24 de maio de 2007

Os hipocritas subiram no telhado

Os mesmos que, há pouco, bradavam contra a chaga corrupção; os mesmos que, há dias, elogiavam a ação da Polícia Federal como uma das maiores derrotas inflingidas às históricas organizações criminosas do país, agora vêm a público repercurtir a estranhíssima queixa de certos setores nacionais contra os métodos da mesma PF para desbaratar as ditas quadrilhas.

Vejam a contradição. A PF conseguiu desbaratar as quadrilhas, que agiam há décadas, desviando bilhões dos cofres públicos, e com isso (as quadrilhas) sendo co-responsáveis pela miséria e sub-desenvolvimento da nação. E a mídia golpista agora vem lançar sombras sobre os métodos bem-sucedidos, acusando-os de lembrarem a ditadura militar, deslavada mentira. Na época da ditadura, não se prendiam corruptos. Prendiam políticos, ou subversivos, segundo o jargão do tempo. As ordens de prisão partiam diretamente do Executivo. Hoje, os métodos são aprovados pelo Judiciário. Ou seja, o Estado de Direito está preservado. Muito curioso que a mídia repercuta, acriticamente, o protesto de advogados contra a invasão de escritórios jurídicos suspeitos de corrupção. Quando a Polícia de São Paulo, por exemplo, sem nenhuma autorização judiciária, matou mais de 600 pessoas durante a guerra entre o Estado e o PCC, os mesmos advogados e a mesma mídia não acusaram nenhuma semelhança com a ditadura militar, nem repercutiram com a mesma intensidade as queixas das organizações de direitos humanos, nacionais e internacionais, contra a matança de inocentes, a maioria negros e pobres, da periferia paulista.

Vale lembrar que, recentemente, a Anistia Internacional, denunciou setores radicais da imprensa brasileira, de patrocinarem um clima de violência por parte do poder público, para dar solução a problemas de insegurança cujas causas e origens remontam há décadas de omissão e descaso. É a velha história. Acusam-se as organizações de direito humanos e a esquerda de querer proteger criminosos, quando o que ocorre é que segmentos importantes da sociedade acreditam, muito lucidamente, que a matança de inocentes, com o pretexto de combater o crime, não apenas não dá resultado, como provoca, por parte das populações que sofrem o assédio deste discricionário poder policial, uma revolta contra a própria autoridade constituída, conduzindo a um aumento da criminalidade. É interessante que a Anistia Internacional denunciou especificamente “setores radicais” da grande imprensa brasileira. Com isso, estaria citando exatamente jornalistas como Noblat, Reinaldo Azevedo, e a linha editorial de jornais como Globo, Folha e Estadão.

O cinismo com que a mídia, no momento, está digerindo e vomitando as notícias sobre a operação Navalha, da Polícia Federal, é algo a ser ensinado aos filhos, a ser alertado aos alunos pelos professores, a ser denunciado continuamente pela blogosfera. A tentativa de confundir o público é algo inacreditável. O governo deflagra uma das maiores operações de combate à corrupção da história do país, prendendo gente graúda que nunca antes fora sequer tocada, atingindo ministros, juízes, altos funcionários estatais e mega-empresários, e a mídia, que até há pouco se pretendia o farol da moralidade, agora não apenas se nega a louvar e apoiar publicamente as ações, como inicia uma estratégia de contra-informação incrivelmente maquiavélica, procurando associar, sempre que possível, o governo à corrupção que ele combate.

A verdade é que a corrupção, definitivamente, não é um mal brasileiro, mas uma chaga antiga das sociedades organizadas. Está associada, especialmente, às organizações estatais. Sêneca, um dos maiores escritores latinos da Antiguidade, ensinava, em Cartas a Lucílio, que a corrupção não era um mal contemporâneo, lembrando que mesmo no tempo em que os maiores moralistas latinos, como Catão, vociferavam contra este mal das tribunas de Roma, a então república sofria com escandalosos processos que envolviam juízes, senadores e grandes empresários.

De vez em quando, leio meus inimigos. Eles me divertem e, irritando-me, inspiram-me. Estou acompanhando, por exemplo, as ações dos estudantes uspianos contra os decretos do Serra e a repercussão na mídia. Reinaldo Azevedo tem se revelado um dos mais furiosos adversários dos estudantes. Por mim, estou do lado deles. Acho muito bonito esse renascimento do movimento estudantil universitário paulista. Bonito e importante para a democracia brasileira. Eles mostraram que existem, que têm opinião, que precisam ser ouvidos. Conquistaram os sindicatos de professores e funcionários, que agora se alinham decididamente a seu lado. Azevedo destila preconceito indescritível. Atacando um professor que escrevera um artigo sobre a situação, diz que o sujeito é diretor de um sindicato, e só se consegue sê-lo “sendo petista”. Ou seja, Azevedo nem sabe se o sujeito é petista, o que não teria nada demais, visto que o Partido dos Trabalhadores é um partido legalmente constituído, o maior partido do Congresso Brasileiro (portanto legimitado democraticamente por dezenas de milhões de eleitores), além de ser o partido do presidente da República, eleito com mais de 60 milhões de votos, mesmo assim ele ataca o sujeito dizendo que, para alçar uma posição num sindicato, ele necessariamente precisa ser petista. Azevedo e outros como ele, quer um capitalismo metafísico, existente apenas na cabeça lunática deles, sem sindicatos, sem protestos de trabalhadores, sem organizações que defendam os interesses dos trabalhadores. Esse tipo de gente adora falar mal do Brasil, acusando indigência na intelecutalidade brasileira, sobretudo na esquerda, mas são eles que constituem uma direita primitiva, pré-revolução industrial, que se recusa a compreender que um capitalismo sadio pressupõe trabalhadores que ganham bem, formando assim uma massa de consumidores que impulsiona o desenvolvimento economico. Recusa-se também a ver que, nos países desenvolvidos o Estado tem vastos programas sociais, e que estes programas, ao evitar a indigência, evitam a proliferação da criminalidade e ajudam a injetar capital na economia.

Mas o que eu queria falar era sobre a citação que Azevedo faz de Pasolini. O grande cineasta italiano escreveu uma vez (ele era colunista do Corriere de la Sera, os jornais europeus davam espaço para a pluralidade) um artigo muito polêmico e muito bonito, em que defendia os policiais que combatiam as manifestações estudantis. Azevedo cita este artigo, para atacar os estudantes e defender os policiais que estão sendo enviado para desalojá-los. Mas o descontextualiza e o distorce totalmente de seu objetivo. Pasolini não defendia a repressão violenta. Nunca o fez. Ele dizia o óbvio. Pasolini procurava evitar que os estudantes e a esquerda direcionassem seu ódio para o alvo errado. Erro que poderia gerar mais violência e, eventualmente, morte de inocentes, nos dois lados. E o fez num caso específico, em que o governo mandou policiais reprimirem as manifestações estudantis do final dos anos 60. Os culpados não eram os policiais, dizia Pasolini, mas seus chefes, as autoridades que obrigavam os policiais a combaterem jovens idealistas e bem intencionados, embora não necessariamente certos na forma como agiam e pensavam.

Absolutamente ridículo Azevedo citar Pasolini, um socialista fervoroso, um homem orgulhoso de ser esquerda e defender os princípios mais fundamentais da esquerda européia, sempre se posicionando ao lado dos trabalhadores e contra a frieza e crueldade da economia de mercado, sempre criticando a burguesia e os meios de comunicação de massa. Absolutamente ridículo, enfim, Azevedo citar Pasolini para atacar os estudantes paulistas. Pasolini estaria ao lado dos estudantes. Estaria contra o governo Serra, certamente. Obviamente, seria um adversário poderoso de gente como Azevedo, proto-fascista travestido de defensor de economia de mercado; falso adepto da democracia, visto que não respeita os códigos éticos que a democracia supõe, pelo menos entre jornalistas com espaço na grande imprensa, entre eles o respeito aos partidos constituídos e um mínimo de imparcialidade no julgamento dos fatos políticos; e inominável hipócrita, mais um dos que gritavam pela ética e agora, que os fundamentos da grande e histórica corrupção começam a tremer diante da ação da PF, preferem omitir o seu apoio ou participar da trama que visa confundir o público quanto ao significado político e histórico da Operação Navalha.

Muitos se perguntam as razões que levam os donos e os representantes da grande imprensa a adotar tal atitude. Desespero, preconceito e fanatismo ideológico são as respostas. Com isso, rodeam-se de imbecis, ingênuos e mau intencionados, que se deixam levar facilmente por suas artimanhas. Com isso, portanto, caminham rapidamente na direção do abismo. Com prazer, eu os ajudaria, dando um empurrãozinho, fazendo-os cair no vazio, na lixeira negra da história.

3 comentarios

Anônimo disse...

boa miguel. nota dez pra voce.

Anônimo disse...

Miguel, Reinaldo Azevedo não é para ser citado por jornalista sérios., Trata-se de um preconceituoso, a serviço da elite e da direita.
Do meu ponto vista, acho que ele, é mais um publicitário do que jornalista.
È um vergonha para os colegas.

Anônimo disse...

Miguel,

Ao frequentar certos blogs portugueses, encontrei comentários de brasileiros com palavras extremamente agressivas contra o Brasil e seu povo. E o que é mais asqueroso ainda é o modo subserviente desses traidores ao concordarem com as críticas e as piadinhas de mau gôsto dos portugueses em relação a nós. A impressão que ficava é a de que os portugueses estavam adorando a deixa que os falsos-moralistas ofereciam.

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