24 de agosto de 2008

Manuskripto é lançado



Noite amena, fresca, a Lapa velha e boa de sempre, num sábado particularmente calmo. Na Joaquim Silva, rua onde dormia Madame Satã quando moleque, diante da escadaria de azulejos coloridos os amigos se reúnem e fazem sua modesta contribuição à economia brasileira, quer dizer belga. Leia-se Inbev. Na foto, Nilton Pinho, à esquerda, explica os altos e baixos da cotação do levedo, tema que também preocupa sobremaneira Sideral, ao fundo. Priscila, à direita, entedia-se com o assunto, enquanto Juliano Guiherme e Hélcio Barros (segurando um exemplar do Manuskripto) tentam desviá-lo para filosofia alemã do século XIX.

Lancei a revista e encerrei a festa bem cedo, meia noite e pouco, por influência de um Legião Urbana tocado mais repetidamente do que o aconselhável - ainda mais considerando que ouvi tanto Legião na adolescência que preciso de mais uns vinte ou trinta anos para voltar a curtir a banda. E o Manuskripto tinha mais a ver com um blues antigo. Quiçá algum clássico do Celso Blues Boy. Um Fausto Fawcett. Mas a festa era emprestada, e não posso reclamar muito porque ao menos é um espaço onde não toca samba - que eu gosto, mas que virou uma ditadura na Lapa. Não aguento mais ouvir "afivelaram meu peito, para eu deixar de eu te amar". Mais de dez anos escutando essa música, tenha dó.

Ainda estou longe dos jornais, e minha síndrome parece ter diminuído. Não sinto mais tanta falta, nem dos cadernos de cultura. Ontem estava meio aborrecido com umas coisas e li duas entrevistas que levantaram meu astral, na famosa coletânea da Paris Review. Uma com Faulkner, outra com Céline. Faulkner afirma de forma muito comovente a sua independência e deu algumas dicas. Ele começou escrevendo em Nova Orleans, enquanto fazia todo tipo de bico, geralmente trabalhos manuais que lhe deixavam o cérebro livre para pensar. Faulkner diz que já ouviu falar de inspiração, mas que nunca soube direito o que é. Literatura, diz ele, é feita de 90% de talento, 90% de determinação e 90% de trabalho.

A entrevista com Céline é divertida. O curto prefácio diz que ele já estava meio demente, isolado numa casa de periferia, endividado e solitário. Céline conta que foi muito pobre na infância e juventude. Era uma pobreza particularmente difícil porque tinham uma vendinha na galeria Lafayette e precisavam demonstrar alguma decência. Moravam no segundo andar da loja, num apartamento cuja cozinha era menor que um armário. A mãe de Céline, com uma perna quase inválida, tinha que subir e descer uma escadinha em espiral umas vinte e cinco vezes por dia, para ferver água, voltar para loja, subir para fazer o molho, etc. Céline disse que a vida inteira comeu apenas macarrão porque era o único prato que não dava cheiro nas roupas que a mãe passava e entregava nas residências ricas.

Impressionou-me uma observação de Céline sobre o tempo em que trabalhou como médico de uma fábrica da Ford nos EUA. Indagado se notara muitos problemas físicos e mentais junto aos operários, Céline diz que os doentes eram os mais apegados à empresa. Os saudáveis, diz ele, estavam sempre abandonando a fábrica. Pareceu-me lógico. As pessoas mais frágeis, fisica ou psicologicamente, agarram-se a seus empregos com medo e sofreguidão. O que me leva a refletir se interessa ao sistema ter pessoas semi-doentes e inseguras.

E na entrevista com Faulkner ele diz que para escrever basta papel, comida e uísque. A repórter indaga: "bourbon?", e ele responde: "uísque está de bom tamanho". Faulkner diz que o escritor de primeira classe não tem tempo de correr atrás de ajudas de governo e que conforto financeiro também não ajuda em nada. Paz e alegria, diz Faulkner, não têm nada a ver com arte. O melhor emprego que teve, diz Faulkner, foi o de zelador de motel, que lhe proporcionava tempo para pensar, e alguma agitação para espantar o tédio.

*

Bem, voltando à Manuskripto, trata-se de uma revista em papel branco comum, tamanho A3, dobrado em dois. Na capa, um belíssimo poema de Dylan Thomas, uma importante citação de Spinoza, um editorial escrito a mão. Traz ainda poesias diversas, de vários autores, uma crônica política, um ensaio sobre o trabalho do Nilton Pinho. Quem quiser adquirir um exemplar, ou fazer uma assinatura para receber toda quinzena, mande um email ou deixe um comentário.

9 comentarios

Vera Pereira disse...

Quero comprar. Como fazer?

Anônimo disse...

Parabéns pela Manuskripto, Miguel, está em boas mãos. By the way:viu na primeira página do UOL o anúncio descarado do governo Serra?Fossem Lula/Marta eles seriam comidos vivos!
beijos desta La Denser

Anônimo disse...

Vou repetir minha pergunta: como é que posso comprar a revista?

Anônimo disse...

Vou repetir minha pergunta: como é que posso comprar a revista?

Anônimo disse...

Vou repetir minha pergunta: como é que posso comprar a revista?

Miguel do Rosário disse...

oi vera, desculpe demorar a responder. estava fora. para comprar a revista, basta depositar R$ 3,00 (R$ 2,00 do preço + R$ 1 do correio), na seguinta conta: Banco do Brasil / Agencia 0087-6 / C/C 25018-x.

Obrigado e um abraço.

Miguel do Rosário disse...

Falou Marcia, Beijos. Nâo vi essa capa do UOL não. Cara de pau.

Anônimo disse...

Eu queria um exemplar

silvio barros
SERVIDÂO CANARINHOS, 189
RIO TAVARES- FPOLIS-SC
CMO FAZER ?

SB

Miguel do Rosário disse...

Oi Silvio, vou fazer um post apenas sobre isso. Estou implantando uma forma de pagamento online. Abraço. Miguel

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