10 de maio de 2008

A maconha estragada de Merval Pereira

Em sua coluna de hoje no Globo, Merval Pereira volta a seu jogo preferido. Manipulações chinfrins, ilações forçadas, acusações veladas. "Enfim, o dossiê", diz Merval, como se tratasse de assunto de grande novidade. O texto torce e retorce notícias requentadas para colocar Dilma e governo dentro de uma moldura com a legenda: criminosos.

Imprensa e oposição apostaram alto demais no dossiê. Quer dizer, primeiro apostaram no escândalo dos cartões corporativos. O negócio respingou no governo Serra, cujos gastos com cartão revelaram-se superiores ao do governo federal, e na gestão FHC, que também gastou mais, através das contas tipo B, que não prevêem transparência e são mais difíceis de serem investigadas. Por fim, grande parte das denúncias de mau uso dos cartões revelou-se leviana ou vazia. Conforme declarou Jorge Hage, chefe do CGU, Controladoria Geral da União, houve uma espetacularização do nada.

Aliás, é com orgulho que lembro da minha defesa da mesa de sinuca, comprada com cartão corporativo. Foi um caso ao qual me dediquei com especial paixão. Gosto muito de sinuca e revoltou-me assistir a criminalização lacerdista de um objeto tão inocente. O Globo estampou a foto da mesa na capa, e um manchetão na página 3: "Até mesa de sinuca".

Pois bem, eu defendi arduamente a mesa de sinuca. E não é que, após a investigação da CGU, descobriu-se que a mesa era propriedade da União, usada por funcionários e seguranças do Ministério da Comunicação em suas horas de lazer, e o seu conserto fora, portanto, totalmente conforme as leis? Não houve crime algum. No entanto, funcionários, instituições e a própria sinuca foram caluniados por um dos jornais de maior circulação e prestígio no país. Não se pediu desculpas e só fiquei sabendo do resultado da investigação sobre a sinuca pela internet, não pelo mesmo jornal que havia (injuriosmente) denunciado o caso.

Voltando ao Merval, ele constrói uma verdadeira ficção policialesca para falar de Dilma e o dossiê. Leiam esse trecho:



"Mas e se a Dilma estiver mesmo mentindo desde o início e o dossiê foi confeccionado a mando dela, para contra-atacar a oposição, que denunciava o uso abusivo de cartões corporativos pelo governo Lula e havia conseguido a demissão de uma ministra?

Essa possibilidade foi deixada em aberto pela própria ministra, segundo relato de Elio Gaspari, não desmentido: ´Quem ouviu a ministra Dilma Rousseff no jantar do Iedi de 20 de fevereiro, numa sala reservada do restaurante DOM, em São Paulo, não teve a menor dúvida: ela informou que o governo estava coletando dados para incriminar o governo de FFHH na farra dos cartões corporativos. Como já se passou mais de um mês, não é possível assegurar qual foi a palavra exata da comissária. (...) O tom era policial. "



Merval agride a inteligência dos leitores porque omite pontos essenciais: 1) Não era preciso lembrar de reunião em restaurante para saber que Dilma estaria reunindo informações sobre o governo FHC. A ministra repetiu, em diversas ocasiões, para todo mundo ouvir, que a coleta de dados faz parte do trabalho de sua secretaria. A CPI dos Cartões aprovou a investigação dos cartões desde 1998, portanto era necessário que a Casa Civil procedesse a reunião do material. 2) Não é crime coletar material de FHC ou de qualquer governo. Dilma está no poder e pode reunir material de quem quiser. Foi nomeada pelo presidente da República e tem autoridade, autonomia e o direito legítimo e democrático para executar a pesquisa que lhe der na telha. 3) Os dados de FHC, no fim das contas, nem sigilosos são, porque ele não é mais presidente e o sigilo vale mesmo para o cargo, não para a pessoa. 4) Mesmo entendendo que os dados fossem sigilosos, os membros da CPI teriam acesso aos mesmos, o que desmonta a tese de chantagem.

Por fim, Merval defende o senador Alvaro Dias de forma canina, no caso do vazamento das informações para imprensa, no qual ele está envolvido até o pescoço. A Polícia Federal descobriu que José Aparecido, funcionário da Casa Civil, vazou o dossiê para o assessor de Dias. Merval não faz, todavia, a ilação mais lógica: Aparecido teria sido subornado pelo senador? Pereira aventa hipóteses sobre as mil e uma motivações de Aparecido para vazar o dossiê, mas não fala do mais simples: a milenar e tradicional venalidade humana, que pode ter concorrido para convencer Aparecido a executar um vazamento que traria, como trouxe, graves danos à sua chefe, Dilma Rousseff.

Francamente, eu não dou mais bola para o que Merval escreve. Eu rebato apenas para participar, à minha maneira, da luta política no país. Mas é sempre a mesma ladainha, já tá cansando.

*

Estou abismado com Fernando Gabeira. Pensava que, candidatando-se a prefeito, seria obrigado a despir-se do lacerdismo tardio que, embora lhe renda tanto sucesso na mídia, gera antipatia crescente (portanto, perda de votos) na esquerda. Ledo engano. Gabeira tascou uma crítica virulenta à Comissão de Anistia, por causa das pensões e indenizações às vítimas da ditadura. O que não ele contava é que a Comissão decidisse, coincidentemente ou não, divulgar que tinha iniciado o julgamento sobre o seu próprio pedido. Ou seja, Gabeira, em 2003, entrou com requerimento junto a Comissão de Anistia pedindo indenização ao Estado.

Qual a reação do deputado? Fúria, destempero. Diante do flagrante de hipocrisia, voltou a atacar violentamente a Comissão, acusando-a de fazer "política" por ter começado a analisar o seu caso somente agora, depois que ele tinha criticado. Tentou se explicar, dizendo que, em 2003, teria receio quanto a seu futuro, e por isso fez o pedido. Hum? Isso é explicação? Então, isso justificaria o pedido dos outros, não?

Que é isso companheiro? Que falta de educação é esta? Quer dizer que, depois de 20 anos de ditadura militar, cujos ecos ainda estão por aí, você elege a Comissão de Anistia como sua inimiga número 1? Depois de sequestrar embaixador e o escambal, você agora virou um lacerdista meia-boca, esverdeado, detentor de ideais anfíbios, refém de um eleitorado esquizóide, que se divide em maconheiros ingênuos e idosos ranhetas do Leblon?

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Por falar em maconha, minha opinião sobre o assunto é a seguinte. Tem que liberar totalmente: consumo, produção e distribuição. Os americanos que se danem, porque são uns hipócritas. É o povo que mais fuma maconha no mundo, botam maconha em tudo que é filme, e depois patrocinam campanhas internacionais contra a produção nos países que a podem cultivar. O Brasil poderia agregar alguns bilhões a mais a sua balança comercial, beneficiando principalmente o sofrido Nordeste, se a cannabis fosse legalizada. Não adianta liberar o consumo e proibir a produção. Isso é ridículo. Se pode consumir, tem que poder produzir. É lógico.

Quem viaja bastante, pelo Brasil e pelo mundo, sabe que o uso da maconha está em toda parte e em todas as classes sociais. Houve uma explosão a partir da década de 60. Segundo institutos de pesquisa, quase dois terços dos estudantes universitários americanos já experimentaram maconha. É uma taxa quase igual à do álcool e, em face das bilionárias campanhas anti-drogas patrocinadas pelo governo americano, mostra que é preciso repensar imediatamente sobre sua eficácia. Esses bilhões de dólares não seriam melhor aplicados de outra forma?

Isso não significa que eu defenda o uso da maconha. Não aconselho ninguém a beber cachaça e faço o mesmo com a maconha. Por que vicia sim, psicologica e culturalmente. A destruição provocada pela maconha é bem mais sutil e lenta que a provocada pela cocaína, mas pode ser tão ou mais nociva, a depender, naturalmente, da quantidade, intensidade e da relação que a pessoa mantém com a droga.

O Obama já fumou, FHC já fumou, Bill Clinton fumou. O Mick Jagger, quando veio ao Rio, nos 70's, fumou num restaurante cinco estrelas, apavorando os clientes. Glauber Rocha acendeu um baseado numa reunião entre chefes de Estado no Chile. Gilberto Gil, nem se fala. Raulzito, Vinicius de Morais, Bezerra da Silva, Chico Buarque, a galeria dos maconheiros ilustres é interminável. Outro dia foram cair na besteira de perguntar aos ministros britânicos se já tinham fumado e, batata, todos confessaram. Enfim, deixo aqui registrado um protesto contra a ridícula proibição da marcha da maconha no Rio de Janeiro e declaro, solenemente, que o Óleo do Diabo defende a sua incondicional e total legalização.

2 comentarios

Anônimo disse...

Miguel.Tudo que a nossa Mãe Natureza nos presenteou não são "drogas", são dádivas divinas.Então, quem é a droga?A resposta é única: É o homem.Quem transforma tudo em "droga":É sempre o homem.Todos os elementos criados pela Natureza quando usados inapropriadamente transformam-se irremediavelmente em "droga".Senão vejamos:Em cada três crianças que morrem todo o dia, uma morre pela água,com diarréia infecciosa.A água é transformada em "droga".O automóvel que mata e mutila 500.000pessoas nas estradas brasileiras,por ano,não é considrado "droga".O Alexandre Garcia diz repetidas vezes que são 800.000 pessoas. Por que dá lucros astronômicos ao grande capital, não são considerados "droga" como tal.O governo do Reagan quando criou o "Guerra nas Estrelas", também procurou divulgar perversamente que o terrorismo e a droga teriam que ser combatidas em todo o Mundo,utilizando-se do poder da Mídia(Meios de Enganação de Massa) pra divulgar à exaustão e diariamente esta ideologia da existência da "droga"e que tem que ser reprimida em qualquer ponto da Terra.Pobre Brasil que é povoado por imbecis que acreditam nesta mentira,mas que atende aos objetivos da Potência Hegemônica Mundial.O nosso grande dramaturgo Nelson Rodrigues sempre diz: "Se os fatos provam tudo isso, pior para os fatos".

José Carlos Lima disse...

Merval começa seu texto de forma espetaculosa com a frase "Mas e se a Dilma estiver mesmo mentindo desde o início..."

Como se vê, Merval endossa as palavras ditas por José Agripino Maia, ao fazer uma associação entre a mentira e a ditadura, da qual Dilma foi vítima, Ditadura da qual Agripino Maia foi capanga.

Como se vê, os meios de comunicação querem porque querem fazer-nos crer que José Agripino Maia estava certo.

Uma lástima nossa imprensa.

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