12 de outubro de 2007

Fim da novela?

A imprensa respirou aliviada. Renan Calheiros, o ciclope aético, o minotauro da corrupção, pediu licença. Já era tempo, pois alguns parlamentares, entre eles Chico Alencar (Psol), vinham organizando uma campanha Fora Renan. Agora é assim. Esqueçam eleições, esqueçam processos legais, esqueçam provas. Ganha-se no grito. Com ajuda da mídia, é claro. Os bonzinhos, os éticos, os justos da vida pública nacional falam mal do Renan. E aparecem nas páginas dos jornais. Chico Alencar sabe disso e, nos últimos dias, só aparece na mídia para falar mal do Renan. Até na Parada Gay, diz o jornal, ele irá participar com manifestação contra o Renan! Mesmo depois do olho do Ciclope ter sido furado. O show tem que continuar. A imprensa cerca qualquer um que queira ajudar Renan. Uma pesquisa recente disse que 70% dos senadores têm processos no Supremo Tribunal Federal, mas a imprensa escolhe quem receberá os holofotes. O irônico é que a imprensa e o judiciário, as duas instâncias republicanas que não possuem processos democráticos em sua hierarquia interna, parecem se dar um abraço corporativo, auto-elogiando-se continuamente.

Eu queria fazer uma denúncia grave. A seção de cartas dos jornais tornou-se um apêndice editorial. Com o aumento exponencial do envio de cartas aos jornais, devido à facilidade proporcionada pelo email, o processo de seleção de cartas vem sendo manipulado. O jornal tende a publicar as cartas que corroboram a sua própria opinião. Claro que nem sempre isso acontece. De qualquer forma, os jornais deveriam adotar regras de transparência, para que suas páginas interativas refletissem de maneira mais justa o pensamento da sociedade. O resultado final pode até ser pior do que é, mas será mais transparente, mais honesto, incentivando as partes incomodadas a também se manifestarem. Haveria mais confiança da sociedade sobre o valor desses espaços.

Interessante observar a influência da mídia sobre os jovens de 13 a 16 anos da classe média das grandes cidades, estudantes da rede particular, que vem organizando algumas passeatas contra o Renan e pela ética na política. Lembro do famoso ensinamento dos editores do New York Times a seus jornalistas, de escreverem textos visando sempre a compreensão de um adolescente de 13 anos.

Eu penso o seguinte. Se a imprensa americana, na época da guerra no Iraque, conseguiu manipular uma sociedade altamente desenvolvida sobre as motivações para a invasão, o que não conseguirá no Brasil, com seus argumentos éticos? Em 1964, a imprensa brasileira conseguiu levar 100 mil pessoas, em São Paulo, a protestar contra o governo Jango e defender um golpe militar. Porque não conseguiria o mesmo com alguns estudantes de escola particular, irritados com as políticas de cotas nas universidades, que separam vagas para estudantes das escolas públicas? É natural que a sociedade tenha seus conflitos internos. Mas aí temos um conflito de classes disfarçado de luta pela ética. Por que esses estudantes não foram às ruas quando o governo FHC nomeou Renan para Ministro da Justiça? Há tempos que a mídia percebeu que pode fomentar manifestações públicas contra seus desafetos. E não hesita em deslegitimar manifestações contrárias a seus interesses.

Recentemente, FHC deu entrevista a um programa de entrevistas inglês. O jovem repórter, diante das goiabadas éticas do ex-presidente - que havia falado em malaise de setores da classe média, olha só o nível de charlatanismo lacerdista - perguntou porque o procurador-geral de seu governo havia engavetado todos os 600 processos de suspeita de corrupção que havia recebido.

FHC guaguejou e respondeu que a imprensa - sim, ela mesma, a velhinha virgem da sociedade tupi - também não havia encontrado muita coisa. AHAHa! FHC não respondeu. Auto-denunciou-se e a seus amigos, a imprensa. O fato é que somente agora alguns colunistas encontraram sua divina vocação de paladinos da ética no Brasil. Certo que houve o caso dos Anões, o Jader, o Collor, mas desde a chegada do rei Fernando, impôs-se a mordaça. O Jader era adversário de ACM e a imprensa e o governo haviam se se alinhado caninamente a este último.

O Partido da Imprensa Golpista (PIG - roylaties para o PHA) tem candidatos e adversários. Tem poder eleitoral. Alguns candidatos dependem, particularmente, da imprensa para conseguir votos. Outros precisam menos, mas todos dependem, ao menos em parte, de ficar bem na foto.

O licenciamento de Renan é uma vitória do partido da imprensa. A tal pressão insuportável da opinião pública nada mais é que a pressão midiática. O caso Renan foi um teste de forças, um exercício de poder. A sua permanência na presidência do Senado era uma afronta ao poder da imprensa. Tirá-lo dali passou a ser uma questão de honra. Esperemos para ver qual será a próxima vítima.

O interessante neste caso foi que, pela primeira vez em anos, políticos de diversas tendências ideológicas tiveram consciência da arbitrariedade com que a imprensa escolhe seus alvos. A imprensa saiu um tanto desmoralizada das eleições presidenciais, não somente por causa da eleição de Lula, mas também pelo desempenho vigoroso dos partidos progressistas. O PT foi o partido com maior número de votos em 2006, e foi o PFL, cujo presidente, Borháááusssenn, havia predicado um ostracismo de 20 anos para a esquerda, foi o PFL que minguou. Tanto que o Borháááusssen se afastou, envergonhado, da política partidária e o PFL mudou de nome.

Alguns políticos do centro e da direita, como o próprio Renan, viram-se compelidos a aliar-se ao governo Lula, pressionados por seus eleitorados. Neste momento, a máquina midiática se volta contra eles. Sem o apoio da esquerda, por razões ideológicas, e sem o apoio da mídia, Renan Calheiros ficou isolado. Mas Renan surpreendeu. Ele não é um político de centro qualquer. Um de seus irmãos é comunista. Tem amigos poderosos, tanto na esquerda quanto na direita, por razões afetivas, mais que ideológicas. Uma parte importante da elite política nordestina, incluindo caciques do PSDB, tem antiga relação de amizade com Renan. Interessante observar como esses laços afetivos também influenciam a vida política nacional. E não estou convencido de que isso é totalmente negativo. Tem um lado ruim, que é proteger maus amigos, mas tem um lado bom, que é defender amigos acima dos interesses políticos partidários.

Parte importante da classe política (a maioria no senado e no congresso, como se viu), além disso, enxergou no linchamento midiático de Renan um precedente perigoso para a vida pública brasileira. Afinal, todos estariam vulneráveis aos humores de meia-dúzia de nababos da comunicação e seus cães de aluguel.

Entretanto, o fato de que a imprensa precisou de cinco meses de linchamento para fazer Renan se licenciar e de que, após tanto tempo, o máximo que conseguiu foi fomentar passeatas de garotos de 13 anos que estudam em escolas particulares de bairros nobres de BH e Rio, isso mostra que o poder midiático está em declínio. E justamente por estar em declínio, é tão perigoso, tão agressivo, tão sem escrúpulos.

Num daqueles boxs de opinião que se multiplicam como fungo ideológico por suas páginas, o Globo responde ao deputado José Genoíno, que acusou, da tribuna do Congresso, a imprensa de criminalizar o PT. No box, em editorial não assinado (o que acho sempre covardia), o Globo lembra que uma das chapas do PT inclui petistas "mensaleiros". Então é isso. O jornal não tem obrigação com nenhum tipo de coerência. O que seria o mensalão? O governo pagar mesadas (mensalão vem de mensal, portanto, de pagamentos mensais, ou ao menos periódicos) para que parlamentares votassem medidas favoráveis a ele. Ora, o governo petista precisaria pagar mesada a deputados petistas? Não tem lógica. Segundo, não foram pagamentos periódicos. Os parlamentares teriam recebido apenas um depósito, em dinheiro supostamente de caixa 2. O deputado Luizinho recebeu 15 ou 20 mil reais. Isso é mensalão? Ora, vão para a puta-que-os-pariu!

Enquanto isso, o caixa 2 tucano, que conta com muito mais provas de uso de recursos púlicos, que tem documentos, que foi confessado pelo ex-presidente do PSDB, Eduardo Azeredo, que envolve valores muito maiores, que envolve mais deputados, este continua sendo abafado pela mídia. Existem documentos provando caixa 2 em 1998 e em 2002, sendo que, em 2002, os valores são gigantescos. Por que a imprensa não faz gráficos e não publica fotos? Por que não escreve editoriais contra a hipocrisia de parlamentares exigindo a ética que não possuem?

A novela não terminou. Um de seus personagem saiu de cena. Outros assumirão o papel. Mas o que eu gostaria de ver mesmo é que um dos autores desta novela, a imprensa, também se transformasse em personagem. Muita gente boa ou ingênua veria que não é um personagem tão bonzinho como ele (esse narrador-personagem) se auto-retrata. Ao contrário. Em alguns momentos é o principal vilão da história.

(Pintura: Jackson Pollock)

8 comentarios

José Carlos Lima disse...

Quando algum filiado ao PIG(Partido da Impresa Golpista) é pego no flagra por alguma câmera escondida, a mídia usa a vitimilogia para alerdear que o seu correlegionário foi vítima de espionagem.

Foi aconteceu com os senadores goianos Marconi Perillo/PSDB e Demostenes Tores/DEM.

Pegos no flagra nesta semana, eles apareceram durante 24 horas na mídia goiana como vítimas da "espionagem" de Renan Calheiros.

Agora que Renan caiu, eles podem reforçar ainda mais o discurso de vítimas.

É sempre assim. Quando algum deles é pego no flagra, esta imprensa vagabunda alardeia por aí que eles foram vítimas de espionagem e fica por isso mesmo.

E agora que o STF proibiu aos benefeciários do foro previlegiado serem indiciados pela PF, que a coisa ficou feia mesmo.

Juliano Guilherme disse...

É a hora do congresso reagir. Com a autoridade de representantes, eleitos pelo povo, os parlamentares não podem aceitar passivamente ser encurralados pela imprensa e pelo judiciário. Ao contrário do parlamento, essas duas instâncias não passam pela fiscalização da sociedade, como é uma eleição, por exemplo. A imprensa alardeia que age em nome da opinião pública, mas esta é uma coisa abstrata, divusa. E como você disse, a carta dos leitores é facilmente manipulável. Sendo assim, os parlamentares tem muito mais legitimidade para falar em nome da sociedade, pois os votos são algo concreto e mensurável, do que a imprensa que cada vez menos reflete o que pensa os cidadãos, vide a reeleição do Lula.

Anônimo disse...

Muito bom texto, Miguel. Espero que a ditadura dessa mídia venal, nojenta, mesquinha, hipócrita e golpista esteja chegando ao fim.

Anônimo disse...

Triunvirato - PT preside agora a Câmara o Senado e a República
Obrigado, muito obrigado Oposição, valeu sem vocês isto não seria possivel, foi o “pulo do gato”. Pelo visto vai vir chumbo grosso encima da gente, podem vir, nós não somos o Renan, ja aguentamos coisa pior e vencemos. Com Luiz Inácio Lula da Silva, Arlindo Chinaglia (SP) e Tião Viana (AC), vão ter que nos engolir.

Anônimo disse...

fico revoltada com essa imprensa GOLPISTA,mas acho que ela vai dar uma boa provada no seu póprio veneno,ela já deu várias provadas em dose homeopáticas mas não demora vai ser pra valer.Vale o trabalho de vocês blogueiros,vamos continuar nas denuncias.

Juliano Erichsen disse...

Olá. Gostaria de saber se eu poderia republicar alguns artigos seus no meu blog, citando a fonte é claro.

se quiser dar uma olhada antes aí vai o link: http://www.julianoerichsen.blogspot.com

Anônimo disse...

CHANTAGEM FEMININA.

Mais um caso doloso de chantagem feminina, em troca de quantias milionárias.
Heather Mills ex-mulher do cantor e compositor Paul MacCartney, pede ao ex-Beatle, a quantia irrisória de 25 milhões de libras. No caso de não acordo, ela promete revelar detalhes íntimos dos 5 anos de casamento. Para isso, esta ameaçando convocar a imprensa para revelar detalhes, das intimidades de sua relação com o musico.
Alguns meses atrás, caso parecido ocorreu no Brasil, quando a jornalista Mônica MADALENA Veloso, usando da mesma baixaria contra o senador Renan, solicitou a ele, em troca de seu silencio, conforme processo, a misera quantia de alguns milhões de reais, como se dinheiro nascesse em arvore. Em ambos os casos, estamos diante de um jogo sujo, vergonhoso e imoral.
Está mais do que comprovado que esse tipo de crime é sem sombra de duvida, um prato cheio para enriquecimento ilícito, isto é, 171 e outras desqualificações existentes no código penal.
Essas espécies de mulheres, se pode ser chamada de mulher, deveriam estar no fundo de uma prisão, sem qualquer compaixão.
Por outro lado, a mulher de verdade, não precisa descer as profundezas do submundo, para conseguir o seu sustento e muito menos para a sua família, basta trabalhar e lutar, para ser alguém na vida, como a maioria faz.
O que me deixa, mais indignado ainda, é a mídia brasileira e principalmente o PIGT (Partido da Imprensa Golpista e Terrorista), defendo e acobertando, por interesse próprio, as mulheres que vivem de chantagem financeira e ainda por cima de promover, diariamente, a divulgação dessa ação criminosa, desrespeitando diretamente a mulher herói, a mulher “Mulher”, a mulher batalhadora e briguenta, no bom sentido da palavra.
O PIGT esta colaborando consciente na extinção definitiva, da moral das mulheres, com conseqüências nocivas e nada faz para mudar a situação.
A digníssima Senhora, a brasileira é claro, como não conseguiu ir a diante com o seu plano funesto, vendeu o seu corpo para uma revista masculina, pelo menos é menos indigno.
Como não existe mulher feia, com certeza, não foram esses os motivos para usufruir a grana alheia e sim tremenda safadeza, misturada com total falta de vergonha na cara.

Anna Paula disse...

Acho que nao há santos nessa história, assim que, por mais que se possa acusar a imprensa de nao cumprir com seu dever de transparência e imparcialidade, dizer que outro roubou TAMBÉM e talvez mais, no meu entendimento, nao exime a pessoa de arcar com as conseqúências do próprio roubo.
Se pudesse provar sua inocência, provavelmente Renan Calheiros teria podido se sair muito bem dessa situaçao, sem precisar de toda a novela que envolveu votaçoes secretas e um circo tremendo.
Que a sociedade está precisando defender melhor seus valores e que nao dá para aceitar como ovelhinha tudo o que a imprensa diz ok, agora a partir do momento que o argumento passa a ser "o outro também fez", pra mim é assumir culpa.

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