Henry Miller, o escritor americano famoso por sua trilogia Sexus, Nexus e Plexus, além dos romances Trópico de Câncer e Trópico de Capricórnio, foi um dos autores que mais marcaram a minha vida. Ler Miller não é somente ler um livro. É uma experiência profundamente orgânica e psicológica, uma verdadeira viagem pelos quatro continentes da alma humana. Ele transforma sua história, seus sofrimentos, em símbolos da derrocada e redenção do homem. O mais legal em Miller é que ele nos ensina que a experiência não é resultado de bebedeiras, drogas, festas. Também não sustenta as teorias jesuíticas sobre o valor do sofrimento para a formação do artista. A experiência é sobretudo um ato de criação, um extravasamento de nossa sabedoria e criatividade. Ninguém é mais sábio que outro por ter conhecido países diferentes. A criatividade não é comprada em Nova York. Por isso, temos grandes artistas como Machado de Assis e Cartola, que nunca saíram do Rio de Janeiro, e se tornaram universais.
O Miller escreveu também um ensaio chamado Tempo dos Assassinos onde analisa a obra de Arthur Rimbaud com sua verve inigualável. Miller conheceu a obra de Rimbaud tarde, quando já morava em Paris, após os 40 anos, e sentiu imensa afinidade com o angustiado poeta francês que abandonou a literatura aos 20 anos para se tornar traficante de armas e escravos na África. Rimbaud, assim como Miller, buscou transformar a literatura numa experiência autêntica, vital. C'est le temp de les assassins, é o verso final de um lindo poema do jovem nascido em Charleville, que uma vez fugiu de casa aos 16 anos para se juntar aos communard, os anarquistas que tomaram o poder em 1871, durante a Comuna de Paris. Rimbaud não suportou a vidinha medíocre e artificial das rodas literárias parisienses.
Há um filme interessante, com Leonardo Di Caprio fazendo papel de Rimbaud, cujo título em português é Eclipse de uma Paixão, que descreve as peripécias do poeta em Paris e Londres.
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Abaixo o poema onde consta a expressão "tempo dos assassinos", no original e na tradução do Ivo Barroso.
Matinée D'Ivresse - Arthur Rimbaud
Ô mon Bien ! Ô mon Beau ! Fanfare atroce où je ne trébuche point ! Chevalet féerique ! Hourra pour l'œuvre inouïe et pour le corps merveilleux, pour la première fois ! Cela commença sous les rires des enfants, cela finira par eux. Ce poison va rester dans toutes nos veines même quand, la fanfare tournant, nous serons rendus à l'ancienne inharmonie. Ô maintenant, nous si dignes de ces tortures ! rassemblons fervemment cette promesse surhumaine faite à notre corps et à notre âme créés : cette promesse, cette démence ! L'élégance, la science, la violence ! On nous a promis d'enterrer dans l'ombre l'arbre du bien et du mal, de déporter les honnêtetés tyranniques, afin que nous amenions notre très pur amour. Cela commença par quelques dégoûts et cela finit, - ne pouvant nous saisir sur-le-champ de cette éternité, - cela finit par une débandade de parfums.
Rire des enfants, discrétion des esclaves, austérité des vierges, horreur des figures et des objets d'ici, sacrés soyez-vous par le souvenir de cette veille. Cela commençait par toute la rustrerie, voici que cela finit par des anges de flammes et de glace.
Petite veille d'ivresse, sainte ! quand ce ne serait que pour le masque dont tu nous as gratifiés. Nous t'affirmons, méthode ! Nous n'oublions pas que tu as glorifié hier chacun de nos âges. Nous avons foi au poison. Nous savons donner notre vie tout entière tous les jours.
Voici le temps des ASSASSINS.
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Manhã de Embriaguez - Arthur Rimbaud (traduzido por Ivo Barroso)
Oh meu Bem, oh meu Belo! Fanfarra atroz em que não mais tropeço! cavalete feérico! Hurra pela a obra inaudita e pelo corpo maravilhoso, pela primeira vez! Tudo começou com risos de crianças, com eles vai terminar. Este veneno permanecerá em nossas veias mesmo quando acabar a fanfarra e voltarmos à nossa antiga inarmonia. Ó, agora que somos tão dignos dessas torturas! recolhamos fervorosamente esta promessa sobreumana feita ao nosso corpo e à nossa alma criados: esta promessa, esta demência! A aparência, a ciência, a violência! Prometeram-nos enterrar na sombra a árvore do bem e do mal, desterrar as honestidades tirânicas, para que pudéssemos realizar o nosso amor mais puro. Começou com certas repugnâncias e terminou, - não nos sendo possível apreender de imediato esta eternidade, - terminou com uma debandada de perfumes.
Risos de crianças, discrição dos escravos, austeridade das virgens, horror das faces e objetos daqui, sagrados sede vós pela lembrança desta vigília. O que havia começado com toda a grosseria, eis que vai acabar em anjos de chama e gelo.
Curta vigília de embriaguez, sagrada! ainda que não seja pela máscara com que nos gratificaste. Nós te confirmamos, método! Não nos esquecemos que ontem glorificaste cada uma de nossas idades. Temos fé no veneno. Sabemos dar a nossa vida inteira todos os dias.
Eis o tempo dos Assassinos.
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Mas o que eu queria falar mesmo era sobre a exposição do Daniel Senise, no Museu de Arte Moderna do Rio. Senise enveredou por uma linha racionalista que me desgosta muito. Acho triste, inclusive, que esta frieza venha sendo valorizada como uma qualidade. Arte não é cálculo. Há alguns trabalhos na exposição que fogem a esta linha e são os mais bonitos, na minha opinião.
26 de junho de 2008
Tempo dos assassinos
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belissimo blog
Ainda adolecente, saboreando meus 16 anos, lí a trilogia (entre pasmo e afoito), mas nao aguentei os Trópicos. Me lembrava Hemmingway após a fama ... deitou na cama. Mas, nao sei bem porqe, HM me lembra T. Williams e suas obras (sub) urbanas, algo como Plínio Marcos ou 1 Nélson Rodrigues (menos brilhante q nosso genial tupiniqim).
Inté,
Murilo
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