30 de novembro de 2008

Arquivo: A Bienal e o auxílio luxuoso do movimento estudantil

(esse é um artigo de algumas semanas atrás, publicado originalmente no blog da Bienal, no site da UNE e no Vermelho. Publico aqui para tê-lo em meu arquivo)


Um brilho puro e louco nos olhos. A capacidade ilimitada de sonhar, rir, amar. Uma determinação maníaca de ser feliz e transformar o mundo. Quem é tão biruta de agir assim? Quem senão a juventude? A juventude! Há exatamente quarenta anos, o governo decretou o AI-5, o golpe fatal nos direitos civis do Brasil e uma bomba atômica nos sonhos da juventude. A partir daí, o país tratará os jovens como seus principais adversários. A polícia prendia jovens na rua simplesmente por serem jovens, terem cabelos compridos e não conseguirem esconder a fúria no olhar. Quantos milhares de jovens não tiveram seus sonhos destruídos em porões de tortura, em exílios dolorosos e miseráveis, em tempos sombrios onde a alegria e a subversão, ou seja, os dons mais queridos, mais inerentes à juventude, foram erigidos em inimigos públicos número um! De lá pra cá, muitos tentaram manipular a juventude, direcionar-lhe a energia anárquica, a generosidade sem limites, a inocência orgulhosa. Num mundo cínico, arrogante e fútil, porque tantos jovens ainda são atraídos por discursos revolucionários? Pior: ainda se organizam em partidos, ainda disputam centros acadêmicos, ainda militam no movimento estudantil?

Claro, alguns segmentos sociais gostariam que a juventude rebelde existisse apenas em seriados de tv. Diante da impossibilidade de conter seu natural ímpeto subversivo, muitos gostariam que o mesmo se restringisse a camisas de chê guevara, a uma rebeldia estética, hipócrita e inofensiva. Ah, mas a coisa é pior do que se pensa. O movimento estudantil, emergindo aos poucos dos escombros da ditadura, que traumatizou e mutilou a subversão criativa da juventude, começa a botar suas longas asas pra fora. Não esperam simpatia dos mesmos que os perseguiram, mas também não guardam rancor. Os jovens representam a vingança mais terrível contra os reacionários (que ainda se penduram nos derradeiros cabides do regime militar), porque não reagem emocionalmente aos inimigos do passado: ignoram-lhes solenemente. Estão noutra.

E agora ainda têm o desplante de organizar formidáveis Bienais de Cultura! É irônico que, ao mesmo tempo em que curadores famosos e fundações ricas realizam a "Bienal do Vazio", em São Paulo, onde o fato mais notório é um andar inteiramente desocupado, e cujos debates se voltam exclusivamente para labirínticos tópicos acadêmicos e chororôs por falta de verba, os jovens estudantes fluminenses realizam, com recursos bem mais modestos, a sua primeira Bienal de Cultura, Ciência e Tecnologia, com o seguinte tema: Arte em novas tecnologias. Sem chororô, sem furibundos debates na mídia. Trabalham, organizam, e fazem o que é possível. E fazem bem.

A Bienal de Cultura do Rio, a se realizar nos dias 20 a 23 de novembro, contará com shows, festas, debates, oficinas, exibição de filmes, grupos de dança, peças teatrais, e promete se tornar um evento marcante no calendário cultural do estado. A União Estadual dos Estudantes (UEE), entidade responsável pela organização do evento, deverá trazer e alojar mais de 600 estudantes de diferentes cidades fluminenses. E tudo acontece na Lapa, um dos bairros mais fascinantes do mundo, por sua efervescência musical incomparável, seu democratismo econômico e geográfico, sua arquitetura oitocentista, sua história.

Será uma oportunidade magnífica de conhecer o que há de mais vibrante e original na cultura fluminense. Aconselhamos a todos os interessados a entrar no blog da Bienal, imprimir a programação e anotar cuidadosamente os eventos dos quais desejam participar. Lembre-se: a Bienal é aberta a todos, estudantes, não-estudantes, jovens e velhos.

A abertura da Bienal, dia 20, quinta-feira, acontece no Circo Voador, a legendária casa de show por onde já passaram, e continuam passando, todos os grandes nomes da música brasileira. BNegão, Renegado, Marcelinho da Lula têm presença confirmada.

Os dias seguintes terão debates, oficinas e talk-shows durante a tarde. E imperdíveis festas à noite. Sempre na Lapa. Para saber mais detalhes sobre a programação dos shows, consulte o nosso blog bienalueerj.blogspot.com, ou diretamente neste link. A programação dos debates está aqui.

A juventude brasileira, com auxílio luxuoso do movimento estudantil, continua transviada, maravilhosamente transviada, e tem consciência da importância política e existencial de tudo isso, de maneira que só nos resta afirmar que a Bienal de Cultura do Rio será uma oportunidade de todos viverem momentos inesquecíveis de diversão, conhecimento, arte, amor e paz!

* Miguel do Rosário, 33, é editor do blog da Bienal de Arte, Ciência e Cultura do Rio de Janeiro, e responsável pelo blog OleodoDiabo.blogspot.com.

1 comentário

José Carlos Lima disse...

Sinto um grande orgulho de ter participado de uma das Bienais de Cultura da UNE, até hoje guardo o catálogo, por sinal muito bem produzido.

Quanto à uma União Estadual de Estudantes promover tal evento, para mim é novidade, espero que os demais Estados sigam o exemplo do RJ.

Enquanto Ivo Mesquita faz sua masturbação intelectual com a tal "Bienal do Vazio" os estudantes fluminenses produzem, participam, mostram.

Parabéns por ter dado esta força aos estudantes, com certeza a garotada não vai esquecer

Iso aí

Abs

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