4 de setembro de 2008

As manchetes perdidas e os tesouros no fundo do mar

Por conta do factóide dos grampos, várias manchetes legais foram engavetadas. Pesquisa do Dieese indicou que o custo da cesta básica caiu, e fortemente, em praticamente todas as grandes capitais. A indústria registrou um salto vigoroso em agosto, puxado por um segmento promissor, o de bens de capital, que é o setor ligado à compra de maquinários. O índice de utilização da indústria ultrapassou 83%, o maior da série histórica. São dados que, analisados em conjunto, indicam uma grande pujança da indústria nacional. Não se trata de otimismo idiota. São dados econômicos e publicações internacionais, como The Economist, The Wall Street Journal, entre outros, nos últimos tempos, vem apontando justamente para esses dados.

Política, economia e cultura são três senhores caminhando pela mesma estrada. Nem sempre juntos, mas sempre na mesma direção.

A maneira como a mídia torce contra o Brasil é patética. Ontem, houve um fato importante, histórico, e a mídia procurou, de todas as maneiras, obscurecê-lo. Jorrou o primeiro petróleo do pré-sal. A Miriam Leitão nem tocou no assunto. Preferiu falar de grampo. Os jornais publicaram belas fotos na primeira página, mas as manchetes ficaram com as patuscadas de Gilmar Mendes e da Veja.

O que mais me assombrou ontem, porém, foi a grotesca tentativa de desqualificar a Abin por ter adquirido um equipamento eletrônico. Entristeceu-me a participação do ministro Nelson Jobim, fazendo o jogo midiático. Achei, no mínimo, traiçoeiro da parte dele. O governo federal precisa de um eficiente e poderoso serviço de inteligência, porque o Brasil é um país com imensos recursos naturais e humanos e precisa se proteger de inimigos domésticos e estrangeiros. A Abin está sendo recuperada, assim como o foi a Polícia Federal. Por isso, acho não só normal que a Abin adquira equipamentos eletrônicos de varredura de último tipo, como até acho absurdo que já não os tivesse. Acho estranho quem acha estranho que a Abin, o serviço oficial de inteligência do governo brasileiro, adquira um computador que faz varredura. Há o fato deste computador poder ser adaptado e ser transformado num instrumento para realização de escuta telefônica. E daí? Pode ser adaptado? Ora, qualquer coisa pode ser adaptada para qualquer coisa hoje em dia. Pode-se dizer que o tal computador pode ser adaptado para se transformar numa bomba atômica, o que significa que se pode fabricar manchetes dizendo que a Abin está construindo uma bomba atômica. Ademais, nem é o caso. Um diretor da Abin foi à CPI dos Grampos e explicou que o tal equipamento só pode fazer escuta - depois de adaptado - num raio de 100 metros. Ou seja, nada. E não custou 500 mil reais, e sim 20 mil dólares.

A nossa mídia está ficando parecida às novelas das oito. A gente pode ficar sem ver por semanas, e quando volta tudo continua na mesma.

Os editorialistas ainda estão à caça de comunistas. As expressões "político-ideológicas", "ideológicos", são usadas à farta nos editorias, no sentido mais pejorativo possível, como se um interesse ideológico fosse, terminologicamente, conceitualmente, negativo, e o irônico é que, ao agirem desta forma, ela, a mídia, é que está sendo ignominiosamente ideológica, porque criminaliza a política e, portanto, a própria democracia. Ideologia não é crime, carajo. O governo tem interesses ideológicos porque o povo os tem, e o povo vota nos seus representantes e estes então defendem os interesses ideológicos do povo. O povo quer saúde pública, o povo quer educação, o povo quer assistência social, o povo quer que o dinheiro do petróleo permaneça no país. A mídia acusa a esquerda de ranço autoritário, o que é ridículo, por confundir a esquerda brasileira, democrática, com uma já-perdida-na-história esquerda totalitária alienígena, oriental. A mídia sim tem um ranço autoritário, que vem não apenas da ditadura mas do império. Temos uma imprensa imperial. O tom melodramático dos editoriais continua o mesmo. Se você pegar o Globo de 50 anos atrás, verá que os editoriais são rigorosamente os mesmos. Há que se cumprimentar o Globo, e o Estadão e a Folha, por sua coerência, ou lamentar pela estagnação histórica.

Quanto aos tais interesses ideológicos, trata-se de um tema que estou sempre abordando. O que a direita brasileira não compreendeu - e a mídia corporativa tem se revelado um sólido refúgio de uma direita cada vez mais isolada do mapa eleitoral - é que a ideologia da esquerda mundial está em construção, está aberta. É uma obra aberta, sensível às peculiaridades econômicas e culturais de cada país e, sobretudo, aprendeu a se relacionar com o capital de uma forma mais adulta. Afinal, se o Estado não tem condições de dar emprego para todo mundo, o mínimo que se pode esperar do Estado é respeito pelas pessoas e empresas que geram empregos e contribuem para a economia nacional.

Além do maciço apoio popular, e da totalidade do apoio sindical, Lula foi apoiado, tanto em 2002 e 2006, por grandes indústrias, redes de varejo e instituições financeiras, porque criou-se um entendimento que a má distribuição de renda e a pobreza eram problemas que obstaculizavam o desenvolvimento econômico do país e que se eles fossem atacados, com atenção prioritária, seria como retirar as pedras que represavam as águas de um grande e caudaloso rio.

O engraçado é ver gente que, diante da força dos números, passaram a negar a credibilidade das instituições. É uma reação estranha, psicótica, de gente tão acostumada a enxergar negativamente as coisas, que ficou mutilada mentalmente para as interpretações mais singelas, quando elas apontam sinais positivos. É engraçado porque negam a ciência e portanto são medievais.

Naturalmente, a vida não é um mar de rosas para ninguém. É um mar de verdade, com tubarões, detritos estranhos, coliformes fecais, mas também com bastante peixe para comer e lá no fundo, bem no fundo, podemos encontrar tesouros ocultos.

3 comentarios

Anônimo disse...

Caro Miguel,
são poucos os que têm capacidade de "encontrar" esses "tesouros" (o pré-sal sempre esteve lá rsrsrs). E
por falar em tesouros, tenho colecionado os "tesouros" que são os seus posts.
Parabéns e obrigado!

Anônimo disse...

Texto primoroso, parabéns.

Anônimo disse...

Grande Miguelito.
Comentar o quê? Só há duas coisas a fazer. Divulgar e meditar. Não dá para aceitar tanta burrice. No melhor momento de sua história, na hora de dar um salto qualitativo, tanto desencontro inútil, irracional; Tantos brasileiros, tantas cabeças importantes torcendo contra o Brasil. Tudo por causa de preconceitos, de mentes distorcidas por uma ânsia doentia, de 'intelectuais' que estão aí dando murro em ponta de faca, lutando pateticamente contra essa enorme onda de realidade que transforma a nossa história e alavanca nosso País. Chegamos ao ambiente que a maioria queria. Democracia, com muita participação política, muita transparência, boa distribuição de renda, bom crescimento econômico, bom desempenho da polícia, etc. Por que melar o Jogo? Por que esconder o sucesso?

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