11 de maio de 2007

Papa faz mídia ficar doidona

Esta visita do Papa ao Brasil e seu encontro com Lula deixou os críticos mais duros do governo em situação apertada. Fiquei me perguntando como o Globo faria com as imagens de Lula ao lado do Papa. Bem, o jornal resolveu o dilema estampando o Serra, governador de São Paulo, na mesma foto.

Mas o buraco foi bem mais fundo. A mídia continua tentando de todas as formas criar uma imagem satânica. A manchete gêmea da Folha e Globo, dizendo que “Papa apóia excomunhão de políticos pró-aborto” foi o mico do século. Não apenas por repetir a manchete e a foto, indicando a homogeneidade enjoativa dos jornalões, mas sobretudo pelo posicionamento ridiculamente pró-papa, ainda mais numa questão dessas.

Aliás, durante todo o tempo em que o debate sobre o aborto rolou na imprensa, esta se colocou notavelmente em favor do lado conservador. No minimo, a nossa imprensa, que se arvora como liberal, deveria ser mais imparcial neste assunto, ainda mais considerando as milhoes de mulheres que morrem por ano em consequencia de abortos clandestinos.

Por incrivel que pareça, fui encontrar uma posiçao mais lucida num artigo daquele boçal do Larry Rother, que escreve para o NYTimes e coligados (li no Herald Tribune). Ele cita os segmentos sociais, ligados à setores conservadores da Igreja Catolica, que fizeram protestos contra as campanhas do governo pelo uso do preservativo, e lembra que essas mesmas campanhas foram premiadas internacionalmente e ajudaram a reduzir fortemente as taxas de contaminaçao de Aids no Brasil. Durmam com essa: até o Larry Rother fica a favor de Lula, mas a nossa imprensa nao, prefere o Opus Dei.

Quero deixar bem claro aqui. Sou a favor do aborto. Acho que a mulher tem o direito de optar se quer aquele filho ou nao. Para mim, a vida humana inicia somente a partir da formaçao do cerebro, com dois meses ou mais.

Hoje a Miriam Leitão, pela primeira vez em anos, se manifesta a favor do governo, denunciando como obscurantismo o cerco que a imprensa, incluindo o próprio jornal em que trabalha, fez sobre o ministro, por causa de suas declarações super sensatas sobre o aborto, dizendo que se trata de uma questão de saúde pública, etc. Entretanto, a Leitão me irritou mesmo assim. Primeiro, deveria ter falado da condenação que o Vaticano faz do uso da camisinha. Aliás, quer saber. Para mim, ela nem devia ter comentado nada sobre isso. Devia era ter comentado a manchete do caderno de economia que fala do Brasil estar a um passo de alcançar o investment grade, que seria um passo importante para o país receber um grande volume de investimentos estrangeiros. Se o governo Lula é tão incompetente porque o Brasil está avançando tão firmemente na avaliação dos principais organismos financeiros internacionais?

Como eu previa, a imprensa está abafando ao máximo a repercussão do livro do Luis Nassif, que fala do escândalo da grande desvalorização de 1999, que provocou um rombo de bilhões nas contas públicas nacionais. Nassif acusa, com provas, que as autoridades governamentais comportaram-se ilicitamente neste caso. Trata-se de um escândalo do campo da economia, ou seja, no campo da Miriam Leitão. Mas ela não fala disso. Nem ela nem ninguém na Folha, no Estadão, em lugar nenhum. Ninguém quer saber de nada que possa prejudicar o PSDB.

O Globo, que sempre defendeu maior controle sobre as greves do funcionalismo público, só porque o governo está tentando fazê-lo, agora não mais o apoia. Eu apoio, eu acho que o funcionalismo publico deve ter seu direito de greve garantido, mas regulado, até para não desmoralizar o próprio funcionalismo e a greve em si. E o Globo estampa foto na página 3 de um cidadão vestindo uma camisa onde se lê: Polícia Federal traída por Lula. È muita malícia. A Globo nunca publicou os dados que mostram o incrível aumento dos investimentos, em pessoal, em aparelhos, em recursos, de Lula na Polícia Federal. Nunca escreveu editorial elogiando o governo por ter recuperado o prestígio da PF, que nos governos anteriores não prendia ninguém ou tinha atuação medíocre. E agora vem com essa foto, em tamanho gigante, muito pouco informativa, que diz somente a uma querela sindical muito específica. O que acontece é que as pessoas pouco informadas, sobretudo as crianças, ficam com uma imagem equivocada do que acontece.

Sarkosy e o mito da esquerda perfeita

A eleição de Sarkozy está reverberando profundamente no mundo inteiro, sobretudo nos países onde ainda existem esquerdas fortes, como Brasil, Itália e a própria França, e onde os grupos financeiros que dominam setores importantes da imprensa mantém uma batalha diária para impor sua ideologia. No Brasil, o Merval Pereira escreveu um artigo hoje louvando Sarkosy. Um artigo muito vazio, escrito apenas para falar de uma direita “desassombrada”, ou seja, um artigo do tipo auto-ajuda para a direita nacional.

Uma vitória não se esgota após a batalha final vitoriosa. As consequências dessa vitória e a perseguição aos exércitos vencidos são fundamentalmente importantes. È isso que a direita vem fazendo, tentando maximizar os efeitos da eleição francesa. Por mim, acho que a esquerda deve mesmo rever alguns valores, alguns discursos. Não sou nenhum esquerdista fanático. Não acredito em perfeição e acho uma bobagem considerar a esquerda um valor positivo em si. A esquerda precisa mesmo reconstruir uma ideologia mais segura de si, mais lúcida no sentido de compreender o mundo, o ser humano e a economia mundial.

Por exemplo, existe uma grande confusão entre o discurso e a prática. Sempre fui um defensor de Chávez, por exemplo, sobretudo durante a crise política que viveu aquele país, mas permitam-me críticas a ele. Ninguém é santo. Não é porque um sujeito vocifera contra os Estados Unidos que ganha minha admiração automática. Pelo contrário, acho que o Chávez é um grande desastrado na questão da política externa, principalmente na relação com os EUA. Ao vociferar ameaças e bravatas contra os EUA, ele coloca em risco militar o povo de seu país, danifica o comércio do povo de seu país com as empresas americanas e, enfim, cria um fator de instabilidade em todo o continente sul-americano. Não é necessário fazer isso. Outra coisa. Esse tipo de discurso radical afastou milhões de empreendedores venezuelanos, prejudicando seriamente a geração de empregos no país. A partir do momento em que Chávez sabe que não está criando um comunismo estatal, onde o Estado é proprietário de tudo, o que não é sua intenção, creio eu, a sua estratégia tem sido muito nociva à Venezuela, porque se trata de um país com um baixo nivel de industrialização, que precisaria portanto incentivar a iniciativa industrial privada, e não de assustá-la e afastá-la.

Em relação ao Lula, continuo achando que ele está no caminho certo. Os índices econômicos e sociais apontam avanço extraordinário. Faltava cuidar da educação, e os novos investimentos prometidos para o setor devem provocar uma boa melhora. A questão econômica é fundamental para melhorar o nível cultural, e não creio que uma ingerência direita do Estado na educaçao seja saudável. Aumentando os salários dos professores e garantindo mais recursos para as escolas, teremos um excelente progresso. Triste mesmo è a falta de cobrança, por parte da imprensa, de um maior empenho de prefeituras e governos estaduais no setor da educação. Li hoje que o governo de SP fechou dezenas de centros culturais no Estado. Li na Agência Carta Maior, porque os jornalões prosseguem altamente seletivos quanto a este tipo de notícia. O paraíso islâmico de de todo político é ser governador de SP e fazer parte do PSDB.

Reinaldola X Lula

Por fim, registro aqui o impressionante espetáculo de histeria do colunista-blogueiro da Veja por ocasião da visita do Papa ao Brasil. Sendo um papista fanático, o Tio Fedorento entrou em curto-circuito vendo Lula e o Papa confraternizarem. Azevedo critica cada minimo detalhe do comportamento de Lula frente ao Papa. Como pode alguém gastar tanta energia em ninharias? Por exemplo, escreve centenas de palavras babando ira contra a presença de Marisa na reunião de Lula com o Papa. Acontece que o Papa justamente elogiou o fato de Lula trazer sua mulher, dizendo que seria um sinal de valorização da família. Azevedo diz que foi “só por educação”. Que isso quer dizer? Está chamando o Papa de mentiroso? Ás vezes, imagino que Azevedo deve ter pesadelos eróticos com Lula. Mas não vou ficar aqui comentando as bravatas de Azevedo. Lembro da sugestão de Virgílio à Dante (na Divina Comédia) quando passavam diante de certo tipo de condenados especialmente desprezíveis: "guarda e passa". Olho rapidamente e sigo adiante.

1 comentário

Anônimo disse...

Bravos, Miguel! Competentíssimo em suas observações, como sempre, aliás.

Abç

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