportados; preço médio baixo significa exportação de matérias-primas ou produtos de baixo valor). A participação norte-americana nas exportações brasileiras, por sua vez, é de 13%, com preço médio de US$ 931. Viu bem? Repare agora no preço médio dos produtos brasileiros exportados para a América do Sul: US$ 1.483 a tonelada!

A América do Sul é, portanto, um mercado bem maior do que os Estados Unidos; e bem melhor do que a Europa, porque importa produtos brasileiros industrializados de alto valor agregado, enquanto as nações do primeiro mundo bloqueiam solenemente qualquer artigo nacional um pouco mais elaborado. O preço médio das exportações brasileiras para a Europa, nos últimos 12 meses, ficou em míseros US$ 392 por tonelada...

Sabe porque você não sabia disso, meu caro? Por duas razões: primeiro porque é um fenômeno recente, de uns seis ou sete anos para cá; segundo porque a mídia tradicional não dá o merecido destaque a um fato que revolucionou, para o bem, o comércio exterior brasileiro!

Cuidado, porém, para não se deixar engambelar por uma última artimanha de nossa mídia golpista e antipatriota, a de que nossa política externa, "terceiro-mundista e ideológica", desdenhou dos EUA e Europa. As exportações brasileiras para o primeiro mundo também experimentaram um vigoroso crescimento nos últimos anos. Vale um parágrafo só sobre isso.

Reparem que uso o período Maio/Abril 2000/2001 como referência porque foi o sétimo ano do governo Fernando Henrique Cardoso. O atual período Maio/Abril 2008/2009 corresponde ao sétimo ano da gestão Lula. Em 2000/01, as exportações brasileiras totalizaram 57,42 bilhões de dólares; repetindo: em 2008/09, foram 188,69 bilhões de dólares, um aumento, portanto, de 228,62%! Vejamos agora apenas as exportações para os EUA. Em 2000/01, nós exportamos 14,18 bilhões de dólares para os EUA; valor este que saltou para 24,96 bilhões em 2008/09, um aumento de 76%! Quem dera se toda política externa anti-americana fosse assim!

*

Creio ser desnecessário lembrar que o fato de termos reduzido nossa dependência comercial dos Estados Unidos, consistiu num importante trunfo contra a crise econômica, cujo epicentro aconteceu justamente ali, ao norte do Rio Grande.

Capisce?

7 comentarios

Clarabóia disse...

Incrível como o pig consegue atingir o 100% de erro. É difícil, mesmo que se tente errar tudo, não é fácil. Sempre se acaba acertando em alguma coisa sem querer. A mídia nativa consegue essa façanha. Eureka, descobri o motivo do sucesso do governo Lula. Ele deve fazer sempre o contrário do que a mídia diz que é certo. Batata, não tem erro. Agora, eu não sei se é por burrice ou má-fé que a mídia diz que a política comercial brasileira se pauta pela ideologia "esquerdóide" anti-americana. A essa altura do campeonato já deveriam estar carecas de saber que o Lula, antes de ser de esquerda(o que ele já negou, uma vez), é um pragmático. Na histeria ant-comunista do Jabor, por exemplo, acho que predomina o mau-caratismo. Mas em alguns, como o Sardenberg e o Merval, tem uma boa dose de burrice, também. O que acha. Miguel?

Miguel do Rosário disse...

também é uma eterna dúvida pra mim. inclino-me pelo cinismo. eles não se preocupam com a verdade, apenas com seus salários. são corrompidos. um tipo de corrupção muito muito pior do que construir castelos ou mandar a filha pro havaí com passagem paga pelo contribuinte.

Itárcio Ferreira disse...

Miguel, parabéns pelo texto, como sempre maravilhoso e esclarecedor. Olha, tem uma matéria interessantíssima no blog do André Lux, link http://tudo-em-cima.blogspot.com/2009/05/nao-deixem-de-ver-zeitgeist-1-e-2.html#links
Abraços!

Jean Scharlau disse...

Sensacional, Miguel. Importantíssimas informações.
Furaste todos os jornalões!
Isto não é raro na blogosfera, mas em termos de informação básica de economia... Caramba!

Que porcaria de desinformação e mentiras que essa cambada (vara) despeja em cima dos brasileiros!

Anônimo disse...

Miguel, parabéns. É desse tipo de informação que o público precisa. Abraço Ísis.

Paulo Palavra disse...

Parabéns meu caro!!! Admiro esse seu trabalho esclaredor fundamental para se criar juízo de valores baseados em FATOS e não factóides midiáticos comprometidos com os responsáveis (oligárcas - sind. patronais rurais, industriais, comerciais efinanceiros) que controlavam as três esferas de governo e os três poderes desse país até 2002 (FHC) tornando-o através das décadas na maior concentração de renda do planeta. A Partir de 2003, os sindicalistas patronais representados partidariamente por partidos oriundos do velho MDB e do PDS (Arena), "vem perdendo" (O PMDB sangue-suga oportunista faz parte da base aliada pragmática - sem ela não se governa) o controle pela primeira vez na história do EXECUTIVO FEDERAL para representes dos partidos dos trabalhadores (Lula). Este é um processo árduo e demorado, porém como vc mesmo já disse e provou com números, as coisas estão mudando para melhor. Hoje temos muito mais autonomia nas decisões política e econômicas do executivo federal. O Itamaraty (tão criticado pela oposição sem programa) faz um excelente trabalho!!!Mais uma vez parabéns, meu caro!!!

OBS: Frequento os fóruns diários econômicos abertos de comentários do Globo. Já os Blogs de Mídian (gripe) Leitão, SAr"DEM"bERG, Mer"D"al pereira, Lúcia Hipólito e NOBláblá fui censurado exatamante por demonstrar com números, tal como você, que os artigos desses "ARTICULISTAS (empregados) GLOBAIS", no mínimo, equivocados". Um grande ABRAÇO!!!

Paulo Palavra disse...

Indicarei o seu Blog com temas esclarecedores que reúnem dados do CAGED, IBGE, FGV, etc... ao fazer os meus comentários nos fóruns políticos e econômicos do INFOGLOBO.

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