27 de abril de 2010

Rubens Barbosa e os 10% de verdade

Hoje, no Globo, me deparei com um artigo de Rubens Barbosa falando mal do Mercosul. Até aí tudo bem, ele é tucano, foi embaixador no tempo de Fernando Henrique, e essa turma gosta mesmo é de tirar o sapato para os EUA. O artigo também foi publicado no Estadão.

Acontece que me intrigou o seguinte trecho do texto:

Com as sucessivas medidas restritivas e contrárias à tarifa externa comum (TEC), desapareceu a agenda de liberalização comercial, principal característica da fase atual do Mercosul, a união aduaneira. A perda de relevância comercial para os países membros (o Mercosul representou cerca de 16% do comércio exterior brasileiro em 1998, contra menos de 10% em 2009) não estimula maiores esforços para a superação das dificuldades.

Estranhei. Ué? Mercosul perdeu espaço na pauta das exportações brasileiras?

Os leitores desse blog sabem das minhas manhas estatísticas. Então lá fui eu fuçar o Sistema Alice, em busca de informações detalhadas sobre a informação de Barbosa.

E o que descobri? O que eu já suspeitava. Não se trata exatamente de uma mentira, mas de uma distorção malandra. Em 1998, o Mercosul, de fato, representou até mais do que o apurado por Barbosa, 17%, contra 10,3% em 2009.

Ocorre que, em 1998, as exportações brasileiras totalizaram 51 bilhões de dólares, contra 153 bilhões em 2009. Em 2008, antes da crise internacional, as exportações brasileiras haviam atingido 198 bilhões de dólares.

Ou seja, Barbosa usa um percentualzinho chulé para distorcer a realidade, dando a entender que estávamos melhor antes do que agora. Em 1998, o Brasil registrou déficit na balança comercial de 6 bilhões de dólares, ou seja, importou mais do que exportou. Em 2009, houve saldo de 25 bilhões de dólares.

Mais uma: em 1998, o Brasil registrou déficit no comércio com o Mercosul de 538 milhões de dólares. Em 2009, ano ruim, teve saldo positivo de 2,7 bilhões, após registrar saldo de 6,8 bilhões em 2008.

Ou seja, o Mercosul gerou imensa quantidade de divisas para o país e o tucanão de cabelos lambidos vem com esse chororô de crocodilo. Quer enganar quem?

De 1998 para 2009, as exportações brasileiras para o Mercosul cresceram 78%. A queda na participação do Mercosul no bolo total aconteceu porque as vendas brasileiras para outros destinos cresceram muito mais. Só para a China, as exportações brasileiras cresceram 1580% no período, puxando os percentuais para si. Em se tratando de estatísticas de percentual, se um ganha pontos, outro perde.

Além disso, a qualidade das exportações brasileiras para o Mercosul também cresceu, com o preço médio subindo de 774 dólares a tonelada em 1998 para 1.494 dólares a tonelada em 2009.

Entretanto, um raciocínio se impõe. Segundo Rubens Barbosa, o Mercosul é ruim e estaria engessando as exportações brasileiras. Ora, em vista do aumento espetacular das exportações nos últimos anos, eu gostaria de saber onde é que o Mercosul atrapalhou?

Se o Mercosul corresponde a 10% das exportações brasileiras, contra 17% no passado, é porque o país ampliou substancialmente o leque dos destinos de seus produtos, e não porque o Mercosul deu errado. Parece-me que esses 10% deveriam ser aplicados, isso sim, ao percentual de verdade no texto do embaixador.

Clique nas tabelas para vê-las por inteiro.



5 comentarios

Kiril Araujo disse...

Miguel, acho que deve ser: Em 1998... ou seja, importou mais do que exportou.
Ou ainda, exportou menos do que importou.
De todo modo, muito bem observado, esse tipo de coisa já virou praxe.
Um abraço.
Kiril
São Paulo

Miguel do Rosário disse...

Já corrigi, Kiril. Valeu.

Lino disse...

Contra ratos os fatos... ou números!

Unknown disse...

è sempre a mesma coisa lembro alguns anos atraz querendo comparar o dempenho do brasil com a argentina somente nos numeoros percentuais tipo arg 7% E BRA 2,5% Mas transformando em $ era discrepante a diferença tipo a argentina movimentou milhoes e o brasil bilhões.

ziulsorrab disse...

Miguel qual o móvel de lesa evolução do PSDB? Declarar o Mercosul uma farsa foi mais uma senha do que querem. Sujeição à Alca, à ideologia da riqueza seja qual for sua amplitude em relação á desigualdade de renda das famílias, No Brasil inaceitável em face de nossa riqueza natural.
Já disse o vaticínio épico ibérico “América latina, berço de uma nova civilização”, encontra-se poeticamente contido em nosso Hino e na nossa Constituição em seu emblemático art. 4º, quanto mais no seu parágrafo único que diz: O Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações"

Não uma sujeição econômica imperialista como a mentalidade anglo saxonica que se esgotou na Europa com a perda das colônias e nos EUA pelo esgotamento de suas riquezas e que pelo excesso de consumismo adotou a doutrina bélica intervencionista como se depreende do Destino Manifesto (Wikipedia).
Aqui a explicação da polaridade extremada que ocorre nessa eleição. Uma mudança de ciclo nítida á partir de um lado a esquerda possível, (PMDB, acordo c/ Judas se fosse eleito, etc) que Lula lidera intuído e do outro Serra/PSDB. Serra/PSDB que não estão sendo violentados pelo “destino missão”, eles crêem e praticam firmemente por convicção os valores do velho ciclo que agoniza e então essas energias plasmadoras do novo ciclo já formando uma corrente de pensamento nesta quadra totalmente favorável ao novo ciclo “usam” fazer com que Serra “erre” dando mais esta senha “O Mercosul é uma farsa, uma barreira”
Serra é contra a Constituição brasileira textual e ideologicamente. Serra/PSDB crêem na competição, no individualismo exacerbado enfim no Estado mínimo do ciclo que se esgotou.

O óleo do diabo participa ainda mais sendo sinônimo de Lúcifer-luceferino, a luz das tradições. Contamos e participamos dessa tarefa.

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