Recebi um email com um artigo do escritor João Ubaldo Ribeiro, que ultimamente publica todo domingo um petardo anti-Lula no Globo. Assim garante seu emprego. Os primeiros artigos do Ubaldo no Globo eram geniais. Engraçados, irônicos. Mas há tempos, desde antes da crise, tornaram-se absurdamente enfadonhos e repetitivos. Dá a impressão que ele tá de saco cheio do serviço, mas precisa desesperadamente da grana. Aliás, ele já andou até admitindo isso...
Com a crise, ele vem se excedendo no besteirol político. O último que recebi é intitulado: "Precisamos de nova matéria-prima". É de um moralismo tão metido a besta, tão cacete, tão óbvio, que naturalmente cai como uma luva no discurso global para engambelar a classe média.
O artigo fala, em resumo, que todo brasileiro é safado, rouba de um jeito ou de outro, e que, portanto, com FHC, Collor ou Lula, o país sempre terá seus problemas éticos. A solução, portanto, é mudar a matéria-prima do país, ou seja, o povo.
O enganador da questão é que, se você analisar a coisa sem refletir, vai concordar com isso. Ele cita como exemplo o empregado que leva pra casa os clipes, papéis e canetas da empresa, achando que tem direito a isso. De fato, há uma corrupção disseminada em todo corpo social brasileiro. A gente nem se dá conta disso. Até aí tudo bem. Agora, falar em trocar a matéria-prima? Falar em trocar o povo? Seria melhor se o Ubaldo aconselhasse seus patrões a elevar o nível das novelas, que só ensinam porcaria e desonestidade. É sempre todo mundo traindo todo mundo.
Esse tipo de raciocínio do Ubaldo é o que produz todo moralismo fundamentalista, e tem como máxima o seguinte: a virtude e o pecado estão no homem.
Bem, o assunto é complexo e isso aqui não é uma tese de pós-gradução em antropologia cultural. Então vamos direto ao meu ponto-de-vista: não concordo com isso.
Para mim, a virtude e o pecado estão na história.
Ninguém vai me convencer que o brasileiro é safado por natureza. Quer dizer, não mais que outro cidadão de outro país. Assim como acho a máxima de Rousseau, todo homem nasce bom, a sociedade que o corrompe, uma babaquice já totalmente desmoralizada desde que Voltaire publicou "Candido, o otimista", também acho equivocada e mesmo má-intencionada a consideração de que o homem nasce mau, sobretudo quando o sujeito tem a desgraça de nascer no Brasil.
Peralá. Ubaldo, com todo respeito, não adianta nem você disfarçar dizendo que, ao chegar em casa, vai encontrar o culpado no espelho. Esse catolicismozinho culpado no final do artigo só serve para explicitar a falsidade e a torpeza de seu raciocínio: todos os brasileiros são safados, inclusive eu, e ponto final.
Ah, peraí. Trata-se de uma simplificação tão grosseira que um bom escolástico medieval iria cuspir na sua cara. Quer ser moralista, então o seja com classe e sofisticação. Esse moralismo telenovela não resolve nada.
Os problemas éticos no Brasil estão ligados à sua história. Vá ler o livro do Gaspari (grande historiador e péssimo jornalista) sobre a ditadura, e veja como ela destruiu as instituições responsáveis pela vigilância ética do país. Qualquer policial corrupto, quando acuado, batia a mão no peito e dizia: eu sou anti-comunista! E a imprensa se calava sob a mira do fuzil. Não tinha mais Ministério Público, Tribunal de Contas, Corregedoria, não tinha mais nada. Ficou tudo nas mãos dos milicos e sua revoluçãozinha de merda
Além disso, outros fatores desmoralizaram o país: a miséria, a inflação, o desmantelamento do ensino público.
Depois veio o Fernando Henrique e fez a dívida externa e interna multiplicar por dez. E entregou a conta pro Lula pagar. O que eles não aceitam, é que o Lula pagou! Lula decidiu não dar calote nenhum e conseguiu melhorar a imagem do Brasil no exterior. Claro que tudo isso é complicado demais. Os mais inteligentes se confundem.
Que tem muito safado no Brasil, a gente sabe que tem. Nas ruas, em casa, nas repartições, nos escritórios. Agora generalizar? Isso não aceito. Quem é honesto: o americano, o francês, o inglês, o holandês, o suíço? Ah ah ah. É muito fácil ser honesto com cem mil dólares na conta de cada um, casa própria, depois de duzentos ou trezentos anos de exploração econômica do terceiro mundo.
Você acha, Ubaldo, que tenho inveja da França porque tem aquelas maquininhas automáticas de venda de jornal, onde o sujeito pega o seu exemplar e põe o dinheiro, sem ninguém vigiando?
Não tenho nenhuma. Eu amo o país do jeito que ele é. Cheio de malandragem, assim mesmo. Estamos na luta para melhorar tudo isso, mas prefiro o sol escaldante do meu Rio a pisar em cocô de cachorro em Paris. Eles lá, os franceses, lutaram para melhorar. Não foi fácil pra eles, não, seu Ubaldo. Guerras, fome, peste. Séculos de opressão.
Eu adoro Paris, Ubaldo, apesar de nunca ter visitado a cidade-luz. Sou poeta, gosto de qualquer lugar do mundo onde a bebida não seja proibida. Mas aqui eu sou gente, lá serei mais um emigrante lavador de prato e discriminado pelas autoridades.
Não tem que trocar matéria-prima nenhuma. Temos é que ir aperfeiçoando nossa democracia traumatizada por séculos de oligarquias corruptas, ditaduras, preconceitos de classe. É um processo lento, mas é seguro. Assim caminha a humanidade. O Brasil vai melhorando aos poucos. Diz que não quem é cego, analisa a história lendo a Veja ou Globo. E se não melhorar, foda-se, a gente vai tentar ser feliz do mesmo jeito, indo à praia, bebendo cerveja, amando, lendo e escrevendo livros e, de vez em quando, usando os jornais como papel higiênico.
O Brasil não precisa de moralismo, Ubaldo. Precisa sim de emprego, melhores salários, presídios menos fascistas, inflação baixa, professores mais interessados, sindicatos atuantes, escritores mais inteligentes, instituições respeitadas e vigilantes, imprensa mais múltipla, mais música, mais turismo, mais agricultura, mais cuidado com o meio ambiente. Aí sim, Ubaldo, o brasileiro será mais honesto. Ou então mais feliz, o que é a melhor maneira de transmitir a idéia do bem. Até cachorro agora se adestra com carinho, não com porrada.
Com a crise, ele vem se excedendo no besteirol político. O último que recebi é intitulado: "Precisamos de nova matéria-prima". É de um moralismo tão metido a besta, tão cacete, tão óbvio, que naturalmente cai como uma luva no discurso global para engambelar a classe média.
O artigo fala, em resumo, que todo brasileiro é safado, rouba de um jeito ou de outro, e que, portanto, com FHC, Collor ou Lula, o país sempre terá seus problemas éticos. A solução, portanto, é mudar a matéria-prima do país, ou seja, o povo.
O enganador da questão é que, se você analisar a coisa sem refletir, vai concordar com isso. Ele cita como exemplo o empregado que leva pra casa os clipes, papéis e canetas da empresa, achando que tem direito a isso. De fato, há uma corrupção disseminada em todo corpo social brasileiro. A gente nem se dá conta disso. Até aí tudo bem. Agora, falar em trocar a matéria-prima? Falar em trocar o povo? Seria melhor se o Ubaldo aconselhasse seus patrões a elevar o nível das novelas, que só ensinam porcaria e desonestidade. É sempre todo mundo traindo todo mundo.
Esse tipo de raciocínio do Ubaldo é o que produz todo moralismo fundamentalista, e tem como máxima o seguinte: a virtude e o pecado estão no homem.
Bem, o assunto é complexo e isso aqui não é uma tese de pós-gradução em antropologia cultural. Então vamos direto ao meu ponto-de-vista: não concordo com isso.
Para mim, a virtude e o pecado estão na história.
Ninguém vai me convencer que o brasileiro é safado por natureza. Quer dizer, não mais que outro cidadão de outro país. Assim como acho a máxima de Rousseau, todo homem nasce bom, a sociedade que o corrompe, uma babaquice já totalmente desmoralizada desde que Voltaire publicou "Candido, o otimista", também acho equivocada e mesmo má-intencionada a consideração de que o homem nasce mau, sobretudo quando o sujeito tem a desgraça de nascer no Brasil.
Peralá. Ubaldo, com todo respeito, não adianta nem você disfarçar dizendo que, ao chegar em casa, vai encontrar o culpado no espelho. Esse catolicismozinho culpado no final do artigo só serve para explicitar a falsidade e a torpeza de seu raciocínio: todos os brasileiros são safados, inclusive eu, e ponto final.
Ah, peraí. Trata-se de uma simplificação tão grosseira que um bom escolástico medieval iria cuspir na sua cara. Quer ser moralista, então o seja com classe e sofisticação. Esse moralismo telenovela não resolve nada.
Os problemas éticos no Brasil estão ligados à sua história. Vá ler o livro do Gaspari (grande historiador e péssimo jornalista) sobre a ditadura, e veja como ela destruiu as instituições responsáveis pela vigilância ética do país. Qualquer policial corrupto, quando acuado, batia a mão no peito e dizia: eu sou anti-comunista! E a imprensa se calava sob a mira do fuzil. Não tinha mais Ministério Público, Tribunal de Contas, Corregedoria, não tinha mais nada. Ficou tudo nas mãos dos milicos e sua revoluçãozinha de merda
Além disso, outros fatores desmoralizaram o país: a miséria, a inflação, o desmantelamento do ensino público.
Depois veio o Fernando Henrique e fez a dívida externa e interna multiplicar por dez. E entregou a conta pro Lula pagar. O que eles não aceitam, é que o Lula pagou! Lula decidiu não dar calote nenhum e conseguiu melhorar a imagem do Brasil no exterior. Claro que tudo isso é complicado demais. Os mais inteligentes se confundem.
Que tem muito safado no Brasil, a gente sabe que tem. Nas ruas, em casa, nas repartições, nos escritórios. Agora generalizar? Isso não aceito. Quem é honesto: o americano, o francês, o inglês, o holandês, o suíço? Ah ah ah. É muito fácil ser honesto com cem mil dólares na conta de cada um, casa própria, depois de duzentos ou trezentos anos de exploração econômica do terceiro mundo.
Você acha, Ubaldo, que tenho inveja da França porque tem aquelas maquininhas automáticas de venda de jornal, onde o sujeito pega o seu exemplar e põe o dinheiro, sem ninguém vigiando?
Não tenho nenhuma. Eu amo o país do jeito que ele é. Cheio de malandragem, assim mesmo. Estamos na luta para melhorar tudo isso, mas prefiro o sol escaldante do meu Rio a pisar em cocô de cachorro em Paris. Eles lá, os franceses, lutaram para melhorar. Não foi fácil pra eles, não, seu Ubaldo. Guerras, fome, peste. Séculos de opressão.
Eu adoro Paris, Ubaldo, apesar de nunca ter visitado a cidade-luz. Sou poeta, gosto de qualquer lugar do mundo onde a bebida não seja proibida. Mas aqui eu sou gente, lá serei mais um emigrante lavador de prato e discriminado pelas autoridades.
Não tem que trocar matéria-prima nenhuma. Temos é que ir aperfeiçoando nossa democracia traumatizada por séculos de oligarquias corruptas, ditaduras, preconceitos de classe. É um processo lento, mas é seguro. Assim caminha a humanidade. O Brasil vai melhorando aos poucos. Diz que não quem é cego, analisa a história lendo a Veja ou Globo. E se não melhorar, foda-se, a gente vai tentar ser feliz do mesmo jeito, indo à praia, bebendo cerveja, amando, lendo e escrevendo livros e, de vez em quando, usando os jornais como papel higiênico.
O Brasil não precisa de moralismo, Ubaldo. Precisa sim de emprego, melhores salários, presídios menos fascistas, inflação baixa, professores mais interessados, sindicatos atuantes, escritores mais inteligentes, instituições respeitadas e vigilantes, imprensa mais múltipla, mais música, mais turismo, mais agricultura, mais cuidado com o meio ambiente. Aí sim, Ubaldo, o brasileiro será mais honesto. Ou então mais feliz, o que é a melhor maneira de transmitir a idéia do bem. Até cachorro agora se adestra com carinho, não com porrada.
isso mesmo miguel...bem q esse tal de Ubaldo podia ler seu texto, mas pessoas como ele não devem se sentir atingidos por críticas....e gentinha...odeio gentinha conservadora e moralista...q os Deuses perdoem essas gentinhas...
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