Claro que os fariseus vão criticar a proposta de Lula de combater à fome no mundo de demagogia, farsa do capitalismo para burlar a luta de classes, mas a verdade é que se trata de uma proposta progressista que serve para desmoralizar os Estados Unidos e sua ridícula cruzada pela liberdade. Que liberdade se as pessoas não tem o que comer? Que liberdade se as pessoas são mortas por bombas? Que liberdade se os países estão encalacrados em dívidas impagáveis? A pior arma de destruição em massa é a fome e qualquer iniciativa no sentido de se alocar mais recursos para amenizar o sofrimento é bem vinda. Demagogia é achar que o "desenvolvimento econômico" por si só resolve a questão. Não, não. Uma pessoa passando fome precisa primeiro comer, depois comer de novo, mais uma vez, e aí sim ela vai se levantar e procurar se educar e trabalhar. A falta de comida, além disso, transtorna moralmente os indivíduos, gerando graves distúrbios de personalidade. Josué de Castro, em sua obra-prima, Geografia da Fome, faz uma brilhante análise do fenômeno da fome e suas consequências psicológicas e sociais. É um absurdo que os EUA pulverizem bilhões de dólares numa guerra espúria no Iraque enquanto, logo abaixo, na África sub-saariana, a fome e a aids estão dizimando milhões de pessoas por ano.
O Bush será reeleito, tudo bem, mas isso será importante para que as contradições se agudizem nos EUA e no mundo, de maneira a provocar mudanças efetivas e profundas no médio prazo. A história é assim, dizia Hegel, funciona através de movimentos dialéticos onde as situações geram suas sombras, e as sombras geram a luz.
20 de setembro de 2004
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