3 de fevereiro de 2006

Governo Lula faz inflexão política


De uma hora pra outra, o terrível blogueiro Ricardo Noblat virou cronista de tragédia marítima. Fenônemo inexplicável, visto que o assunto não rende comentários nem desperta interesses para o público brasileiro. Mais inexplicável ainda se considerarmos que o post dele sobre a lista do Dimas trouxe imediatamente mais de duzentos comentários, sendo este, portanto, o assunto mais premente do momento. Ué? O blog dele não era um blog político?

O jornal Globo de hoje, sexta-feira, não traz sequer uma linha sobre o assunto.

Bem, mas eu não estou aqui para falar da tal lista profana. Ela pode ser falsa e, de qualquer forma, o governo Lula não precisa desta lista para se reerguer. A popularidade de Lula já vinha crescendo vigorosamente antes mesmo dela aparecer. A crise também já vinha minguando. Por isso, acho leviandade grossa as insinuações maliciosas da oposição e da mídia de que a lista seria uma produção do governo para abafar a crise.

Por mim, acho a lista perfeitamente verossímel. Além disso, ela foi atestada pelo indefectível Roberto Jefferson. Quando o mesmo falou sobre o mensalão, todos acreditaram, mesmo ele afirmando que não possuía um documento, uma prova. Pois bem, agora o Jefferson afirma que recebeu os R$ 75 mil de Dimas, sugerindo a veracidade da lista. Agora há provas, e a mídia, e os colunistas e os âncoras da TV não falam nada? Jabor! Ei, Jabor! Cadê você e sua cara vermelha, raiventa, babando veneno pelos cantos da boca?

Como ia dizendo, o governo Lula não precisa da lista. A inflexão política de Lula começa em 2006 com o surgimento de novas lideranças petistas, mais duras e mais afinadas com o Planalto. Começa com a eleição de Aldo Rebelo para a presidência da Câmara, decerto o parlamentar mais brilhante e preparado a presidir a Casa, sem falar no poderoso simbolismo de ser o primeiro comunista a ocupar cargo tão importante no país...

A inflexão política de Lula vem em 2006 com o forte aumento no salário mínimo, a ser pago com um mês de antecedência, representando uma das maiores vitórias da classe trabalhadora e das centrais sindicais dos últimos 50 anos.

O preço da carne, do frango, dos alimentos e da cesta básica vem caindo vertiginosamente nos últimos anos, ao mesmo tempo em que a agricultura se mantém pujante e saudável, apesar da queda na renda provocada pelo dólar.

Os recursos da Caixa Econômica Federal a serem aplicados na habitação este ano, 11 bilhões de reais, são os maiores dos últimos vinte anos, e junto com o setor privado, envolvido no pacote federal, totalizarão mais de 17 bilhões de reais.

A criação da CPI da Privatização, que investigará a corrupção no governo tucano, também foi um ato de grande importância na luta política brasileira. Existem toneladas de documentos e gravações comprovando que houve corrupção, desvios, incompetência, má fé e, por que não dizer, atos de lesa-pátria, no processo de privatização do setor público promovido pelos administradores tucano-pefelistas.

A desembargadora que reabriu o processo contra a privatização da Vale do Rio Doce observou que imensas jazidas de minérios valiosíssimos não foram sequer incluídas no relatório da Merril Lynch que avaliou o preço da mineradora brasileira.

Eu lembro muito bem como foi a privatização da Vale do Rio Doce. Aquilo me marcou muito. A assinatura da privatização foi feita no Bolsa do Rio, na Praça XV. O governo montou uma praça de guerra, para evitar as manifestações de milhares de pessoas contra a privatização. Houve confronto com a polícia. Foi uma das raras vezes que participei de um ato público. Acho que foi a partir daquele momento que resolvi me informar mais sobre política. Senti que, se não fizéssemos alguma coisa, os párias da nação iriam destruir nosso país, como de fato quase o fizeram.

Participei da luta contra o governo FHC da forma mais democrática possível. Escrevia artigos, publicava jornais e desenvolvia argumentações para convencer as pessoas a não votarem nele novamente. Não gostava, porém, das táticas da ultra-esquerda, de "Fora FHC Fora FMI". Achava de uma falta de criatividade brutal e sem apelo. Continuo achando, sendo que a falta de originalidade se tornou agora um caso patológico, visto que em sua última manifestação nacional a ultra-esquerda pregou o Fora Todos. Como se devêssemos retornar a monarquia: não sei bem se regida pelo José Maria do PSTU ou pela Heloísa Helena.

Quando Lula se lançou candidato, não tive nenhum pudor de ser tendencioso e o apoiei desde o início, assim como o faço até hoje. O primeiro ano, 2003, foi difícil para Lula e me esforcei para fazer os intelectuais enxergarem a necessidade de darem pelo menos 2 anos de prazo para o novo governo botar ordem na casa.

Aconteceu, enfim, que Lula se mostrasse um bom presidente, que erra mas sabe voltar atrás. Com pouca instrução mas muito experiente politicamente, muito viajado e muito respeitoso do saber alheio - à diferença dos intelectuais de outrora, como FHC, que não escutava ninguém e quase quebrou o país em 1999, com a desvalorização cambial.

A crise política despertou velhos preconceitos, sobretudo entre a classe média, que é o grande público alvo dos jornalões. Agora, contudo, setores importantes da classe média, que estavam silenciosos e perplexos diante da crise, estão surgindo. O blog do Noblat, que tinha virado um impressionante captador de raivosos anti-petistas, agora está repleto de comentários irados contra a oposição tucana e a favor de Lula. O Observatório da Imprensa tem sido literalmente tragado por uma avalanche de mensagens pró-Lula e contra a postura editorial dos principais grupos midiáticos.

De fato, a História não morreu. Está viva, a velha safada, prestando atenção nas fofocas e dando seus murros na mesa de vez em quando...

Comente!