Por Jorge Duarte ( jorgeduarte1975@yahoo.com.br / sem homepage) escreveu:
A crise política serviu pelo menos para uma coisa: para despertar o espírito combativo que andava adormecido na esquerda séria e nos movimentos sociais. De início perplexa e paralisada com as acusações gravíssimas que o ex-deputado federal Roberto Jefferson lançava sobre o então ministro José Dirceu e, portanto, sobre todo governo, a esquerda brasileira, em conformidade com sua fé inabalável na democracia e nos princípios constitucionais, não quis se comprometer com a defesa de nenhum dos envolvidos, nem do próprio Lula.
Foram montadas CPIs, ações da Polícia Federal, do Ministério Público, a imprensa se mobilizou, a opinião pública correu para jornais e televisão, atenta a tudo.
O tempo foi passando, e uma situação paradoxal foi se produzindo: ao mesmo tempo em que não se ia encontrando nada de extraordinário, os formadores de opinião, os pit-mídia assalariados, em conluio descarado com atores políticos, foram elevando o tom dos ataques, tentando criar uma atmosfera apocalíptica. O fato da economia seguir sólida ficou cada vez mais constrangedor. Miriam Leitão anunciava grandes debacles econômicos para o futuro próximo, em função da crise (logo depois, foi aos EUA, ganhar uma medalha de jornalismo, a mesma que Lacerda ganhou por suas mentiras), até que se rendeu ao óbvio e hoje tenta conciliar suas sofríveis incursões na política com razoáveis análises econômicas.
As crises políticas sempre fizeram parte da luta de classes. A atual serviu para mostrar à sociedade, principalmente a seus segmentos mais politizados, que a luta politica no país entrou, definitivamente, no século XXI, com todos seus instrumentos de comoção psicológica, o uso de credibildades jornalísticas e artísticas acumuladas ao longo de anos, a fragilidade conceitual das velhas ideologias e o caráter manipulável das classes médias brasileiras.
Não se poupou nem a esperança, que foi a primeira a ser impiedosamente brutalizada logo nos primeiros dias da crise. O experiente Aristóteles escreveu sobre o caráter dos velhos: não gostam da esperança, porque esta é, sobretudo, uma expectativa de alegria futura; tendo apenas a morte como futuro, os velhos desprezam a esperança. Os velhos de espírito poderíamos acrescentar ao texto do mestre.
A manipulação das consciências havia começado desde o início do governo Lula. Sua prudência em evitar aventurismos econômicos foi logo taxada de continuísmo. Parte da esquerda não conseguiu suportar a violência de estar no poder, e arcar com os riscos inevitáveis: erros administrativos, corrupção, necessidade de alianças políticas, exposição constante na mídia não como acusador mas como acusado, enfim todos os percalços já tão conhecidos pelas classes dominantes, que tiveram muitos séculos de experiência.
Lendo Casa Grande & Senzala, do Gilberto Freyre, observo como perduram até hoje antigos preconceitos senhoriais, segundo os quais os chefes políticos devem exercer autoridade com mão-de-ferro. Chama-se Lula de indeciso porque ele evita esse autoritarismo chauvinista idiota que parte da classe média tanto idolatra; prefere dialogar incansavelmente com a sociedade civil, com políticos, ministros, assessores, em busca da melhor alternativa; e está sempre disposto a voltar atrás e tomar outra direção.
Aliás, esse é o grande receio das classes dominantes do Brasil: que Lula acumule capital político suficiente para acelerar a democratização econômica no país. A politica tem um tempo próprio. Não podemos esquecer que a democracia foi uma invenção burguesa, e que sua estrutura e constituição muitas vezes são usadas contra o trabalhador, sobretudo porque os operadores da lei pertencem, em sua maioria, no Brasil, a oligarquias nacionais.
A crise serviu ainda para projetar um holofote sobre a mesquinharia de setores da esquerda nacional. Há um segmento totalmente niilista, que considera todos os políticos farinha do mesmo saco. É o Fora Todos. A depender deles, nosso presidente seria a Hebe Camargo. Esses não gostam de nada que seja vivo, que por ser vivo é sempre contraditório. Não sabem o que querem: não gostam de Lula, de Fidel, de Chávez, da mãe, do pai, não gostam da vida. Querem o socialismo mas não comemoram quando um comunista é eleito presidente do Congresso Nacional. Acham que o Brasil é um grande centro acadêmico.
Outro segmento social a receber grande luz foram colunistas e escritores políticos. Elio Gaspari e sua eterna ladainha sobre a patuléia... Porque ele não entrega metade de seu salário à patuléia? Jabor e seu cinismo tucano aditivado com dinheiro global. Recebeu milhões de recursos públicos para fazer um filme, comprou um apartamento e esquecer do filme. Virou garoto-propaganda da Globo e cabo eleitoral de FHC. Sabe porque a Globo não fala mal do FHC? Porque FHC deu bilhões ao Globo.
FHC deu, de presente, 20 bilhões de reais, do Tesouro Nacional aos bancos. E vem o Globo dizer que os bancos lucram mais no governo Lula que no governo FHC... Graças a Deus! A desgraça seria ver o Lula sendo obrigado a dar nosso precioso dinheirinho aos banqueiros de novo, para evitar que o sistema financeiro nacional entrasse em colapso, como ocorreu na Argentina, e todos perdessem suas contas bancárias. Quer dizer, tem os juros e a dívida pública. Mas estamos pagando e reduzindo. Aqui não é Argentina, não dá para dar calote.
Entrou um novo ator no cenário político: o jovem Reinaldo Azevedo, sucessor de Olavo de Carvalho no machartismo tupiniquim, mas ainda não totalmente esquizóide e paranóico como o ex-colunista do Globo. É um imbecil completo, mas tem ganhado enorme espaço e aprendeu alguns macetes com o Mainardi sobre como chamar a atenção.
A crise despertou os movimentos sociais. Os sindicalistas estão de olho aberto. Prometeram botar fogo no país caso a oposição ouse depor o presidente. Querem vencer Lula? Que o façam nas urnas.
21 de novembro de 2005
Esse comentário no Manifesto da Novae tá bom
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