3 de maio de 2006

O gás é dos trabalhadores

A decisão de Evo Morales, recém-eleito presidente da Bolívia, de nacionalizar o gás e o petróleo em território boliviano tem que ser compreendida como um marco histórico na história recente do país, que poderá ajudar em seu processo de industrialização e desenvolvimento social. Também é um gesto de afirmação soberana que vai melhorar muito a auto-estima dos bolivianos.

Desta vez, porém, o Brasil parece sair perdendo, porque a Petrobrás tem ativos no país. Políticos e, principalmente, setores da imprensa, exigiram reação truculenta do governo brasileiro.

Trata-se de uma medida naturalmente polêmica, ainda a ser digerida e devidamente entendida por todos, mas desde já é bom rechaçar a tentativa de setores reacionários da sociedade brasileira, entre os quais incluo a Globo, de usar o fato para produzir atrito entre duas nações que estão imersas na mesma busca pela maior união da América do Sul.

Autoridades dos dois países já garantiram que o fornecimento de gás não será interrompido e qualquer eventual aumento de preço será gradual e racional. De qualquer forma, a Petrobrás está atuando no sentido de aumentar a produção de gás na bacia de Campos.

A "inteligentzia" reacionária nacional, da qual Arnaldo Jabor é um dos representantes preferidos, está usando o fato para atacar o governo Lula e todo o Mercosul.

Como sempre, falta visão. Falta franqueza e bom senso. É interessante para o Brasil que a Bolívia se desenvolva. Após o fim da II Guerra, os EUA iniciaram o plano Marshall, emprestando a fundo perdido bilhões de dólares para a Europa se reconstruir. Os EUA entendiam que precisavam de uma Europa forte e rica como mercado comprador para seus produtos.

É assim que compreendo a necessidade do Brasil ajudar seus parceiros latinos. Enquanto Jabor usou seu espaço na Globo para rogar praga para os bolivianos, prevendo mais pobreza e mais catástrofe, eu quero afirmar aqui que acredito no povo boliviano e, dentro das minhas possibilidade, estou disposto a ajudá-lo. É um país vizinho e espero haver um dia que os bolivianos venham ao Brasil como turistas e não como mão-de-obra barata.

Olhando-se do lado estritamente financeiro, uma Bolívia mais desenvolvida irá trazer benefícios enormes ao Brasil, porque será um grande mercado comprador de produtos brasileiros.

Do lado humano, político e cultural, uma Bolívia com mais auto-estima também será de grande valia para o Brasil, porque poderá contribuir com mais filmes, mais livros, mais músicas e produção científica.

Esse súbito nacionalismo de setores reacionários do Brasil é ridículo, hipócrita, oportunista. O interesse dos trabalhadores é o mesmo em todo mundo, não importa a cor de sua bandeira: justiça social. O que é bom para trabalhadores da Bolívia será bom para os trabalhadores do Brasil.

Viva a Bolívia, viva o Brasil!

10 comentarios

Anônimo disse...

Entendo que devemos ajudar nosso vizinho em seu crescimento econômico. Mas é difícil engolir que a partir da nacionalização das indústrias nesse país, bilhões de reais de investimentos da Petrobrás serão esquecidos... a quem vão cobrar o retorno desse investimento? Porque aqui não temos a quem nos ajudar, a não ser por juros exorbitantes.

Anônimo disse...

O pressuposto de seu post é o de que, sim, o Brasil explorava a Bolívia, impedindo seu desenvolvimento econômico. E mais, que Lula está certo em reconhecer, tacitamente, essa situação de injustiça e compreender as razões bolivianas para expropriar os bens e direitos da Petrobrás na Bolívia.
Se isso é verdade, Lula foi covarde e traiçoeiro, pois deveria ter se antecipado ao próprio Morales e, como controlador da Petrobrás, denunciar o contrato e pôr fim à exploração.

Anônimo disse...

Concordo plenamente com você. Brasil e Bolívia são nações irmãs e é interesse do Brasil o desenvolvimento do vizinho. Lula, mais uma vez, acerta na mosca e se mostra como grande estadista, não cedendo à direita que quer retaliações, reconhecendo o direito da Bolívia e, ao mesmo tempo, negociando uma solução melhor para o Brasil.

Luiz Carlos FS Marques disse...

Respeito sua posição e coloco a minha...
Se você mora em um imóvel que tenha muitas dependências aceitaria de bom grado em dividir com "sem-tetos"?
Concordo que um país como a Bolívia tome iniciativas para melhorar a qualidade de vida dos seus habitantes, mas não de forma unilateral, sem respeitar os contratos em vigor.
Pelo menos negociar alterações, e com um forte argumento que tem, afinal uma Bolívia produtiva é bom para todos.

Miguel do Rosário disse...

Acho que é interessante para o Brasil, economicamente falando, que a Bolívia se desenvolva. Contratos podem ser quebrados se forem injustos. Os EUA não quebraram contratos ao invadir o Iraque? O Brasil não rompeu contratos ao declarar-se independente de Portugal? Acho que a Petrobrás e o governo devem brigar pela manutenção do preço de contrato. Trata-se de uma briga comercial.

Miguel do Rosário disse...

acho que a atitude do Morales foi certa, embora talvez ele pudesse ter escolhido um caminho mais negociado. acho que essa medida vai permitir aos bolivianos ganharem responsabilidade e desenvolverem um corpo técnico e patriota capaz de gerir as próprias riquezas.

Miguel do Rosário disse...

lcmarques, desculpa mas não acho que o seu argumento se ajusta aqui. Eu não aceitaria de bom grado ninguém estranho na minha casa. Agora, se eu fosse proprietário de 5 mil apartamentos, também não estranharia que houvesse, eventualmente, uma invasão de um deles. O certo seria que eu apoiasse iniciativas sociais para manter, ao menos, "uma boa imagem" perante a sociedade. Ou então, venderia tudo e ia curtir a vida nas praias do Maranhão... Sei, talvez seja por pensar assim que gente como eu nunca vai acumular 5 mil apartamentos... Agora, voltando para a Bolívia. O governo anterior errou ao deixar o Brasil dependente de uma fonte só. E o atual errou também ao não prever esse tipo de problema. O negócio agora é levar os bolivianos no "bico". Não podemos engrossar muito porque não queremos crise. Não queremos desabastecimento de gás, que não é o gás de cozinha, entenda-se bem, como o bobão do Fernando Rodrigues noticiou (será que já se desculpou?). Ao mesmo tempo, acho necessario ser duro na defesa de preços equilibrados.

Magui disse...

Eu tenho a mesma visao.Vc escreveu muito bem . Eu acho que tudo sera resolvido. So nao concordo do lula estar mentindo para o povo quando na cabeca dele esta tudo resolvido, tudo combinado com o Evo e permitir que o Chaves se meta no que nao e da conta dele.Pelo menos diretamente.
http://somaguizip.net

Anônimo disse...

Tenho uma visão que esse fato servirá, para um e para outro, de plataforma política.
Até julho, quando se elege o congresso boliviano, Morales trombeteia a auto-determinação e ("o petróleo é nosso" - jargão já usado aqui) e, depois disso e até outubro, nosso presidente "conquistará" ganhos na negociação com o país vizinho e sairá da pendenga como grande estadista e negociador, catapultando votos para sua reeleição. É um jogo. Abraço

Anônimo disse...

OLá, Miguel. Concordo com tudo o que você escreveu. Como trabalho com comércio exterior, estive naquele e em outros países sul-americanos (em suas principais cidades) dezenas de vezes e posso atestar que, de todas as nações latino-americanas que conheço, a Bolívia é a mais pobre e desigual de todas. Seu gás natural tem permitido ao Brasil pagar pelo produto um dos preços mais baratos do planeta, se não o mais barato. É um absurdo. O Brasil não precisa de esmolas da Bolívia nem deve explorar o país vizinho. Quando se fala em obter um preço vantajoso numa negociação, negociantes sérios não buscam expoliar aquele com quem negociam e sim obter vantagens lícitas e duradouras. Não se pode imaginar que a Bolívia continuaria nos vendendo gás por 1/5 do que vale. Abraço, Eduardo Guimarães

Postar um comentário