25 de fevereiro de 2009

Exercício para uma crônica de carnaval n.2



Um rapaz caminha sozinho pelas ruas de paralelepípedo de Bom Jardim. Carnaval, anos 90, eu passava o feriado no sítio dos meus pais nas imediações de Nova Friburgo. O sítio, situado num vale, chamava-se Sítio do Sereno; tinha um hectare e meio, uma casa velha e sólida com três quartos; o Rio Bengala passava ao fundo. Meu pai adorava aquele sítio, onde podia descansar nas férias e nos finais de semana, fazer churrasco, beber uísque o dia inteiro e curtir sauna peladão.

No Carnaval, eu pegava um ônibus e ia para Bom Jardim, onde havia sempre uma festa organizada pela prefeitura, com trio elétrico e centenas de barraquinhas. Os homens se fantasiavam de "piranha" e as garotas desfilavam em roupas sensuais. Eu começava, como sempre, bebendo latinhas de cerveja e, a certa hora, quando via que era chegado o momento de passar para outra dimensão, pedia um copo de conhaque. A partir dali, as memórias se apagavam. Foram muitos carnavais assim, solitários, melancólicos, loucos. Outros tantos carnavais passei com amigos em cidades como Visconde de Mauá, Sana, Búzios, Friburgo, Valença e Lençóis (Bahia).

Volto ao carnaval de Búzios, que passei com um grupo de quatro amigos: Felipe, Rodrigo, Rafael e Pedro, todos dormindo no mesmo quartinho de um alojamento-camping. Na época, eu era quase autista, por timidez, introversão ou por aquele grau de esquizofrenia do qual muitos jovens costumam sofrer em certas épocas. O fato de usarmos quantidades colossais de maconha e bebermos toneladas de cerveja, dentre otras cositas, seguramente não me ajudava a alcançar um satisfatório equilíbrio psicológico.

Nesse sentido, meus amigos pareciam todos mais fortes e mais sólidos. Dentre eles, o mais próximo era o Felipe, a pessoa mais honesta que já conheci. Os outros não me conheciam tão bem. Lembro que, antes de viajar, escolhera um livro à esmo em casa para levar para a viagem. Era de um autor chamado Sidney Sheldon, um best-seller bobinho. Havia um rapaz, Pedro, alguns anos mais velho, que me subestimava muito. Ele era alto, louro, tinha uma postura arrogante, e de vez em quando me chamava de "caboclo", o que era uma derrisão até meio racista. Encontrando o tal livro no quarto, e descobrindo que me pertencia, declarou que "só podia ser do Miguel".

Pedro também era faixa preta de judô. Eu já estava irritado com o jeito pedante do cara. Até que uma noite, enquanto a gente bebia no quarto, eu disse que também estudara um pouco de judô, embora nunca tenha passado da faixa amarela. Então ele me chamou para lutar. Ah, que surpresa. Eu, mais baixo, mais magro e mais novo, com uma força certamente extraída da minha loucura, apliquei-lhe um golpe e o imobilizei por vários minutos, quase o sufocando, até que ele desistiu. Os outros ficaram muito empolgados com a luta, bateram palmas, gargalharam furiosamente, porque sabiam que o Pedro era medalhista, e conheciam seu lado orgulhoso, de forma que minha vitória havia sido, em todos os sentidos, surpreendente.

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Seguem alguns vídeos do Cordão do Boitatá e do Boitolo, que é para ilustrar a recente crônica sobre o tema, que gerou alguma controvérsia.







1 comentário

josaphat disse...

Também passei um carnaval em Búzios com dois amigos e dormindo em um quartinho que devia ter uns 2,5 x 2,5 mts e onde só havia uma cama e sem ventilador e se a gente não se deitasse bêbado seria impossível para Morfeu nos embalar.
Agora, ..."seguramente não me ajudava a alcançar um satisfatório equilíbrio psicológico." foi muito engraçado.

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