28 de fevereiro de 2011

O inimigo agora é outro


(Judith, segurando a cabeça de Holofernes, em pintura de Lucas Cranach, o Jovem).

A articulação de Kassab para sair do DEM e ingressar no PSB, através de uma longa e tortuosa artimanha jurídico-partidária, me lembrou esses casais que preparam o casamento com um antecedência de mais de ano, o que sempre me pareceu prova de invejável determinação e autoconfiança. Quanta coisa pode acontecer num ano! A metáfora, no entanto, não é muito boa porque não dá conta do aspecto burlesco do caso. Analistas políticos já começaram a troçar, e com toda razão.

Não temos, porém, apenas um caso burlesco. Há um componente maquiavélico também. E tão óbvio que já foi parar na lavanderia da Barão de Limeira. Renata Lo Prete, colunista da Folha, deu nota hoje em que nega a existência de fantasmas, mas admite que há ruídos estranhos na casa.

Não procede a ideia, propagada pelos petistas mais desconfiados, de que toda a movimentação de Gilberto Kassab (DEM) se dá em sintonia oculta com José Serra (PSDB). Mas também não é verdade que os possíveis destinos partidários do prefeito de São Paulo sejam todos igualmente mal vistos por aquele que o projetou na política. A ida para o PMDB, agora praticamente descartada, seria puro prejuízo para Serra, dado que a sigla não só está com Dilma Rousseff como ficará com o PT em 2014. Já a migração para o PSB, com ou sem passagem por uma nova legenda "de transição", poderia render dividendos no longo prazo.

Quem sabe? Os serristas estão convencidos de que Eduardo Campos, dono do PSB, não conseguirá realizar o sonho de desalojar o PMDB e ser vice na chapa de Dilma ou de Lula em 2014. Isso posto, poderia ser atraído para um projeto alternativo -ainda que o tucano mais próximo do governador de Pernambuco seja Aécio Neves.

Outra grã-fina da imprensa paulista, a Eliane Cantanhede, vai na mesma linha:

(...) é cedo para o governo federal e o PT comemorarem. Ok, o apoio a Dilma vai aumentar, mas o PSB, que já tem Eduardo Campos e Ciro Gomes e colecionou vitórias nas eleições de 2010, vai encorpar e disputar forças com o PMDB. Os dois podem "ensanduichar" o PT. O PMDB já é o maior partido, o PSB infla, e o PT está cheio de si e de cargos, mas não é porto seguro para os "neogovernistas" loucos para virar dilmistas desde criancinhas. Como ficam os "aliados" agora e na eleição de 2014?

A tese das jornalistas encaixa-se perfeitamente no que já vem dizendo há tempos Wanderley Guilherme dos Santos: o inimigo agora é outro. E falo em inimigo apenas para fazer uma paródia com o lema do filme Tropa de Elite II. Se no primeiro filme, combatiam-se traficantes, no segundo, a guerra se dá contra a própria polícia. Uma guerra doméstica, portanto.

É uma questão lógica. O discurso de que não há oposição no Brasil não procede. Ela pode estar quieta, como os fantasmas, mas "que los hay, los hay", e não necessariamente virá dos partidos conservadores tradicionais.

O problema, afinal, não é o PSB querer disputar a presidência em 2014, e sim quais serão seus aliados nessa empreitada. A recepção calorosa que a direção socialista organiza para o prefeito paulista e a participação do PSB nos governos tucanos de São Paulo e Minas Gerais mostra que o partido se tornou uma espécie de coringa no baralho político nacional. Ele pode ir para qualquer lado, mas tem procurado, principalmente, atrair nomes de peso do conservadorismo nacional: latifundiários, presidentes da Fiesp, ex-caciques do DEM... O que me leva a pensar que o PSB poderá, de fato, vir a se tornar a ponta-de-lança que irá ferir as costas da esquerda brasileira e abrir caminho para alguns temerários gengis khan (que bem conhecemos...) voltarem ao comando das legiões.

Uma terceira mulher, Luiza Erundina, que presumo tenha alguma experiência política, também percebeu do que se trata:

"O PSB não pode ser barriga de aluguel. Kassab é o plano de Serra para derrotar Alckmin. É um pedaço do PSDB tentando derrubar outro pedaço do PSDB."

Mas eu acrescentaria uma observação: o plano pode ser de Serra, mas é para emplacar Aécio em 2014. Serra, já resignado com falta de condições políticas para se candidatar novamente ao cargo máximo, opera nos bastidores para se tornar o lider que levará o mineiro ao Planalto, ganhando terreno para ser, desde agora, presidente do partido e, após a vitória em 2014, talvez ministro da Fazenda...

2 comentarios

Anônimo disse...

Bonde sinistro! Bonde do Terror!

Anônimo disse...

"O PSB não pode ser barriga de aluguel. Kassab é o plano de Serra para derrotar Alckmin. É um pedaço do PSDB tentando derrubar outro pedaço do PSDB."

Mas eu acrescentaria uma observação: o plano pode ser de Serra, mas é para emplacar Aécio em 2014. Serra, já resignado com falta de condições políticas para se candidatar novamente ao cargo máximo, opera nos bastidores para se tornar o lider que levará o mineiro ao Planalto, ganhando terreno para ser, desde agora, presidente do partido e, após a vitória em 2014, talvez ministro da Fazenda...

Risível a frase de Luisa Erundina, só quem vive no mundo da lua do congresso nacional pode emitir tal opinião. Acompanhasse de modo mais rigoroso o cenário político de São Paulo, sobretudo a densidade política de um e de outro (Kassab e Alkmin), a deputada saberia que Kassab não existe políticamente frente a Alkmin. Kassab não passa de um prefeito biônico, e não se reelegeria prefeito, muito menos governador. Quanto ao que diz o titular deste blog, cabe um reparo: Plano do Serra para cadifar e eleger o Aécio? É para rir? Se o ilustre autor do texto acompanhasse mais amiúde a carreira política de José Serra saberia que o mesmo é o típico político do bloco do "eu sozinho", dono de um umbigo maior que o oceano atlântico. Alguém assim não elege um "inimigo.
Saudações cordiais.

P.S.
Se a análise feita de modo tão efusivo se mostrar errônea, o aultor do texto e, também, a deputada, emitirão um pronunciamento acusando o erro de avaliação? Espero que sim! Chutômetro na grande imprensa ou em blogs alternativos são sempre irresponsáveis.

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