7 de outubro de 2009

Globo tenta, mais uma vez, quebrar a espinha da UNE

A turma do Ali Kamel não engole que o movimento estudantil seja de esquerda, partidário, ideológico e, supremo vício, apóie o governo Lula. Os platinados têm um tipo ideal de movimento estudantil na cabeça e não descansarão enquanto não produzi-lo. Estão se esforçando para isso. Hoje, quarta-feira, 7 de outubro, o Globo estampa na primeira página uma enorme foto com uma multidão de 12 estudantes, reunidos no playground de algum edifício da zona sul. Depois dedica a página 4 inteira ao grupo. Repare na declaração de "bom-mocismo" de um dos integrantes:

"Somos apartidários, não queremos nos envolver com nenhum tipo de jogo político."

Eu não quero julgar esses garotos. Acho extremamente positivo que a juventude se politize. Tenho certeza, aliás, que eles, desde que ingressem, de verdade, na política estudantil, irão, mais cedo ou mais tarde, aproximar-se de partidos e governos. É natural e saudável que assim aconteça. A tentativa grotesca dos ideólogos do Globo de criar um movimento estudantil que não faça política dá vontade de rir.

Pode ser interessante haver um setor não-partidário no movimento estudantil, mas muita gente esquece que os jovens deixam de ser jovens e os estudantes deixam de ser estudantes, e que precisarão aplicar a experiência política acumulada em alguma parte e, no Brasil como em qualquer outra democracia, é preciso estar inscrito num partido para participar da vida politica oficial do país. A menos que não se queira fazer política de verdade, e se tornar uma espécie de diletante palpiteiro (como eu).

É preciso, sobretudo, não criminalizar partidos ou governos, porque, ao fazê-lo, critica-se o próprio modelo republicano nacional, já que essas são as únicas instâncias realmente democráticas da sociedade. Claro que há problemas no movimento estudantil, nos partidos, e nos governos, e nas relações entre as partes, mas é preciso modernizar essas relações, não pretender, ingenuamente, extingui-las.

Sim, os partidos, muitas vezes, aparelham o movimento estudantil de forma fria e negativa, mas também dão suporte para que estudantes pobres possam exercer participação política. Sem apoio partidário, nenhum estudante pobre poderia participar do movimento estudantil, ou ficaria muito mais difícil para eles. Não é por outra razão que os 12 estudantes fotografados pelo Globo são estudantes de classe média, que estudam em colégios caros da zona sul carioca.

O ridícula da história é o Globo tentar vender um movimento insignificante, localizado num pedacinho endinheirado do Rio, como algo comparável à UNE, cujos números chegam às dezenas de milhares de delegados eleitos democraticamente.

Tenho respeito por esses 12 estudantes, repito. Mas eles precisam tomar cuidado para não serem manipulados pela ideologia antipolítica (hipocritamente antipolítica, diga-se de passagem, porque a mídia nunca foi tão politizada), que criminaliza partidos, ideologias e movimentos sociais organizados.

Em sua campanha covarde para desqualificar a UNE, o Globo sempre lembra o papel da entidade na ditadura militar, sem contextualizar o momento, e, sobretudo, sem se auto-contextualizar. Na época, o movimento estudantil foi destroçado pela ditadura e pelos meios de comunicação. No dia posterior ao golpe, o Globo noticiou, sem disfarçar o êxtase, a depredação e incêndio da sede da UNE. E durante os anos de chumbo, sempre retratou os jovens que protestavam como baderneiros.

O Globo criou o mito de um movimento estudantil eternamente revoltado contra tudo e contra todos, o que não corresponde a realidade ideológica do jovem contemporâneo, cujo espírito já assimilou as transformações mundiais, como o fim do mundo socialista e a abertura econômica da China. O socialismo não morreu, mas modernizou-se e, para desespero de alguns reacionários, de direita e esquerda, amadureceu. Desde os tempos de Lênin, os verdadeiros revolucionários são aqueles que não negam a realidade, que entendem a correlação de forças e que procuram agir visando resultados concretos.

O movimento estudantil deve, sobretudo, precaver-se contra a instituição mais reacionária nesses tempos de decadência liberal: a imprensa corporativa, este odioso Leviatã midiático que vem minando a democracia em toda a América Latina, inclusive, em pleno século XXI, apoiando golpes de Estado. Deve lembrar-se que a UNE apoiou João Goulart em 1964, e também era criticada pela mídia reacionária da época, também era chamada de chapa-branca. O governador de São Paulo, José Serra, quando era presidente da UNE e ainda não se havia bandeado para o conservadorismo midiático que professa hoje, discursou ao lado de Goulart no último comício deste.

O Globo trabalha incessantemente para quebrar a espinha de movimentos sociais, partidos, sindicatos, todos que defendem os trabalhadores no país; e a estratégia de "dividir" para reinar sempre foi eficiente. O movimento estudantil precisa de sangue novo. A política brasileira precisa de sangue novo. Mas como contribuiremos para renovação da classe política brasileira se defendermos um movimento estudantil "não-partidário" e distante do "jogo político"? Como teremos um melhor Congresso, um melhor Senado, condenando a participação partidária?

Também é egoísta e medíocre a argumentação de que ao movimento estudantil só cabe pedir "reforma educacional". Por quê? O movimento estudantil deve participar das políticas de todos os setores, não apenas do setor educativo.

O irônico é acusar a UNE, com seus congressos de 20 mil delegados, com suas milhares de ramificações estaduais e municipais, de não representar os estudantes e, ao mesmo tempo, pretender que um grupo de 12 estudantes de escolas ricas da zona sul carioca tenha representatividade relevante.

As forças conservadoras preferem que nossos jovens se mantenham afastados das lides partidárias porque têm plena consciência de que a maioria esmadora da juventude professa uma ideologia de esquerda - o que seria até aceitável, desde que não fosse esse maldito esquerdismo contemporâneo, pragmático e astuto, sem medo do poder. Os conservadores querem, no fundo, deixar o terreno livre para que os sindicatos patronais ocupem o espaço político que deveria, democraticamente, pertencer ao povo. Com apoio de militares, mídia, associações empresariais, parlamentares pouco comprometidos com a democracia, e com uma juventude apartidária e despolitizada, os Michelettis do mundo poderão sempre dar seus golpes e assumir o poder.

9 comentarios

Anônimo disse...

Para vcs verem a que ponto chega a loucura da Rede Goobles, no Jornal Hoje, ao noticiar a troca da data do enem, eles chegaram ao absurdo de entrevistar duas "patricinhas" que moram em Paris e vieram ao Brasil só para fazer as provas do enem.Estavam voltando para a França, a tempo de degustar um bom vinho e queijos, decepcionadas com a mudança de data. O jornaleco Hoje foi incapaz de citar a Grafica da Folha que permitiu toda essa confusão, ou produziu toda essa confusão.
Um abraço

José Carlos Lima disse...

Vi as imagens da manifestação e, como não poderia deixar de ser, os mauricinhos e patricinhas apareceram com narizes de palhaço, como nos bons(?) do fracassado movimento Cansei.

Outra coisa que me chamou foi a ausência de pessoas de cor negra em tais manifestações, o que é lógico, pois a nossa burguesia não gosta de preto estudando, trabalhando.

Anônimo disse...

"Somos apartidários...."
Sei.
Esta frase é digna de Madre Tereza de Calcutá.
Quer dizer então que usar símbolos do fracassado movimento Cansei, e procurar a Globo, de oposição a Lula e à esquerda, é ser apartidário.

É de dar nojo.

Este tipo de gente no Congressos da UNE costuma fazer suas carretas em carrões de luxo para "defender a democracia", claro, uma democracia do ponto de vista deles:

contra os negros

contra o PROUNI

contra o bolsa-família

André Rezende.

Vera Pereira disse...

É clara a tentativa de manipulação dos jovens aspirantes ao ensino superior. É muito prováel que a ideia da sabotagem (eu acho que foi sabotagem da FSP) tenha sido do Paulo Renato de Souza, ex-ministro da Educação do FHC. Como todo aliado de FHC, Paulo Renato se julga um sábio e é tão preponte quanto os dois amigos diletos, Serra e FHC. Péssimo ministro da Educação, odiado pela maioria dos professores, alunos e funcionários das universidades federais no Brasil inteiro, no tempo em que trabalhei numa delas, foi um reitor da Unicamp dos mais truculentos nos anos 80 (onde também trabalhei e convivi com essa figura). A idéia deve ter sido desmoralizar de uma vez o ministro Fernando Haddad (que era cotado para concorrer ao governo de SP) e o Enem como formato de substituição dos vestibulares. Tudo bem, mas eu acho que o ministro Haddad, de resto muito bom, deve ter se empolgado demais com as possibilidades do Enem e possivelmente tentou dar um passo largo demais: passar de uma avaliação que reunia algumas centenas de milhares de alunos a uma prova com validade de vestibular que juntou milhões. O modelo do Enem tinha de ser revisto sim. Mas sem dúvida agora ele já sabe que é preciso dormir com um olho aberto, porque os corvos pessedebistas parece que nem dormem.

Nelson disse...

Não apenas na capa do Globo, os jornalões de S.Paulo, das organização José Serra (Estadão e Folha) também publicaram fotos na primeira página da manifestação dos mauricinhos e patricinhas das escolas tradicionais do Rio. E como o José Carlos bem observou, nenhum negro na turminha.

Ines Ferreira disse...

Miguel,
Acho que o MEC deveria fazer sempre as provas com Empresas sérias como o Cesgranrio, Cesp que já viam fazendo as provas do Enem a mais tempo sem ter tido nenhum problema até hoje. As provas do Enem, é assunto do muito sigiloso, deve ser dispensável de licitacão.
Ao abrir para empresas desconhecidas, o caso deste consórcio, deu no que deu, a ainda municão p/ mídia direitista se esbaldar.

Anônimo disse...

A UBES entrou em campo para defender o ENEM.
Serra conseguiu o que queria: boicotar o ENEM.
Prá isso deu ordens para que a gráfica Plural/Folha fizesse vista grossa para vigilância das provas.
Ao invés de vigilantes a Folha colocou larápios para lidar com as provas.
Tudo programado conforme o desejo de Serra.
Nem a gravação que foi feita pela propria gráfica serviu para se impedir o crime.

Augusto, candidato concurso ENEM.

Anônimo disse...

Lula falou e disse:
que suspeita de ser sabotagem por parte de gente que teria sido prejudicado pelo ENEM
Só faltou pronunciar que o tal é o mafioso Serra, expert em serviços de inteligência onde os mandantes nunca aparecem, como deve ser todo serviço de inteligência que se preze.

Augusto

Márcio disse...

Claro que UNE precisa de alguns ajustes, entretanto botar uma dúzia de playboys num jornal e dizer que eles são oposição a UNE é brincadeira! que a mesma teve uma atitude conformista é fato, agora esses mauricinhos da zona sul estão reclamando pelo fato do adiamento ter atrapalhado os interesses deles, não estão nem um pouco preocupados com a educação de maneira global, porque nunca fizeram uma manifestação pela melhoria do ensino público? é a mesma turminha do movimento pró - democracia, que se colocam como apartidário, avisa para estes que dentro da democracia moderna é necessário filiação partidária para participar do jogo político, enquanto isso a emissora que engana o povo continua manipulando o povo em favor da classe média e média alta como os doze revoltadinhos do zona sul.

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