28 de julho de 2005

Comentário no Fórum da Novae

Prezados, reproduzo aqui o meu último comentário no Fórum da Novae, referente ao artigo de Luciano Martins, publicado nessa revista.


Excelente o artigo de Luciano Martins Costa, A inexorável descontrução de Lula. Realista ao ponto mesmo de beirar um pessimismo brutal. Mas subestima um pouco a inteligência do povo brasileiro, como se todo ele ainda fosse submisso à influência da mídia paulista. Lula tem grande força nos rincões esquecidos do país, muita força no nordeste, muita força sobretudo onde os programas sociais estão operando. Lula elegeu-se com 53 milhões de votos, e pelo menos há aí uns 30 milhões que são diretamente beneficiados diretamente pelos programas sociais e estão garantidos. Com esta crise, as forças conservadoras querem impor Ciro Gomes ou Alckmin, e tem grande chance de consegui-lo. Agora, fácil não vai ser. A grande imprensa terá que queimar cartuchos. Outro fator esquecido pelo articulista. Lula não vai ficar parado. Como ele próprio já demonstrou em seus recentes discursos direcionados ao proletariado, existe um outro Lula, combativo, indignado, dentro do Lula paz e amor criado por Duda Mendonça. Ao descontruir o Lula atual, as elites vão encontrar, debaixo da casca, o Lula antigo, com linguagem incendiária de luta de classes. Finalmente, o articulista esqueceu uma coisa. Lula não é mais uma ameaça da esquerda. Ele é uma realidade, ocupa o poder. Tem acesso a informações e possui conexões com outros setores econômicos tão poderosos quanto os setores econômicos que o combatem. O articulista trabalha com a hipótese das elites econômicas agirem sob a mesma bandeira, e sabemos que isso é muito difícil. As elites também combatem entre si. Desta vez, será difícil. Lula tem um orçamento de 200 bilhões de reais nas mãos. Diante da possibilidade de perder as eleições, a vontade de poder falará mais alto que o desejo de estabilizar os mercados, e Lula será tentado (e torço para que caia nessa tentação) pelo populismo, por ações mais grandiosas que melhorem efetivamente a situação do povo.

Enfim, o articulista fez uma projeção muito lúcida sobre as ações da mídia e das forças econômicas para descontruir Lula, mas esqueceu o fator fundamental: faltou combinar com os russos, ou seja, com o time adversário, com os movimentos sociais e grandes sindicatos, os quais, diante da iminente queda de seu líder (e Lula, há que se admitir, permanece um grande líder de massas), já prometeram se manifestar com vigor inquietante para as elites. "Ousem depor! Ousem apear Lula do Planalto! Vamos pra rua protestar!", já repetiram lideranças de poderosos sindicatos. Os próprios movimentos sociais, agora organizados numa frente única, já divulgaram manifesto condenando as intenções golpistas da direita. Já vi esse filme antes. A imprensa, no afã de descontruir Lula, acaba por iludir-se a si própria. O articulista mesmo disse: irão pipocar estatísticas distorcidas sobre a queda de popularidade de Lula. Moçoilas bem vestidas e lindas correrão os condomínios de luxo de São Paulo perguntando aos membros da corte se Lula deve ser enxotado. É sabido que a massa não tem voz. Ela só se manifesta mesmo nos grandes momentos. Existem incógnitas na História. Na verdade, ninguém sabe o que vai acontecer. Mas agora ninguém pode dizer que a história está morta. Quando a luta de classes se acende, é porque o país conseguiu reviver sua dinâmica e está novamente se desenvolvendo. Lula pode até perder ou ser deposto, mas a paixão e o desejo de mudança que o elegeram não morrerão, porque não são reflexos do capricho de uma classe média sempre hesitante, mas sim do estrondoso clamor das massas por um país melhor. Clamor esse que, embora silenciado, pode explodir a qualquer momento, principalmente se estas massas virem seu líder estiolar sob golpes traiçoeiros da direita brasileira. Lula poderia, por exemplo, morrer agora num acidente doméstico. As massas não morrem. A cada trabalhador morto, nascem cinco, dez outros com mais fome e mais ambição. E a mídia não vai conseguir mentir eternamente. Viva a democracia.

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