4 de dezembro de 2008

conversa póstuma

(Helcio Barros)



"Porque nenhuma batalha se vence ele disse. Elas não são nem ao menos disputadas. O campo de batalha revela ao homem somente a sua loucura e desespero".
O Som e a Fúria, William Faulkner.


*

de que adianta morrer
se deixas teu cheiro
e contas não pagas
em hotéis baratos
da praça tiradentes?

de que adianta fugir
para outros mundos
sem compreenderes
que o amor
não cobra dívidas?

ainda estamos aqui
apreendendo
a poesia
enquanto te entorpeces
junto a são pedro

tua festa póstuma,
sinto informá-lo
foi cancelada

mesmo agora
perante o vazio
tua amizade
continua se esfacelando

não há bondade
sem elegância
e as cegonhas
daquele filme russo
ainda voam

*

nem as bandeiras
que agito
nem os versos
canhestros
os pombos mortos
a neuro-solidão
e as cigarras
histéricas do aterro
nada se compara
ao grito de guerra,
covarde, louco,
ecoando lá no fundo
infinito
da história

*

talvez uma autópsia
permita descobrir
o poema
oculto em tuas entranhas
aquele que nunca
lograstes escrever

só não me peça
benevolência

com muito custo
e cerveja
mantenho vivos
minha burrice
e talento

a compaixão, porém,
eu guardo
para as crianças
que me pedem dinheiro

*

não te verei mais
no quadrilátero
do crime e talvez
sinta saudades

mas, you know,
bêbados
não tem saudades
bêbados bebem
escutam música
jogam sinuca
arrumam confusão
e se apaixonam
perdidamente
pelas amigas
desempregadas

por isso,
perdoe-me
seu grandessíssimo
filho-da-puta

não tenho tempo
para pensar em ti
estou ocupado
ouvindo john hammond

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