7 de julho de 2009

Sarney e a República de Weimar




(Pois é, não resisti. Deixei o trabalho de lado e corri pra cá).

Eis que Sarney se torna o inimigo público número um! Ele é a vítima perfeita, pelas mesmas razões que Renan Calheiros também era uma excelente presa para os ódios midiáticos. Sarney não tem a simpatia da esquerda porque é um político conservador e tradicionalista. E desde que tornou-se um importante suporte do governo Lula, perdeu também a simpatia das direitas. Restou-lhe a tolerância morna, quase indiferença, do centro político da opinião pública.

A campanha midiática contra Sarney, portanto, conseguiu ganhar corpo com imensa facilidade. Por quê?

1) Por que a mídia tem facilidade de fazer campanha contra qualquer um, sobretudo se apoiar Lula. Se o Papa elogiar Lula, no dia seguinte, encontraremos todos os podres dele estampados nos jornais. Obama, que chamou Lula de "o cara", perdeu a graça junto a mídia. A cobertura da política obamista esfriou repentinamente.

2) Sarney pertence a uma das famílias mais enraizadas na política. Tem centenas, talvez milhares, de parentes e contraparentes e sei lá mais quem trabalhando com política. Achar um sobrinho, um apadrinhado, um amigo-do-filho de Sarney trabalhando em alguma das milhões de sinecuras de Brasília é a coisa mais fácil do mundo. Mas pelo menos a filha do Sarney, Roseana, foi pra rua e elegeu-se pelo voto popular, ao contrário da filha de FHC, que, ao ser flagrada trabalhando "em casa" para o senador Heráclito Fortes, reagiu dizendo que "o Senado é uma bagunça". Essa arrogância, de comer no prato onde se refestelou, é de lascar.

*

O que está em jogo, afinal, não é o destino de Sarney, mas a cadeira de presidente do Senado num momento em que a oposição, com apoio obstinado e histérico da mídia, se prepara para iniciar a CPI da Petrobrás. A mídia está louca para trocar Sarney por outro menos comprometido com a governabilidade. Fale-se o que quiser de Sarney, mas ele tem prestado um importante apoio ao presidente Lula.

O Senado é o calcanhar de aquiles do governo Lula. É onde a oposição é mais forte. Por isso, a mídia se ocupa tanto do Senado, porque sabe que é ali que pode surgir um ataque efetivo ao presidente Lula. O Senado pode votar um pedido de impeachment. Pode atrasar indefinidamente a liberação de um orçamento. Pode destruir, através de uma CPI bem orientada, a reputação de uma candidata...

Ao infernizar a vida dos senadores da base aliada, a mídia manda o seu recado: tudo bem, podem apoiar Lula, mas pagarão caro por isso!

A campanha para derrubar Sarney, no entanto, não desgasta somente o Senado. Serve também para mostrar à classe política que ela não pode mais fugir à batalha ideológica travada nos meios de comunicação. Deve partir para o enfrentamento usando as armas que os eleitores deram. As armas são as leis. Se existem legisladores, é porque as leis precisam estar sendo constantemente atualizadas para dar conta de uma realidade dinâmica que muda a cada instante.

A classe política precisa, portanto, votar leis que moralizem a comunicação pública no Brasil. E agora que teremos também um Parlamento do Mercosul, cumpre estabelecer parâmetros legais e democráticos comuns a todo continente americano.

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A situação de Sarney lembrou-me a República de Weimar, o breve governo republicano e democrático que vigiu na Alemanha entre as duas grandes guerras, e que foi derrubado pelo nazismo. A república era atacada duramente pela esquerda e pela direita. O país enfrentava uma severa crise econômica, em consequência da derrota militar em 1918 e agravada pela crise das bolsas em 1929, e os políticos do weimar se tornaram, de repente, símbolo de todos os males que afligiam os alemães. A república de weimar era o sarney germânico. Os sindicatos alemães, muito fortes e organizados, uniram-se à campanha das elites para desmoralizar o governo. Os objetivos eram opostos, naturalmente, mas o adversário era um só. Enfim, conseguiram derrubar a república. E daí nasceu o nazismo.

A lição dessa história é que os sindicatos alemães e a inteligentzia de esquerda incorreram num imperdoável erro estratégico. Ajudaram a desestabilizar um governo sem considerar as consequências para a classe trabalhadora, para o povo alemão em geral, e para o mundo. É sempre confortável unir-se à gritaria moralista e vociferar que os políticos são todos corruptos. Mas e aí? Quid prodest? A quem beneficia a campanha? Remover Sarney da presidência do Senado às vésperas da instalação da CPI da Petrobrás me parece extremamente oportuno para a direita golpista, para essa direita que, agora vemos claramente, ainda acredita em golpes militares.

Link da ilustração.

9 comentarios

infinitoamanajé disse...

"Enfim, conseguiram derrubar a república. E daí nasceu o nazismo."
Esta é uma verdade assustadora nesse momento. NUNCA FOI TÃO NECESSÁRIA NESSE EXATO INSTANTE A UNIÃO DOS POVOS DAS AMÉRICAS E DO MUNDO CONTRA A ESCRAVIZAÇÃO IMPOSTA PELO IMPÉRIO.

Anônimo disse...

Que bom que você resolveu voltar e escrever, como sempre, de forma tão lúcida, madura, equilibrada. Para mim, as melhores reflexões sobre política estão no Óleo. Parabéns e vê se não some.

Marisps disse...

Saudades dos seus textos Miguel!

Anônimo disse...

Miguel, a estratégia do Governo deve ser: mantenha-se Sarney no Senado, com oposição e mídia e tudo, mesmo que o Senado legisle menos. Por estratégia e para aporrinhar com a oposição. Enquanto Sarney serviu ao PSDB, não se viu essa grita. Outro ponto: patético o senador Arthur Virgílio (PSDB), depois de receber ajuda do tal Agaciel, posar de moralista. Ísis

Miguel do Rosário disse...

Minha comparação de Sarney à República de Weimar foi mais feliz do que eu imaginei ser num primeiro momento. O processo inflacionário que seu governo viveu lembra muito problemas similares vividos pela Alemanha no período entre-guerras. E os ataques brutais, à direita e à esquerda, sofridos por Sarney, lembram os ataques da esquerda e da direita alemã à República de Weimar. Daí nasceu Hitler na Alemanha. E Collor no Brasil. Aliás, sobre Collor há muita coisa o que falar, e não é discursinho lacerdista não. Mas fica pra daqui a pouco.

Sandro Stahl disse...

Suas análises são muito verdadeiras, parabens.
O que vem me atormentando é o fato do governo de São Paulo estar fazendo vários empréstimos junto ao banco mundial, alguns para aplicar em áreas de difícil fiscalização, como recuperação de rios e manaciais, e a mídia de massas não falar sobre o assunto, nem uma notinha sequer, depois acontece como sempre aconteceu nos governos do PSDB; Pegam muito dinheiro nas mãos, de privatizações e empréstimos, não fazem nada e não prestam contas do que fizeram com o dinheiro, e ninguem cobra, só querem tornar o país ingovernavel para tirar proveito em 2010.

Vera Pereira disse...

Imperdível o post de hoje do Luís Nassif: O blog da mídia http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2009/07/11/o-blog-da-midia/

Miguel do Rosário disse...

Eu vi, Vera. E sabe que mais: mesmo que o Sarney não renuncie, eles conseguiram um objetivo: enfraquecê-lo, para que ele se torne mais dócil durante a CPI da Petrobrás, derradeira esperança de derrubar Lula.

Anônimo disse...

OS BOIS DO QUÉRCIA TOMARAM DORIL!!!

14/07/2009 - 08h19

Quércia teve gado apreendido pela Polícia Federal em fazenda de Daniel Dantas


FLÁVIO FERREIRA
da Folha de S.Paulo

O ex-governador de São Paulo Orestes Quércia (PMDB) teve um lote de 201 cabeças de gado apreendido em uma fazenda da Agropecuária Santa Bárbara Xingura, ligada ao grupo Opportunity, no interior de São Paulo, durante a Operação Satiagraha, em julho de 2008.

Advogados de Quércia apresentaram à Justiça Federal em São Paulo um pedido de devolução do lote, que foi apreendido com mais 1.143 cabeças que estavam na fazenda da agropecuária em Amparo (SP).

Para a Polícia Federal, a Santa Bárbara Xinguara adquiriu rebanhos por meio de um esquema de lavagem de dinheiro com origem nas Ilhas Cayman. O grupo Opportunity e a Agropecuária Santa Bárbara Xinguara negam as acusação da PF. O presidente da agropecuária é Carlos Rodenburg, ex-cunhado do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity.

Quércia, que cria gado em Pedregulho (SP), disse ontem que no começo de 2008 realizou uma permuta com a agropecuária. O ex-governador afirmou que cedeu à Santa Bárbara Xinguara cerca de mil cabeças de gado nelore PO (puro de origem) --que valem R$ 2 milhões--, e que, em troca, receberia aproximadamente mil vacas inseminadas. O negócio também envolveu o empréstimo de 15 vacas de Quércia para a Santa Bárbara, para a obtenção das matrizes utilizadas nas inseminações.

"Eu fiz negócio com o Carlinhos Rodemburg, ele também tem gado nelore e está sempre nos leilões, eu encontro com ele sempre", afirmou o ex-governador.

Quércia disse que a agropecuária entregou as vacas inseminadas até o dia da apreensão dos animais pela PF. "Tenho direito [ao gado], está atrapalhando as minhas coisas não ter a prenhezes [vacas inseminadas] de volta". A Justiça ainda não decidiu sobre a devolução.

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