29 de março de 2006

Calejado em crises

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(Em 2005, o salário sobe e o desemprego cai. Enquanto o Globo publica cartinhas
chorosas da classe média TFP, o povo festeja a vida e vota em Lula )

A queda do ministro Palocci abriu mais feridas no campo governista e em seu imenso exército de simpatizantes. Levará alguns dias para cicatrizar, e deixarão marcas na pele, a serem incessantemente apontadas pela oposição. Os novos filisteus apontarão as marcas e dirão ao povo que são sinais malditos. Mas os lutadores sabem que só se fere quem se arrisca, quem age, quem toma posição. As cicatrizes serão as medalhas desta guerra. Daqui a muitos anos, quando os observadores elogiarem o vigoroso salto social, econômico e de política externa do Brasil durante o primeiro governo Lula, os combatentes de hoje saberão que contribuíram para isso. E lembrarão, com orgulho, dos momentos difíceis que enfrentaram.

A história se repete de forma muito interessante. A hostilidade entre setores do jornalismo e da oposição e o governo lembra muito a época Vargas e JK. Mas foi durante Vargas e JK que passos cruciais foram dados, de consolidação da autonomia econômica e industrial do país. Petrobrás, Vale do Rio Doce, Companhia Siderúrgia Nacional, Salário Mínimo, Leis Trabalhistas, Brasília, tudo foi criado e consolidado por estas duas lideranças excepcionais.

A atitude de Palocci e Mattoso, ao que parece uma atitude ingênua e arrogante, a saber, brincar com o sigilo bancário de um cidadão, mesmo que sob suspeita de ter sido subornado, representou mais uma facada nas costas no presidente Lula. Ele não merecia isso, justo agora que havia recuperado a popularidade e as contas públicas atingiram a maturidade necessária para o início de uma nova fase de investimentos.

Mas aconteceu, bola pra frente. Vale como lição para todo país. Espera-se que oposição também tenha aprendido e não volte a violar sigilos como tem feito nas CPIs. Como era de se esperar, Jabor, Miriam Leitão, Merval Pereira, os representantes políticos da oposição na imprensa, exultaram com mais essa chance de golpear o governo. Que se divirtam.

É preciso, no entanto, fazer justiça à firmeza e rapidez com que Lula e o ministro Thomaz Bastos determinaram a solução do problema. O governo podia ter encontrado um bode expiatório, como todos sempre fizeram em governos passados, mas não. Não é sempre que a Polícia Federal bate de frente, e derruba, um ministro da Fazenda. Em poucos países, por mais democráticos que sejam, a PF tem essa liberdade. Lula foi rápido, substituiu Palocci no mesmo dia, e Guido Mantega, ainda na noite de segunda-feira, concedeu entrevista como novo Ministro da Fazenda. Os efeitos negativos da crise foram amortecidos pela rapidez com que foi conduzida.

O governo Lula já está ficando experiente em crises, e este é o aprendizado mais importante de um político, ainda mais no Brasil. A direita brasileira é forte porque sabe conduzir as crises, mesmo que para ela seja tudo mais fácil, devido ao fato de ter a cumplicidade da mídia, inclusive porque em muitos estados, os donos dos meios de comunicação são ligados aos interesses partidários dos conservadores.

Os erros de Lula, ou de qualquer um de seu governo, são amplificados ad infinitum. Rodrigo Maia expõe dados sigilosos para o Jornal Nacional? Ninguém liga. Quebram o sigilo telefônico de Gilmar de Carvalho? Ninguém liga. Dirceu é cassado com base num processo sistemático de quebras de sigilo e vazamentos para imprensa, fator que produziu o quase linchamento moral do deputado? Ninguém liga. Mas quando quebram o sigilo de um caseiro que está fazendo um depoimento devastador, com consequências terríveis para a vida pessoal do Ministro da Fazenda, está criado o Carnaval.

Está certo, foi um crime. Tem que fazer um Carnaval mesmo e seria ingenuidade nossa querer a complacência do adversário. Não se trata de moral pequeno-burguesa. Isso é papo de PSTU. A lei foi violada sem necessidade. A Polícia Federal iria descobrir mais dia menos dia que o caseiro levou uma bolada. Palocci não suportou a tensão e surtou. Sempre desconfiei daquela calma excessiva dele. Ninguém suportaria a pressão que ele sofreu.

A investigação sobre o caseiro, no entanto, tem que prosseguir, porque muito mais grave que a quebra do sigilo bancário seria descobrir o suborno de uma testemunha numa circunstância dessa, contra um ministro da Fazenda, visando produzir desestabilização no país. Algumas vozes da oposição, inclusive a Miriam Leitão, já fizeram a cama: afirmam que não tem importância se o caseiro recebeu suborno ou não. Nada disso. Se recebeu tem que investigar quem foi o parlamentar que planejou esse golpe. Podiam começar quebrando o sigilo bancário e telefônico do senador Antero Paes de Barros, o inventor de Nildo.

Se o caseiro não passa de um bastardo de sorte, então que deixem-no em paz. A menos que o PFL quiser transformá-lo em candidato da deputado federal, como já fez com aquela Karina. Não interessa aos patriotas, porém, a intensificação da crise. O Brasil pode viver um grande momento econômico este ano, com geração de emprego e crescimento. A conjuntura é positiva e os setores sociais mais vulneráveis não podem pagar o preço de uma guerrinha de facções rivais.

Palocci caiu? Obrigado e tchau Palocci. Você foi muito importante, boa sorte e passe bem. Com Palocci saíram todos aqueles almofadinhas tucanos herdados do governo anterior, Murilo Portugal, Joaquim Levy e Marcos Lisboa. Adeus. Talvez Mantega seja um pouco menos muquirana que Palocci. Livre do FMI, orçamento recorde, contas equilibradas, será possível ao governo dar início a uma extraordinária fase de investimentos públicos em educação, saúde, agricultura familiar, recuperação de florestas, energia, financiamentos de casa própria, reforma agrária, etc. Mantega também será uma influência mais forte contra os juros altos no Conselho Monetário Nacional.

PS: Sobre a culpabilidade de Palocci e Mattoso, só espero que não seja mais uma armação dos golpistas. Tá difícil de acreditar que Palocci seria tão idiota, mas enfim... nós, simples mortais, estamos longe dos bastidores do poder.

Ah, e aconselho os visitantes deste blog a fazerem um passeio ao La Insignia, e lerem dois textos, o último do Fernando Soares Campos, "Breve, Muito Breve Nelson", e o "O jogo sujo da direita", de Gilson Caroni Filho.

27 de março de 2006

O fim da era Palocci

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(Nilton Pinho)


Palocci se foi, de forma melancólica, acusado de frequentar a mansão da luxúria em Brasília. Desesperado pela denúncia de uma testemunha, mentirosa segundo ele, usou de seu poder ministerial para quebrar o sigilo bancário do caseiro. Bola fora. Gol contra. Não devia ter feito isso. Ainda não está claro se foi ele que pediu a quebra, ou o Jorge Mattoso ou algum funcionário do alto escalão. Mas todos erraram. E vão pagar por isso. O que se pode dizer, em prol de Lula, é que nunca um ministro de Estado foi investigado e punido tão rapidamente pela própria Polícia Federal.

A saída de Palocci representa uma derrota para o governo Lula, não apenas por perder um importante quadro intelectual e político, mas sobretudo por mais um deslize ético, muito bem explorado pela oposição e turbinado pela mídia, que está cada vez mais histérica com a crescente força eleitoral de Lula. Entretanto, os erros de Palocci e Mattoso indicam que, se foram competentes em suas áreas, não eram tão preparados assim no campo político. É a lei de Darwin aplicada à política, vão sobrando os melhores e os mais fortes.

Política é assim mesmo. FHC, hoje o arauto da ética, cansou de perder ministros e presidentes do Banco Central. Um deles, o Chico Lopes, ainda é processado pela ajuda aos bancos Marka e FonteCidam. Os presidentes do Banco do Brasil de FHC foram condenados a vários anos de prisão.

Palocci errou e, como ele mesmo teve a humildade de dizer, "temos que pagar por nossos erros". O que temos que ter em vista, no momento, é que a importância do governo Lula é bem maior do que Palocci. Não vamos repetir aqui todos os índices econômicos e sociais. Não precisamos lembrar o contexto internacional. Vocês estão cansados de saber. Palocci foi, mas Lula continua.

A história é sábia. Talvez a saída de Palocci constitua um bem ao governo Lula, porque pode representar uma ousadia maior em gastos sociais e investimentos em infra-estrutura, que sofreram muito com o comedimento excessivo de Palocci. Guido Mantega, o novo ministro da Fazenda, tem um perfil mais progressista. Lembro-me que, no embate entre Palocci e Dilma Roussef, Mantega se posicionou ao lado de Dilma, como aliás todo o campo progressista.

Durante a crise, nos posicionamos ao lado de Palocci por lealdade e por entendermos que o ataque ao ministro fazia parte de uma estratégia maior da oposição de ataque ao governo Lula. Ele se vai, tendo deixado um bom legado, de austeridade e seriedade na condução das finanças nacionais, mas ao mesmo tempo sob uma saraivada de críticas de exagero no uso do remédio.

Com o equacionamento das contas públicas proporcionado pela gestão Palocci, o governo Lula poderá iniciar uma fase mais agressiva em termos de investimentos. Mantega, Dilma e Lula são desenvolvimentistas.

A tristeza que se segue à saída de Palocci, em vista das circunstâncias lamentáveis em que ocorreu, pode ser o prelúdio de muitas alegrias com um estilo mais ousado de política econômica. Palocci foi um bom ministro, mas era excessivamente conservador. Era um dos maiores defensores da autonomia do Banco Central e estava discutindo a proposta do Déficit Zero, de Delfim Netto, a qual teria sido o motivo do atrito com Dilma Roussef. A saída de Palocci dá força à Dilma. Isso é muito positivo, porque Dilma está bem mais à esquerda que Palocci. E, como já disse, Mantega é mais afinado com Dilma. O governo segue mais coeso, e com um perfil agora menos conservador.

26 de março de 2006

Cisneros comprou a Folha?

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(Coletânea da série Cabides Descabidos, de Nilton Pinho)


Gustavo Cisneros é o todo-poderoso da mídia venezuelana, que ganhou notoriedade no mundo ao patrocinar o primeiro golpe midiático deste novo século. Acusações de corrupção, preconceito, hostilidade, histeria, esse era o tom comum aos artigos, editoriais e notícias em todos os jornais e canais de tv da Venezuela. Pois então: a impressão é que está acontecendo a mesmíssima coisa por aqui. A impressão é que Cisneros comprou a Folha e o Estadão.

O editorial da Folha de hoje mostra que o jornalão paulista, que já nos rendeu tantos momentos de bom jornalismo, continua se degradando e, abandonando de vez qualquer prurido de imparcialidade e elegância, decidiu intensificar seus ataques ao governo mais popular e mais democrático da história do Brasil.

É absolutamente hipócrita o discurso pró-democracia da Folha, quando ela não respeita a instuição que, por excelência, é a essência da democracia num país, a saber, a presidência da República, pois é a única instituição cujo poder emana do sufrágio universal de todas as regiões brasileiras. As acusações da Folha ao governo Lula podem ser destinadas à própria Folha e aos demais órgãos de imprensa. É o que eu já disse em post anterior: na ânsia de agredir o presidente da República, numa atmosfera de preconceito que em tudo lembra o processo venezuelano, a mídia corporativa vem desrespeitando o Judiciário, o Legislativo e a grande maioria do povo brasileiro, o qual, segundo pesquisas da própria Folha, elegerá Lula no primeiro turno.

Vale lembrar ainda que, ainda segundo o próprio Datafolha, Lula está ganhando forte apoio inclusive em São Paulo. A estratégia do tudo ou nada da Folha é lamentável, é um desrespeito ao próprio jornal, a seus empregados, jornalistas, entregadores e todos que fazem da Folha de São Paulo um dos mais influentes jornais do país.

O Brasil tem poucos jornais de circulação nacional. É lamentável que esses poucos sacrifiquem seu futuro em prol de caprichos e preconceitos ideológicos de seus controladores. A atitude da Folha me leva a conclamar a sociedade brasileira a boicotar este jornal, que se mostra nocivo à estabilidade democrática. Não comprem a Folha, não assinem o Uol. A atitude da Folha também me leva a acreditar mais firmemente na importância da internet, espaço realmente democrático, na luta contra esse golpe midiático que tenta fraudar a vontade democrática do povo brasileiro. Todas as pesquisas revelam que Lula ganharia no primeiro turno. A explicação é simples: o povo, aí incluído o povo esclarecido (e não somente os que recebem o bolsa-família) entende que o presidente Lula é um grande estadista, respeitado internacionalmente e que vem fazendo um excelente governo.

A acusação de que a política econômica de Lula apenas repete à do governo anterior é ridícula, pelo simples fato de que o governo FHC aumentou exponencialmente nosso nível de endividamento e dependência externa, enquanto com Lula ocorreu o contrário: nossa exposição externa foi brutalmente reduzida, além do fato poderosamente simbólico de ter cancelado o contrato com o Fundo Monetário Internacional, o famigerado FMI. Lula fortaleceu as estatais, enquanto FHC as vendeu, num processo suspeito, apressado, a preços subavaliados. Lula elevou expressivamente o crédito à agricultura familiar. E praticamente reinaugurou no Brasil o crédito popular, que ficou totalmente represado nos tempos de FHC, produzindo uma explosão no consumo das classes baixas, que pôde finalmente comprar computadores, tvs modernas, dvds, etc.

O combate à inflação, esse grande mal que assolava a economia brasileira, tem sido muito mais eficiente na gestão de Lula do que na anterior, porque FHC combateu a inflação com uma política recessiva que produziu enorme desemprego, aumentou o endividamento e ainda criou uma bomba cambial que quebrou bancos e empresas. O fato do governo FHC ter segurado artificialmente o câmbio até depois das eleições constituiu uma fraude na vontade democrática do povo brasileiro que causou prejuízo de bilhões de reais aos cofres públicos. Isso sim é falta de ética: uma fraude criminal que o PSDB ainda não explicou ao país, e que os colunistas políticos nunca cobraram devidamente. Gostaria de ouvir a Lucia Hippolito falando sobre isso. E o Alckmin ainda tem o desplante de falar em "banho de ética"? E FHC ainda tem a cara-de-pau de falar que "a ética do PT é roubar"?

O editorial da Folha é ridículo, e ainda mais ridículo porque fala de iniciativas do governo Lula que não foram levadas adiante, justamente porque Lula teve a sabedoria de recuar e ouvir as demandas da sociedade civil. Todas as iniciativas do governo Lula que foram criticadas como "autoritárias" foram revistas, prova contundente do espírito anti-autoritário do governo Lula, mesmo que algumas das referidas iniciativas não contivessem, efetivamente, nada de autoritário. O Conselho Nacional de Jornalismo, por exemplo, é uma demanda antiga da Federação Nacional de Jornalistas, que foi o real proponente da medida. Foi erroneamente interpretado por autoritário pelo mesmo grupo de "estrelas" do jornalismo, que atualmente são os que, arrogantemente, se arvoram como representantes máximos da opinião pública brasileira. A verdade é que o jornalista hoje é mal pago, não tem a mínima estabilidade financeira, é um verdadeiro escravo dos donos de jornais. O resultado é um jornalista submisso, inseguro, tímido e, por fim, violentado ideologicamente.

A máscara da mídia fica cada vez mais fina e transparente, mostrando a face horrenda do golpismo. Um golpismo sofista, a cara do pós-modernismo. O mesmo sofismo cínico, mentiroso que, nos EUA, manipulou a opinião pública em prol de uma guerra absurda que rasgou todas as convenções internacionais, está agora presente no Brasil.

Há contudo um ponto positivo nisso tudo. A esquerda brasileira, acostumada a lutar, tinha ficado meio sem bandeira após a vitória de Lula. A mídia, acuada pela vitória estrondosa do PT em 2002, ficou mansinha num primeiro momento. Esperou o governo sofrer os desgastes naturais do processo político e administrativo, usou os erros naturais e manipulou habilmente a crise política detonada pelo bufão Roberto Jefferson. Agora, na reta final, está desesperada. Que fique desesperada. Que enlouqueça. Mas que não ouse violentar a democracia e prejudicar a economia do país. Se for preciso, iremos às ruas bradar contra essa mídia anti-patriótica e reacionária, que parece se entristecer sempre que os números da economia e do emprego são positivos. É estarrecedor ver como Miriam Leitão fica cada vez mais sorumbática e melancólica diante de números positivos e como se torna eufórica quando lhe cai qualquer má notícias nas mãos. Vá ser urubu assim lá no raio que o parta!

Eu sei que não posso obrigar a ninguém a preferir esse ou aquele candidato. Meu poder de influência é limitado, infinitamente menor que essa mídia corporativa. Mas tenho o meu voto, que vale tanto quanto o voto do dono da Folha. Um grande orgulho eu tenho. O meu voto eles não vão comprar. Eu voto em Lula. Conheço muita gente que vai votar em Lula. Estão se formando, pela internet, grupos coesos e organizados de pessoas que apóiam Lula. Criando blogs, sites, manifestando-se por toda a parte. A tendência deste movimento é crescer.

Vou torcer pela vitória de Lula mais que pela vitória do Brasil na Copa do Mundo. Esta alegre expectativa já é, para nós, uma espécie de triunfo. Não somos que nem eles, os anti-patriotas, que se entristecem ao ver a economia se consolidando, o desemprego caindo e o otimismo se espraiando nas classes trabalhadoras. Provaremos que somos maiores que essa midiazinha medíocre. O Brasil está na crista da onda de um grande movimento de independência política da América Latina. A América Latina precisa de Lula, porque Alkmin não será amigo de Evo Morales, não será amigo de Chávez, não será amigo de Kirchnner, nem de Michelet. Alkmin formará, junto com Uribe, um eixinho do mal, os serviçais do imperialismo americano.

Terminando: espero que esses partidos que se intitulam de esquerda (eu os considero cupinchas da direita) como PSOL, PPS, PSTU, entre outros, tenham um mínimo de compreensão do processo político internacional e não ajudem a direita a voltar ao poder no Brasil.


Leia abaixo o editorial da Folha de São Paulo, domingo, 26/03/2006

ABUSO DE PODER

A desfaçatez, o uso sistemático da mentira, o empenho em desqualificar qualquer denúncia, nada disso constitui novidade no comportamento do governo Lula. Chegou-se nos últimos dias, entretanto, a níveis inéditos de degradação ética, de violência institucional e de afronta às normas da convivência democrática.
Na tentativa inútil de salvar a credibilidade em farrapos de um ministro, viola-se o sigilo bancário de um cidadão comum, o caseiro Francenildo Costa _enquanto toda sorte de malabarismos jurídicos e parlamentares protege as contas de Paulo Okamotto, celebrizado pelos nebulosos favores que prestou ao presidente. Fato ainda mais grave, o caseiro se torna alvo de investigação por parte da Polícia Federal, num ato indisfarçável de ameaça e abuso de poder. A iniciativa _tomada em tempo recorde_ não tem paralelo na história recente do país, infelizmente pródiga em situações nas quais representantes do poder público se viram às voltas com denúncias sérias de corrupção.

Seria o caso de qualificá-la como um crime de Estado, não fosse, talvez, excessiva indulgência chamar de "Estado" o esquema de intimidação oficial que assume o proscênio no momento. Com arrogância e desenvoltura típicas de uma organização habituada à impunidade e aos acertos inconfessáveis, representantes do lulismo já faziam saber, antes mesmo que as contas do caseiro viessem ao conhecimento público, que dispunham de dados supostamente capazes de incriminá-lo.

Posteriormente, a demora em chegar aos responsáveis pelo abuso não fez mais do que intensificar as convicções de que terá partido dos altos escalões governamentais a orientação para que fosse levado a efeito.

Da "lei da mordaça" contra o Ministério Público ao abortado projeto de um Conselho Nacional de Jornalismo, da tentativa de expulsar do país o correspondente do jornal "The New York Times" aos sucessivos embaraços antepostos à ação das CPIs, o governo Lula já deu mostras de que convive mal com a liberdade de imprensa e com a procura da verdade. Ultrapassou, contudo, o terreno das propostas legislativas desastrosas, como ultrapassou também o terreno das bazófias, das chicanas e do cinismo militante, para se aventurar na prática da chantagem e do abuso de poder.

25 de março de 2006

Fascismo pós-moderno

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Não quero aqui fazer um paralelo entre o horrendo processo histórico-psicologico que produziu patologias políticas em nações tão ricas culturalmente e o que ocorre hoje nas Américas Latinas, particularmente no Brasil, Venezuela, Bolívia, onde uma imprensa se arvora, cada vez mais, como intérprete da opinião pública. As circunstâncias históricas são outras. Mas o fascismo é o mesmo.

O caso da deputada petista que dançou no plenário é emblemático. Desta vez, ela não é acusada de corrupção, de frequentar casas suspeitas ou nada parecido. A acusação: ensaiar uns passinhos de dança em comemoração à absolvição de um colega que, segundo ela, seria inocente das acusações que pesam contra ele.

Ora, quem acompanha as votações do Congresso sabe que os deputados comemoram efusivamente as vitórias e derrotas. Sabe também que as piores baixarias são pronunciadas. Agora, concentrar toda essa energia negativa sobre a deputada é um golpe baixo. O jornal O Globo dedicou metade de sua seção de cartas aos recalcados que protestaram contra a dança da deputada. No mesmo jornal, o tucanista Reinaldo Azevedo escreve mais um de seus cínicos artigos intitulado A Dança da Bruxa. Os blogs políticos decidiram promover um processo de linchamento moral e político sem igual. Josias de Souza, da Folha, divulgou o email da deputada e incitou os leitores a enviarem mensagens. Ele mesmo conclamou seus leitores a não votarem na deputada no próximo pleito, num gesto de parcialidade política estarrecedor num jornalista que se pretende imparcial. Todos disponibilizaram vídeos da dança, sendo que o Noblat comete o desplante de repetir um post com o vídeo.

É evidente que todos nós temos nossos momentos de ridículo. Se os brasileiros tivessem acesso às palhaçadas grotescas que faço, na intimidade ou nos bares, com publicação simultânea em todas as redes de tv, jornal e internet do país, certamente também choveriam cartas dizendo que uma pessoa como eu não mereceria ser levada a sério.

A deputada ficou acuada, por isso pediu desculpas. Ela é gente, afinal. Quem poderia suportar uma campanha com esse nível de violência? Getúlio, um homem velho, experiente, se suicidou em função da tortura psicológica que lhe infligiram diariamente desde o início de seu governo. Como não conseguiram destruir o PT como partido, estão agora tentando destruí-lo deputado por deputado, ministro por ministro.

Quando recebemos um email negativo ou, em meio a um fórum de mensagens, alguém diz algo negativo sobre a gente, já ficamos aborrecidos. Imagine como é ser alvo nacional, ser ridicularizado nacionalmente como estão fazendo com essa deputada, uma parlamentar corajosa e leal, que está sozinha no Conselho de Ética a enfrentar leões cínicos e hipócritas.

Estão querendo provocar novamente a opinião pública, incitar o ódio, a revolta. Entretanto, ao mesmo tempo em que tentam ridicularizar a deputada petista, eles também caem no ridículo, ao reduzir o debate político e ideológico a um nível tão mesquinho.

Notei que muitos companheiros e articulistas do campo progressista também criticaram a deputada, acusando-a de ser irresponsável. Ela mesmo fez uma mea culpa. Todos, inclusive ela própria, a meu ver, são vítimas desse processo eminentemente psicológico, opressivo, covarde, desestabilizador. Na minha opinião, a deputada errou, não foi sensível à óbvia repercussão que sua atitude teria num momento tão delicado. Acabou atrapalhando a si própria e mais ainda à sua missão de ir na contra-mão do que decidem seus colegas no Conselho de Ética.

Entretanto, fiquei perplexo com essa tentativa de linchamento. Ela é uma brasileira legítima, e mostrou com sua dança ser uma pessoa passional, sensível, de espírito popular, festeiro, como é a grande maioria dos brasileiros. Foi um gesto infantil, lúdico, impensado, da parte dela. Mereceria talvez uma repreensão, nunca essa violência midiática que procurou satanizá-la e derrubar a única (ou uma das únicas) cadeira do Partido dos Trabalhadores no Conselho de Ética.

Com esta crise, sinto que todos cobram de todos uma força e um comportamenteo incompatível com um ser humano normal. É a velha batalha do mal contra o bem, onde o mal triunfa pelo cinismo e pela violência. Tenho visto nesse mundo as pessoas boas serem trituradas pelos canalhas de toda espécie. Na política, é igual. Felizmente, as coisas conseguem ser diferentes às vezes. Os bons precisam ser mais fortes, mais inteligentes, mais duros.

É como dizia Chê, hay que endurecer, sendo que a ternura, essa talvez, infelizmente, esteja ultrapassada. Temos que ser duros, somente duros. A ternura, essa a gente guarda para os amigos, os filhos. Se eles querem guerra, terão guerra. O espírito de milhões de almas, passadas e futuras, nos vigia e nos protege. As almas dos que morreram de fome, dos que foram torturados e assassinados pelos governos, não só do Brasil, mas da Argentina, Chile, Bolívia, El Salvador, Guatemala. Esses serão nossos anjos da guarda.

Não vamos deixar o país voltar às mãos sujas do PSDB/PFL, quando as instituições policiais não investigavam nada. Polícia Federal, Ministério Público, Procuradoria Geral da União, Tribunal de Contas, não tinham independência. Quando estatais foram vendidas subavaliadas, a toque de caixa. Quando o desemprego atingiu níveis alarmantes. Quando o endividamente parecia aniquilar completamente qualquer possibilidade de soberania nacional e desenvolvimento. Hoje o Brasil respira aliviado. Hoje existe efetivamente esperança de um país melhor. Os problemas continuam, mas o motor da locomotiva foi consertado. Estamos prontos para crescer. E, pela primeira vez, não de forma egoísta, mas junto com nossos irmãos argentinos, paraguaios, bolivianos, africanos. A história nos observa.

24 de março de 2006

Nildo, o novo Macunaíma

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Tenho que reler a obra-prima de Mario de Andrade, Macunaíma, o herói sem caráter, pois estou inclinado a pensar que esse livro pode conter muita informação útil para compreender a realidade política brasileira de hoje.

Os oposicionistas, perplexos e confusos diante da crescente ascensão de Lula em todos os segmentos sociais e com seu prestígio no exterior inabalável, como ficou claro no recente encontro do presidente com a rainha da Inglaterra, com o primeiro ministro Tony Blair e com empresários e parlamentares ingleses, estão apostando todas as suas fichas neste novo Macunaíma: Francenildo, ou mais simplesmente, Nildo, o caseiro.

Já conheci muitos caseiros na minha vida, mas nunca conheci nenhum com 20 mil reais na conta bancária. Tudo bem, o pai biológico dele foi gentil e doou o dinheiro. Mas a mídia escondeu várias informações importantes, coisa que certamente nunca ocorreria se o caseiro estivesse denunciando puladas de cerca do Geraldo Alkmin. Por exemplo, o pai dele é militante do PFL, tendo sido candidato a vereador pelo partido.

Imaginem se o caseiro dedurasse Alkmin, dizendo que tinha visto o sóbrio governador umas dez ou vinte e cinco vezes numa casa frequentada por viciados em crack, travestis aidéticos e traficantes internacionais. Aí descobria-se que o caseiro tinha movimentado 40 paus em sua conta bancária nas vésperas da denúncia.

Colunistas, âncoras, blogueiros, repórteres, cairiam em cima do caseiro sem dó nem piedade. Aì partiriam para cima do suposto pai que doou o dinheiro, e explorariam todas as contradições. Quando descobrissem que o pai era do PT, então... Viria a bomba:

FARSA DESMONTADA: PAI DE NILDO É DO PT

O processo de venezualização da política brasileira está levando a mídia a atacar as principais instituições do país. Polícia Federal, Supremo Tribunal, Congresso, Presidência, nada tem escapado da fúria machartista, particularmente intensificada com a ascensão de Lula nas pesquisas eleitorais.

É assim, não conseguem ganhar dentro do processo democrático, querem ganhar no tapetão, com artimanhas. Não conseguirão. Não quero acreditar que a classe média que acreditou na mídia, durante a crise, e voltou a apoiar Lula agora vai se deixar enganar. O povão, esse então, está mais confiante em Lula do que nunca, com o aumento do salário mínimo, a inflação baixa e os programas sociais.

Ganhar Lula será muito difícil, ainda mais com um adversário fraco como Alkmin. Estão dizendo que o vice será o José "voz taquara rachada"Agripino. Valha-me Deus. Acho que vou processar o PSDB pelos pesadelos que terei com a possibilidade, felizmente remota, de que essa dupla grotesca assuma o poder.

Está difícil escrever

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Flávio Shiró


Confesso a vocês. Está difícil escrever sobre política hoje. À princípio, pensei em rebater a coluna de Miriam Leitão, que retomou sua verve oposicionista, num texto cheio de adjetivos, opiniões subjetivas e falsidades. Seu artigo é bem paradigmático da linha de pensamento dos segmentos anti-Lulistas da sociedade. Francenildo está sendo alçado agora à condição de mártir, o que é a coroação de sua meteórica carreira de dedo duro de aluguel.

Em seu depoimento à CPI, Nildo lamentou não ter seu celular de última geração, com câmera fotográfica, na época em que espionava a casa onde trabalhava. Afinal é isso que ele fazia, não? Buratti e Poletto eram tão burros que dividiam dinheiro na frente do caseiro, e a uma distância tão próxima a ponto de permitir que ele identificasse o valor das notas.

Voltando à coluna de hoje de Miriam Leitão, nota-se uma retomada, bem repetitiva, dos bordões usados pela mesma durante a crise política, que se ainda dura, perdeu seu status de "seção especial" de sites e jornais. Enfim, a empolgação golpista, que parece ter ganhado certa força nos últimos dias, alimentada pelos desdobramentos do caso Nildo, está longe de atingir o nível perigoso do ano passado. A coluna de Miriam Leitão de hoje não despertou em mim nada mais que um desprezo frio.

À procura de inspiração para esse blog, fui pesquisar outro assunto e deparei-me com um de interesse razoável: a dança da deputada petista Angela Guadagnin, em comemoração à absolvição de seu colega, o também petista João Magno. A imprensa usou o fato com um viés explicitamente fascista. Noblat chegou a publicar o email da deputada e incitar os leitores a enviarem mensagens, de protesto é claro. Depois publicou várias cartas de leitores revoltados com a dança "da impunidade", da dança do "mensalão", como estamparam algumas manchetes. A cientista política Lúcia Hippólito (que de cientista não tem nada, mas de política tem muito) escreveu um daqueles artigos carregados de ódio e indignação. Hippolito diz que a deputada poderia dançar numa churrascaria ou qualquer outro lugar, menos no salão do Congresso.

Lucia Hippolito não parece se importar que os deputados não votem o Orçamento, que devia ter sido votado no ano passado. Não se importa que deputados e senadores estejam fazendo uso ilegal das CPIs, produzindo uma desestabilização política que atrapalha a governabilidade e causa danos à economia brasileira. Não se importa que o senador Arthur Virgílio suba ao palanque e diga, com todas as letras, que irá dar uma surra física no presidente da República. Para Hippolito, quebrar o decoro é dar uns singelos passinhos de dança, uma simples demonstração de alegria de uma parlamentar em ver a absolvição de alguém que, a seu ver, estaria sendo incriminado injustamente. Uma atitude espontânea, brasileira, que a meu ver não agride em nada o Congresso Nacional. E fiquem atentos ao fato de que o citado deputado foi absolvido por TODO o Congresso Nacional, e portanto, segundo os representantes do povo, estaria inocente do crime do qual é acusado pela mídia. A mídia hoje se quer superior ao Congresso, superior ao Supremo Tribunal e superior à sociedade brasileira, que elegeria hoje Lula no primeiro turno, segundo todas as pesquisas.

Wanderley Guilherme dos Santos já havia previsto no ano passado: quando, no frigir dos ovos, todas as grandiosas denúncias e acusações se revelarem inconsistentes, exageradas ou simplesmente vazias, a mídia que as comprou não terá outra alternativa senão vender ao público uma grande pizza.

Na impossibilidade de fazer uma mea culpa, a oposição midiática está jogando a culpa toda no Congresso Nacional, cuja credibilidade vem se recuperando vigorosamente sob a presidência de Aldo Rebelo (PCdoB - AL).

Os vendedores de crise se voltam contra qualquer instituição que não lhes compre os produtos. O Supremo Tribunal é contra a crise?, então ataque-se o Tribunal. A sociedade está contra a crise?, então ataque-se a sociedade, acuse-a de se vender barato, por esmolas do Bolsa Família, ou do Bolsa-Miami, ou seja, dólar baixo. Acuse-a de se vender pelo aumento no salário mínimo.

Vão em frente, jornais, e digam tudo: a sociedade brasileira está se vendendo por um sonho torpe: o desenvolvimento e a justiça social. Como ousam! Como ousaram os estudantes e movimentos sociais realizarem uma grande manifestação em defesa do Presidente Lula, no auge da crise, no ano passado! Miriam Leitão, numa postura fascista, tentou desqualificar o movimento estudantil. "Protesto a favor", denunciaram colunistas sarcásticos, ignorando o fato de que, no fundo, era um protesto "contra" o processo de desestabilização política do governo Lula.

Noblat ganhou emprego no Estadão com sua cobertura altamente envenenada da crise, misturando ficção e realidade. Não esqueçamos que várias reuniões importantes de planejamento do golpe militar de 64 se deram nos escritórios do Estadão, cujos donos também participaram de todas as conspirações golpistas do século XX, contra Vargas, contra JK, contra Jango, enfim contra o Brasil. Uma das consequências mais danosas da ditadura militar foi ter deixado o Brasil apenas com essa imprensa de direita, eliminando jornais com perfil mais progressista, como o Correio da Manhã e a Última Hora, e não permitindo o surgimento de outros jornais.

Está difícil escrever hoje, como eu ia dizendo, porque a oposição midiática está repetitiva.

22 de março de 2006

Quebra do sigilo é crime; oposição e imprensa são os maiores bandidos

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Reproduzo abaixo um texto publicado pelo site do Partido dos Trabalhadores, que deve ser lido por todos aqueles que ficaram indignados com a quebra do sigilo do caseiro. A liderança do PT condenou veementemente a quebra do sigilo, mas estranhou o tom emocional com que imprensa e oposição vêm tratando o assunto, procurando jogar pra cima do governo toda a responsabilidade do episódio. Leiam o artigo.


22/03/2006 - Quebra de sigilo: As duas faces da oposição

A oposição tem denunciado a quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa com uma indignação inversamente proporcional à que tem quando ela própria revela segredos fiscais e bancários de pessoas do PT ou ligadas ao governo. Um levantamento feito pela Liderança do PT na Câmara mostra que nos últimos meses a oposição tem vazado freqüentemente para a imprensa documentos confidenciais e informações sigilosas.

Esse comportamento contraditório da oposição tem sido criticado pelos pelos líderes do governo na Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), e do PT, deputado Henrique Fontana (RS). Para Chinaglia, a oposição tem uma "indignação seletiva" e tenta explorar política e eleitoralmente a crise em nome da suposta "defesa do direito à privacidade".

Fontana, por sua vez, entende que a oposição, no momento, mira no ministro da Fazenda Antonio Palocci, mas quer mesmo é desestabilizar o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva numa atitude de desespero diante das últimas pesquisas eleitorais.

Elas colocam o presidente Lula com larga vantagem à frente de seus eventuais adversários. "O zelo do PSDB e do PFL pela preservação de dados confidenciais e da privacidade devia ser republicano e valer nos 365 dias do ano, e não apenas agora, de forma seletiva e oportunista, para tirar proveito político e eleitoral", diz Fontana.

O líder petista condenou a quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. "Somos totalmente contra qualquer quebra de direito constitucional, e, portanto, do sigilo bancário do caseiro. Isto tem que ser investigado profundamente e o governo já determinou esta apuração. A quebra do sigilo é ilegal, e isto não pode ocorrer. O nosso governo e a nossa bancada não concordam em nenhuma hipótese com este tipo de conduta”, disse.

O levantamento feito pela Liderança do PT na Câmara mostra diferentes casos de violação de sigilo. Um deles aconteceu em agosto de 2004, quando revista de circulação nacional divulgou dados fiscais e patrimoniais do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Esses dados deviam estar protegidos, mas foram violados com fins eleitorais e políticos, na expressão de Chinaglia.

Ainda em 2004, a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (Concrab) teve suas informações bancárias e fiscais – protegidas por lei – divulgadas por dois jornais de circulação nacional. Essas informações estavam sob proteção da CPI da Terra. As reportagens faziam menção explícita ao relatório parcial de dados fiscais e bancários da Concrab, elaborado pela assessoria do presidente da CPMI, senador Álvaro Dias (PSDB-PR), agora integrante da CPI dos Bingos, a chamada CPI do Fim do Mundo.

No ano passado, os deputados federais petistas Devanir Ribeiro (SP), Sigmaringa Seixas (DF), Vicentinho (SP),Wasny de Roure (DF) e Zezéu Ribeiro (BA) tiveram seus nomes associados a saques no Banco Rural em decorrência de vazamento atribuído ao líder do PFL na Câmara, deputado Rodrigo Maia (RJ). Nada se provou contra eles, e dias depois comprovou-se que as pessoas apontadas não tinham nenhuma relação com os deputados.

Nas palavras do desembargador federal Walter do Amaral, da 3ª Região, em artigo publicado no site Consultor Jurídico: "O fato mais emblemático da prática do crime de violação do sigilo bancário e segredo de justiça foi de responsabilidade do líder do PFL na Câmara dos Deputados que convocou a imprensa para a apresentação de documentos sob sigilo legal, onde foram revelados para o escárnio de toda a nação os nomes de pessoas que teriam sacado recursos supostamente repassados pelas empresas do senhor Marcos Valério, algumas das quais homônimas e outras absolutamente inocentes, como se comprovou depois".

Ainda no ano passado, o deputado Onyx Lorenzoni (PFL-RS) vazou à imprensa documentos de posse da CPMI dos Correios que continham dados protegidos pelo sigilo bancário e fiscal do ex-deputado José Dirceu (PT-SP). Por isso, o PT entrou com representação contra o pefelista, por quebra de decoro parlamentar. Há denúncias de que documentos desapareceram na CPMI dos Correios, por envolverem parlamentares da oposição. Já se denunciou também que parlamentares fotografaram documentos com seus celulares, conforme lembrou no plenário da Câmara o líder Arlindo Chinaglia.

A mais recente violação aconteceu na última terça-feira (20), desta vez envolvendo a estatal Petrobras. Um relatório confidencial e provisório do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a estatal foi divulgado com grande destaque pela imprensa. Outro caso claro de violação foi o vazamento do depoimento secreto do funcionário dos Correios, Maurício Marinho, ao Ministério Público. O vazamento é atribuído a integrantes da CPMI dos Correios.

Banestado
A CPMI do Banestado também foi acusada de divulgar informações confidenciais. O presidente da comissão, senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT) pediu ao Banco Central a quebra do sigilo bancário de 220 pessoas sem ao menos identificá-las.

Além disso, vários nomes foram divulgados para a imprensa, fato que fez com que os Estados Unidos se recusassem a passar dados para CPMI dos Correios. Depois de instalada a CPMI dos Correios, o sigilo bancário do publicitário Duda Mendonça foi completamente devassado ao ser inteiramente divulgado para a imprensa.

Senado – O senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), hoje uma das vozes que se levantam em defesa do caseiro, foi protagonista, no governo FHC, de um dos maiores escândalos da República. ACM, juntamente com o hoje deputado (licenciado) José Roberto Arruda (PFL-DF), foi responsável pela violação do sigilo do painel do Senado, sem qualquer autorização judicial.

Por causa do escândalo, e para evitar processo de cassação, ambos renunciaram aos mandatos, em 2001. ACM também foi acusado de promover escutas telefônicas ilegais na Bahia. O caso de violação de sigilo do deputado Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), sem autorização judicial, foi investigado pelo Conselho de Ética do Senado.

Okamotto
O jornal Estado de S.Paulo publicou no último dia 2 de março matéria devassando o sigilo fiscal, bancário e telefônico do presidente do Sebrae, Paulo Okamotto. Impedidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de ter acesso ao sigilo de Okamotto, técnicos das CPIs dos Correios e dos Bingos combinaram esforços secretamente e descobriram 161 ligações trocadas entre Okamotto e alguns dos investigados pelas duas CPIs. A maior parte das ligações foi feita em 2002, durante a campanha eleitoral à Presidência da República.

O próprio Okamottto disse que, como foi coordenador de infra-estrutura da campanha de 2002, "nada mais natural que se relacionasse com freqüência com pessoas envolvidas na campanha", como o então tesoureiro do PT, Sílvio Pereira, o presidente do partido, José Dirceu, e o publicitário Duda Mendonça. Porém, houve exploração política do caso, porque algumas ligações foram feitas em 2003.

No site da revista Veja, no dia 16 de agosto de 2005, publicou-se denúncia do doleiro Antonio Oliveira Claramunt, o Toninho da Barcelona, que, em depoimento em São Paulo aos integrantes da CPMI dos Correios, disse "saber coisas" de operações financeiras ilegais que teriam sido realizadas pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, pelo deputado federal e ex-ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, pelo ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e pelo deputado federal José Janene (PP-PR).

Não havia provas e nada foi provado depois, mas mesmo assim integrantes da comissão vazaram o depoimento à imprensa.

Leia também:
Chinaglia: Indignação da oposição é seletiva
Fontana critica tentativa de desestabilização do governo Lula

Coincidência?

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Foi só aparecer um juiz federal acusando o senador Antero "Pé" de Barro de ligação com o crime organizado de Mato Grosso, mais especificamente com o Comendador Arcanjo, cuja extradição para o Brasil foi negociada há poucas semanas. Foi só o deputado federal pelo PFL ACM "grampinho" Neto ter se metido numa enrascada: na tentativa de incriminar os fundos de pensão na gestão de Lula acabou escancarando os esqueletos no armário da administração anterior. Foi só o eleitorado deixar claro que vai eleger Lula no primeiro turno.

Enfim, foi só a situação ficar realmente ruim para o lado da oposição, que ela, muito espertamente, decidiu que era chegado o momento de usar a arma "caseiro Nilton", muito bem pago por um militante do PFL do Piauí. Na impossibilidade de atacar Lula, procura-se ferir Palocci, usando a mesma estratégia de tentar debilitar Lula através de seu isolamento.

A história é tosca. Agora não é mais 38.880 reais e sim 25 mil, porque o caseiro teria ele mesmo retirado e feito depósitos. Humm, gostaria que provassem isso. De qualquer forma, não acredito no carisma desse dedo-duro de aluguel. E se, por acaso, não é de aluguel, é dedo-duro da mesma forma, porque tudo que tem a falar são baixarias sexuais sobre a vida do ministro. Se formos acreditar a versão dele, é dedo-duro e chantagista do pai. Os agentes da PF que ficaram com ele, durante o programa de proteção à testemunha, disseram que ele demostrava uma inusitada vontade de dar entrevistas. Como o programa de proteção à testemunha não permite essa exposição toda, ele preferiu abandonar o programa para poder dar vezo a sua incontrolável verve dedo-durista.

A oposição está acuada. E como todo bicho venenoso e violento, torna-se perigoso quando acuado. Senadores como Paes de Barro, ligado ao Comendador, sabem como comprar, intimidar e coagir pessoas em prol de seus interesses.

O que novamente está causando grande irritação nas pessoas é a cumplicidade da imprensa, que agora usa a violação da quebra de sigilo para jogar uma cortina de fumaça sobre todas as denúncias envolvendo a oposição, como o já citado envolvimento do senador Antero Paes de Barro, do PSDB, com o Comendador Arcanjo, a malversação dos fundos de pensão na gestão tucana, entre tantas outras coisas.

A indignação desta "opinião pública", já denunciada por Bob Fernandes, da Carta Capital, de ser composta de apenas 13 jornalistas/colunistas, está causando grande irritação na verdadeira opinião pública do país, que está notando como parlamentares estão usando as CPIs, com apoio das redes de tv e jornal, para produzir um insuportável clima de desestabilização política.

Para Pedro Estevam Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC-SP, a CPI dos Bingos deveria ser suspensa, pois desrespeita direitos básicos, afronta a democracia e o Estado de Direito. “Ela investiga tudo menos a finalidade pela qual foi criada. É uma ofensa e um atraso para a democracia”, denuncia. Para Pedro Serrano, parlamentares que conduzem trabalhos da CPI estão ignorando a Constituição e a legislação penal brasileira. Sobre o assunto, leia aqui artigo de Marco Aurélio Weissheimer, da Agência Carta Maior.

Este sim deve ser o verdadeiro motivo de indignação. A exploração de aspectos sexuais da vida de parlamentares não contribui em nada para o desenvolvimento econômico do Brasil. Pelo contrário, deseduca o povo e cria uma atmosfera política envenenada.

O grande problema de analistas políticos modernos é endeusar a democracia de forma acrítica, esquecendo de que todo modelo político deve ser constantemente aperfeiçoado. O próprio sistema democrático existe para isso. O Legislativo tem o poder de mudar as leis, teoricamente para melhor, atualizando-as de acordo com as novas realidades. O uso de CPIs como instrumento de luta eleitoral, como agora está claro, é inadmissível.

Outro fato que está causando irritação extrema em certos segmentos da população esclarecida é esse conluio sujo e degradante entre a esquerda corporativa (PSOL, PPS, PDT) e a direita nacional. É estarrecedor ver a senadora Heloísa Helena, outrora uma combativa (hoje vemos que não passava de falastronice) guerreira contra a roubalheira tucana-pefelista, se juntando a figuras como Paes de Barro, ACM e Jorge Borghausen, nos ataques contra o governo Lula.

Para mim, essa esquerda não é esquerda nada. É direita. Ela só tem futuro político com Alckmin no poder, para poder existir à sombra, sem efeito prático para os brasileiros, servindo apenas para conferir um charme democrático ao parlamento nacional. Enquanto o Brasil vai sendo vendido barato pelos comissionistas tucano-pefelês, essa esquerda esbravejaria inofensivamente, para o deleite de meia dúzia de estudantes de olho azul.

21 de março de 2006

O caseiro e o ministro

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Por Urariano Mota

É possível que no momento em que vocês comecem a ler este artigo, ele já esteja obsoleto. A crise, que no Brasil quer dizer a luta política, eleitoral, é tão rápida, que mal começamos a escrever sobre ela já novos dados e informações surgem, e de tal maneira, que mudam o corpo e o espectro do que víamos antes. "O tempo não pára", como cantava Cazuza, mas não só, porque agora e nesses últimos dias o tempo é um embusteiro, a cada instante a nos enganar com novas armadilhas, a nos revelar uma face e esconder outra. O tempo não pára de ser embusteiro.

Há pouco, queremos dizer, até sexta-feira (17/3), o tempo na imprensa era a intromissão - indevida, para melhor reforço - do Judiciário sobre o Legislativo. Na véspera, o depoimento do caseiro Francenildo dos Santos Costa na "CPI do fim do mundo", aquela que acerta todas as contas, todos os pecados no dia do juízo, pois sendo CPI dos Bingos joga a sorte de todos os pecadores no Juízo Final; na véspera, o depoimento do caseiro a virtuosos republicanos fora interrompido por uma decisão do Supremo Tribunal Federal. Este era o assunto, esta era a indignação que corria a imprensa de Sul a Sudeste do país, e por extensão, portanto, do Norte ao Nordeste apêndice do Brasil. Anunciava a Folha de S.Paulo: "STF atende PT e cala caseiro". Completava O Globo: "Mordaça para proteger Palocci". E continuava O Estado de S.Paulo: "Supremo pára CPI, abre crise e Lula diz que Palocci não sai".

Poucos, para não dizer nenhum dos jornais, trazia a público as razões do STF para suspender o depoimento na CPI contra o Ministro Palocci. Alceu Nader, neste Observatório, lembrou e sublinhou algumas delas, quando transcreveu a decisão :

"Nenhum parlamentar pode, sem descumprimento de dever de ofício, consentir no desvirtuamento do propósito que haja norteado a criação de CPI e na conseqüente ineficácia de suas atividades... Noutras palavras, seu depoimento (do caseiro) em nada ajudaria a esclarecer ou provar a suposição de que seria dinheiro oriundo de casas de jogo! E é o que se presume à condição cultural e ao próprio trabalho que a testemunha desempenharia no local apontado." E com isto, o Ministro relator do Supremo Tribunal Federal apenas disse: 1. A CPI dos Bingos deve investigar o Bingo, o jogo ilegal; 2. O caseiro da mansão em Brasília não era bem o tesoureiro do Bingo. Coisa tão óbvia, acreditem, ninguém viu.

Uma das mais cívicas e patrióticas colunistas da Folha, que certa vez escrevera que o maior legado da Albânia para o mundo civilizado teriam sido massas de famintos e de piolhos, preferiu ver um jogo sujo na interrupção do depoimento do caseiro Francenildo:

"Como empregado da bela casa alugada em Brasília pela 'república de Ribeirão Preto' (do 'chefe' Palocci), Nildo ouvia e via muita coisa, sabia de reuniões ortodoxas e heterodoxas. Relata jogos, malas de dinheiro, as chegadas do ministro num Peugeot prata de vidro fumê e como ele pedia para apagar as luzes de fora para não ser visto -desmascarado?
Nildo sabia onde estava se metendo: 'Eu não sou nada perto dele [Palocci]. Mas ele está mentindo'. E sua versão tem início, meio, fim e credibilidade, seja ele um achado ou não da oposição. Contra fatos, não há argumentos".

Fatos... vísceras ou acontecimentos?

Para um caseiro, que até prova em contrário é um empregado que cuida dos exteriores e das cercanias da casa, Francenildo é um excelente e insuperável espião. Como poucos. Como os raros e impossíveis. Ele sabia das reuniões ortodoxas e heterodoxas - como ele as distinguia? Palocci nu a pular na sala seria a distinção? Mais: via malas, que para ele se abriam nos jardins, na garagem, no quintal, no terraço, e se estivesse escuro, o Ministro lhe gritava: "Nildo, aqui temos dinheiro. Veja". Ao que Nildo lhe respondia: "Chefe, quanto dinheiro! De onde vem tanta riqueza?" E Palocci: "Do bingo, do bingo, Nildo. Guarda esta informação, que poderás usá-la contra mim". "Onde, chefe?" E Palocci, a sorrir: "Na CPI, homem. Nas colunas dos jornais brasileiros, onde aparecerás como autor de versões de início, meio e fim e credibilidade. Não te esqueças".

E se as coisas não ocorreram assim, podemos crer que Fracenildo seria um caseiro de um gênero fantástico, pois também exercia as funções de cozinheiro, garçom, barman, camareiro, repórter, fotógrafo, cameraman, contador, auditor da Receita Federal, fiscal de alcova, confessor de igreja, ou, mais precisa e modestamente, em resumo, as funções de testemunha poderosa, ocular e invisível da história. Aquela, que é um achado para os partidos fora do poder.

No outro dia

No fim da tarde de sábado (18/3), o tempo, que não pára, voltou a mudar. Descobriu-se que a poderosa testemunha, o senhor múltiplo de espionagem, recebera depósitos em uma conta que alcançam o valor de R$ 38.860,00. Furo de reportagem da revista Época. Segundo os repórteres, no começo do ano o caseiro possuía apenas R$ 24,76 na conta. Depois de sucessivos depósitos e saques, no dia do depoimento na CPI estava com R$ 19.662,35. Então veio rápido a explicação do advogado do caseiro: os depósitos seriam, na verdade, 25 mil reais, dos quais o caseiro teria sacado 15 mil, para, arrependido, devolver 13 mil à conta. A fonte dos depósitos seria de um pai distante, constrangido e envergonhado, que assim se redimia frente ao filho que não reconhecera, porque o caseiro veio de uma relação fora do casamento.

Então a boa imprensa, tão boa e melhor em desmontar mentiras e versões petistas, primeiro se pôs incrédula. Dos depósitos. E como não acreditava no que via, perdeu o ânimo de perseguição investigatória. Aceitou como natural a coincidência de depósitos e depoimento do caseiro, e passou a ver um fato muito mais estarrecedor.

Rápido parêntese. Aqui deve ser mencionado que em relação ao governo Lula os grandes jornais e os mais honrados partidos da oposição, PFL e PSDB, auxiliados pelos acima de qualquer suspeita PPS e PSOL, estão cada vez mais estarrecidos. O termômetro do susto e da fúria são os números de Lula nas pesquisas eleitorais. Pela última, o presidente ganharia as eleições já no primeiro turno. Parêntese fechado.

Então os partidos, de hipocrisia e terror, depois da intromissão do Judiciário no Congresso, "um fato nuca visto desde a ditadura", conforme as palavras do abismado senador Antonio Carlos Magalhães, então os partidos, de mágoa e desespero, se depararam com essa violência: a quebra do sigilo bancário do caseiro, de uma testemunha, de um espião fundamental no processo contra o governo Lula. Escândalo! E o caseiro, um pequeno Davi, vítima dessa luta desigual, declarou à Folha de S.Paulo: "Mexeram nas minhas contas. O que posso esperar mais?". Sim, o que mais pode esperar um homem íntegro, porque se mostra inteiro, um autêntico homem do povo à margem da esperança dos despossuídos, que se presta ao papel de informante; sim, o que mais pode esperar?

Uma vista desarmada a mirar bem as fotos do caseiro nas entrevistas e depoimentos, uma leitura atenta da sua paisagem em torno perceberá o que ele pode esperar. Há de chegar um momento em que o senhor de terno a seu lado abrirá uma grande caixa, pegará o corpo da testemunha nas costas e o largará, encolhido, na caixa que será fechada. Imóvel e mudo permanecerá até o próximo show. Este é o destino e futuro de todo boneco de ventríloquo. Se houver espetáculo, voltará a abrir a boca.

Neste "exato" instante

Mas o tempo não pára. Neste exato instante, enquanto os ventríloquos recorrem contra a decisão do STF, eis o passo que a honrada oposição ameaça contra o governo Lula. Acreditem e creiam:

"O prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia (PFL), afirmou que garotas de programa agenciadas pela promotora de eventos Jeane Mary Corner poderiam confirmar a ida do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, a uma mansão em Brasília... 'Eu soube que tem menina da Jeane querendo falar, já procuraram parlamentares nossos dizendo que querem falar... É muito melhor que chamem o caseiro e o motorista e deixem as meninas da Jeane na casa delas porque a vergonha vai ser menor assim"".

Isto deveria estar gravado em letras de ouro, em placa, à entrada do Congresso brasileiro. Prostitutas na CPI. Das que vendem e alugam sexo, queremos dizer. O tempo não pára de ser embusteiro.

Esse artigo, escrito por Uraniano Mota, foi publicado originalmente no Observatório da Imprensa.

20 de março de 2006

Indignação seletiva

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A "opinião pública" dos jornais tem, pelo jeito, uma indignação totalmente seletiva. Quando informações sigilosoas vazavam da CPI e paravam nas redações de jornais, não houve uma só voz que se erguesse contra esse tipo de violação jurídica e moral. Não foi um caso não. Foram vários.

Quando a oposição suborna testemunhas para afirmarem que o viram em casas frequentadas por prostitutas, levando-as para o centro do palco midiático das CPIs, nenhum sopro de indignação passa pelas salas ar-condicionadas dos jornais.

Quando Fernando Henrique Cardoso diz a seu colega, em gravação tornada pública, que o BNDES deveria favorecer o grupo de Daniel Dantas na compra da Telebrás, nenhuma voz se levanta.

Quando uma desembargadora - e isso é recente - reabre o processo contra a privatização da Vale do Rio Doce, afirmando que há diferenças superiores a mais de 100 bilhões de reais entre o preço de venda e o valor real da empresa; que jazidas inteiras de ouro, urânio, nióbio, foram subavaliadas ou sequer mencionadas, no relatório da empresa norte-americana, Merril Lynch, que avaliou o preço da mineradora; que a avaliadora Merryl Linch estaria ligada aos grupos compradores; ninguém se revolta, ninguém estranha.

Quando um caseiro empregado numa casa pelo PSDB recebe dinheiro de seu suposto pai, do PFL, para depor contra o ministro da Fazenda, segundo cargo executivo mais importante do país, provocando risco de desestabilização econômica, fazendo o país perder não se sabe quantos milhões ou bilhões por causa de investimentos que não são feitos à espera dos fatos, não há uma voz que se alevante contra esses absurdos.

Agora, quando um par de repórteres tem a sorte de pôr a mão no extrato do caseiro, o mundo vira de cabeça para baixo. A privacidade que negam às mais altas figuras da República querem preservar para um dedo-duro de aluguel? Quem mais merece privacidade?

A participação de Nildo no processo de destabilização do ministro da Fazenda e, portanto, do governo federal, gerando insegurança em todo país, torna-o automaticamente uma figura pública, peça chave na sangrenta luta entre governo e oposição. Não é mais um simples cidadão. A própria mídia o expôs. Qualquer informação relativa à ele passa a ter um valor ultra-dimensionado.

Entendam bem: evidentemente que sou contra a violação do sigilo bancário sem prévia autorização judicial. Mas peraí. Agora a mídia vai usar um dedo duro de aluguel para desmoralizar a Polícia Federal, a Caixa Econômica Federal? É demais! A Caixa Econômica nunca teve uma gestão tão competente, gerando lucros e oferecendo tanto crédito a seus clientes. Nunca foi tão respeitada. A Polícia Federal, idem. Nunca antes a PF prendeu ou autuou tantos figurões, sonegadores, traficantes e contrabandistas de alto gabarito.

Vem cá. Os bancos não são obrigados a informar as autoridades sobre toda a movimentação suspeita? Uma movimentação financeira suspeita por parte de um sujeito que está acusando violentamente o ministro da Fazenda não seria caso de ser informada à Polícia Federal?

Vem cá, essa mídia não vai ao menos pesquisar com mais acuidade a procedência desse dinheiro? Não vai achar, no mínimo, estranho, que um pai aceite dar 40 mil reais para um filho sem exigir o exame de DNA? Não vai achar estranho que, mesmo se for o pai do garoto, ele pertença ao PFL?

É sumamente engraçado agora ver como a declaração do ex-presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Nelson Jobim, defendendo o sigilo bancário, é alçada à paradigma das linhas editoriais. Peraí, é óbvio que Jobim defende o sigilo bancário. Sobretudo diante de perguntas desse calibre, sobretudo em face de sua atuação sempre defendendo o sigilo das pessoas. Mas, na época em que defendeu o sigilo bancário de Paulo Okamoto, por exemplo, todos o atacaram, violentamente. Virou herói agora?

O jogo sujo começou. A oposição joga sujo, joga pesado. Criam situações tensas, que acabam provocando reações apressadas por parte do governo, o que por sua vez é explorado ainda mais pela mídia. A população tem que estar atenta. O governo também erra, ainda mais sob ataque de armas sujas, acusações que mancham a honra pessoal das figuras, perturbando as relações familiares dos envolvidos. Mas há que se separar o joio do trigo. Errar é humano, atentar contra o país, contra a República, contra o bem estar nacional é um crime infinitamente superior a qualquer violação de sigilo, crime aliás comum na mídia e que nunca despertou nenhuma indignação.

A principal razão da indignação é que a oposição midiática tinha no caseiro uma de suas armas mais importantes. A revelação de que ele recebeu 40 paus para denunciar o ministro criou um constrangimento enorme, porque é a prova de que a oposição vem fazendo isso sistematicamente. Lembram daquela tal Karina? Pois é, sumiu da mídia, mas logo após depor contra o governo decidiu se candidatar pelo PSDB, depois pelo PFL. E assim caminha a humanidade, tropeçando em traidores da pátria.

18 de março de 2006

A grande ópera bufa de Ricardo Noblat

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Dedico este post a meu amigo e grande escritor de sátiras políticas, Fernando Soares Campos e ao sempre atento articulista e blogueiro Eduardo Guimarães



Um pobre caseiro de Brasília, em mansão pertencente a um militante do PSDB, é assediado pelo senador Antero Paes de Barro, também tucano, para depor contra o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, considerado um dos mais sólidos pilares do governo Lula. A acusação: Palocci chegando num carro prata, à noite, luzes apagadas no quintal, para participar de orgias com garotas de programa.

O caseiro também afirma que viu notas de cem e cinquenta, andando nuas pelos corredores dessa mal assombrada casa.

Os motivos que levaram o caseiro a se tornar um dedo-duro - o que inclusive já está produzindo uma grande indignação entre caseiros de todo o Brasil, que temem que a classe fique desonrada e perca a confiança dos patrões - foram os mais patrióticos possíveis.

Além de corajoso patriota, o caseiro tem uma linda e comovente história de vida. Por uma dessas coincidências patéticas de novela mexicana, alguns meses antes de se tornar o novo herói da mídia, nosso caseiro pegou um avião para sua cidadezinha natal no dia 23 de dezembro. A história é contada por Ricardo Noblat, dramaturgo do grupo Estadão.

Francenildo parte de Brasília para Teresina num avião da Tam. O preço da passagem, faz questão de informar Noblat, foi a bagatela de R$ 420,00. Coisa pouca para um caseiro tão sortudo e querido entre poderosos da capital federal. Mais uma prova das boas políticas sociais e econômicas de Lula: caseiros agora andam de avião.

De lá, segue para sua cidade natal, Nazário, a cerca de 25 km de Teresina. Francenildo está com friozinho na barriga, antevendo grandes acontecimentos na sua vida. Na noite anterior, teve um sono agitado: sonhou com orgias, nas quais ele tinha intensa participação, em casas de luxo de Brasília. Sonhou ainda que encontrava um anjo da guarda extremamente rico e bondoso, que lhe dava, de vez em quando, uns trocados de 5 ou 10 mil reais.

Depois de agradáveis dias em Nazária, cidade que leva o nome do Salvador, talvez como sinal de que Francenildo seja o novo Messias, aquele que libertará o Brasil das garras de uma gangue de tarados e corruptos.

Pois bem, no dia 4 de janeiro, Francenildo volta para Teresina e, muito ansioso, procura Euripedes Soares, que, segundo lhe informou sua mãe, seria seu verdadeiro pai.

A história de sua mãe, a excelentíssima senhora Benta Maria dos Santos Costa, 42 anos, merece um parágrafo à parte. Em depoimento a estagiários do grupo teatral Estadão, Benta confessa em prantos que foi seduzida por Euripedes quando tinha 15 anos. Na época, Euripedes era um pequeno empresário, com apenas 2 onibus e não possuía nenhum empregado. O relacionamento durou um mês, o suficiente para engravidar Benta. O filho, como vocês já devem estar suspeitando, seria o protagonista de nossa história, Francenildo.

O fato de Francenildo ter 24 anos e ter sido concebido 27 anos atrás é só um detalhe que os dramaturgos se encarregarão de corrigir mais tarde. A peça é voltada para as massas e não há necessidade de muitos cuidados com a verossimilhança. Um dos estagiários sugeriu o seguinte a Noblat, dramaturgo chefe: "já que Francenildo é um ser especial, dotado de visão raio-x, que lhe permite ver cédulas de dinheiro através de paredes e malas, podemos alegar que a gravidez de Benta durou 3 anos, como às vezes acontece com santos e super-heróis. Que tal?" Noblat ergue as sobrancelhas e diz que pensará nessa possibilidade.

Francenildo encontra seu pai no escritório da empresa. Segue abaixo um trecho do diálogo real entre pai e filho, segundo me informou uma testemunha.

"Pode entrar, garoto", diz Euripides para o rapaz que estava à porta e informara à sua secretária que tinha um assunto muito importante a tratar com o empresário. Ao ouvir aquele senhor robusto, cabelos grisalhos, chamá-lo de "garoto", Francenildo sente as pernas tremerem e tem um pensamento absurdo de alegria. Imagina-se criança novamente, chorando escondido no mato, de tristeza por não possuir um pai. Finalmente, agora teria sua chance.

"Senhor Eurípides", balbucia Francenildo, ainda trêmulo, sem saber como iniciar a conversa.

"Pois não, o que você deseja. Diga logo. Tenho que sair daqui a pouco", responde o empresário, já irritado com o que suspeitava ser mais um caso de gente lhe pedindo dinheiro. Empresários, sobretudo os pequenos, costumam ter uma desenvolvida intuição quando se trata de reconhecer credores, fiscais ou filhos bastardos que vêm atrás de grana. Eurípedes estava preocupado com os impostos cada vez mais altos que pagava. Ser empresário em Teresina, cidade importante mas miserável do Piauí, não é mole.

Não tenho tempo, e receio que meus leitores também não tenham, de continuar descrevendo aquele memorável diálogo entre o filho bastardo e o empresário.

O fato é que Francenildo convenceu o pai de que era de fato seu filho. Chegou a chorar ao lembrar de que ficara preso na barriga da mãe durante três anos, tempo que durou a gravidez, já que a mãe teve um caso com Francelino quando tinha 15 anos, mas o parto só ocorreu três anos depois. "Três anos na barriga de minha mãe, meu pai", chora Francenildo. Esse teria sido o principal argumento que levou Eurípedes a acreditar que Francenildo era realmente do seu sangue. O jeitinho safado de Francenildo também lembrava muito, em Eurípedes, a sua própria pessoa.

Depois das lágrimas, os negócios. Francenildo ameaçou denunciar o pai à família deste. Eurípedes ficou aterrorizado, pois era membro da alta cúpula do Opus Dei, contando com amigos importantes na seita, como o governador de São Paulo, Geraldo Alkmin, e a sua religião não aceitava em hipótese alguma qualquer desvio de conduta, sobretudo moral, já que os desvios na política eram um mal necessário que a Opus Deis sempre tolerou e perdoou.

Eurípedes aceita dar dinheiro em troca do silêncio do rapaz. Pensava em dar uns dois ou três mil reais, mas ao fazer tal proposta escuta um pavoroso e diabólico riso de Francenildo.

"Eu quero exatamente R$ 40 mil", diz Francenildo.

Eurípedes tenta argumentar que aquilo era muito dinheiro para um pequeno empresário como ele, mas Francenildo estava agora possuído por uma estranha energia. Seus olhos projetavam um brilho de loucura que hipnotizou Eurípedes. Este se prontificou a assinar um cheque, mas Francenildo o interrompeu:

"Não quero cheque. Quero em dinheiro, em parcelas inferiores à R$ 10.000. Não pode ser mais que 10 mil para a Coaf não descobrir. Daqui a uns meses vou dedurar o ministro da Fazenda e, se eles descobrirem que recebi esse dinheiro, vão dizer que eu fui comprado pela oposição para atacar o governo".

Eurípedes nem sabia o que era Coaf, e ficou confuso ao ouvir aquele papo de alta política vindo de um garoto de 24 anos, que tinha sido caseiro toda a vida. Mas como pertencia à Opus Deis e conhecera lá muitos políticos importantes, além de ser filiado ao PFL e portanto acostumado a essas intrigas palacianas, não ficou tão impressionado assim. Concordou e aceitou dar os R$ 40 mil em parcelas variadas. Outra prova do sucesso do governo Lula: pequenos empresários não vêem mais problema nenhum em dar R$ 40 mil para filhos bastardos que surgem da noite para o dia.

Estou louco para saber o desdobramento dessa incrível novela e aproveito para parabenizar o grande Ricardo Noblat pela sua criatividade ímpar, que tantos frutos têm gerado para nosso sofrido país. Algumas más línguas acusam Noblat, tendo por trás Estadão e partidos de oposição, de pretender, com esta novela, desestabilizar o governo Lula.

Isso é uma grande injustiça e mais uma tentativa stalinista-bolchevique do PT contra a liberdade de expressão.

Assinado: Comendador Virgíllio Maia Carllos Magallhães Bisneto Beira Mar

17 de março de 2006

Campanha sangrenta

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O abandono de qualquer escrúpulo quanto à governabilidade agora é evidente. Acusado por um juiz federal de ser ligado ao Comendador Arcando, chefe do crime organizado do Mato Grosso, o senador Antero Paes de Barro (PSDB) foi atrás da vingança. Segundo Teresa Cruvinel, colunista política do Globo, foi Paes de Barro que "encontrou" o caseiro e convenceu-o a dar o depoimento contra Pallocci. Com isso, o senador tucano desvia definitivamente as atenções da mídia de sua pessoa (aliás, a mídia nunca deu muita atenção a essa ligação do PSDB com a máfia, afinal que novidade há nisso?), e concretiza um poderoso ataque ao governo federal.

A mídia, notadamente a favor do tucano, mobilizou todas as suas forças em prol desse novo ataque. As atenções midiáticas se voltaram em peso para o depoimento do caseiro Francelino Santos Costa.

Com o rompimento de qualquer preocupação com a governabilidade, os senadores assinam o atestado de seu desinteresse pelo país. Em vez de estarem estudando leis e formas de acelerar o crescimento econômico e reduzir a desigualdade social, estão promovendo um ridículo espetáculo, atacando o ministro da Fazenda mais respeitado no exterior desde muitas décadas. Pallocci pode ser odiado internamente entre certos setores da esquerda porque atuou como um conservadorismo que flertou com o neoliberalismo, mas queira-se ou não foi essa política que pôde blindar a economia brasileira às histéricas perfomances de CPIs e gerou uma estabilidade bem superior àquela estabilidade artificial da gestão FHC, lastreada no aumento exponencial da dívida pública, acordos com FMI, bolha cambial, desemprego e venda de estatais. A estabilidade econômicia de Pallocci, e portando do governo Lula foi fundamentada em pilares bem mais sólidos: câmbio livre, redução da dívida externa, fortalecimento das estatais e forte geração de emprego.

Agora, a pergunta que a mídia quer enfiar em nossas goelas é: Pallocci foi ou não foi à tal casa maldita. Paes de Andrade deve ter prometido milhões ao caseiro, e matar toda sua família caso ele desminta a história. Esse é o procedimento padrão de políticos ligados ao crime organizado. Por isso eles se mantém tanto tempo no poder. Mandam matar, ameaçam família, torturam, mutilam, quando se está contra eles. E prometem, e dão, rios de dinheiro quando se faz o jogo deles.

Entretanto, nós, cidadãos sem acesso às privilegiadas informações dos bastidores do poder, ficamos novamente de mãos atadas. Cabe ao governo federal e aos partidos aliados lutarem o bom combate. Irritei-me particularmente com a estupidez ingênua do senador Eduardo Suplicy, que votou com a oposição pelo depoimento do caseiro. Justificou-se dizendo que o depoimento seria fechado. Chegou até a ligar para o ministro Pallocci explicando isso. Pois bem, o depoimento foi aberto, porque o objetivo era mesmo realizar mais um daqueles espetáculos que caracterizaram a crise política. A mídia, como sempre, tem sido fiel cachorrinha da oposição. Hoje, o Globo deu destaque à declaração de Alkmin: "Em seu governo, não teria chegado a esse ponto; nem teria entrado". Ah, muito fácil falar, né, Alkmin. Seu governo foi mestre em barrar CPIs na Assembléia Legislativa de São Paulo. O PT precisa também se fortalecer, como pode o Suplicy ter sido tão burro? Aliás, há tempos que observo no Suplicy uma ingenuidade totalmente incompatível com a importância de seu cargo para a governabilidade, visto que o governo federal tem minoria no Senado e ele é um Senador do partido governista.

Mas não quero aqui somente atacar Suplicy. Ingenuidade é sempre irritante, ainda mais num meio hostil e traiçoeiro como é a política nacional, mas é melhor que termos pedófilos, como Arthur Virgílio ou gente ligada à máfia do crime, como Antero Paes de Barro.

Espero que o PT e o governo federal, com a chancela que a população vem lhe dando, demonstrem um pouco mais de combatividade contra essa oposição irresponsável. Nossa parte, como blogueiros e participantes dos debates públicos criados pelo advento da internet, estamos fazendo.

15 de março de 2006

Quebraram a cara

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(Juliano Guilherme)

O Ibope divulgou hoje que Lula pode ganhar Alkmin, seu principal adversário político, já no primeiro turno. A recuperação política de Lula tinha sido apontada em pesquisas anteriores. A de hoje confirma que é uma tendência firme, e não só apenas entre "os pobres", como a mídia sugeria com indisfarçável desprezo.

O vergonhoso embate interno que desgastou o PSDB, a meu ver, já reflete o desânimo dos tucanos em face desta nova realidade política. Tenho a forte impressão que o vazamento do caixa 2 tucano, seja através da Lista de Furnas, seja pelas investigações da Polícia Federal, também influenciou a produzir o dissensso tucano em torno da candidatura pela presidência da República.

É impossível negar o prazer que sinto em imaginar as prováveis caras de bunda de certos colunistas políticos diante da demonstração de força do governo federal em superar a crise e recuperar a confiança do povo brasileiro.

Miriam Leitão, Merval Pereira, Clóvis Rossi, Arnaldo Jabor, Jô Soares, Lucia Hippolito, agora terão que encarar o fato de que a maioria de seus leitores e ouvintes apóiam o presidente da República.

O Ibope ainda não detalhou os dados da pesquisa de hoje, mas o último levantamento já indicava a forte recuperação do eleitorado de classe média, que é, ao fim das contas, o que importa para os grupos midiáticos, já que vendem seus produtos, principalmente, para esses segmentos.

A classe média, por ser assinante de Veja, Folha, Estadão, Globo, veículos que a tratam como ratinhos de laboratório, experimentando todo o tipo de manipulação psicológica, sexual, política, vem acessando cada vez mais a internet, onde encontra informações que neutralizam a influência da mídia corporativa. Esse fato pode ser observado nas seções de comentários e cartas dos principais blogs e sites políticos do país.

Sinto grande felicidade e mesmo um grande alívio em constatar que o governo Lula vem recebendo um forte apoio intelectual das classes médias, coisa que não ocorria antes da eleição nem nos dois primeiros anos subsequentes. Antes, Lula era apoiado somente pela esquerda de carteirinha, e mesmo assim esse apoio tinha as características contraditórias da esquerda brasileira, em grande parte ainda não arejada com as novas ideologias e, portanto, atrelada a um discurso e uma psicologia retrógrados, utópicos, infantis e rancorosos. Lula não tinha nem um mês de mandato e Caros Amigos, Brasil de Fato, Bafafá, PT, e quase todos os intelectuais esquerdistas do país caíam de pau no Lula sem dó nem piedade. O Governo Lula ficou isolado. Setores importantes da mídia de esquerda não faziam mais que repercutir, em sua própria linguagem, o mesmo discurso da mídia corporativa.

Um renomado intelectual canadense chegou ao cúmulo de escrever e divulgar uma tese segundo a qual Lula era uma invenção do FMI. Sites de esquerda, como o Resistir.info entraram de cabeça na onda. Por trás desse processo, havia ainda a crise ideológica do PT, em face de uma nova realidade geopolítica no mundo, com a vitória ideológica arrasadora do capitalismo. O socialismo contemporâneo ainda é tímido e avança sem muita insegurança num cenário hostil. Se a esquerda avançou de forma extraordinária na América Latina, desta vez o crédito não é dos intelectuais, mas do povo que ousou votar em candidatos e políticos de esquerda, sentindo talvez que somente a experiência, a dolorosa experiência do poder, seria capaz de provocar novas idéias e atualizar o socialismo.

Parte da esquerda, porém, se recusa a essa renovação ideológica. Continua amarrada a um socialismo conservador, autoritário. Outra é puramente oportunista, ou demagógica, como PSOL e PSTU. Procura se locupletar com a inocência ou o corporativismo de alguns setores sociais para conseguir votos.

Lula conseguiu vencer essa esquerda corporativa e, no ano em que disputa a reeleição, conseguiu o que nem os mais otimistas imaginaram: despertou a voz adormecida das massas. As cartas, comentários, depoimentos que lemos em toda parte em defesa do governo Lula não são mais acadêmicos da USP, filósofos da PUC, escritores, enfim todo esse segmento que monopolizava o discurso progressista. Hoje são comerciantes, analistas de sistema, professores de ginásio, aposentados, empresários, enfim nota-se uma tocante diversidade humana entre os defensores do governo Lula. O que é surpreendente é que a defesa de Lula desmente a tese de que os brasileiros são esquecidos, ignorantes políticos ou sei lá mais que incapacidades. São textos muito bem articulados, enriquecidos com estatísticas, análises isentas, e demais elementos que os tornam extremamente persuasivos. Alguns ainda não tem a manha com a linguagem escrita; cometem crassos erros de ortografia; o que pode gerar preconceito entre certa intelectualidade pedante, que ainda considera um ç ou ss no lugar um sinal de grande inteligência.
Estão errados; lendo sites da Bolívia, da Venezuela, do Haiti, nunca encontramos nenhum erro; é que são elites ultra-cultas que dominam todos os ramos da comunicação pública. No Brasil, alguns setores, antes bloqueados psicologicamente a qualquer manifestação escrita, agora estão sentindo-se mais livres, mais preparados, mais corajosos para enfrentar, de igual para igual, poderosos e argutos colunistas políticos. O misticismo da palavra escrita, pelo menos na política, está perdendo espaço para a manifestação espontânea do cidadão comum.
A própria crise política serviu para despertar um QI inusitado no grande público nacional. Hoje, quando vemos qualquer um desses colunistas ou blogueiros políticos destilarem matérias com venenos sutis e armadilhas teóricas, cria-se logo uma avalanche de leitores atentos que desmentem, com acuidade surpreendente, as ilações falsas, e apresentam dados novos, interpretações mais lúcidas, apontando os pontos dúbios. Essa atitude está obrigando ou obrigará muita gente a buscar a imparcialidade perdida e a tratar o governo Lula com mais respeito.

14 de março de 2006

O suicídio do governador Antônio Menino

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(Flávio Shiró)

Para relaxar um pouco, trago-lhes hoje um conto.


Há tempos que amigos insistem que eu lhes conte a verdade sobre o suicídio do governador, ou melhor, do ex-governador Antônio Menino. Estão convencidos de que eu - à época um de seus principais assessores - estou a par de toda a sórdida trama por trás daqueles famosos fatos acontecidos ao final da década de 90. Entretanto, temendo não apenas pela minha segurança pessoal mas por toda a minha família, tenho sistematicamente negado qualquer informação à respeito.

Contudo, depois que a viúva do governador publicou aquele hediondo (porém utilíssimo às futuras gerações) livro sobre a vida do falecido marido, e depois que chegou a meu conhecimento certa notícia vinda da Ásia que explicarei mais adiante, não há mais sentido em manter um silêncio para mim já insuportável. Além disso, a viúva, cujo objetivo ao publicar o livro foi simplesmente ganhar dinheiro às custas do vergonhoso estelionato eleitoral sofrido pela população, e financiar o seu milionário padrão de vida, acusa-me de ter sido cúmplice do ex-governador em diversas ações criminosas, como aquela em que ele mandou matar um promotor público que estaria muito próximo de descobrir-lhe os podres, ou ainda uma outra, em que o governador, mesmo sabendo da existência de um esquadrão da morte dentro da secretaria de segurança, procurou por todos os meios neutralizar qualquer tipo de investigação. Sem negar que o livro revela com justeza os principais ilícitos praticados por aquela triste administração, quero provar que a maior parte foi feita sem que eu tivesse deles o mínimo conhecimento.

Em primeiro lugar, acho necessário esclarecer as razões que me levaram a tornar-me assessor de homem tão execrável. Bem, eu simplesmente não sabia que ele era assim. Nós pertencíamos à mesma congregação evangélica e participávamos de encontros religiosos onde a fé ardente em Deus parecia nos eximir de qualquer deficiência moral. É claro que eu conhecia seus objetivos políticos e, a bem da verdade, via-os com bons olhos, pensando em como seria bom ao nosso estado que pessoas com verdadeira fé em Deus assumissem o poder.

Durante os anos de 1997 a 1999, o governador desviou milhões de reais que haviam sido repassados para os cofres públicos pelo Banco Mundial para o programa de despoluição da baía de Guanabara. Eu descobri isso bem tarde, um pouco antes do caso estourar na imprensa. Mas o que ninguém ficou sabendo foi que o verdadeiro motivo que levou o governador a cometer o suicídio não foi esse escândalo, e sim o que aconteceu no dia 15 de fevereiro de 1999, em pleno sábado de Carnaval. A viúva (e aí explica-se o seu atual ódio pela memória do falecido), que voltara subitamente de umas férias que passava em Teresópolis, flagrou o marido, na cama de um dos quartos do Palácio Guanabara, com duas mocinhas muito bonitas, estagiárias do gabinete executivo.

Agora vamos à grande revelação, desconhecida da própria viúva. O governador, desesperado com o escândalo público e com o flagrante da esposa, chamou seus assessores mais próximos, entre os quais eu, e explicou o seu plano: iria forjar a própria morte e fugir do país. Mandou que arrumássemos um cadáver de indigente no Instituto Médico Legal e que trabalhássemos para que o acidente de carro fosse explicado como uma espécie de suicídio. Vocês se lembram que os jornais publicaram a carta de despedida do governador, uma imitação tosca da carta de Getúlio após se matar no Palácio do Catete em agosto de 1954. O carro foi lançado de um penhasco da serra de Teresópolis e explodiu contra as pedras. O corpo só foi reconhecido pela aliança de casamento, um anel de ouro, e alguns objetos pessoais que escaparam ao fogo.

O governador deveria estar, portanto, nesse exato momento, curtindo férias em alguma deslumbrante praia da Ásia. Uso o verbo no futuro do pretérito porque, segundo fontes fidedignas me relataram, essa nefasta e triste figura já não faz parte de nosso mundo. Pode-se dizer que foi vítima da fúria de Deus. Hospedado num luxuoso hotel do Sri Lanka, estava tomando uísque com água-de-côco na beira da praia quando notou que o mar recuava rapidamente. Teve tempo de beber ainda outras duas doses (a garrafa estava a seu lado), antes que visse, com horror, a onda gigante se aproximando. Ergueu-se com dificuldade da cadeira - desde sua simulada morte, engordara quase vinte quilos. Deu alguns passos em direção ao hotel, e foi tragado pela força terrível das águas. Seu corpo nunca foi encontrado.

8 de março de 2006

A verticalização e a postura da mídia corporativa

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(O Buda urbano, por Juliano Guilherme)

Confesso que não tenho opinião formada sobre a tal verticalização. Achava, porém, que se o Congresso a aprovou em sessão oficial, com quórum normal, os tribunais deveriam respeitar a soberania da casa que (em teoria, é claro) defende os interesses do povo brasileiro.

Entretanto, o que me estranha agora é a postura da mídia corporativa, incluindo aí seus pit-blogueiros. Quando os tribunais impedem as CPIS, em decisões tomadas por um punhado de parlamentares da oposição, de devassarem a vida de pessoas que não tem nada a ver com as investigações em curso, a imprensa vem e grita que há um "confronto" de poderes, e que a Justiça está ferindo a soberania do Congresso.

Agora, quando o Supremo Tribunal Eleitoral vai contra uma decisão votada pelo Congresso Nacional, com apoio de todos os partidos, governo e oposição, a mídia se alinha fanaticamente com os tribunais? Ué? Cadê o discurso pela soberania? Que incoerência é essa? Quer dizer que um punhadinho de senadores do PFL/PSDB podem fazer tudo o que querem, e os tribunais devem dar o aval automaticamente, para não serem achincalhados pela imprensa, como fizeram Estadão, Veja, colunistas e blogueiros. Agora, quando a Justiça se choca com uma decisão soberana de TODO o Congresso Nacional, a imprensa fica do lado dos juízes?

Não tô entendendo... Ou melhor, sei sim. A mídia corporativa está parecendo uma criança pirraçenta. Só porque Lula apoiou o fim da verticalização, a mídia entende que, se a decisão do Congresso não for aceita, isso representaria uma derrota política para o presidente. Então é assim, tudo que Lula defende ou fala, a mídia é contra, não importa o quê. Daqui a pouco, Lula vai dizer que acredita em Deus e a mídia vai defender o ateísmo; no dia seguinte, Lula diz que está em dúvida quanto à validade dos dogmas católicos e a mídia adere ao Opus Dei!

6 de março de 2006

A contra-informação e a reeleição de Lula

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(Mordem em excesso, por Juliano Guilherme)


Os únicos presidentes no mundo que tiveram uma votação superior a Lula, de 54 milhões de voto, foram, pelo que me consta, Bush e Clinton e isso num país, os EUA, com 300 milhões de habitantes. O Brasil, lembrem-se, tem 185 milhões. Essa é uma das razões pela qual a Rainha da Inglaterra receberá o mandatário brasileiro com toda pompa nesta segunda-feira. Também é por isso que a bíblia do capital mundial, a The Economist dedicou quase 40 páginas, entre entrevistas e editoriais, ao mesmo presidente que é, por aqui, vilipendiado e caluniado sistematicamente por poderosos e influentes grupos de comunicação de massa.

Outra razão é a notória competência administrativa do governo Lula, que conseguiu tirar o Brasil do buraco e colocá-lo, novamente, nos trilhos do desenvolvimento. Sobre isso, acho muito pertinente, apesar do enfoque distorcido, a Folha ter dado destaque, em sua edição de domingo, ao fato de que Empregos são mais importantes que Ajudas governamentais. O blogueiro Eduardo Guimarães já escreveu um post (Leia jornal e sofra) sobre isso. Acho que a Folha acha que seus leitores são retardados. Chega disso, tá até perdendo a graça criticar a mídia. Não sei se foi a crise política que ajudou a elevar o QI dos leitores, realmente não sei, mas já é possível dizer que a recuperação política de Lula e do PT não é, de forma alguma, resultado de "esmolas" governamentais, conforme a oposição elitista se refere ao Bolsa Família, esquecendo-se, muito convenientemente, que todos os países desenvolvidos possuem programas sociais de transferência de renda, e que chamar o Bolsa Família de esmola é um desrespeito, uma forma de humilhar as pessoas que dependem destes recursos para sobreviver. O fato é que o governo Lula, em três anos de governo, além da ampliação dos programas sociais, também gerou quase 4 milhões de empregos, de carteira assinada!

Quando Bono Vox veio ao Brasil e foi encontrar-se com Lula, o editor da Ilustrada da Folha deu umas mordidas banguelas no irlandês pelo fato dele "emprestar seu prestígio à Lula". Quero ver se ele vai falar a mesma coisa da Rainha da Inglaterra. Afinal, ao convidar Lula e Marisa para hospedarem-se no Palácio Real, ela está "emprestando" prestígio a Lula. Ou não?

Entretanto, o que me tirou da cama nesta madrugada de domingo para atualizar este blog foi um pensamento algo filosófico. É sobre a questão ética do PT. Sabemos que a oposição vai usar a questão ética o máximo possível no processo eleitoral. Quem defende Lula precisa estar preparado filosoficamente para essa luta.

Pois bem, levantou-se o discurso que o PT não podia errar. O PT não! Qualquer outro partido podia manchar-se com corrupção e Caixa 2. O PT dizia possuir o monopólio da ética, acusaram. Não só a direita, como segmentos importantes da esquerda. Um monte de perna bamba como Chico Alencar; o cara de cachorro triste, o Cristóvão Buarque; e as histéricas Heloísa Helena e Luciana Genro repetiram o mesmo discurso da direita: O PT era dono da ética, não podia se manchar eticamente.

Bem, entendo que esse é um discurso hipócrita, tendencioso, idiota e ardiloso. O PT pode errar sim! Qualquer partido pode errar. Acredito inclusive que seria ingênuo achar que o PT nunca mais vai errar no futuro. O PT é uma instituição humana e precisa aperfeiçoar-se, criar instrumentos mais rigorosos de controle ético, mas achar que um partido de massa, com mais de 1 milhão de filiados, vai extirpar completamente qualquer elemento nocivo de suas entranhas é ser perigosamente tolo. O mal só pode ser combatido quando temos consciência de que ele sempre vai continuar existindo e, portanto, precisa constamente ser combatido. Para isso, existe a Polícia Federal, o Congresso, a imprensa. No caso da imprensa, o uso de denúncias vazias, ilações tendenciosas e colunismo partidário, só a desprestigia e lhe reduz a capacidade de influenciar. De qualquer forma, a chegada dos blogs e sites veio para quebrar a crista da mídia corporativa. A mídia alternativa deixou de ser jornalzinho universitário, zines mal feitos e tablóides sindicais: a internet trouxe o acesso universal e estimulou o surgimento de centenas de sites com prestígio suficiente para enfrentar o poderio dos grandes. Os Davids, mais uma vez, tem a chance de vencer os Golias.

Entretanto, o PT teve um comportamento absolutamente digno em face do escândalo do Caixa 2. Pediu desculpas publicamente à nação. Delúbio Soares assumiu a responsabilidade. O presidente do partido, José Genoíno, renunciou ao cargo e recolheu-se. O próprio Lula, num gesto de humildade, pediu desculpas pela TV.

Quando ele falou na tal facada nas costas, houve aquele burburinho: quem traiu? Ora, pra mim não é difícil saber: Delúbio Soares, Silvio Pereira, José Genoíno. Mas quem deu o golpe mais traiçoeiro no presidente Lula foi mesmo Roberto Jefferson. Tá certo, o erro de Lula e Dirceu foi acreditar numa víbora. Jefferson, contudo, foi o Mefistófeles de Lula, "o mal que emprenhou o bem". Ao dedurar o Caixa 2 petista, ele ajudou o PT a se olhar no espelho e não gostar do que via. O Caixa 2 do PT contraria a história do partido, é uma contradição dilacerante, que quase o destruiu. O PT correu o risco de ser eliminado da história política brasileira, sobretudo porque muitos de seus altos parlamentares participaram do escândalo; e outros, quando deviam dar exemplo de força e lealdade, mostraram-se fracos, pusilânimes, covardes.

O PT errou feio. Mas soube admitir o erro. Ainda hoje, o discurso de Berzoini, atual presidente, Lula e outros, é de que o PT tem que assumir o erro e procurar, humildemente, ganhar novamente a confiança da sociedade.

Agora, diz aí: você viu o PSDB pedir desculpas pelo envolvimento com o crime organizado em Mato Grosso. Você viu o PSDB assumir uma atitude humilde diante do Caixa 2, já provado, da campanha de Eduardo Azeredo (presidente do PSDB até pouco tempo!) para o governo de Minas?

Nem falo na Lista de Furnas porque tenho receio de que seja uma armadilha, conforme alertou nosso vigilante Fernando Soares. Isso não importa tanto. A Polícia Federal tem outras provas e testemunhas de que a estatal Furnas foi usada pelo PSDB e PFL para arrecadar recursos não contabilizados para as eleições de 2002.

Lula tem tudo para ser reeleito. Fez e está fazendo um excelente governo. Não o de nossos sonhos, mas bem acima da média anterior, e é isso que importa. Não acredito que governos operem milagres num país como Brasil, tão grande, tão diverso, e com tantos problemas acumulados. A sociedade, como um todo, precisa participar do esforço pelo desenvolvimento. Creio que um país federativo, dotado de Estados e municípios com relativo grau de autonomia, precisa ter bons governantes em todas as esferas para se desenvolver. Tivéssemos prefeitos e governadores mais competentes, éticos e preocupados com o social, a pressão sobre Lula seria reduzida e ele poderia concentrar recursos financeiros do governo federal nos grandes projetos, sobretudo de infra-estrutura e tecnologia. Infelizmente não é o caso, e continuamos ainda esperando que Lula resolva todos os problemas nacionais.

Lula merece um segundo mandato porque recebeu um país quebrado e o pôs de pé. O primeiro ano de governo, 2003, foi levado com um Orçamento aprovado em 2002, pela gestão anterior. O nível de endividamento externo, seja em dívida externa, seja em dívida interna atrelada ao dólar, era escabroso. O Brasil tinha um contrato draconiano, humilhante com o FMI.

Lula rasgou o contrato com o FMI de forma digna para a política externa do país: pagou tudo e disse tchau. Em uma nova gestão, Lula terá margem de manobra muito mais ampla para investir no social e em infra-estrutura. Não haverá restrições contratuais com o FMI e o prestígio do Brasil subiu exponencialmente, permitindo ao governo obter recursos no exterior em condições vantajosas.

Haverá dificuldades, naturalmente, para a reeleição de Lula. A oposição, desta vez, conta com forte apoioo do grande empresariado, sobretudo paulista, cujos preconceitos de classe e ranço ideológico conseguiram ser exacerbados pelo talento linguístico dos pit-jornalistas corporativos. É incrível isso. Mesmo faturando alto, em função de um ambiente macro-econômico mais estável, e de uma massa de consumidores ampliada pela queda no desemprego e pela melhora na renda das famílias, os empresários, descendentes que são (ao menos psicologicamente, ou culturalmente) dos antigos donos de capitanias hereditárias, querem os tucanos de volta. Lula está promovendo mudanças. Isso assusta aos donos do capital, conservadores por questão genética.

Os bancos estão lucrando mais que nunca. É claro. Com a inclusão social de milhões de pobres no sistema bancário, os bancos tem mais clientes, e lucram mais. As empresas estão vendendo mais. Pra onde vai o dinheiro? Pros bancos. A bolsa de São Paulo vem batendo recordes de movimentação financeira. Para onde vai o dinheiro? Adivinhou? As pessoas estão comprando mais apartamentos, carros, computadores. Quem faz os empréstimos? Entretanto, os bancos estatais Banco do Brasil, Caixa Econômica e BNDES, estão sólidos financeiramente, e estão investindo bilhões na agricultura familiar, na compra e reforma da casa própria. Antes davam prejuízo, porque só serviam para emprestar a fundo perdido para latifundiários, multinacionais e grandes empresas com amigos no governo.

Vocês queriam os bancos quebrando, como na Argentina? Queriam uma nova crise bancária no Brasil, obrigando o governo, como fez FHC, a fazer um novo Proer, aquele plano que deu mais de 20 bilhões de reais do Tesouro Nacional, a fundo perdido, às instituições financeiras?

Sinceramente, não dá pra entender. Bancos lucrando é sinal de solidez econômica. É bom pro país. Considerando que as nossas contas, mesmo as mais humildes, estão guardadas nos bancos, acho muito saudável que eles estejam tendo lucros. O que é importante é que, pela primeira vez na história recente, o setor produtivo está tendo lucros e receitas maiores que os bancos. As grandes indústrias nacionais estão girando mais dinheiro que os bancos. Isso é o mais importante. Mais importante ainda: a renda das famílias está aumentando, o percentual de miseráveis (gente que vive com menos de 1 dólar por dia) caiu substancialmente, o salário mínimo vai ter o maior aumento real em décadas, o turismo está crescendo exponenciamente, exportações crescendo, etc. Enfim, os indicadores econômicos estão positivos.

Há muita gente preocupada com a queda do dólar. Há um lado irônico nessa história, pois no começo do governo Lula a grande gritaria era por intervenção contra a "alta" do dólar. Agora é o contrário. Mas o forte aumento das importações, registrado em janeiro e fevereiro, já vai resolver naturalmente a queda exagerada do dólar, que, de fato está prejudicando as nossas exportações. O legal é verificar que o crescimento das importações tem sido mais intenso no setor de maquinários industriais, o que indica que as indústrias estão aproveitando o dólar baixo para modernizarem suas fábricas, o que levará ao aumento da eficiência das empresas nacionais, ao barateamento dos produtos e ao subsequente aumento da competitividade dos produtos manufaturados brasileiros no mercado internacional.

O dólar baixo vem prejudicando principalmente importantes segmentos agrícolas, como os produtores de soja e algodão. Caso o presidente fosse Serra, mandão e arrogante como é, baixaria logo uma medida provisória para segurar artificialmente o dólar, dando margem, mais uma vez, para um desastre financeiro e cambial no futuro próximo, como ocorreu em 1999. O governo Lula está estudando uma medida provisória para zerar alíquotas de importação de insumos agrícolas e zerar o INSS e outros tributos que incidem sobre a agropecuária. Ou seja, estamos aproveitando o dólar baixo em nosso favor, sem nos deixar levar por um desespero e por soluções de curto prazo, como costumavam fazer gestões anteriores. Baixando o custo dos insumos agrícolas, os produtores terão seus custos reduzidos, recuperando parte da lucratividade perdida com a valorização do Real.

Todos esses argumentos são o que se pode chamar de "contra-informação", na medida em que eles constituem o oposto do discurso midiático. Os indivíduos e segmentos sociais que defendem a reeleição de Lula precisam aprender o valor da contra-informação e usá-la com inteligência. A internet está aí para isso. A participação em blogs, sites, fóruns, o envio de emails para entidades, jornais, revistas e políticos, será fundamental nestas eleições. O movimento já começou.

Dito isto, respeitemos algumas regras óbvias, mas nem por isso fáceis de serem seguidas. Sejamos auto-críticos. Procuremos desenvolver argumentos que possam convencer não somente aqueles que já partilham de nossas idéias, mas sobretudo os que não partilham e os indecisos. Sejamos cuidadosos, usando números confiáveis e não espalhando calúnias fantasiosas. Sem fanatismo lulista ou petista, sem messianismo, o que só provoca, mais adiante, o velho discurso do desencanto.

Evitemos qualquer tipo de baixaria. Se usarem de baixaria contra nós, sejamos altivos e responderemos à altura, agressivos se for o caso, mas com elegância. Vivemos numa democracia e apoiamos quem a gente quiser. É muito importante ainda respeitar a decisão de outros de criticar Lula e apoiar outros candidatos. Voto se ganha com educação e respeito à opinião alheia.

Mesmo não sendo filiados (eu não o sou), não tenham vergonha de ser chamados de Petistas, Petralhas, Pentelhos. Somos, antes de tudo, cidadãos dignos, e esses ataques visam atingir a nossa auto-estima. Inventem apelidos também para os Tucanos. Faz parte do jogo. Estudem esse documento aqui, com informações sobre as ações do governo. Entrem no site do adversário, Primeira Leitura, editado por Reinaldo Azevedo e procurem ler seus artigos. Para contra-argumentar com eficácia é preciso conhecer a fundo o pensamento oposto. Não se deixem impressionar com a arrogância dos colunistas desse site: é seu ponto-fraco. Os arrogantes sempre se acham inteligentes demais. Ao cabo, ficam histéricos, não aceitam a realidade que lhes desaba, implacável, sobre suas cabeças.

Cuidado com o salto alto. Ele é o prefácio de toda derrota. Nos preparemos para vencer ou perder. Uma derrota não será o fim do mundo. Há um velho ditado chinês que diz que só quem está preparado para perder é abençoado com a vitória. Numa democracia madura, há sempre algo de sábio na decisão popular. Viva a democracia!


Obs: Os interessados nas pinturas e trabalhos de Nilton Pinho e Juliano Guilherme favor entrar em contato através dos tels 21 9206 5848 (Nilton) ou 21 2507 5564 (Juliano). Eles têm ateliês no Rio, aberto à visitação e suas obras estão à venda. Conselho meu: é um bom investimento.