24 de março de 2006

Está difícil escrever

Flávio Shiró


Confesso a vocês. Está difícil escrever sobre política hoje. À princípio, pensei em rebater a coluna de Miriam Leitão, que retomou sua verve oposicionista, num texto cheio de adjetivos, opiniões subjetivas e falsidades. Seu artigo é bem paradigmático da linha de pensamento dos segmentos anti-Lulistas da sociedade. Francenildo está sendo alçado agora à condição de mártir, o que é a coroação de sua meteórica carreira de dedo duro de aluguel.

Em seu depoimento à CPI, Nildo lamentou não ter seu celular de última geração, com câmera fotográfica, na época em que espionava a casa onde trabalhava. Afinal é isso que ele fazia, não? Buratti e Poletto eram tão burros que dividiam dinheiro na frente do caseiro, e a uma distância tão próxima a ponto de permitir que ele identificasse o valor das notas.

Voltando à coluna de hoje de Miriam Leitão, nota-se uma retomada, bem repetitiva, dos bordões usados pela mesma durante a crise política, que se ainda dura, perdeu seu status de "seção especial" de sites e jornais. Enfim, a empolgação golpista, que parece ter ganhado certa força nos últimos dias, alimentada pelos desdobramentos do caso Nildo, está longe de atingir o nível perigoso do ano passado. A coluna de Miriam Leitão de hoje não despertou em mim nada mais que um desprezo frio.

À procura de inspiração para esse blog, fui pesquisar outro assunto e deparei-me com um de interesse razoável: a dança da deputada petista Angela Guadagnin, em comemoração à absolvição de seu colega, o também petista João Magno. A imprensa usou o fato com um viés explicitamente fascista. Noblat chegou a publicar o email da deputada e incitar os leitores a enviarem mensagens, de protesto é claro. Depois publicou várias cartas de leitores revoltados com a dança "da impunidade", da dança do "mensalão", como estamparam algumas manchetes. A cientista política Lúcia Hippólito (que de cientista não tem nada, mas de política tem muito) escreveu um daqueles artigos carregados de ódio e indignação. Hippolito diz que a deputada poderia dançar numa churrascaria ou qualquer outro lugar, menos no salão do Congresso.

Lucia Hippolito não parece se importar que os deputados não votem o Orçamento, que devia ter sido votado no ano passado. Não se importa que deputados e senadores estejam fazendo uso ilegal das CPIs, produzindo uma desestabilização política que atrapalha a governabilidade e causa danos à economia brasileira. Não se importa que o senador Arthur Virgílio suba ao palanque e diga, com todas as letras, que irá dar uma surra física no presidente da República. Para Hippolito, quebrar o decoro é dar uns singelos passinhos de dança, uma simples demonstração de alegria de uma parlamentar em ver a absolvição de alguém que, a seu ver, estaria sendo incriminado injustamente. Uma atitude espontânea, brasileira, que a meu ver não agride em nada o Congresso Nacional. E fiquem atentos ao fato de que o citado deputado foi absolvido por TODO o Congresso Nacional, e portanto, segundo os representantes do povo, estaria inocente do crime do qual é acusado pela mídia. A mídia hoje se quer superior ao Congresso, superior ao Supremo Tribunal e superior à sociedade brasileira, que elegeria hoje Lula no primeiro turno, segundo todas as pesquisas.

Wanderley Guilherme dos Santos já havia previsto no ano passado: quando, no frigir dos ovos, todas as grandiosas denúncias e acusações se revelarem inconsistentes, exageradas ou simplesmente vazias, a mídia que as comprou não terá outra alternativa senão vender ao público uma grande pizza.

Na impossibilidade de fazer uma mea culpa, a oposição midiática está jogando a culpa toda no Congresso Nacional, cuja credibilidade vem se recuperando vigorosamente sob a presidência de Aldo Rebelo (PCdoB - AL).

Os vendedores de crise se voltam contra qualquer instituição que não lhes compre os produtos. O Supremo Tribunal é contra a crise?, então ataque-se o Tribunal. A sociedade está contra a crise?, então ataque-se a sociedade, acuse-a de se vender barato, por esmolas do Bolsa Família, ou do Bolsa-Miami, ou seja, dólar baixo. Acuse-a de se vender pelo aumento no salário mínimo.

Vão em frente, jornais, e digam tudo: a sociedade brasileira está se vendendo por um sonho torpe: o desenvolvimento e a justiça social. Como ousam! Como ousaram os estudantes e movimentos sociais realizarem uma grande manifestação em defesa do Presidente Lula, no auge da crise, no ano passado! Miriam Leitão, numa postura fascista, tentou desqualificar o movimento estudantil. "Protesto a favor", denunciaram colunistas sarcásticos, ignorando o fato de que, no fundo, era um protesto "contra" o processo de desestabilização política do governo Lula.

Noblat ganhou emprego no Estadão com sua cobertura altamente envenenada da crise, misturando ficção e realidade. Não esqueçamos que várias reuniões importantes de planejamento do golpe militar de 64 se deram nos escritórios do Estadão, cujos donos também participaram de todas as conspirações golpistas do século XX, contra Vargas, contra JK, contra Jango, enfim contra o Brasil. Uma das consequências mais danosas da ditadura militar foi ter deixado o Brasil apenas com essa imprensa de direita, eliminando jornais com perfil mais progressista, como o Correio da Manhã e a Última Hora, e não permitindo o surgimento de outros jornais.

Está difícil escrever hoje, como eu ia dizendo, porque a oposição midiática está repetitiva.

11 comentarios

Anônimo disse...

Caro Miguel: é assim que me sinto diante de tantos artigos medíocres, uma sensação de desprezo. Mas quando leio seus artigos sobe de ânimo e lucidez minha força!!! Ainda quando seus artigos dizem que não sabem o que dizer.. Seus artigos dizendo ou não sabendo o que dizer fazem bem...
Parabéns e grande abraço!

Miguel do Rosário disse...

voce esqueceu de dizer seu nome ou pelo menos inventar um nick, mas tudo bem, agradeço da mesma forma. abraço.

Anônimo disse...

É MIGUEL...

Dá nojo ! Eu me pergunto : será que os anunciantes, as grandes empresas, não pararam para pensar que podem estar jogando dinheiro fora ao estampar os comerciais de seus produtos em "veículos de comunicação sem credibilidade ?" Digo isto constatando meu caso : tenho uma boa condição econômica, uma família numerosa, filhos consumistas e, desde o início do "golpe midiático" , praticamente não assistimos mais os vendidos telejornais, não compramos revistas como istoera(a vejamente nem se fala, desde a época do collor tenho asco desta #%&*%@+#), jornais então, todos temos raiva e deixamos de comprar.
Casos semelhante devem ter centenas de milhares no Brasil. Na prática significa que os anunciantes não terão o retorno esperado, pois os veículos escolhidos são , a cada dia, menos lidos, vistos e perdem credibilidade a olhos vistos...

Mudando de assunto, a dança da Angela foi massacrada por TODA a mídia vendida como uma vergonha nacional, MAS o tasso e o pauderney mais o virgilio gardenal mandando SE FUDER EM PLANO SENADO é lindo, é na verdade uma aula de ética. Sem esquecer o vale-tudo do pmdb, socos quebra-quebra, etc , Também não vi INDIGNAÇÃO nenhuma... "isto" é o amontoado de maus jornalistas e vendidos sem moral E sem caráter que se mostra e se denomina "mídia imparcial" FAZ-ME RIR..............

Anônimo disse...

Esqueci o nome : Jasmin

Miguel do Rosário disse...

Jasmin, concordo com voce. mas explico uma coisa que voce diz não entender, que é o fato de empresas agirem de forma tão parcial que leva a perder assinantes: são famílias que são donas dessas mídias, muito ricas, com capital acumulado, patrimonio, e que não vêem, pelo menos no horizonte do resto de suas vidas, nada que justifique qualquer temor financeiro, mesmo que perdessem milhões ao ano. No máximo, vão mandar demitir funcionários. No dia que tivermos uma mídia menos dominada por famílias e mais profissional, talvez as coisas melhorem... ou não, que isso somente a História dirá.

Anônimo disse...

MIGUEL

Concordo neste ponto, mas referia-me aos anunciantes como Ambev, GM, Boticário, Motorola, Redes de Hotéis, etc. abçs Jasmin

Miguel do Rosário disse...

ah, tá. também não entendo. acho que tem a ver com monopólio. são poucas revistas e jornais com circulação alta. A distribuição também é monopolizada por poucas empresas.

Anônimo disse...

A América Latina, latrina histórica e quintal do Império Yankee, que, através de décadas, tirando Cuba e, por alguns momentos Nicarágua e Chile, serviu não só de tentáculo mas, principalmente de esgoto dos EUA, com seus ditadores subservientes de plantão, escrava e escravizadora dos mais frágeis, com a face da miséria e da expoliação de um povo que, após o sonho de Bolivar, viveu o pesadelo de uma escravidão sem cor, sem raça, escravidão sem saída, com os generais de plantão na presidência, com uma ultradireita de um capitalismo selvagem, sem par na história da humanidade, acorda e se redime.
Os governos populares pululam no continente e se aproximam , formando um bloco forte, onde seus componentes, irmamente busca uma unidade.
Ouvindo canções libertárias de Violeta Parra, de Vitor Jara, de Silvio Rodriguez, Pablo Milanez, Chico Buarque, Ana Belen, Mercedes Sosa, entre outros, a emoção sempre me aflorou à pele.
E, à flor da pele, me sinto hiperestesiada quando escrevo isso. A campesina interiorana, filha dos sonhos da revolução, quando no brilho dos olhos de uma gente sonhadora e sedenta de justiça vê um novo amanhecer a cada nova vitória da esquerda. DO SOCIALISMO! Fui comunista paradoxalmente católica mas, ao rever meus conceitos e analisar o cristianismo não só como religião, mas filosoficamente falando, observando o sentido real dos milagres, principalmente o da multiplicação dos pães e da conversão do sangue em vinho, da dor na festa, e da carne em pão, do suor do trabalho, na refeição compartilhada com dignidade, entendo que somente o SOCIALISMO pode permitir tal fato. Sou socialista, com muito orgulho, e fico muito feliz em ver que o PCdoB, o PSB e o PT unidos, fazem desse país um local mais digno de viver.
Me entristece ver tantos partidos dito socialistas, como o PDT, o PSOL o PPS e, porque não dizer o próprio PSDB agirem como a ultradireita que tanto combati, até o Fernando Gabeira entrou nessa, me decepcionando tanto, logo quem, exilado por lutar até o extremo por um ideal, no fundo éramos todos socialistas.
Hoje, credito tal fato a traidores velhos e contemporâneos. Roberto Freire, traidor do PCB, ofendendo a memória de Luis Carlos Prestes, no seu desespero de ser aceito pela direita, como num complexo de inferioridade com relação aos coronéis, coisa tipo subconsciente ou até inconsciente, prefiro crer. Não credito isso a defeito de caráter mas, prostituiu o PCB, dando-lhe o nome, mais aceito e até incorporado por muita gente da direita, inclusive canalhas, de PPS. Já Fernando Henrique Cardoso é outro caso, nesse não acredito em ingenuidade, para mim, a traição desse aos Franco Montoros e Mário Covas da vida é mais flagrante, a associação desse com o que há de mais podre na política nacional, o PFL que, aproveitadores, ao perceberem a derrota do PDS, antiga Arena, bandearam para não perderem o poder, desses talvez escape não por ideologia, mas por honrabilidade o Aureliano Chaves, mas carregando consigo os coronéis nordestinos e agrupados a um Cesar Maia, sem caráter e sem ideais, formaram o que há de mais nojento na política brasileira.
Hoje os traidores têm outra face - a face da rancorosa e aética Heloísa Helena, mestra em usar a tribuna como palanque e, cada vez mais parecida com o mesmo ACM que acusou de ter votado pela absolvição do Luis Estêvão, coisa que suas atitudes me permitem pensar ser verdadeira. Junto com a mesma, alguns companheiros ou por oportunismo ou por outro motivo qualquer, mergulharam no obscurantismo ideológico que cerca tal criatura.
Já o PDT, a bem da verdade, nunca foi de esquerda, já que a posição política de Getúlio era mais próxima da ultradireita xenófoba e integralista do que à esquerda, que o diga Olga, ex-mulher de Prestes.
Leonel, o último caudilho, tinha o perfil dúbio, do centralizador, cuja ideologia variava conforme seu humor.
De tudo isso, sobraram os ideais de minha geração, que, apesar desses traidores, está sendo realizado, e essa onda, capitaneada por Lula, significará a liberdade e a união do nosso povo, creio que é por isso que a mídia, sempre aliada dos poderosos e, americanófila ao extremo, servis de um governo como o desse debilóide, George Bush, republicano e WASP, tenta, usando uma guerrilha canalha, a da desinformação, das meias verdades e das mentiras inteiras, roubar do povo a esperança.
Nossa reação urge e se torna fundamental, para não deixarmos roubarem a luz do final do túnel que tanto almejamos.
VAMOS Á LUTA, NÃO PODEMOS DESISTIR NUNCA.

Anônimo disse...

O Wanderley Guilherme dos Santos está fazendo muita falta. Dois detalhes precisam ser explicados. 1 - a oposição cansou de vazar sigilos, e o Dirceu em entrevista a CBN, que está no Informante, repete isso. Mesmo assim, naqueles casos, a imprensa valorizou mais os dados e não o crime de vazamento. 2 - Será que o povo sabe que o Buratti denunciou 7 prefeituras no caso Leão&Leão? Paraece que foi só Ribeirão Preto, não?

Zé Luiz Soares disse...

Miguel, senti que a Angela vacilou duas vezes. A primeira quando deu chance pros tubarões ao dançar na frente da câmeras numa atitude, no mínimo, dispensável, diante do atual e delicado momento. A segunda quando pediu "perdão ao povo" por isso. Senti que a emenda saiu pior que o soneto. Ela deveria ter sido firme, do tipo: "dancei sim, assumo. Estamos no Brasil, não na Suíça. Não tem nada de mais, é da minha personalidade, e quem quiser me criticar que o faça analisando meu trabalho como deputada."

Fiquei mais constrangido com o pedido de perdão do que com a tal dança - de resto, uma bobagem.

Anônimo disse...

Miguel, quanto à dança da deputada, percebe-se o viés que a imprensa dá nos fatos, ao não dispensar a mesma crítica contundente às gargalhadas dos senadores durante o depoimento do caseiro. Li no jornal num cantinho da página, que os senadores gargalharam a cada resposta do simplório caseiro... Veja, isto sim, que horror!, o senado da República gargalhando num momento desse, no qual, inclusive, se decidia o cargo de um ministro da República.
Entre dança de alegria e gargalhadas de cinismo, fico com a dança.
Abraços,
Glória

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