25 de outubro de 2008

Crônica de agradecimento e loucuras (eternamente) juvenis

Quero agradecer a todos leitores pela força que dão ao blog, assinando-o, lendo-o, divulgando-o, assinando a revista impressa, fazendo doações. Recentemente, divulguei aqui que estava precisando de uma cadeira ergonômica, por causa de meus problemas de coluna, que custa R$ 250,00, e um leitor fez uma doação neste exato valor. Estou comprando a cadeira hoje, o que me permitirá trabalhar sem dores no braço e ombro, e, portanto, escrever mais e melhor.

Em virtude de vossa confiança, quero esclarecer alguns pontos. Larguei meu emprego fixo para ter mais tempo para me dedicar aos textos que escrevo neste blog. Esta é a razão básica pela qual tenho escrito mais. Acho aconselhável, prudente e, em alguns casos, até necessário, que um blogueiro tenha um emprego estável e fixo que garanta a sua subsistência. Há casos, porém, em que o indivíduo deve concentrar suas energias num só objetivo, com vistas a ser mais eficaz e alcançar a meta desejada.

Completo minha renda com free-lances para revistas. Ofereço meus préstimos para quem precisar, desde que paguem decentemente e dêem-me liberdade para escrever. A vida de blogueiro independente, no entanto, só é aconselhável para quem possui: 1) disposição; 2) talento; 3) gosto pelo debate; 4) tempo livre; 5) coragem para defender suas idéias. Os três últimos itens são fundamentais porque a blogosfera, à diferença do suporte livro tradicional, nunca será apenas um espaço de expressão estética, mas também, quiçá principalmente, uma arena de debate, para todos os temas: artes visuais, cinema, politica e culinária.

Estou enchendo o blog de anúncio para ser mais independente, pois a independência política, tanto de um país quanto de um jornalista, é proporcional a seu grau de independência financeira. Esse tipo de publicidade na internet oferece a oportunidade de uma relação transparente e higiênica entre anunciante e meio de comunicação. O anunciante não interfere no trabalho do comunicador. Não preciso, como num jornal impresso, defender os banqueiros para ter seus anúncios. É um processo robotizado, limpo, impessoal, neutro. Isso não significa ganhar muito dinheiro, mas o mercado convencional para o jornalista (nem falo do escritor) já é tão fechado, que especialistas estão mesmo indicando as vias alternativas. De que adianta ser colunista da Folha de São Paulo ou do Globo, ganhar R$ 400 por matéria (eles pagam muito mal) e sofrer coações, tácitas ou não, ideológicas & estéticas? O resultado é que a maior parte dos formandos hoje visam antes passar em concursos para Petrobrás do que venderem seus corpos para o Ali Kamel.

Os únicos colunistas que ganham realmente bem, e teriam, em tese, maior independência de opinião, são: Arnaldo Jabor, Veríssimo, João Ubaldo Ribeiro, Elio Gaspari. Só. Quatro cidadãos num mar de 300 mil jornalistas. Porque publicam a mesma coluna em dezenas de publicações diferentes. Mesmo assim, nota-se em seu texto, às vezes, uma tensão melancólica, um peso angustiado e, por fim, um tom aborrecido, de quem não tem liberdade suficiente para escrever o que de fato pensa.

Outro dia lembrei uma canção que ouvia na infância, do disco do Saltimbacos: "nós gatos já nascemos pobres / porém / já nascemos livres". É isso. Tenho orgulho de ter largado meu emprego, e estar, pela primeira vez na vida, dedicando-me totalmente ao que gosto de fazer, que é escrever e pensar. Pobre, mas livre, o que é uma sensação realmente poderosa. O que sinto, às vezes, caminhando pelas ruas, podendo pensar e escrever qualquer coisa, é um sentimento de glória. Mas que ninguém se empolgue, é resultado de décadas de leitura, renúncia, privação, risco e, por fim, sem nenhuma perspectiva de estabilidade finaceira pelas próximas décadas. Claro que, para isso, é preciso tomar algumas providências. Primeiramente não ter filhos. A pessoa que tem filhos assina um atestado de dependência eterna: nunca será livre. Falo de escritores, esses miseráveis vaidosos, condenados a um destino de pobreza, desespero e frustração e suas contra-partidas: venalidade, hipocrisia, cabotinismo e mediocridade. Ter filhos deve ter suas vantagens existenciais, mas não para um escritor, para um jornalista independente. Não para mim, pelo menos.

Segundo ponto, e esse talvez seja o mais socialmente cruel: é importante ter um apartamento próprio ou resignar-se a morar, definitivamente, com seus pais ou avós - sendo que, neste caso, é melhor permanecer solteiro. Pagar aluguel é a carga mais pesada e insuportável que um cidadão pode carregar. O aluguel deveria ser proibido nas grandes cidades. Donos de imóvel deveriam ou vender ou morar neles. Taí uma lei quue provocaria uma demanda constante para o mercado imobiliário. Isso ou então viver em pensões ou hotéis, outra opção bastante razoável, desde que houvesse, de fato, pensões e hotéis a preços compatíveis com a renda do brasileiro, quer dizer, do escritor pobre, do jornalista independente, do blogueiro.

Tenho consciência de meus limites, meus defeitos, alguns dos quais sei que carregarei comigo até o fim dos tempos. Outros talvez consiga superar. Há defeitos que manterei, com orgulho, e alguns consumir-me-ão anos de luta inglória, resultando quiçá apenas em cansaço e desalento.

O que eu preciso, portanto, em primeiro lugar, é continuar orando ao deus íntimo que zela por mim (que é, enfim, o velho e bom Deus de sempre, somente um pouco mais cínico e bem vestido) que continue enviando-me centelhas de razão e criatividade.

Quanto ao combate político, não tenho outra ambição do que contribuir, na medida das minhas possibilidades, para elevar o nível intelectual dos debates promovidos na blogosfera. Tenho ciência das minhas limitações enquanto agente político, já que não sei falar em público, minha paciência para ouvir o contraditório é restrita ao tecnicamente necessário para não ser acusado de anti-democrático, e meu comportamento intelectual é deliberadamente anárquico, confuso, apaixonado, subversivo e tendencioso - o que não são exatamente qualidades, antes são espíritos de anjos e demônios que levam-me a beber cerveja ou ler romances policiais baratos com intensidade exagerada. Nada que um bom banho, um café forte, uma corrida no Aterro, e algumas horas de William Faulkner não resolvam.

5 comentarios

Vinicius Duarte disse...

Caro Miguel,

Toda força aí. Seus textos são muito bons, sempre (até quando não concordo com eles, rsrs)

E, no sentido de ajudar, o uso correto da mesóclise no seu texto é "consumir-me-ÃO", sem "h".

Abraço

Miguel do Rosário disse...

valeu pelo h, sempre fico na dúvida sobre ele. se me desse alguns minutos, talvez eu o corrigiria. grande abraço e obrigado pela força.

RLocatelli Digital disse...

Olá, prezado Miguel.

Filosofando: a luz de uma lanterna a pilha mal ilumina um círculo de um metro de diâmetro. Essa mesma quantidade de luz, concentrada num feixe de laser perfura uma placa de aço de um metro.
Agora que sua energia está concentrada feito um laser, ninguém segura você!
Sucesso!

Junia disse...

Que ótimo que escreverá mais. Todos os dias eu vinha aqui várias vêzes ao dia prá ver se havio postado algo, agora sei que sempre terá coisa nova!!
Obrigada e um abraço!!!!

José Carlos Lima disse...

Mecenas como este que fez esta doação é que alavancam o mundo, a arte, ao apoiar aqueles que eles percebem merecedores de sua ajuda.

No decorrer da história da arte estas pessoas estes que colaboraram com artistas, doando até tintas para quem não tinham grana para tal.

Quero parabenizar a pessoa que fez a doação.

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