Tiro férias forçadas, novamente, por conta do braço. Mas, desta vez, há um componente excitante. Grandes mudanças estão em curso e, quando retornar, terei mais tempo para escrever este blog e outras coisas. Devo voltar só em meados de agosto. Peço aos leitores para assinarem o blog, assim poderão ser notificados sobre as novidades. Não precisarão ficar entrando no blog à tôa. Seus emails estarão sob absoluto sigilo e eu sou contra spam (enviar emails não autorizados ou vender listas de emails para outros).
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28 de julho de 2008
Grandes mudanças e mais umas férias - Assine o blog
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# Escrito por
Miguel do Rosário
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segunda-feira, julho 28, 2008
2 comentarios # Etichette: Comunicação
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25 de julho de 2008
Memórias e desmemórias da Lapa
6 comentarios
(Essa é uma gravura de um punk que o Justo comprou ontem na Lapa e me mandou por email hoje. Achei legal).
Tranquila noite lapiana. Justo passou aqui e saímos. Na esquina da Riachuelo com a Lavradio, bar do Paulinho, uma grata surpresa: Bortolotto e demais participantes da peça À Queima Roupa. Fui com o Justo ver como eram os dois bares novos que abriram ali ao lado, na Riachuelo, com temática rock 'n roll. São bonitos, porém mauricinhos demais. Talvez com o tempo, eles absorvam a atmosfera informal do bairro. Mas é um sinal de que tem gente tentando rachar o monopólio do samba, graças a Deus, ou ao diabo, se for o caso dele ser mesmo pai do rock, como diz Raulzito. Tenho feito bastante pressão espiritual nesse sentido, de trazer mais rock pra Lapa. Sintomático que os bares estejam no meu quarteirão preferido, entre a Lavradio e os Arcos. É uma área bastante preservada arquitetonicamente. De um lado da Riachuelo, os prédios pertencentes à Terceira Ordem do Carmo; de outro, onde fica o Paulinho, os sobradões centenários, e um edifício art noveau magnífico. Para quem não sabe, a Riachuelo é a antiga Mata-Cavalo, a rua onde moravam Capitu e Bentinho, os protagonistas de Dom Casmurro. Pensando bem, o bar não tem que ser "temático" em rock. Basta tocar rock, ser rock. E quando eu falo rock, eu penso também em bipbop, em Jonhy Cash cantando Girlt From North Country junto com Dylan e Hendrix tocando The Wind Cries Mary. E no The Animals, é claro, tocando The House of Rising Sun.
A Lapa continua vivendo um grande momento. Libertou-se da Joaquim Silva e agora cresce pela Mem de Sá e Riachuelo. Alguns, sobretudo os anarquistas, como o Mirisola, reclamam do ar moderninho chique que prolifera no bairro. Mas a Lapa ainda tem muita gordura a ser queimada, quer dizer, os moderninhos são uma minoria; 80% da Lapa ainda são botequins mal ajambrados, casas de show suspeitas e pensões vulgares, enfim a legítima e velha Lapa. E algumas das casas moderninhas são legais também. Atraem umas garotas mais bem vestidas. E o Paulinho, que de moderninho só tem a placa doada pela Inbev, e cujo nome oficial é Bar do Gerson (o Paulinho voltou pra Minas) agora vende uísque importado. Isso é um progresso!
Eu e Juliano, nobres utopistas de botequim, mais uma vez procuramos acertar os problemas brasileiros, tarefa que exige notável dose, ou doses, de energia, quer dizer, cachaça. O inverno carioca é uma maravilha, porque a temperatura não cai muito, chove pouco, e as noites ficam amenas, um clima mais cool, calmo, limpo, bem diferente do verãozão enlouquecedor, sensual e sujo, quarenta graus latejando nas suas têmporas. Há dez anos moro na Lapa ou perto dela. Primeiro morei 30 dias no hotel Santa Teresa, o famoso hotel dos descasados, que na verdade era uma pensão que alugava quartos por um valor mensal, variando de R$ 400 com banheiro e R$ 300 sem banheiro.
Mudei-me enfim para a rua da Lapa n.1, área que concentra o maior número de travestis por metro quadrado do país. Era um prédio legal, novo, onde residi três anos numa quitinete cujo tamanho estava na proporção inversa da minha sensação de liberdade. Um cômodo só, estreito, de um lado um arremedo de cozinha, de outro o sofá-cama e a mesa. Para usar a mesa, eu tinha que fechar a cama. Mas era meu palácio e tinha uma bela vista para as montanhas de Santa Teresa.
Foi uma época difícil, como aliás são todas, mas essa em particular por causa da morte recente do meu pai e das responsabilidades súbitas que eu assumira. O poeta cedeu lugar ao jornalista especializado em café, mas exigiu, em troca, um mergulho na boemia profunda e bandida da Lapa.
Em meio ao burburinho, eu ainda editava o jornal Arte & Política. Bons tempos do bar Pega Leve, pilotado por Seu Nilo, que só tocava blues, ou um tempo antes, o bar do Seu Cláudio, com suas inesquecíveis rodinhas de samba de segunda-feira. Nessa época, eu havia abandonado a faculdade, pela enésima vez, e saía quase todas as noites. Minha tática para não deixar a Lapa me consumir totalmente era sair bem tarde de casa. Passava as tardes lendo, fingia trabalhar um pouco, lia mais, escrevia um tanto e, à noite, fazia minha festinha particular, com uísque nacional, charuto e música. Dançava sozinho em casa, ao som de Bob Dylan, bêbado e feliz, depois ia para a esbórnia da Joaquim Silva.
De vez em quando, arrastava uma vagabunda pra casa. Havia cortado laços com qualquer movimento literário local ou nacional, mas ainda era reconhecido como poeta por toda a marginália das letras. Eu gosto da Lapa porque é um bairro simples, mas culto. Diferentemente de Ipanema, onde as pessoas escondem sua cultura como quem teme usar jóias na rua. Não querem mostrar que são elite. Querem ser "povo", então evitam qualquer conversação de alto nivel.
Na Lapa, não. Na Lapa todo mundo conversa sobre tudo, sem pudor. Filosofia alemã, futebol, purrinha, Dylan Thomas, culinária. Nesses dez anos de Lapa, eu nunca saí à noite sem desfrutar um bom papo cabeça. Não apenas com intelectuais. Qualquer zépovinho da Lapa sabe discutir política internacional. Alguns são especialistas, outros só falam besteira. Mas todos têm sua opinião e merda por merda, não existe pior burro do que o letrado, mas isso é uma teoria que explico depois. Na Lapa, ia dizendo, há aviadores desempregados, oficiais expulsos do exército, professores de ginásio, camelôs, advogados e uma pá de gostosas pedantes ciscando de bar em bar.
De qualquer forma, a gente sempre termina no "quadrilátero do crime", na encruzilhada diabólica da Gomes Freire com a Mem de Sá, onde ficam os bares que nunca fecham. A gente pendura as chuteiras naquelas bandas, quando começamos a trocar o português pelo sânscrito. Mesmo sentados na mesma mesa, gritamos uns com os outros como se estivéssemos separados por quilômetros, frases soltas, disparatadas, respondidas por absurdas risadas, motivadas principalmente pela cara de palhaço alheia.
Até que alguém, corajosamente, ergue-se e foge dali, dando início à revoada. Esses momentos, desde que saio do bar até acordar no dia seguinte, é um período eivado de mistério, um não-tempo, porque não lembro direito como chego em casa e o que faço. Amor, talvez. Devoro um pedaço de pizza fria? Vejo metade de um filme com o velho Bogart? Enfim, existo sorrateiramente por algum tempo, antes de adormecer e sonhar com uma choupana à beira do São Francisco, onde poderei escrever em paz...
*
Não percam, neste sábado, a última chance de assistir Bortolotto no Rio. Domingo, o preço é R$ 1, mas é preciso chegar mais cedo para comprar o ingresso.
À QUEIMA ROUPA
Texto, Direção, sonoplastia e iluminação : Mário Bortolotto
Elenco : Eucir de Souza, Mário Bortolotto, André Ceccato, Marcos Amaral, Walter Figueiredo, Alessandro Bartel e Fábio Guará.
Operação Técnica : Marcelo Montenegro
Direção Técnica : Régis "Nêgadete" dos Santos
No Teatro Ziembinski - Tijuca
25, 26 e 27 de Julho - às 20h
Rua Heitor Beltrão, s/n (em frente ao metrô São Francisco Xavier)
Ingresso : R$ 15 (meia : R$ 7,50)
A Lapa continua vivendo um grande momento. Libertou-se da Joaquim Silva e agora cresce pela Mem de Sá e Riachuelo. Alguns, sobretudo os anarquistas, como o Mirisola, reclamam do ar moderninho chique que prolifera no bairro. Mas a Lapa ainda tem muita gordura a ser queimada, quer dizer, os moderninhos são uma minoria; 80% da Lapa ainda são botequins mal ajambrados, casas de show suspeitas e pensões vulgares, enfim a legítima e velha Lapa. E algumas das casas moderninhas são legais também. Atraem umas garotas mais bem vestidas. E o Paulinho, que de moderninho só tem a placa doada pela Inbev, e cujo nome oficial é Bar do Gerson (o Paulinho voltou pra Minas) agora vende uísque importado. Isso é um progresso!
Eu e Juliano, nobres utopistas de botequim, mais uma vez procuramos acertar os problemas brasileiros, tarefa que exige notável dose, ou doses, de energia, quer dizer, cachaça. O inverno carioca é uma maravilha, porque a temperatura não cai muito, chove pouco, e as noites ficam amenas, um clima mais cool, calmo, limpo, bem diferente do verãozão enlouquecedor, sensual e sujo, quarenta graus latejando nas suas têmporas. Há dez anos moro na Lapa ou perto dela. Primeiro morei 30 dias no hotel Santa Teresa, o famoso hotel dos descasados, que na verdade era uma pensão que alugava quartos por um valor mensal, variando de R$ 400 com banheiro e R$ 300 sem banheiro.
Mudei-me enfim para a rua da Lapa n.1, área que concentra o maior número de travestis por metro quadrado do país. Era um prédio legal, novo, onde residi três anos numa quitinete cujo tamanho estava na proporção inversa da minha sensação de liberdade. Um cômodo só, estreito, de um lado um arremedo de cozinha, de outro o sofá-cama e a mesa. Para usar a mesa, eu tinha que fechar a cama. Mas era meu palácio e tinha uma bela vista para as montanhas de Santa Teresa.
Foi uma época difícil, como aliás são todas, mas essa em particular por causa da morte recente do meu pai e das responsabilidades súbitas que eu assumira. O poeta cedeu lugar ao jornalista especializado em café, mas exigiu, em troca, um mergulho na boemia profunda e bandida da Lapa.
Em meio ao burburinho, eu ainda editava o jornal Arte & Política. Bons tempos do bar Pega Leve, pilotado por Seu Nilo, que só tocava blues, ou um tempo antes, o bar do Seu Cláudio, com suas inesquecíveis rodinhas de samba de segunda-feira. Nessa época, eu havia abandonado a faculdade, pela enésima vez, e saía quase todas as noites. Minha tática para não deixar a Lapa me consumir totalmente era sair bem tarde de casa. Passava as tardes lendo, fingia trabalhar um pouco, lia mais, escrevia um tanto e, à noite, fazia minha festinha particular, com uísque nacional, charuto e música. Dançava sozinho em casa, ao som de Bob Dylan, bêbado e feliz, depois ia para a esbórnia da Joaquim Silva.
De vez em quando, arrastava uma vagabunda pra casa. Havia cortado laços com qualquer movimento literário local ou nacional, mas ainda era reconhecido como poeta por toda a marginália das letras. Eu gosto da Lapa porque é um bairro simples, mas culto. Diferentemente de Ipanema, onde as pessoas escondem sua cultura como quem teme usar jóias na rua. Não querem mostrar que são elite. Querem ser "povo", então evitam qualquer conversação de alto nivel.
Na Lapa, não. Na Lapa todo mundo conversa sobre tudo, sem pudor. Filosofia alemã, futebol, purrinha, Dylan Thomas, culinária. Nesses dez anos de Lapa, eu nunca saí à noite sem desfrutar um bom papo cabeça. Não apenas com intelectuais. Qualquer zépovinho da Lapa sabe discutir política internacional. Alguns são especialistas, outros só falam besteira. Mas todos têm sua opinião e merda por merda, não existe pior burro do que o letrado, mas isso é uma teoria que explico depois. Na Lapa, ia dizendo, há aviadores desempregados, oficiais expulsos do exército, professores de ginásio, camelôs, advogados e uma pá de gostosas pedantes ciscando de bar em bar.
De qualquer forma, a gente sempre termina no "quadrilátero do crime", na encruzilhada diabólica da Gomes Freire com a Mem de Sá, onde ficam os bares que nunca fecham. A gente pendura as chuteiras naquelas bandas, quando começamos a trocar o português pelo sânscrito. Mesmo sentados na mesma mesa, gritamos uns com os outros como se estivéssemos separados por quilômetros, frases soltas, disparatadas, respondidas por absurdas risadas, motivadas principalmente pela cara de palhaço alheia.
Até que alguém, corajosamente, ergue-se e foge dali, dando início à revoada. Esses momentos, desde que saio do bar até acordar no dia seguinte, é um período eivado de mistério, um não-tempo, porque não lembro direito como chego em casa e o que faço. Amor, talvez. Devoro um pedaço de pizza fria? Vejo metade de um filme com o velho Bogart? Enfim, existo sorrateiramente por algum tempo, antes de adormecer e sonhar com uma choupana à beira do São Francisco, onde poderei escrever em paz...
*
Não percam, neste sábado, a última chance de assistir Bortolotto no Rio. Domingo, o preço é R$ 1, mas é preciso chegar mais cedo para comprar o ingresso.
À QUEIMA ROUPA
Texto, Direção, sonoplastia e iluminação : Mário Bortolotto
Elenco : Eucir de Souza, Mário Bortolotto, André Ceccato, Marcos Amaral, Walter Figueiredo, Alessandro Bartel e Fábio Guará.
Operação Técnica : Marcelo Montenegro
Direção Técnica : Régis "Nêgadete" dos Santos
No Teatro Ziembinski - Tijuca
25, 26 e 27 de Julho - às 20h
Rua Heitor Beltrão, s/n (em frente ao metrô São Francisco Xavier)
Ingresso : R$ 15 (meia : R$ 7,50)
24 de julho de 2008
Temporada Bortolotto no Rio encerra neste fim de semana
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A temporada do grupo Cemitério dos Automóveis, que trouxe 4 peças ao teatro Ziembinski, termina neste final de semana com À Queima Roupa, de Mario Bortolotto. Segundo o dramaturgo, esse é um de seus trabalhos preferidos. O blog recomenda. No domingo, o preço é R$ 1,00, devido à promoção da prefeitura, e costuma lotar. Eu devo ir no sábado.
No Teatro Ziembinski - Tijuca
25, 26 e 27 de Julho - às 20h
Rua Heitor Beltrão, s/n (em frente ao metrô São Francisco Xavier)
Ingresso : R$ 15 (meia : R$ 7,50)
No Teatro Ziembinski - Tijuca
25, 26 e 27 de Julho - às 20h
Rua Heitor Beltrão, s/n (em frente ao metrô São Francisco Xavier)
Ingresso : R$ 15 (meia : R$ 7,50)
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Miguel do Rosário
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quinta-feira, julho 24, 2008
Seja o primeiro a comentar! # Etichette: Teatro
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23 de julho de 2008
Divagações pós-ideológicas & blasfêmias
8 comentarios
Tanto se fala no fim das ideologias, mas a verdade é que a humanidade já esqueceu o que elas são. Seu significado esgarçou-se, evaporou-se em meio à fumaça dos carros de luxo misturada à marola dos baseados hippies. Em verdade vos digo: minha ideologia hoje são meus livros, meu computador e alguma coisa no bolso pra cerveja, pizza e cinema. E o desejo de escrever, irreversível. Pois bem, ideologias. O problema das ideologias, assim como da política, é que se as confunde com idiossincrassias psicológicas ou culturais. Taí uma coisa que percebi há tempos. Esquerdistas e direitistas desenvolveram vícios de pensamento, uns preconceitos bobos, inclusive preconceito contra o preconceito. Partindo da premissa que é impossível viver sem preconceitos, sob o risco de nos tornarmos um software do Greenpeace, que se nos permitam tê-los. Que se nos permitam ser hipócritas, preconceituosos e maus. Isso que irrita na esquerda. A pretensão de ser bom. Ser bom não é uma questão de ideologia ou linguagem, mas de simpatia e generosidade. Já fui comunista, anarquista, capitalista, hoje percebo que esses conceitos são artificiais. Não existe capitalismo, por exemplo. Existe democracia. Por isso, os direitófilos são tão nervosos e insatisfeitos com o mundo. Outro dia, li num blog um cara dizendo que os banqueiros estão apoiando os esquerdistas do Brasil, e clama por uma articulação da direita junto aos trabalhadores. Eles acreditam que o mundo atual é socialista. É de morrer de rir. E dá o que pensar.
No entanto, respeito a política. Assim como os médicos. No fundo, sou uma besta em política assim como em medicina. Sou um escritor, e só. E defendo minha classe e que ela tenha mais poder e mais dinheiro. Não pensem, contudo, que ser escritor vale grande coisa. Vale porra nenhuma, ainda mais no Brasil, terra de analfabetos funcionais. Respeito, ia dizendo, os políticos, os médicos e os pipoqueiros. Todos dignos e úteis à sociedade. Agora, não acredito num capitalismo que subsidia grandes agricultores, bancos, seguradoras e complexos militares privados. Que merda de capitalismo é esse? No entanto, esse é o capitalismo americano, europeu, japonês. É um estatismo pior que o comunismo, porque este ao menos ainda provê educação gratuita. Mas não sou comunista porque sou doido, como diria Fernando Pessoa, "com todo o direito a sê-lo, ouviram?", e como todo doido defendo o individualismo. Os loucos são grandes individualistas, porque se acham tão diferentes, tão estranhos.
E o talento. Acredito no talento. Assim como no fracasso. Acredito que os fracos, os bunda-moles e os medrosos têm tanta dignidade quanto seus antípodas, os valorosos. Essa é minha ideologia, que não é das melhores. Talvez seja cristã. Tudo bem, eu supero. Tem uns leitores do blog, uns caras legais, que gostam do que eu escrevo, que andam protestando das minhas divagações blasfemas sobre Deus. Eu andei dizendo que as pessoas não devem confiar tanto em Deus, pois se Ele não conseguiu impedir uma moça inocente como Eva de comer uma maçã, como irá controlar a vontade de três bilhões de mulheres ambiciosas, querendo enganar outras mulheres e todos os homens? Mas sobre isso eu falo depois.
Voltando às ideologias, sempre defendi o individualismo, a liberdade e a democracia. A vaidade também. E o direito de errar e não ser humilhado por isso. Não aceito humilhação. Sei que ela é inevitável e inerente à liberdade que escolhi para mim e para os outros. Mas me revolta ver alguém ser humilhado, mesmo um adversário. Também não concordo com nosso sistema penal. Ninguém devia ir para a cadeia. Só os notoriamente psicopatas e sociopatas. Os outros deviam expiar seu crime trabalhando e pagando multas. Por isso não me tenho orgasmos com Daniel Dantas indo para a cadeira: ficaria mais satisfeito se a Justiça o obrigasse a doar uns vinte bilhões de reais aos pobres do Brasil.
Não acredito em ismos e sim em idéias práticas. Por exemplo, todas as estradas, ruas e avenidas deveriam ter um espaço protegido para pedestres e ciclistas. Acho simplesmente irracional que não seja assim, que um carro tenha direito a trânsito e uma pessoa não. Também acho que o Estado deveria criar uma estatal de aluguel de carros, para estimular as pessoas a, em vez de comprarem carro, alugarem-no na filial mais próxima, podendo entregá-lo em qualquer outra loja da mesma empresa. Idéias, idéias. E também bibliotecas. Espalhar bibliotecas públicas pelo país. E redes gratuitas de wifi.
As pessoas subestimam a importância das chamadas guerrinhas sectárias, entre petistas e tucanos. Como em toda guerra, em toda dialética, ali tambem corre uma energia filosófica, uma faísca de criatividade. Segundo Hegel, a verdade reside na própria tensão dialética, no jogo entre tese, antítese e síntese. Um eterno círculo, águas do rio deslizando, eternamente.
Falta, finalmente, uma consciência de classe por parte dos jornalistas, e coragem em assumir posições políticas, e inteligência para compreender o jogo partidário. É preciso defender um governo aliado, por exemplo, sobretudo quando ele erra. Ou seja, nos momentos difíceis. É muito fácil defendê-lo quando as coisas estão bem. Se alguém acreditou na história de que pragmatismo é um defeito, não tem idéia do que seja a vida. São ranços ibéricos, aristocráticos, quase escravagistas, que ainda nos assolam. Pragmatismo é uma das principais qualidades da política. Dom Quixote foi um grande cara. Admiro-o, amo-o. Mas ele era totalmente insano e ridículo. Sancho Pança que o diga. Suas sandices criavam mais problemas do que ajudavam as pessoas. Isso está bem claro no livro de Cervantes.
Boa noite.
No entanto, respeito a política. Assim como os médicos. No fundo, sou uma besta em política assim como em medicina. Sou um escritor, e só. E defendo minha classe e que ela tenha mais poder e mais dinheiro. Não pensem, contudo, que ser escritor vale grande coisa. Vale porra nenhuma, ainda mais no Brasil, terra de analfabetos funcionais. Respeito, ia dizendo, os políticos, os médicos e os pipoqueiros. Todos dignos e úteis à sociedade. Agora, não acredito num capitalismo que subsidia grandes agricultores, bancos, seguradoras e complexos militares privados. Que merda de capitalismo é esse? No entanto, esse é o capitalismo americano, europeu, japonês. É um estatismo pior que o comunismo, porque este ao menos ainda provê educação gratuita. Mas não sou comunista porque sou doido, como diria Fernando Pessoa, "com todo o direito a sê-lo, ouviram?", e como todo doido defendo o individualismo. Os loucos são grandes individualistas, porque se acham tão diferentes, tão estranhos.
E o talento. Acredito no talento. Assim como no fracasso. Acredito que os fracos, os bunda-moles e os medrosos têm tanta dignidade quanto seus antípodas, os valorosos. Essa é minha ideologia, que não é das melhores. Talvez seja cristã. Tudo bem, eu supero. Tem uns leitores do blog, uns caras legais, que gostam do que eu escrevo, que andam protestando das minhas divagações blasfemas sobre Deus. Eu andei dizendo que as pessoas não devem confiar tanto em Deus, pois se Ele não conseguiu impedir uma moça inocente como Eva de comer uma maçã, como irá controlar a vontade de três bilhões de mulheres ambiciosas, querendo enganar outras mulheres e todos os homens? Mas sobre isso eu falo depois.
Voltando às ideologias, sempre defendi o individualismo, a liberdade e a democracia. A vaidade também. E o direito de errar e não ser humilhado por isso. Não aceito humilhação. Sei que ela é inevitável e inerente à liberdade que escolhi para mim e para os outros. Mas me revolta ver alguém ser humilhado, mesmo um adversário. Também não concordo com nosso sistema penal. Ninguém devia ir para a cadeia. Só os notoriamente psicopatas e sociopatas. Os outros deviam expiar seu crime trabalhando e pagando multas. Por isso não me tenho orgasmos com Daniel Dantas indo para a cadeira: ficaria mais satisfeito se a Justiça o obrigasse a doar uns vinte bilhões de reais aos pobres do Brasil.
Não acredito em ismos e sim em idéias práticas. Por exemplo, todas as estradas, ruas e avenidas deveriam ter um espaço protegido para pedestres e ciclistas. Acho simplesmente irracional que não seja assim, que um carro tenha direito a trânsito e uma pessoa não. Também acho que o Estado deveria criar uma estatal de aluguel de carros, para estimular as pessoas a, em vez de comprarem carro, alugarem-no na filial mais próxima, podendo entregá-lo em qualquer outra loja da mesma empresa. Idéias, idéias. E também bibliotecas. Espalhar bibliotecas públicas pelo país. E redes gratuitas de wifi.
As pessoas subestimam a importância das chamadas guerrinhas sectárias, entre petistas e tucanos. Como em toda guerra, em toda dialética, ali tambem corre uma energia filosófica, uma faísca de criatividade. Segundo Hegel, a verdade reside na própria tensão dialética, no jogo entre tese, antítese e síntese. Um eterno círculo, águas do rio deslizando, eternamente.
Falta, finalmente, uma consciência de classe por parte dos jornalistas, e coragem em assumir posições políticas, e inteligência para compreender o jogo partidário. É preciso defender um governo aliado, por exemplo, sobretudo quando ele erra. Ou seja, nos momentos difíceis. É muito fácil defendê-lo quando as coisas estão bem. Se alguém acreditou na história de que pragmatismo é um defeito, não tem idéia do que seja a vida. São ranços ibéricos, aristocráticos, quase escravagistas, que ainda nos assolam. Pragmatismo é uma das principais qualidades da política. Dom Quixote foi um grande cara. Admiro-o, amo-o. Mas ele era totalmente insano e ridículo. Sancho Pança que o diga. Suas sandices criavam mais problemas do que ajudavam as pessoas. Isso está bem claro no livro de Cervantes.
Boa noite.
# Escrito por
Miguel do Rosário
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quarta-feira, julho 23, 2008
8 comentarios # Etichette: ensaio, Política
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22 de julho de 2008
Globo continua tentando queimar Satiagraha
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O jornal Globo de hoje traz somente matérias que beneficiam Daniel Dantas. A começar pela coluna de Merval Pereira, que pinça trechos dos relatórios do juiz De Sanctis e de Protógenes. Tática desonesta, porque são textos com centenas de páginas, a maioria das quais escrita com zelo técnico e competência profissional. De Sanctis é um dos maiores especialistas em crimes financeiros do país. A admiração e o respeito que goza entre os magistrados ficou mais que provada quando mais de 40o colegas assinaram um documento em seu apoio, e realizaram um ato de desagravo. A quem interessa desprestigiá-lo? Certamente não aos que lutam contra a corrupção. Se há um ou dois parágrafos mais subjetivos nos relatórios, inclusive com acento moralista, isso pode ser explicado pelo sentimento de estarem lutando contra forças poderosissimas, como aliás fica patente agora, com a mídia atacando as instituições que investigam Daniel Dantas. Só há uma matéria no Globo sobre o caso hoje, no caderno de economia e, mais uma vez, batendo nas instituições, não nos criminosos. A matéria é requentada, fala da representação ou sei lá o quê que Protógenes teria registrado no Ministério Público para reclamar contra a falta de recursos e pessoal para tocar a operação Satiagraha. A matéria é omissa porque não diz que o problema foi solucionado: a PF remanejou mais de 50 especialistas para cuidar exclusivamente deste caso. Qualquer falta de recursos, portanto, já teria sido resolvida. Para o Globo, no entanto, o leitor não tem o direito de saber a verdade. A matéria ainda dedica grande espaço para a defesa do senador Heráclito Fortes. Há um tom de chantagem no texto, com ameaças do senador contra o delegado Protógenes.
A matéria traz ainda um box sobre o Protógenes, um texto absurdo, uma perseguição ridícula ao policial em sua primeira aula na Academia, com fotos dele comendo e pagando a conta. O repórter descreve minúncias banais como o fato dele ter pago a conta em dinheiro e irritado-se com o assédio da imprensa. E tudo isso no caderno de Economia. Por estranha opção editorial, a parte de País do Globo, subitamente, virou uma seção paroquial, sobre os candidatos a prefeito no município do Rio.
Enquanto isso, Denise Abreu, aquela que era carrasco e havia virado santa por conta de seus ataques à Dilma Roussef, foi denunciada pelo Ministério Público Federal como uma das responsáveis, embora indiretamente, pelo acidente da Tam no ano passado. A notícia, claro, não ganhou as primeiras páginas dos jornais. Mas devia, pois trata do maior acidente aéreo do país, e envolve uma personagem que ocupou manchetes e editoriais durante semanas.
É realmente curioso o processo de hierarquização das notícias por parte de nossa imprensa. A PF prende Dantas, prova que ele foi um dos principais abastecedores do mensalão, um troço que ocupou o imaginário midiático por quase um ano, sendo chamado por alguns de a maior crise política da história da república - pois bem, agora que o Dantas está indiciado judicialmente, a imprensa perde o interesse pela história. Não vai atrás de informações, não vai atrás da literatura existente sobre o caso. É curioso.
*
O excelente blog do Idelber Avelar, professor de literatura nos EUA, mas que vem sempre ao Brasil e acompanha de perto tudo que acontece por aqui, vem acompanhando o caso Dantas com atenção especial. Em post recente, um comentarista de seu blog, jornalista e ex-marido daquela Andrea, da Folha de SP, que foi pega pela PF dizendo que tinha "uma matéria de encomenda para Dantas" e vazou a operação para a imprensa, fez uma afirmação que desmente muitas das teses que rolam na mídia. Ele diz que muitos jornalistas e publicações não vazam operações da PF por razões éticas: não querem colaborar com bandidos de colarinho branco. Ou seja, mesmo que possam lucrar com isso, não o fazem porque estão do lado das instituiçoes no combate ao crime. Ele observa que é muito difícil para a PF manter o sigilo absoluto das investigações porque os jornalistas convivem com delegados e procuradores e acabam sabendo de alguma coisa.
*
Essa história do envolvimento da filha do Serra com Dantas está dando o que falar. Pode ser que não haja nada de criminal no caso, mas a imprensa está pagando um enorme mico em blindar desse jeito o governador de SP. Passa a impressão de que ele é um político frágil, que sua popularidade não suportaria nenhuma notícia negativa. Estou começando a achar que é verdade, de que Serra é frágil, e que, se notícias negativas começarem a circular a seu respeito, o seu favoritismo para 2010 pode cair sensivelmente. Esse é mais um dos comportamentos tolos da mídia, que no afã de proteger seus aliados, pratica um paternalismo debilitante, que não lhes permite praticar a luta política, exercício indispensável para o fortalecimento de qualquer personalidade e partido.
Os tucanóides, nervosos com o caso da filha de Serra, voltaram a falar sobre o Lulinha, e a disseminar informações exageradas e distorcidas. Esquecem que o caso Gamecorp foi hiper-explorado. Lula teve que responder a milhares de entrevistas, inclusive em rede nacional, em horario nobre, para a Globo, sobre o tema. A Telemar comprou R$ 5 milhões da Gamecorp, empresa da qual Fábio, filho de Lula, tem 17% de participação. O fato de Fábio ser filho do presidente ajudou? Bem, eu penso nos seguintes termos: se ele fosse filho de Fernandinho Beira Mar talvez a Telemar não quisesse participar da empresa. É claro que o fato de Fábio ser filho do presidente da República lhe dá um status diferenciado. Mas isso é normal. Quem quiser ter status similar, que estimule a seu pai que se candidate e vença eleições presidenciais. Lulinha foi capa da Veja inúmeras vezes. Mas não se encontrou nada de irregular no contrato entre Telemar e Gamecorp. Lembre-se que a Telemar, embora tenha fundos de pensão estatais entre seus acionistas, é uma empresa privada, com direito a contratar quem lhe der na telha, desde o filho do Beira a Mar ao filho de Lula. Ministério Público, mídia, PF, CPI, a vida de Lula tem sido devassada de cabo a rabo, e não se encontra nada de irregular. A essa altura do campeonato, se Lula tivesse algum vezo por práticas ilícitas ou suspeitas (o que não é o caso, na minha opinião), creio que a perseguição implacável que sofre da mídia já o teria feito mudar de idéia e seguir estritamente na linha.
Não concordo com perseguição à família de políticos, mas não custava nada que a mídia procurasse esclarecer a população sobre os laços entre a filha de Serra e Daniel Dantas. Prometemos não prejulgar, só queremos saber. A mídia tem medo de que a simples menção ao referido laço possa causar prejuízo à imagem pública de Serra. Mas não é assim que se fortalece um candidato. Um político que não aguenta chuva não tem futuro. Deixem o Serra se molhar um pouco também. Se ele é tão bom, saberá se defender e dar a volta por cima, como Lula tem feito. Esse partidarismo midiático prejudica profundamente a oposição, porque ilude-a, engana-a, mima-a, debilita-a, e isso é muito nocivo à democracia brasileira. Daí, daqui a alguns anos, a oposição brasileira mingua e desaparece e a mídia acusará o governo de "totalitário". Provavelmente, foi isso que ocorreu em outros países latino-americanos.
A matéria traz ainda um box sobre o Protógenes, um texto absurdo, uma perseguição ridícula ao policial em sua primeira aula na Academia, com fotos dele comendo e pagando a conta. O repórter descreve minúncias banais como o fato dele ter pago a conta em dinheiro e irritado-se com o assédio da imprensa. E tudo isso no caderno de Economia. Por estranha opção editorial, a parte de País do Globo, subitamente, virou uma seção paroquial, sobre os candidatos a prefeito no município do Rio.
Enquanto isso, Denise Abreu, aquela que era carrasco e havia virado santa por conta de seus ataques à Dilma Roussef, foi denunciada pelo Ministério Público Federal como uma das responsáveis, embora indiretamente, pelo acidente da Tam no ano passado. A notícia, claro, não ganhou as primeiras páginas dos jornais. Mas devia, pois trata do maior acidente aéreo do país, e envolve uma personagem que ocupou manchetes e editoriais durante semanas.
É realmente curioso o processo de hierarquização das notícias por parte de nossa imprensa. A PF prende Dantas, prova que ele foi um dos principais abastecedores do mensalão, um troço que ocupou o imaginário midiático por quase um ano, sendo chamado por alguns de a maior crise política da história da república - pois bem, agora que o Dantas está indiciado judicialmente, a imprensa perde o interesse pela história. Não vai atrás de informações, não vai atrás da literatura existente sobre o caso. É curioso.
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O excelente blog do Idelber Avelar, professor de literatura nos EUA, mas que vem sempre ao Brasil e acompanha de perto tudo que acontece por aqui, vem acompanhando o caso Dantas com atenção especial. Em post recente, um comentarista de seu blog, jornalista e ex-marido daquela Andrea, da Folha de SP, que foi pega pela PF dizendo que tinha "uma matéria de encomenda para Dantas" e vazou a operação para a imprensa, fez uma afirmação que desmente muitas das teses que rolam na mídia. Ele diz que muitos jornalistas e publicações não vazam operações da PF por razões éticas: não querem colaborar com bandidos de colarinho branco. Ou seja, mesmo que possam lucrar com isso, não o fazem porque estão do lado das instituiçoes no combate ao crime. Ele observa que é muito difícil para a PF manter o sigilo absoluto das investigações porque os jornalistas convivem com delegados e procuradores e acabam sabendo de alguma coisa.
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Essa história do envolvimento da filha do Serra com Dantas está dando o que falar. Pode ser que não haja nada de criminal no caso, mas a imprensa está pagando um enorme mico em blindar desse jeito o governador de SP. Passa a impressão de que ele é um político frágil, que sua popularidade não suportaria nenhuma notícia negativa. Estou começando a achar que é verdade, de que Serra é frágil, e que, se notícias negativas começarem a circular a seu respeito, o seu favoritismo para 2010 pode cair sensivelmente. Esse é mais um dos comportamentos tolos da mídia, que no afã de proteger seus aliados, pratica um paternalismo debilitante, que não lhes permite praticar a luta política, exercício indispensável para o fortalecimento de qualquer personalidade e partido.
Os tucanóides, nervosos com o caso da filha de Serra, voltaram a falar sobre o Lulinha, e a disseminar informações exageradas e distorcidas. Esquecem que o caso Gamecorp foi hiper-explorado. Lula teve que responder a milhares de entrevistas, inclusive em rede nacional, em horario nobre, para a Globo, sobre o tema. A Telemar comprou R$ 5 milhões da Gamecorp, empresa da qual Fábio, filho de Lula, tem 17% de participação. O fato de Fábio ser filho do presidente ajudou? Bem, eu penso nos seguintes termos: se ele fosse filho de Fernandinho Beira Mar talvez a Telemar não quisesse participar da empresa. É claro que o fato de Fábio ser filho do presidente da República lhe dá um status diferenciado. Mas isso é normal. Quem quiser ter status similar, que estimule a seu pai que se candidate e vença eleições presidenciais. Lulinha foi capa da Veja inúmeras vezes. Mas não se encontrou nada de irregular no contrato entre Telemar e Gamecorp. Lembre-se que a Telemar, embora tenha fundos de pensão estatais entre seus acionistas, é uma empresa privada, com direito a contratar quem lhe der na telha, desde o filho do Beira a Mar ao filho de Lula. Ministério Público, mídia, PF, CPI, a vida de Lula tem sido devassada de cabo a rabo, e não se encontra nada de irregular. A essa altura do campeonato, se Lula tivesse algum vezo por práticas ilícitas ou suspeitas (o que não é o caso, na minha opinião), creio que a perseguição implacável que sofre da mídia já o teria feito mudar de idéia e seguir estritamente na linha.
Não concordo com perseguição à família de políticos, mas não custava nada que a mídia procurasse esclarecer a população sobre os laços entre a filha de Serra e Daniel Dantas. Prometemos não prejulgar, só queremos saber. A mídia tem medo de que a simples menção ao referido laço possa causar prejuízo à imagem pública de Serra. Mas não é assim que se fortalece um candidato. Um político que não aguenta chuva não tem futuro. Deixem o Serra se molhar um pouco também. Se ele é tão bom, saberá se defender e dar a volta por cima, como Lula tem feito. Esse partidarismo midiático prejudica profundamente a oposição, porque ilude-a, engana-a, mima-a, debilita-a, e isso é muito nocivo à democracia brasileira. Daí, daqui a alguns anos, a oposição brasileira mingua e desaparece e a mídia acusará o governo de "totalitário". Provavelmente, foi isso que ocorreu em outros países latino-americanos.
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Miguel do Rosário
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terça-feira, julho 22, 2008
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21 de julho de 2008
Bortolotto revive últimos dias de Kerouac
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Neste sábado, fui assistir a peça Kerouac, texto de Maurício Arruda Mendonça e interpretação de Mario Bortolotto, no teatro Ziembiski. Bortolotto revive os últimos dias do escritor americano. Morto aos 47 anos, de cirrose, Kerouac é um dos nomes mais célebres da chamada geração beat. Vivendo com a mãe e sua terceira esposa, ele passa a maior do tempo trancado em casa, lembrando os velhos tempos e lamentando o presente. O texto cai como luva para Bortolotto, ele também um escritor, com assumida influência beat. É muito bonito. Semana que vem, de sexta a domingo, tem mais Bortolotto, com a peça A Queima Roupa, no mesmo Ziembiski, que fica em frente ao metrô São Francisco Xavier. Horário: 20 horas. Ingresso: R$ 15 (7,5 para estudantes).
Semana passada, eu fui assistir outra peça com B., Efeito Urtigão, e escrevi uma resenha, aqui.
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Aproveita e lê a última trágica e hilária coluna do Mirisola no Congresso em Foco. É recomendável especialmente para quem não morre de amores por bancos e banqueiros.
Semana passada, eu fui assistir outra peça com B., Efeito Urtigão, e escrevi uma resenha, aqui.
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Aproveita e lê a última trágica e hilária coluna do Mirisola no Congresso em Foco. É recomendável especialmente para quem não morre de amores por bancos e banqueiros.
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Miguel do Rosário
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segunda-feira, julho 21, 2008
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20 de julho de 2008
Manifestação carioca contra Gilmar Mendes junta 21 brancaleones
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(Abaixo assinado pelo impeachment de Gilmar Mendes já tem mais de 11 mil assinaturas. Assine você também, clicando aqui.)
Foi a primeira manifestação que vou em, sei lá, dez anos. A última que eu participei e, mesmo assim, de forma bem lateral, quase por acaso, foi no dia D da privatização da Vale. Era um belo dia de sol, como ontem e eu me vi, de repente, numa praça XV tomada por tanques do exército e por uma multidão de manifestantes furiosos. Cercaram totalmente a praça, que deixou de ser do povo por um dia. Percencia ao exército e aos financistas que arrecadaram a Vale por 1 bilhão de reais em moedas podres. Detalhe: a Vale é hoje avaliada em mais de 300 bilhões de reais. Para vocês terem uma idéia da "idoneidade" daquela venda. De vez em quando eu falo sobre isso aqui. Não sou contra a privatização em si, e sim contra maneira com que o processo foi conduzido, sem respeitar o clamor popular e sem promover o debate público sobre o tema. O minério de ferro estava com o preço mais baixo da historia, em torno de 15 dólares a tonelada. Por isso a Vale dava pouco lucro (e isso segundo a Miriam Leitão). Mas qualquer analista mais sagaz sabia que as cotaçoes do ferro iriam explodir a qualquer momento, em virtude dos preparativos do governo chinês para promover um grandioso salto de desenvolvimento. Foi o que ocorreu. Pouco tempo depois da venda da Vale, as cotações do ferro dispararam, e continuam subindo até hoje, por causa da crescente demanda asiática.
Mas eu vinha aqui falar da manifestação carioca pelo impeachment do Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, que concedeu dois habeas corpus para Daniel Dantas & corja. O evento juntou 21 pessoas na Candelária, portando faixas e megafone. Os brancaleones depois seguiram pela Avenida Rio Branco, vociferando pelo megafone e portando as faixas, até a Cinelândia. As pessoas que passavam apoiavam entusiasticamente. Chegamos à Cinelândia e nos instalamos no alto da escadaria do Palácio da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, e os discursos prosseguiram. Este escriba foi um dos que mais falou ao megafone. Disse o que a mídia não vem informando: que mais de 400 magistrados assinaram um abaixo assinado contra o Gilmar Mendes, que as associações de classe do Judiciário e do Ministério Público se manifestaram veementemente contra a decisão de Mendes. Falei sobre a frustração da sociedade brasileira em assistir a um membro da mais alta corte do país desprestigiar sistematicamente as instituições que combatem a corrupção e a lavagem de dinheiro. Falei sobre a mídia, que vem blindando qualquer referência negativa a Gilmar Mendes.
Enfim, fizemos a manifestação. Com pouca gente mas com muita fé. As pessoas presentes demonstravam segurança e tranquilidade quanto à importância cívica de nosso ato. Interessante notar a diversidade etárias dos participantes. Em rápida deliberação, combinanos outro ato na quarta-feira, ao meio-dia, em frente ao Fórum do Rio de Janeiro. A escolha do local deu-se após um debate intenso, onde concluímos que ali não só é um lugar que reúne magistrados e advogados, segmentos que devem ser pressionados para que a ordem jurídica nacional não volte a ser violentada em benefício de estelionatários poderosos, mas onde também circula gente de todas as classes sociais.
Depois do evento, alguns de nós fomos ao verdinho, restaurante ao lado do cinema Odeon e, no mais clássico estilo carioca, fizemos uma alegre confraternização, regada a chop, aipim frito e uma agradável e produtiva troca de idéias.
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Em São Paulo, a manifestação juntou mais de 200 pessoas e foi coberta por vários meios de comunicação. Veja fotos no blog do Eduardo Guimarães e matérias nos portais IG , Zero Hora , Agência Brasil , e UOL
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Bem, agora vamos a outros assuntos, muito importantes. Prossegue a celeuma em torno do delegado Protógenes. O jornal O Globo, que leio diariamente, está blindando totalmente Gilmar Mendes e Daniel Dantas, e focando apenas na suposta ou real divisão da Polícia Federal. A seção de Carta dos Leitores do Globo não traz nenhuma mensagem sobre o episódio que mais vem mexendo com a blogosfera brasileira. No sábado, auge da expectativa em torno das investigações, a seção Pais, do Globo, vinha com matéria sobre os camelôs da Lapa! Matéria que, diga-se de passagem, é mais uma das agressões fascistas do Globo contra os vendedores ambulantes.
Tenho notado, com apreensão, que a alquimia midíatica deu certo. O mérito da operação que prendeu Dantas & corja não é atribuído à Polícia Federal ou ao governo. Tornou-se obra exclusiva do delegado Protógenes. Tem gente pregando a construção de estátua de bronze em homenagem ao homem. A mídia conseguiu enganar, mais uma vez, a esquerda ingênua, que voltou a desfilar com sua máscara de "decepcionado", "impotente", "frustrado" e outros epítetos melancólicos. Todo mundo esquece o principal. Quem paga o salário de Protógenes? Quem paga o salário de seus assistentes (que prosseguem no caso)? Daniel Dantas & corja foram indiciados judicialmente. Isso é o que importa. Não é crucificar Dantas que importa. O país tem lei. Se Dantas é solto, se o processo criminal é lento, é porque o Brasil é uma democracia onde os cidadãos (sobretudo os que podem pagar bons advogados) têm amplo direito de defesa. Há um sadismo tolo no ar, como se a justiça só existisse quando o sujeito é lançado numa cela. Não, a justiça permeia todo o processo. Quando a PF iniciou a investigação dos ilícitos de Dantas, ali já estava a Justiça operando, existindo, combatendo o crime. Quando a investigação teve continuidade e se aprofundou, a Justiça também estava ali, acontecendo. Quando o delegado recusa a oferta de 1 milhão de dólares, temos um belíssimo ato de probidade e mais uma prova de existência da Justiça.
É preciso atentar para dois pontos. Ou respeitamos o trabalho da PF ou não respeitamos. Se respeitamos, se achamos que a PF fez um bom trabalho ao prender Dantas, então deixemos a PF nomear quem lhe parecer mais apropriado para dar continuidade às investigações. Qual o direito da mídia, ou mesmo nós, leigos, em decidir se é melhor ou não Protógenes ficar?
Certo que houve uma estupidez política colossal. O anúncio da saída do delegado foi terrivelmente desastrado. Dizer que ele iria fazer um "curso", foi ridículo. O Tarso Genro cometeu um erro crasso. Desculpe, Tarso, mas foste burro, muito burro. Barbaridade, che. Podiam esperar alguns dias para fazer o anúncio. O Protógenes entregavam o relatório e dava seu trabalho por terminado. Simples, limpo e honesto. Entretanto, é mais uma lição para o governo aprender que a mídia, definitivamente, não está do seu lado e, por isso, faz-se necessária uma prudência incomensurável nos assuntos que sensibilizam a opinião pública. Chega de "relaxa e goza".
A sociedade está desorientada. Uns lamentam, em tom derrotista, a possibilidade do caso ir para o STF. Ora, se for, que vá. O importante é que ele continua sendo investigado pela PF e pelo Ministério Público. O que interessa é combater a corrupção. O fim da corrupção, a prisão de todos os corruptos é uma consequência ulterior ao trabalho duro dos orgãos de segurança.
Observei que o caso Dantas fez emergir, de maneira muito forte e visível, o complexo de inferioridade nos brasileiros. Incapazes de acreditar que, finalmente, a PF prendeu um banqueiro poderoso, muitos brasileiros estão se deixando levar por um desalento incongruente com o fato de que Dantas foi indiciado judicialmente há somente dois dias. Não é mais um investigado, mas um réu, e um baita réu, acusado por dezenas de crimes barra pesada, inclusive o de tentar subornar um delegado com 1 milhão de dólares - o dinheiro foi apreendido e o responsável pelo suborno confessou o crime.
O julgamento nem começou, os materiais apreendidos pela PF ainda nem foram analisados; as novas equipes designadas para analisar o caso ainda nem começaram a trabalhar; ainda nem se sabe direito quem é e como é o delegado que substituirá Protógenes; e já se alevanta uma grande onda de "desalento" e "sentimento de impotência". Ora, sinceramente, não acho que o governo possa resolver problemas de impotência. Se for este o caso, melhor tomar um Viagra, e deixar a PF trabalhar em paz. Todo mundo que contribui para a celeuma em torno do Protógenes está ajudando a mídia dantesca a desviar o foco do que é o principal: os negócios escusos do banco Opportunity e suas ligações com o mundo político.
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Existe um documento provando que Daniel Dantas foi sócio da filha do governador José Serra. Como cidadão brasileiro, gostaria de mais esclarecimentos sobre este caso, visto que Serra é pré-candidato à presidência da República e, por enquanto, o favorito para ganhar as eleições em 2010. A mídia, no entanto, blinda o Serra de um jeito que ele pode sair a rua pelado, gritando frases obscenas: não sairá nada em jornal ou TV. O PSDB fica muito confortável diante dessa situação. Mas o conforto também debilita e corrompe. Enquanto isso, o PT e o Lula, tomando porrada diariamente, são obrigados a suar a camisa para não sucumbirem à enxurrada de calúnias e intrigas, e ficam mais fortes e mais prudentes. Essa é uma das belezas da história: a dialética que move os seres e a vida.
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Ah, o juiz Fausto de Sanctis sai de férias por 30 dias. É o tempo certo para os peritos da PF, do Ministério Público e da Receita Federal, analisarem meticulosamente as toneladas de documentos apreendidos. Sanctis já declarou que retoma a análise das provas após sua volta. Ele merece o descanso.
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Miguel do Rosário
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domingo, julho 20, 2008
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18 de julho de 2008
Estarrecedor
3 comentarios
Comprei o Globo e o Estadão hoje. Simplesmente estarrecedor. Eles querem empurrar a tese, na base da porrada, de que os culpados são Polícia e governo. Protógenes foi promovido de demônio a mártir, a ascenção moral mais meteórica da história do mundo. Há uma trama escabrosa no ar. Enquanto isso, o país gerou 1,36 milhão de empregos com carteira assinada no primeiro semestre, recorde histórico. A notícia não aparece em nenhuma primeira página; não tem destaque nem nos cadernos de economia. É fato menor, sem importância. A inflação em SP cai pela quinta vez consecutiva. Nada na primeira página: o tema inflação, que rendeu tantas manchetes nas últimas semanas, sai das pautas. O FMI revisa sua estimativa para o crescimento do PIB do Brasil para cima. Silêncio sepulcral. O Globo diz que "crise se agrava". Bem, aí talvez o Globo tenha acertado o significante, não o signicado. Existe crise sim, e ela se agrava, mas não é na PF, que vem demonstrando um desempenho brilhante na captura de bandidos de colarinho branco, nem no governo, que vive o auge de sua popularidade e surfa em índices econômicos invejáveis. A crise está na mídia. Bom pra gente, blogueiros. Quanto mais a mídia mente desavergonhadamente, manipula a informação, agride a inteligência do leitor, mais o respeitável público corre para a blogosfera em busca de um contra-ponto de opinião. É notória a tentativa de lançar uma cortina de fumaça. Tenho que trabalhar agora. Leiam Terra Magazine, depois a gente conversa.
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Miguel do Rosário
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sexta-feira, julho 18, 2008
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17 de julho de 2008
Desvio do foco
8 comentarios
Não sei como ainda me espanto com isso. Há pouco tempo tinha até me prometido nem comentar mais. É impossível. O jornal O Globo vem fazendo de tudo para perturbar as investigações em torno de Daniel Dantas. Primeiro tentou criar uma crise institucional entre Ministro da Justiça e Ministro do Supremo, e hoje a Miriam Leitão diz que é um absurdo a imagem dos três juntos: Lula, Tarso e Gilmar Mendes. Ora, eles produzem uma crise perigosa entre os poderes e agora reagem agressivamente quando os três aparecem na foto juntos, em harmonia. Primeiro, instigaram Tarso a dizer uma frase imprudente. É uma tática velha. Entrevista-se longamente a pessoa em busca de um deslize verbal. Não importa o verdadeiro sentido da fala do entrevistado. O que importa é montar uma fraude jornalística, pinçando uma frase do contexto. Aí pega-se essa frase e usam-na para atiçar outra pessoa, no caso Gilmar Mendes. A frase era que "Dantas teria muita dificuldade para provar sua inocência". Uma expressão infeliz se tirada do contexto, mas perfeitamente natural de se dizer no meio de uma conversa com jornalistas. Não é prejulgamento nenhum. Aí pegam essa frase e a reproduzem para Gilmar Mendes, que diz, como deveria mesmo dizer, que o julgamento de um réu não é da competência do ministro. Competência aí no sentido de "faculdade concedida por lei para apreciar uma questão". O Globo tasca o manchetão, na primeira página: "Gilmar Mendes diz que Ministro da Justiça é incompetente". Isso é má fé. É jornalismo de intriga e, neste caso, visa criar uma cortina de fumaça por onde Daniel Dantas possa escapar.
E agora criam esse factóide sobre o delegado Protógenes Queiroz. Não interessava à imprensa apurar o que houve, e sim montar a versão que possa criar o constrangimento para o governo e facilitar as coisas para Dantas. A Polícia Federal pode ter desmantelado a maior quadrilha de lavagem de dinheiro, corrupção de autoridades, tráfico de influência, da história brasileira, e a imprensa não demonstra o mínimo ímpeto investigativo para explicar ao leitor a extensão, a profundidade e a origem desses ilícitos. Não, a imprensa procura inverter os papéis, transformando os mocinhos em bandidos. As autoridades constituídas não são perfeitas. Cometem trapalhadas, dão entrevistas fora de hora, gostam de exibir-se, entram em choque uns com os outros, mas se você pensar bem, isso é totalmente normal. Conflitos internos na PF, no governo, entre instâncias, são normais e até saudáveis numa democracia. O mais importante é que a PF está fazendo um bom trabalho. A nossa imprensa até agora não fez um elogio direto, simples, à operação Satiagraha, que, sem disparar um tiro, agindo estritamente segundo a Constituição, usando grampos autorizados pela Justiça, pegou com a boca na botija alguns dos maiores golpistas de nossa história. Não. Criticam a PF por usar algemas, mas não falam que nos EUA, pátria amada idolatrada salve salve, os criminosos de colarinho branco são presos com algemas, COM AS MÃOS À FRENTE, e as operações são televisionadas em rede aberta para todo país.
O irônico é que, assistindo ao noticiário, vemos, no espaço de alguns minutos, a polícia prender estelionatários, algemá-los e socá-los na parte de trás de um camburão, diante das câmeras, e ninguém falar nada. No caso de Dantas, nem algemas eu vi. O que eu vi foi um banqueiro sendo conduzido muito educadamente para a sede da Polícia Federal e, à diferença de qualquer cidadão brasileiro, ser solto duas vezes por ordem direta do Supremo Tribunal Federal, pelo senhor Gilmar Mendes, ex-assessor de Collor e ex-Advogado Geral da União do presidente Fernando Henrique Cardoso. O mesmo STF que havia sido citado, nas conversas gravadas pela PF, como um lugar onde Dantas teria "facilidades".
É espantoso que, depois de anos falando de mensalão como quem fala de uma catástrofe que marcou a história política brasileira, quando a PF prende aquele que teria sido, mais que o mentor, teria sido o financiador principal do mensalão, a imprensa não se interesse mais pela história. Ao contrário, desvia-se continuamente o foco, tentando produzir crises políticas, tentando debilitar as forças do Estado, criando intrigas, jogando confetes por toda a parte.
Tudo tem um preço, porém. Para vender suas teorias, a imprensa voltou às suas velhas práticas mensaleiras. Diz-se, por exemplo, que o Palácio do Planalto quer isso, quer aquilo, deseja aquilo, mas sem nominar fontes, sem consultar nenhum de seus porta-vozes. Volta-se à terra das fontes anônimas, e desconfio que muitas delas nem existam, ou mesmo tem suas declarações distorcidas. Se a imprensa consegue distorcer uma declaração pública de uma autoridade, que dirá de uma fonte anônima. Outra estratégia é usar verbos condicionantes: "ele teria dito", "teria feito". E práticar a (des)memória seletiva - no factóide dos grampos, abusou-se dessa tática. Criou-se a suspeita de que Mendes estaria grampeado, o que foi negado pelas equipes de segurança do próprio STF, após uma varredura. Mas a imprensa aproveitou para lembrar de outras suspeitas no passado, conforme publicadas na Veja. E ainda tem a cara de pau de dizer que foi na Veja. Mas não deixa claro que também foram feitas varreduras e não se encontrou nada.
O curioso é que a imprensa não lembra que um dos crimes dos quais Dantas é acusado é justamente espionagem ilegal de autoridades. Há provas contundentes contra ele nesse sentido. Outro que espionava os outros era o falecido Antonio Carlos Magalhães. E o senhor José Serra, quando ministro da Saúde, contratou uma empresa de espionagem privada, que até alguns anos, agia nas sombras do poder.
Enfim, como diz Bob Fernandes, do Terra Magazine, os intestinos do Brasil estão à mostra. E merecendo uma boa lavagem. Quem irá puxar a descarga?
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Sobre o Protógenes Queiroz, é irônico que ele, após ser vilanizado pela mídia, agora seja ungido como santo. Nem uma coisa nem outra. Ele fez um bom trabalho, mas parece ter se excedido em diversos pontos. O seu relatório revela um idealista e talvez só mesmo ele pudesse ter resistido às pressões que se desencadearam neste caso. Agora que o caso chegou ao ventilador, talvez fosse melhor a hora de entrar um cara mais frio e calculista, que não deixe margem para a defesa fugir pela tangente. Não se esqueçam que as investigações também estão sendo conduzidas pelo Ministério Público, que é independente da PF e do governo federal. Queiroz exagerou, por exemplo, e sobretudo, não soube medir as consequências políticas, ao mandar prender a jornalista da Folha, e ainda lançou suspeitas de que Naji Nahas teria acesso à informações privilegiadas do Banco Central americano - seria melhor que dissesse que ele, Nahas, tenha se vangloriado disso, e não que o soubesse efetivamente. Enfim, Protógenes é um grande delegado, mas é um só e não é super-homem. Está cansado e sob fogo cerrado da mídia - primeiro como vilão e agora como pivô de uma crise entre governo e PF. O trabalho para pegar uma quadrilha desse porte merece uma equipe diversificada, apoio do Ministério Público e da sociedade civil, que precisa pressionar para que as poderosas relações políticas de Dantas não atrapalhem o curso das investigações.
E agora criam esse factóide sobre o delegado Protógenes Queiroz. Não interessava à imprensa apurar o que houve, e sim montar a versão que possa criar o constrangimento para o governo e facilitar as coisas para Dantas. A Polícia Federal pode ter desmantelado a maior quadrilha de lavagem de dinheiro, corrupção de autoridades, tráfico de influência, da história brasileira, e a imprensa não demonstra o mínimo ímpeto investigativo para explicar ao leitor a extensão, a profundidade e a origem desses ilícitos. Não, a imprensa procura inverter os papéis, transformando os mocinhos em bandidos. As autoridades constituídas não são perfeitas. Cometem trapalhadas, dão entrevistas fora de hora, gostam de exibir-se, entram em choque uns com os outros, mas se você pensar bem, isso é totalmente normal. Conflitos internos na PF, no governo, entre instâncias, são normais e até saudáveis numa democracia. O mais importante é que a PF está fazendo um bom trabalho. A nossa imprensa até agora não fez um elogio direto, simples, à operação Satiagraha, que, sem disparar um tiro, agindo estritamente segundo a Constituição, usando grampos autorizados pela Justiça, pegou com a boca na botija alguns dos maiores golpistas de nossa história. Não. Criticam a PF por usar algemas, mas não falam que nos EUA, pátria amada idolatrada salve salve, os criminosos de colarinho branco são presos com algemas, COM AS MÃOS À FRENTE, e as operações são televisionadas em rede aberta para todo país.
O irônico é que, assistindo ao noticiário, vemos, no espaço de alguns minutos, a polícia prender estelionatários, algemá-los e socá-los na parte de trás de um camburão, diante das câmeras, e ninguém falar nada. No caso de Dantas, nem algemas eu vi. O que eu vi foi um banqueiro sendo conduzido muito educadamente para a sede da Polícia Federal e, à diferença de qualquer cidadão brasileiro, ser solto duas vezes por ordem direta do Supremo Tribunal Federal, pelo senhor Gilmar Mendes, ex-assessor de Collor e ex-Advogado Geral da União do presidente Fernando Henrique Cardoso. O mesmo STF que havia sido citado, nas conversas gravadas pela PF, como um lugar onde Dantas teria "facilidades".
É espantoso que, depois de anos falando de mensalão como quem fala de uma catástrofe que marcou a história política brasileira, quando a PF prende aquele que teria sido, mais que o mentor, teria sido o financiador principal do mensalão, a imprensa não se interesse mais pela história. Ao contrário, desvia-se continuamente o foco, tentando produzir crises políticas, tentando debilitar as forças do Estado, criando intrigas, jogando confetes por toda a parte.
Tudo tem um preço, porém. Para vender suas teorias, a imprensa voltou às suas velhas práticas mensaleiras. Diz-se, por exemplo, que o Palácio do Planalto quer isso, quer aquilo, deseja aquilo, mas sem nominar fontes, sem consultar nenhum de seus porta-vozes. Volta-se à terra das fontes anônimas, e desconfio que muitas delas nem existam, ou mesmo tem suas declarações distorcidas. Se a imprensa consegue distorcer uma declaração pública de uma autoridade, que dirá de uma fonte anônima. Outra estratégia é usar verbos condicionantes: "ele teria dito", "teria feito". E práticar a (des)memória seletiva - no factóide dos grampos, abusou-se dessa tática. Criou-se a suspeita de que Mendes estaria grampeado, o que foi negado pelas equipes de segurança do próprio STF, após uma varredura. Mas a imprensa aproveitou para lembrar de outras suspeitas no passado, conforme publicadas na Veja. E ainda tem a cara de pau de dizer que foi na Veja. Mas não deixa claro que também foram feitas varreduras e não se encontrou nada.
O curioso é que a imprensa não lembra que um dos crimes dos quais Dantas é acusado é justamente espionagem ilegal de autoridades. Há provas contundentes contra ele nesse sentido. Outro que espionava os outros era o falecido Antonio Carlos Magalhães. E o senhor José Serra, quando ministro da Saúde, contratou uma empresa de espionagem privada, que até alguns anos, agia nas sombras do poder.
Enfim, como diz Bob Fernandes, do Terra Magazine, os intestinos do Brasil estão à mostra. E merecendo uma boa lavagem. Quem irá puxar a descarga?
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Sobre o Protógenes Queiroz, é irônico que ele, após ser vilanizado pela mídia, agora seja ungido como santo. Nem uma coisa nem outra. Ele fez um bom trabalho, mas parece ter se excedido em diversos pontos. O seu relatório revela um idealista e talvez só mesmo ele pudesse ter resistido às pressões que se desencadearam neste caso. Agora que o caso chegou ao ventilador, talvez fosse melhor a hora de entrar um cara mais frio e calculista, que não deixe margem para a defesa fugir pela tangente. Não se esqueçam que as investigações também estão sendo conduzidas pelo Ministério Público, que é independente da PF e do governo federal. Queiroz exagerou, por exemplo, e sobretudo, não soube medir as consequências políticas, ao mandar prender a jornalista da Folha, e ainda lançou suspeitas de que Naji Nahas teria acesso à informações privilegiadas do Banco Central americano - seria melhor que dissesse que ele, Nahas, tenha se vangloriado disso, e não que o soubesse efetivamente. Enfim, Protógenes é um grande delegado, mas é um só e não é super-homem. Está cansado e sob fogo cerrado da mídia - primeiro como vilão e agora como pivô de uma crise entre governo e PF. O trabalho para pegar uma quadrilha desse porte merece uma equipe diversificada, apoio do Ministério Público e da sociedade civil, que precisa pressionar para que as poderosas relações políticas de Dantas não atrapalhem o curso das investigações.
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Miguel do Rosário
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quinta-feira, julho 17, 2008
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Comentando os comentários & divagações noturnas
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Os posts anteriores me renderam muitos comentários legais e gostaria de agradecer a todos. E também desfazer uma impressão algo antipática que eu possa ter causado, por conta da invenctiva contra "decepcionados". Essas emoções são naturais. As pessoas se decepcionam, voltam a confiar. Mas é que eu acompanho e interajo de perto essas reviravoltas políticas e há tempos observo que a decepção virou uma espécie de espada de Dâmocles pairando sobre o governo Lula. Pensando bem, todavia, é normal. Para quem não sabe ou não lembra, relato rapidamente o que foi a espada de Dâmocles. A história foi contada por Cícero, o famoso orador romano. Na corte de Siracusa, na Grécia antiga, havia um cortesão muito bajulador, chamado Dâmocles, que louvava constamente a felicidade do tirano, Dionisio I. O tirano pede para esse cortesão assumir o seu lugar por um dia, sentando-se em seu trono. O cortesão aceita prazeirosamente o desafio e se diverte muito comendo, bebendo e assistindo mulheres dançando para ele, até que olha para cima e vê uma grande espada pendurada por um fio de rabo de cavalo, apontada para ele. Na mesma hora, ele desiste de ser rei. A lição é sobre os riscos do poder.
Mas há outras lições que podemos tirar do episódio. Tenho pra mim que essas ondas de decepção são consequência de excesso de expectativas que as pessoas depositam no governo. É muito perigoso e certamente frustrante. Nenhum governo poderá cumprir a expectativa de sociedades complexas, divididas em milhares de segmentos econômicos, cada um com suas próprias demandas. Por isso, avaliações sobre governos devem ser ponderadas com muita racionalidade e pragmatismo.
Ontem, por exemplo, aconteceu uma coisa muito importante, e que poderá marcar profundamente a história. Não esperem editoriais candentes sobre isso, o que é lamentável. Lula sancionou o piso salarial de R$ 950 para todos os professores do ensino básico. Considerando que há professores de regiões afastadas que ganhavam até menos do que um salário mínimo e que temos mais de 800 mil professores no país, o fato constitui uma verdadeira revolução.
Quando a lei ainda tramitava no Congresso, o Globo publicou editorial atacando-a. Claro, as organizações Globo atacam tudo que é progressista no país. Outro dia, o cineasta José Padilha respondeu a um artigo idiota do Ali Kamel, que atacava seu filme Garapa, ainda não lançado, só porque Padilha mostra que o Bolsa Família ainda é pouco. O governo deveria ampliar ainda mais os programas sociais. Para Kamel, que prega o fim do Bolsa Família, ou sua redução radical, as propostas de Padilha são inadmissíveis.
Para Kamel, se a fome diminuiu, deve-se reduzir o Bolsa Família. É uma lógica absolutamente esquizóide, porque omite o fato cartesiano, cristalino, de que se é justamente o Bolsa Família que vem ajudando a diminuir a fome, cortá-lo seria um crime histórico. Além do mais, o BF não representa gasto expressivo para os cofres públicos, não se considerarmos o seu alcance e o seu retorno na forma de desenvolvimento econômico, que por sua vez gera renda, trabalho e mais impostos para o governo, produzindo um ciclo virtuoso.
O problema da decepção é que não devemos, a meu ver, apostar nossas expectativas em ninguém a não ser em nós mesmos. Nem Deus merece tanta confiança. Não há ser no mundo que mereça o dom e a maldição de ser o fiel de nossas esperanças. Se queremos uma nação melhor, não há outra alternativa senão melhorarmos a nós mesmos. Individualismo? Sim. Mas um individualismo responsável, cidadão, altruísta.
Em muitas ocasiões, já discorri aqui sobre o que penso das ideologias. Acho que o tempo da guerra fria terminou, para desgosto das viúvas que ainda choram pelos cantos. Não é que o capitalismo tenha vencido. É que o capitalismo puro simplesmente é um engodo. Nunca existiu. Na primeira crise financeira, como se vê agora nos EUA e Europa, o Estado injeta bilhões, trilhões, no sistema financeiro. Que capitalismo é esse em que o Estado salva empresas falidas? Na verdade, existem centenas de sub-teorias econômicas, e uma boa parte delas, conhecidas como neo-liberais, têm como patrocinadores lobbistas e gansgsters do mercado financeiro, que defendem o Estado mínimo para o lado social, porém máximo para salvar banqueiros e emprestar dinheiro público a fundo perdido para empresários amigos.
E aí voltamos a Dantas. Como surgiu Dantas? Reproduzo abaixo um diálogo, interceptado pela PF, ainda no tempo de FHC, entre Ricardo Sérgio, diretor do BB e um ministro de Estado, o Luiz Carlos Mendonça de Barros.
"Mendonça de Barros - Está tudo acertado. Mas o Opportunity está com um problema de fiança. Não dá para o Banco do Brasil dar?
Ricardo Sérgio - Acabei de dar.
Mendonça de Barros - Não é para a Embratel, é para a Telemar [nome de fantasia da Tele Norte Leste].
Ricardo Sérgio- Dei para a Embratel, e 874 milhões para a Telemar. Nós estamos no limite da irresponsabilidade.
Mendonça de Barros - É isso aí, estamos juntos.
Ricardo Sérgio - Na hora que der merda, estamos juntos desde o início.
*
E assim Dantas, com dinheiro emprestado pelo BNDES e fiança do Banco do Brasil, iniciou seu império no mundo das telecomunicações. Lembrem que, nesta época, o setor telefonico estava às margens de profunda revolução tecnológica. As empresas que receberam, de bandeja, o patrimônio comunicacional brasileiro, ganharam uma mina de ouro virgem, ainda não explorada. Quem sabia disso? Quem sabia que o setor de telecomunicações viveria uma revolução, com a entrada dos celulares e das novas tecnologias de fibra ótica e aparelhos sem fio? Alguns figurões do governo sabiam, e mesmo assim venderam nosso patrimônio a preço de banana. Não sou contra a pritazação da telefonia brasileira, mas ela poderia ter sido feita com exigências de contra-partidas que promoveriam importantes lucros sociais ao país.
No caso da Vale do Rio Doce, houve um crime de lesa-pátria. A empresa foi vendida por preço subestimado. As autoridades federais, na ânsia de se desvencilhar de um patrimônio público, davam declarações menosprezantes, contribuindo para o estabelecimento de valores baixos de venda. O mercado de ferro também vivia uma situação promissora. O preço do ferro iria explodir a qualquer momento, por causa do crescimento notável da China e da Ásia em geral. Logo depois da privatização, os preços dispararam, por conta da entrada da China e a Vale ampliou seus lucros, agora enviados regularmente para o exterior.
Mas há outras lições que podemos tirar do episódio. Tenho pra mim que essas ondas de decepção são consequência de excesso de expectativas que as pessoas depositam no governo. É muito perigoso e certamente frustrante. Nenhum governo poderá cumprir a expectativa de sociedades complexas, divididas em milhares de segmentos econômicos, cada um com suas próprias demandas. Por isso, avaliações sobre governos devem ser ponderadas com muita racionalidade e pragmatismo.
Ontem, por exemplo, aconteceu uma coisa muito importante, e que poderá marcar profundamente a história. Não esperem editoriais candentes sobre isso, o que é lamentável. Lula sancionou o piso salarial de R$ 950 para todos os professores do ensino básico. Considerando que há professores de regiões afastadas que ganhavam até menos do que um salário mínimo e que temos mais de 800 mil professores no país, o fato constitui uma verdadeira revolução.
Quando a lei ainda tramitava no Congresso, o Globo publicou editorial atacando-a. Claro, as organizações Globo atacam tudo que é progressista no país. Outro dia, o cineasta José Padilha respondeu a um artigo idiota do Ali Kamel, que atacava seu filme Garapa, ainda não lançado, só porque Padilha mostra que o Bolsa Família ainda é pouco. O governo deveria ampliar ainda mais os programas sociais. Para Kamel, que prega o fim do Bolsa Família, ou sua redução radical, as propostas de Padilha são inadmissíveis.
Para Kamel, se a fome diminuiu, deve-se reduzir o Bolsa Família. É uma lógica absolutamente esquizóide, porque omite o fato cartesiano, cristalino, de que se é justamente o Bolsa Família que vem ajudando a diminuir a fome, cortá-lo seria um crime histórico. Além do mais, o BF não representa gasto expressivo para os cofres públicos, não se considerarmos o seu alcance e o seu retorno na forma de desenvolvimento econômico, que por sua vez gera renda, trabalho e mais impostos para o governo, produzindo um ciclo virtuoso.
O problema da decepção é que não devemos, a meu ver, apostar nossas expectativas em ninguém a não ser em nós mesmos. Nem Deus merece tanta confiança. Não há ser no mundo que mereça o dom e a maldição de ser o fiel de nossas esperanças. Se queremos uma nação melhor, não há outra alternativa senão melhorarmos a nós mesmos. Individualismo? Sim. Mas um individualismo responsável, cidadão, altruísta.
Em muitas ocasiões, já discorri aqui sobre o que penso das ideologias. Acho que o tempo da guerra fria terminou, para desgosto das viúvas que ainda choram pelos cantos. Não é que o capitalismo tenha vencido. É que o capitalismo puro simplesmente é um engodo. Nunca existiu. Na primeira crise financeira, como se vê agora nos EUA e Europa, o Estado injeta bilhões, trilhões, no sistema financeiro. Que capitalismo é esse em que o Estado salva empresas falidas? Na verdade, existem centenas de sub-teorias econômicas, e uma boa parte delas, conhecidas como neo-liberais, têm como patrocinadores lobbistas e gansgsters do mercado financeiro, que defendem o Estado mínimo para o lado social, porém máximo para salvar banqueiros e emprestar dinheiro público a fundo perdido para empresários amigos.
E aí voltamos a Dantas. Como surgiu Dantas? Reproduzo abaixo um diálogo, interceptado pela PF, ainda no tempo de FHC, entre Ricardo Sérgio, diretor do BB e um ministro de Estado, o Luiz Carlos Mendonça de Barros.
"Mendonça de Barros - Está tudo acertado. Mas o Opportunity está com um problema de fiança. Não dá para o Banco do Brasil dar?
Ricardo Sérgio - Acabei de dar.
Mendonça de Barros - Não é para a Embratel, é para a Telemar [nome de fantasia da Tele Norte Leste].
Ricardo Sérgio- Dei para a Embratel, e 874 milhões para a Telemar. Nós estamos no limite da irresponsabilidade.
Mendonça de Barros - É isso aí, estamos juntos.
Ricardo Sérgio - Na hora que der merda, estamos juntos desde o início.
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E assim Dantas, com dinheiro emprestado pelo BNDES e fiança do Banco do Brasil, iniciou seu império no mundo das telecomunicações. Lembrem que, nesta época, o setor telefonico estava às margens de profunda revolução tecnológica. As empresas que receberam, de bandeja, o patrimônio comunicacional brasileiro, ganharam uma mina de ouro virgem, ainda não explorada. Quem sabia disso? Quem sabia que o setor de telecomunicações viveria uma revolução, com a entrada dos celulares e das novas tecnologias de fibra ótica e aparelhos sem fio? Alguns figurões do governo sabiam, e mesmo assim venderam nosso patrimônio a preço de banana. Não sou contra a pritazação da telefonia brasileira, mas ela poderia ter sido feita com exigências de contra-partidas que promoveriam importantes lucros sociais ao país.
No caso da Vale do Rio Doce, houve um crime de lesa-pátria. A empresa foi vendida por preço subestimado. As autoridades federais, na ânsia de se desvencilhar de um patrimônio público, davam declarações menosprezantes, contribuindo para o estabelecimento de valores baixos de venda. O mercado de ferro também vivia uma situação promissora. O preço do ferro iria explodir a qualquer momento, por causa do crescimento notável da China e da Ásia em geral. Logo depois da privatização, os preços dispararam, por conta da entrada da China e a Vale ampliou seus lucros, agora enviados regularmente para o exterior.
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Miguel do Rosário
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quinta-feira, julho 17, 2008
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16 de julho de 2008
Intrigas no ar
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Tão vendo? O próprio presidente da República exigiu, publicamente, que ele permaneça e afirmou que, se ele realmente quiser sair, que o declare em alto e bom som e não faça insinuações. Os decepcionados-relâmpago, que no espaço de algumas horas se voltaram contra o trabalho exemplar da Polícia Federal, terão que se des-decepcionar. Por isso é sempre bom ter paciência.
No caso do delegado, é bem possível que ele tenha pedido mesmo para sair, esgotado com os ataques virulentos que passou a sofrer na mídia. E seus chefes aceitaram com entusiasmo, visto que se trata de uma missão com alta visibilidade midiática e, portanto, que pode ajudar a projetar qualquer profissional aos píncaros da glória. Ou foi obra de seus "superiores", com inveja da referida visibilidade alcançada pelo delegado ou por motivos ainda não explicados. De qualquer forma, chega de insinuações, né? Já basta lidarmos com um caso escabroso, cheio de intrigas e mistérios. Se nos aventurarmos no reino das conspirações, e o caso Dantas é bastante tentador neste sentido, não saímos nunca de lá.
O que me incomodou foi a falta de bom senso e a facilidade com que as pessoas aceitaram as intrigas plantadas na mídia. O Globo logo vendeu a teoria de que o delegado teria se afastado por que as investigações estariam chegando perto do Planalto, quando se sabe que a única ligação seria o telefonema entre o ex-deputado petista e Gilberto Carvalho, cujo conteúdo não tem nada de comprometedor.
A teoria de que Lula estaria tentando abafar o caso é esdrúxula. Se fosse para abafar, ele o teria feito antes do mesmo estourar mundialmente. Ao contrário, Lula disponibilizou até funcionários da Abin para auxiliar o delegado nas operações. Pelo que entendi dos textos do Bob Fernandes, o delegado encontrava problemas junto aos superiores imediatos, talvez com o próprio diretor da PF (mas isso também são conjecturas, e não muito críveis, visto que o delegado conseguiu tudo o que queria), mas recebia aval do Planalto, que acompanhava o caso discretamente, através do serviço secreto, e não interferiu no trabalho do delegado.
Bastaria uma ligação de Lula, no início ou no meio das investigações, para interromper as mesmas e destituir o delegado. É bom ir devagar com julgamentos precipitados. De fato, o anúncio do afastamento do policial foi desastrado. Um erro político crasso, que ajudou a converter um trunfo do governo (a prisão de Dantas) numa mancha explorada por oposição e "decepcionados". Tarso Genro não teve sensibilidade política para notá-lo. Lula, pelo visto, teve.
No caso do delegado, é bem possível que ele tenha pedido mesmo para sair, esgotado com os ataques virulentos que passou a sofrer na mídia. E seus chefes aceitaram com entusiasmo, visto que se trata de uma missão com alta visibilidade midiática e, portanto, que pode ajudar a projetar qualquer profissional aos píncaros da glória. Ou foi obra de seus "superiores", com inveja da referida visibilidade alcançada pelo delegado ou por motivos ainda não explicados. De qualquer forma, chega de insinuações, né? Já basta lidarmos com um caso escabroso, cheio de intrigas e mistérios. Se nos aventurarmos no reino das conspirações, e o caso Dantas é bastante tentador neste sentido, não saímos nunca de lá.
O que me incomodou foi a falta de bom senso e a facilidade com que as pessoas aceitaram as intrigas plantadas na mídia. O Globo logo vendeu a teoria de que o delegado teria se afastado por que as investigações estariam chegando perto do Planalto, quando se sabe que a única ligação seria o telefonema entre o ex-deputado petista e Gilberto Carvalho, cujo conteúdo não tem nada de comprometedor.
A teoria de que Lula estaria tentando abafar o caso é esdrúxula. Se fosse para abafar, ele o teria feito antes do mesmo estourar mundialmente. Ao contrário, Lula disponibilizou até funcionários da Abin para auxiliar o delegado nas operações. Pelo que entendi dos textos do Bob Fernandes, o delegado encontrava problemas junto aos superiores imediatos, talvez com o próprio diretor da PF (mas isso também são conjecturas, e não muito críveis, visto que o delegado conseguiu tudo o que queria), mas recebia aval do Planalto, que acompanhava o caso discretamente, através do serviço secreto, e não interferiu no trabalho do delegado.
Bastaria uma ligação de Lula, no início ou no meio das investigações, para interromper as mesmas e destituir o delegado. É bom ir devagar com julgamentos precipitados. De fato, o anúncio do afastamento do policial foi desastrado. Um erro político crasso, que ajudou a converter um trunfo do governo (a prisão de Dantas) numa mancha explorada por oposição e "decepcionados". Tarso Genro não teve sensibilidade política para notá-lo. Lula, pelo visto, teve.
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quarta-feira, julho 16, 2008
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Ainda sobre o Protógenes
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No post anterior, divaguei muito e queria agora ser mais claro nas minhas opiniões. O afastamento do delegado Protógenes Queiroz estimulou o coro dos eternos "frustrados" e "desencantados". Não sei porque as pessoas se desencantam com a política, como se a mesma fosse uma igreja ou uma seita na qual não acreditasse mais. A política é a própria civilização. Estamos ligados organicamente, como cidadãos brasileiros, ao que acontece na política. Mesmo que não queiramos nos envolver, essa já é uma atitude, que acho até respeitável. Discordo desses eternos discursos em prol do desencanto. O cara chega e fala: "Cansei! Estou desencantado! Estou decepcionado!". Ora, você vai ver que essa mesma pessoa já falou isso quinhentas vezes nos últimos meses. Seria melhor que ela se cansasse de uma vez por todas e esquecesse a política - há muitas coisas boas na vida e não acho que acompanhar jornais esteja entre elas.
Bem, então falemos sobre o afastamento do Protógenes. Os "desencantados", que estão quase virando um partido político, agora usam isso para corroborar teses oposicionistas, como se a prisão de Dantas & Cia fosse um mérito exclusivo dele e não da instituição como um todo, do Ministério da Justiça e do governo federal, que aumentaram os efetivos, as verbas, a independência dos delegados.
Quem prendeu Dantas não foi o delegado Protógenes Queiroz. Foi a Polícia Federal, com autorização do juiz Fausto De Sanctis. Que isso fique bem claro. Se o delegado foi afastado, isso se dá por vários motivos, ligados ou não ao caso Dantas. Em primeiro lugar, acredito que o delegado deve estar estressado emocionalmente. Ele liderou a prisão das pessoas mais poderosas do país, o que pôde comprovar no próprio processo investigativo, no valor das propinas oferecidas, nas conversas grampeadas, nas cifras movimentadas pelo bando. Natural que tenha ficado nervoso. A mídia quer descaracterizar o lado humano do delegado. Critica-o por ter usado adjetivos e opiniões em seu relatório, por sua linguagem. Ora, aquilo é justamente o seu relatório pessoal sobre o caso e Queiroz é um ser humano. Acusam-no de ser "messiânico", de imprimir um carater de luta contra o mal em suas investigações, assumindo o papel do "bem". Ora, mas não é isso mesmo? Queiroz não é o mocinho? Queiroz deve ter ficado muito impressionado, ao longo das investigações, com o poder dos réus, e certamente sua consciência e subconsciente associaram-nos - com toda a razão - a forças do mal. A mídia, com toda a sua pseudo-sofisticação intelectual, está sempre sendo messiânica e sempre assume o papel de paladina do bem contra o mal, porque um delegado, que tem um papel muito mais ativo e pessoal no combate à corrupção, que efetivamente prende bandidos, porque ele não pode sê-lo também?
A campanha midiática contra Queiroz, externada em diversos editoriais duros de grandes jornais, seria, por fim, a razão mais óbvia para seu afastamento. Fico pasmo com o cinismo de nossa mídia. Faz campanhas duríssimas contras as pessoas, e depois, quando essas pessoas cedem à campanha e se afastam da cena pública, não se atribui seu afastamento a essa campanha, que gera, naturalmente, efeitos psicológicos como depressão, ansiedade e stress, problemas que já temos sem precisar ser satanizados pela mídia.
Estou sendo ingênuo? O delegado pode ter sido afastado por forças superiores, que desejam abafar o caso? Sim, pode ser. Por isso mesmo Dantas deveria ter continuado preso. Pode ter acontecido algum suborno nas altas esferas da PF. Ok, o suborno poderia acontecer mesmo com Dantas preso, mas seria mais complicado. Tudo pode ter acontecido. O que não pode é as pessoas culparem a PF e o governo sem provas. A alquimia midiática está dando certo: estão cada vez mais transformando a prisão de Dantas num escândalo do governo. O culpado não é mais Al Capone: é o Eliot Ness. Aliás, o colunista da Folha "acusou" o delegado de ser uma mistura de Eliot Ness com Sassão Mutema. Ele o faz em tom de xingamento, mas é um tremendo ato falho. Desde quando qualificar um policial de Eliot Ness (mesmo que associado a Sassá Mutema, que era um cara ingênuo, mas honesto) é xingamento?
Se o afastamento de Queiroz tem motivações escusas, aí temos outro crime a ser solucionado pela PF. Não esqueçam que a PF tem cortado na própria carne sistematicamente. O que é ingenuidade, ou mais que isso, estupidez, é acreditar que a presidência da República não apoiasse a investigação contra Dantas ou que uma operação dessa importância não fosse do conhecimento das altas esferas da PF. Protógenes chegou inclusive a usar agentes da Abin, ligados à Presidência da República. O diretor da ABin, Paulo Lacerda, diz que não se envolveu pessoalmente, mas aí ele tergiversou - com a discreção obrigatória que um serviço secreto de inteligência deve demonstrar.
Enfim, há um pesado jogo de poder. A briga é de cachorro grande. A gente sabe muito bem de que lado a mídia corporativa joga. É importante sabermos também o nosso.
*
Até agora ninguém arriscou uma opinião sobre o nome da operação que prendeu Dantas, Satiagraha. O termo quer dizer resistência pacífica. Todos os que pedem atitudes agressivas do presidente Lula, para enfrentar mídia, Supremo, elite, lembrem disso. O Paulo Henrique Amorim está furioso. Mas ele faz o papel dele. Faz pressão. Não se pode levar ao pé da letra, todavia, quem acha que o presidente da república deveria entrar em conflito com o presidente do Supremo Tribunal Federal. Só se fosse louco.
A mídia abafou o protesto de mais de 400 juízes e até agora não deu nada sobre as dezenas de abaixo assinados e páginas em orkut criadas contra Gilmar Mendes. Ao agarrar-se a Dantas e a Gilmar Mendes, a mídia perdeu mais uma porção de apoiadores. Perdeu força política. Dantas já perdeu bilhões com sua prisão, conforme atestam os jornais. Perdeu apoio político também, porque, de uma hora para outra, ninguém mais quer estar ligado a ele. Esses fatos devem ser levados em consideração. Uma das lógicas mais importantes da resistência pacífica, da Satiagraha, é a paciência. Há aqueles que esperam resultados muito rápidos, espetaculares. Não é assim. Não podemos deixar que a alquimia midiática faça essa lavagem cerebral em toda a sociedade, que é transformar o desmantelamento da quadrilha de Dantas num ataque político às autoridades constituídas. Se emergem ligações de Dantas com o governo é só porque houve investigação por parte do próprio governo, através da Polícia Federal.
O que as pessoas deveriam entender é o seguinte. Mesmo que descobrissem que Lula, pessoalmente, agiu em favor de Dantas (o que não é o caso), essa descoberta seria mérito de Lula, por ter permitido que as investigações fosse realizadas sem interferência das altas esferas.
PHA está errado. Lula não tem medo. Ele resiste, pacificamente, e ganha eleições, popularidade e prende os banqueiros. O enfrentamento interessaria à mídia, sequiosa por colar seus surrados adesivos autoritários no governo. É preciso paciência. O processo contra Dantas está na justiça. Durará anos. O importante é que os empresários brasileiros agora pensarão duas vezes antes de enviar seu dinheiro para as Ilhas Cayman, fraudando o fisco e lavando dinheiro sujo. O desgaste profundo sofrido por Gilmar Mendes e o STF mostram que os próximos habeas corpus serão ainda mais caros.
Bem, então falemos sobre o afastamento do Protógenes. Os "desencantados", que estão quase virando um partido político, agora usam isso para corroborar teses oposicionistas, como se a prisão de Dantas & Cia fosse um mérito exclusivo dele e não da instituição como um todo, do Ministério da Justiça e do governo federal, que aumentaram os efetivos, as verbas, a independência dos delegados.
Quem prendeu Dantas não foi o delegado Protógenes Queiroz. Foi a Polícia Federal, com autorização do juiz Fausto De Sanctis. Que isso fique bem claro. Se o delegado foi afastado, isso se dá por vários motivos, ligados ou não ao caso Dantas. Em primeiro lugar, acredito que o delegado deve estar estressado emocionalmente. Ele liderou a prisão das pessoas mais poderosas do país, o que pôde comprovar no próprio processo investigativo, no valor das propinas oferecidas, nas conversas grampeadas, nas cifras movimentadas pelo bando. Natural que tenha ficado nervoso. A mídia quer descaracterizar o lado humano do delegado. Critica-o por ter usado adjetivos e opiniões em seu relatório, por sua linguagem. Ora, aquilo é justamente o seu relatório pessoal sobre o caso e Queiroz é um ser humano. Acusam-no de ser "messiânico", de imprimir um carater de luta contra o mal em suas investigações, assumindo o papel do "bem". Ora, mas não é isso mesmo? Queiroz não é o mocinho? Queiroz deve ter ficado muito impressionado, ao longo das investigações, com o poder dos réus, e certamente sua consciência e subconsciente associaram-nos - com toda a razão - a forças do mal. A mídia, com toda a sua pseudo-sofisticação intelectual, está sempre sendo messiânica e sempre assume o papel de paladina do bem contra o mal, porque um delegado, que tem um papel muito mais ativo e pessoal no combate à corrupção, que efetivamente prende bandidos, porque ele não pode sê-lo também?
A campanha midiática contra Queiroz, externada em diversos editoriais duros de grandes jornais, seria, por fim, a razão mais óbvia para seu afastamento. Fico pasmo com o cinismo de nossa mídia. Faz campanhas duríssimas contras as pessoas, e depois, quando essas pessoas cedem à campanha e se afastam da cena pública, não se atribui seu afastamento a essa campanha, que gera, naturalmente, efeitos psicológicos como depressão, ansiedade e stress, problemas que já temos sem precisar ser satanizados pela mídia.
Estou sendo ingênuo? O delegado pode ter sido afastado por forças superiores, que desejam abafar o caso? Sim, pode ser. Por isso mesmo Dantas deveria ter continuado preso. Pode ter acontecido algum suborno nas altas esferas da PF. Ok, o suborno poderia acontecer mesmo com Dantas preso, mas seria mais complicado. Tudo pode ter acontecido. O que não pode é as pessoas culparem a PF e o governo sem provas. A alquimia midiática está dando certo: estão cada vez mais transformando a prisão de Dantas num escândalo do governo. O culpado não é mais Al Capone: é o Eliot Ness. Aliás, o colunista da Folha "acusou" o delegado de ser uma mistura de Eliot Ness com Sassão Mutema. Ele o faz em tom de xingamento, mas é um tremendo ato falho. Desde quando qualificar um policial de Eliot Ness (mesmo que associado a Sassá Mutema, que era um cara ingênuo, mas honesto) é xingamento?
Se o afastamento de Queiroz tem motivações escusas, aí temos outro crime a ser solucionado pela PF. Não esqueçam que a PF tem cortado na própria carne sistematicamente. O que é ingenuidade, ou mais que isso, estupidez, é acreditar que a presidência da República não apoiasse a investigação contra Dantas ou que uma operação dessa importância não fosse do conhecimento das altas esferas da PF. Protógenes chegou inclusive a usar agentes da Abin, ligados à Presidência da República. O diretor da ABin, Paulo Lacerda, diz que não se envolveu pessoalmente, mas aí ele tergiversou - com a discreção obrigatória que um serviço secreto de inteligência deve demonstrar.
Enfim, há um pesado jogo de poder. A briga é de cachorro grande. A gente sabe muito bem de que lado a mídia corporativa joga. É importante sabermos também o nosso.
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Até agora ninguém arriscou uma opinião sobre o nome da operação que prendeu Dantas, Satiagraha. O termo quer dizer resistência pacífica. Todos os que pedem atitudes agressivas do presidente Lula, para enfrentar mídia, Supremo, elite, lembrem disso. O Paulo Henrique Amorim está furioso. Mas ele faz o papel dele. Faz pressão. Não se pode levar ao pé da letra, todavia, quem acha que o presidente da república deveria entrar em conflito com o presidente do Supremo Tribunal Federal. Só se fosse louco.
A mídia abafou o protesto de mais de 400 juízes e até agora não deu nada sobre as dezenas de abaixo assinados e páginas em orkut criadas contra Gilmar Mendes. Ao agarrar-se a Dantas e a Gilmar Mendes, a mídia perdeu mais uma porção de apoiadores. Perdeu força política. Dantas já perdeu bilhões com sua prisão, conforme atestam os jornais. Perdeu apoio político também, porque, de uma hora para outra, ninguém mais quer estar ligado a ele. Esses fatos devem ser levados em consideração. Uma das lógicas mais importantes da resistência pacífica, da Satiagraha, é a paciência. Há aqueles que esperam resultados muito rápidos, espetaculares. Não é assim. Não podemos deixar que a alquimia midiática faça essa lavagem cerebral em toda a sociedade, que é transformar o desmantelamento da quadrilha de Dantas num ataque político às autoridades constituídas. Se emergem ligações de Dantas com o governo é só porque houve investigação por parte do próprio governo, através da Polícia Federal.
O que as pessoas deveriam entender é o seguinte. Mesmo que descobrissem que Lula, pessoalmente, agiu em favor de Dantas (o que não é o caso), essa descoberta seria mérito de Lula, por ter permitido que as investigações fosse realizadas sem interferência das altas esferas.
PHA está errado. Lula não tem medo. Ele resiste, pacificamente, e ganha eleições, popularidade e prende os banqueiros. O enfrentamento interessaria à mídia, sequiosa por colar seus surrados adesivos autoritários no governo. É preciso paciência. O processo contra Dantas está na justiça. Durará anos. O importante é que os empresários brasileiros agora pensarão duas vezes antes de enviar seu dinheiro para as Ilhas Cayman, fraudando o fisco e lavando dinheiro sujo. O desgaste profundo sofrido por Gilmar Mendes e o STF mostram que os próximos habeas corpus serão ainda mais caros.
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As rodas estão girando
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O caso Dantas tomou proporções quase bíblicas, comprovando que o poder e a influência do controvertido banqueiro não eram lenda. Que outro preso motivaria reunião de emergência entre presidente da República, presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro da Defesa e Ministro da Justiça? Que outro preso ensejaria uma verdadeira revolução no judiciário brasileiro, com mais de 400 autoridades judiciárias (juízes, procuradores, desembargadores)assinando um manifesto contra Gilmar Mendes, chefe do STF? O delegado federal, Protógenes Queiroz, e mais dois delegados, foram afastados do caso. A blogosfera pega fogo. As rodas giram mais rápido. A mídia botou seus exércitos na rua para encontrarem o ângulo mais favorável ao escândalo.
Tem gente frustrada, outros revoltados. Eu estou muito tranquilo. As rodas da história continuam girando. Não conheço detalhes da operação. Não vou ler o relatório da PF. Analiso a situação sob um ponto-de-vista mais amplo. Pegaram Dantas. Ele e sua gangue. Ele pode ter conseguido seu habeas corpus, mas a que preço? Queimou seu cartucho mais importante: todo seu poder, seu dinheiro, seu talento serviram para quê? Para não passar cinco dias na cadeia? O homem que ganha bilhões, agora é um mortal que entra e sai do xilindró e está na boca do povo. O relatório do delegado, com milhares de gravações, emails e dados comprometedores, está publicado na internet. Perdeu.
A roda gira. O problema de se acreditar em Deus é que se esquece que a história é ainda mais poderosa que Ele, e tem suas leis próprias, sobrehumanas, terríveis, patéticas, surpreendentes. Quem poderá controlar a história? Nem Deus controla a a história: não pôde evitar que Adão e Eva comessem a maçã, nem esperava que Lúcifer, um de seus anjos mais poderosos, se rebelasse contra sua autoridade.
Dantas pode comprar o Supremo, pode comprar a mídia, pode comprar até Deus, mas poderá comprar a história? Poderá comprar nossas consciências? A roda gira e não é hora para tolas manifestações de desânimo. Sempre haverá bastilhas para serem destruídas. Quem irá controlar a história? Ninguém. A guerra no Iraque foi um fiasco. Obama pode ser o novo presidente americano e Chávez fez as pazes com Uribe. Lula está aí, encerrando a metade de seu segundo mandato. Já é história. Não se pode matar o que já aconteceu. As comparações estão feitas. Quem prendeu banqueiros? Quem prendeu Dantas?
Ah, essas rodas, sempre girando, incansáveis rodas, malucas rodas, que giram giram. As vezes, empurram o mundo de volta ao mesmo lugar de antes. Um cientista brasileiro contesta o Big Bang, a teoria de que o universo surgiu de uma explosão inicial. Segundo ele, o universo é eterno e vive momentos de fluxo e refluxo, expansão e retração. O Big Bang foi um grande momento de virada, de expansão. Em outras palavras, não há movimentos lineares, progressivos, e sim um eterno retorno, ciclos infinitos.
Assim a história. Assim o Brasil. Existem forças que estão acima de nós. Napoleão, o grande libertador da Europa, também foi um grande assassino. Um grande vitorioso e um colossal derrotado. A história do Brasil não está morta. Ainda teremos muitos presidentes, ciclos economicos, prisões espetaculares, copas do mundo, catástrofes. Acabamos de encontrar quantidades prodigiosas de petróleo em nosso litoral! Como dizia Maiakósvki, na brilhante tradução de Haroldo de Campos: se o planeta, para o júbilo, é imaturo, arranquemos alegria, ao futuro!
Entenda-se: o futuro pode ser um tempo pior que o presente. Mas tem grande vantagem sobre o presente: o futuro é uma abstração, e como tal pode ser moldado por nossos sonhos e expectativas. Também por nosso pessimismo, por que não? O pessimismo é o otimismo de sobretudo escuro e chapéu, fingindo ser um escritor noir.
As rodas. Antes de se decidirem se ficam alegres ou tristes, pensem nelas.
Tem gente frustrada, outros revoltados. Eu estou muito tranquilo. As rodas da história continuam girando. Não conheço detalhes da operação. Não vou ler o relatório da PF. Analiso a situação sob um ponto-de-vista mais amplo. Pegaram Dantas. Ele e sua gangue. Ele pode ter conseguido seu habeas corpus, mas a que preço? Queimou seu cartucho mais importante: todo seu poder, seu dinheiro, seu talento serviram para quê? Para não passar cinco dias na cadeia? O homem que ganha bilhões, agora é um mortal que entra e sai do xilindró e está na boca do povo. O relatório do delegado, com milhares de gravações, emails e dados comprometedores, está publicado na internet. Perdeu.
A roda gira. O problema de se acreditar em Deus é que se esquece que a história é ainda mais poderosa que Ele, e tem suas leis próprias, sobrehumanas, terríveis, patéticas, surpreendentes. Quem poderá controlar a história? Nem Deus controla a a história: não pôde evitar que Adão e Eva comessem a maçã, nem esperava que Lúcifer, um de seus anjos mais poderosos, se rebelasse contra sua autoridade.
Dantas pode comprar o Supremo, pode comprar a mídia, pode comprar até Deus, mas poderá comprar a história? Poderá comprar nossas consciências? A roda gira e não é hora para tolas manifestações de desânimo. Sempre haverá bastilhas para serem destruídas. Quem irá controlar a história? Ninguém. A guerra no Iraque foi um fiasco. Obama pode ser o novo presidente americano e Chávez fez as pazes com Uribe. Lula está aí, encerrando a metade de seu segundo mandato. Já é história. Não se pode matar o que já aconteceu. As comparações estão feitas. Quem prendeu banqueiros? Quem prendeu Dantas?
Ah, essas rodas, sempre girando, incansáveis rodas, malucas rodas, que giram giram. As vezes, empurram o mundo de volta ao mesmo lugar de antes. Um cientista brasileiro contesta o Big Bang, a teoria de que o universo surgiu de uma explosão inicial. Segundo ele, o universo é eterno e vive momentos de fluxo e refluxo, expansão e retração. O Big Bang foi um grande momento de virada, de expansão. Em outras palavras, não há movimentos lineares, progressivos, e sim um eterno retorno, ciclos infinitos.
Assim a história. Assim o Brasil. Existem forças que estão acima de nós. Napoleão, o grande libertador da Europa, também foi um grande assassino. Um grande vitorioso e um colossal derrotado. A história do Brasil não está morta. Ainda teremos muitos presidentes, ciclos economicos, prisões espetaculares, copas do mundo, catástrofes. Acabamos de encontrar quantidades prodigiosas de petróleo em nosso litoral! Como dizia Maiakósvki, na brilhante tradução de Haroldo de Campos: se o planeta, para o júbilo, é imaturo, arranquemos alegria, ao futuro!
Entenda-se: o futuro pode ser um tempo pior que o presente. Mas tem grande vantagem sobre o presente: o futuro é uma abstração, e como tal pode ser moldado por nossos sonhos e expectativas. Também por nosso pessimismo, por que não? O pessimismo é o otimismo de sobretudo escuro e chapéu, fingindo ser um escritor noir.
As rodas. Antes de se decidirem se ficam alegres ou tristes, pensem nelas.
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Miguel do Rosário
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quarta-feira, julho 16, 2008
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15 de julho de 2008
Onde os fracos têm vez
1 comentário
Anatole France dizia que a principal distinção entre homem e animais era a mentira. Não sei se concordo, porque os bichos sabem se disfarçar muito bem. Para mim, o que mais distingue os homens é sua fraqueza. E compreender e até gostar de suas fraquezas. Estou mais com Graciliano Ramos, que não queria livrar-se seus defeitos, porque sem eles, dizia, perderia sua própria personalidade. Lembro essas coisas para falar de uma peça de teatro.
Jornalista revoltado, ególatra, neurastênico, isola-se numa choupana distante da cidade, em busca de sossego. Um amigo o descobre lá e decide fazer uma visita, trazendo uma mala cheia de bebidas. Os dois iniciam um diálogo agressivo, marcado pelos furiosos desabafos do protagonista. Assim resumo personagens e trama de Efeito Urtigão, assinada e interpretada por Mario Bortolotto, com participação do ator Paulo de Tharso.
Marcos - o jornalista - não parece interessado na opinião de Emerson, o amigo. Diz, ou melhor, vocifera, o que pensa com uma franqueza brutal. O amigo está lá, atento. Vê-se, pelas caretas, que não aprova algumas coisas, mas entende tudo. Um dos elementos bonitos da peça é justamente essa compreensão. Que também é do espectador. O amigo de Marcos também somos nós, que ouvimos, divertidos, suas invectivas absurdas, ou nem tanto, tristemente sérias, hilariamente estapafúrdias.
O autor trabalha com muitos silêncios e uma trilha sonora extremamente precisa. Silêncio, olhares, discretas expressões faciais - realizando um teatro com notória influência do cinema, conforme o próprio autor reconhece. Com isso, faz um teatro dinâmico, moderno, sem cacoetes espetaculares ou circenses.
- Me diz o nome de uma só pessoa que gosta de você! Me dá um nome! Um só! - diz Marcos, desafiando o amigo (a citação é de memória, não literal). E aí temos outro elemento importante da peça: o afeto. Ou a falta de. A grande amargura, e também a grande liberdade, de Marcos é a ausência de afetos. Não tem amigos. Ou achava que não. Por isso a visita o perturba tanto. O amigo quer fazer uma reportagem sobre Marcos e sua vida de "Urtigão", o inesquecível personagem de Walt Disney. Eis um ponto engraçado: Marcos quer se comparar a Hunter Thompson, o fundador do jornalismo gonzo, que encerrou seus dias isolado num rancho, atirando nos raros e imprudentes visitantes. Mas Emerson prefere equipará-lo a um antipático caipira, que também perseguia, a tiros, os incautos intrusos.
Amizade, revolta e solidão. Eis os elementos centrais desse belo trabalho de Bortolotto, que aprendeu a fazer arte com os mil defeitos e fraquezas que nos fazem tão absurdos, patéticos - e surpreendentes.
PS: Neste final de semana, Bortolotto volta ao Rio com Kerouac, peça que ainda não assisti, mas da qual tenho excelentes referências. No teatro Ziembiski, de sexta a domingo.
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Miguel do Rosário
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terça-feira, julho 15, 2008
1 comentário # Etichette: Resenha, Teatro
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14 de julho de 2008
As cartas estão na mesa
2 comentarios
O caso Dantas elevou a temperatura política e intensificou o debate. Para a blogosfera, tem sido um prato cheio. Talvez estejamos, inclusive, num ponto de virada. Até o momento, a blogosfera tem ficado a reboque da mídia corporativa. Influencia, mas não determina. Sugere, denuncia, mas quem dá a palavra final ainda são editoriais de Folha, Estadão e Globo. As coisas podem ser diferentes agora. A velocidade com que surgiram abaixo-assinados, paginas no Orkut e agendas de protesto pode converter o caso Dantas no primeiro importante momento político do país em que a sociedade mobiliza-se, em grande escala, a partir exclusivamente de opiniões trocadas na web.
Irônico notar que o próprio lacerdismo midiático, tão cultuado nos últimos anos, fugiu ao controle de seus criadores. A principal crítica às operações da Polícia Federal concentram-se numa suposta agressão à "imagem" dos acusados. Desde quando nossos valorosos editorialistas preocupam-se com isso? Os milhões de leitores e espectadores, acostumados ao clima de exposição circense e pré-julgamentos, voltam-se com a mesma gana para os "banqueiros" ladrões, contra os quais há muito mais provas do que em outros casos.
O grave, no entanto, é ver jornais como a Folha de São Paulo iniciando um verdadeiro ataque às instituições, à Polícia Federal e à Justiça. No domingo, a Folha procura desmoralizar o relatório do delegado responsável por conta de insignificantes erros de grafia. É vergonhoso. Hoje a Folha volta com outras estratégias torpes, como editorializar a seção de Cartas, dando destaque as que aplaudem o criminoso golpe dado por Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, que atropelou instâncias inferiores e deu hábeas corpus a um empresário que, está provado, tentou subornar um policial federal com 1 milhão de dólares. Outra estratégia é confundir a opinião pública com entrevistas direcionadas e matérias tendenciosas. A discussão em torno do uso de algemas é lateral. Não pode ser usada para desmoralizar o trabalho de policiais e juízes.
A mídia eleva artificialmente o clamor contra o uso de grampos, por exemplo. Querem garrotear a principal ferramenta da polícia para coibir os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro? Os grampos são autorizados pela Justiça e, se estão dando resultados, porque criticá-los? Se há excessos, não é da PF, e sim de empresários e políticos que agem descaradamente para beneficiar a si mesmos em detrimento do país.
*
Se você quiser participar, assine petição abaixo, pedindo a saída de Gilmar Mendes do STF:
http://www.petitiononline.com/w267x65/
*
O Idelber continua fazendo uma excelente cobertura do caso Dantas.
*
Em São Paulo, prepara-se grande manifestação contra Gilmar Mendes:
http://edu.guim.blog.uol.com.br/
Irônico notar que o próprio lacerdismo midiático, tão cultuado nos últimos anos, fugiu ao controle de seus criadores. A principal crítica às operações da Polícia Federal concentram-se numa suposta agressão à "imagem" dos acusados. Desde quando nossos valorosos editorialistas preocupam-se com isso? Os milhões de leitores e espectadores, acostumados ao clima de exposição circense e pré-julgamentos, voltam-se com a mesma gana para os "banqueiros" ladrões, contra os quais há muito mais provas do que em outros casos.
O grave, no entanto, é ver jornais como a Folha de São Paulo iniciando um verdadeiro ataque às instituições, à Polícia Federal e à Justiça. No domingo, a Folha procura desmoralizar o relatório do delegado responsável por conta de insignificantes erros de grafia. É vergonhoso. Hoje a Folha volta com outras estratégias torpes, como editorializar a seção de Cartas, dando destaque as que aplaudem o criminoso golpe dado por Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, que atropelou instâncias inferiores e deu hábeas corpus a um empresário que, está provado, tentou subornar um policial federal com 1 milhão de dólares. Outra estratégia é confundir a opinião pública com entrevistas direcionadas e matérias tendenciosas. A discussão em torno do uso de algemas é lateral. Não pode ser usada para desmoralizar o trabalho de policiais e juízes.
A mídia eleva artificialmente o clamor contra o uso de grampos, por exemplo. Querem garrotear a principal ferramenta da polícia para coibir os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro? Os grampos são autorizados pela Justiça e, se estão dando resultados, porque criticá-los? Se há excessos, não é da PF, e sim de empresários e políticos que agem descaradamente para beneficiar a si mesmos em detrimento do país.
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Se você quiser participar, assine petição abaixo, pedindo a saída de Gilmar Mendes do STF:
http://www.petitiononline.com/w267x65/
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O Idelber continua fazendo uma excelente cobertura do caso Dantas.
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Em São Paulo, prepara-se grande manifestação contra Gilmar Mendes:
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Miguel do Rosário
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segunda-feira, julho 14, 2008
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12 de julho de 2008
Ferrado
2 comentarios
As coisas esquentando novamente e eu às voltas com um gravíssimo problema pessoal. Em virtude da insensata decisão de fazer uma aula de boxe, minha inflamaçao na articulação do ombro direito agravou-se e estou sofrendo horrivelmente. Com o braço inutilizado, não posso escrever senão com o esquerdo, e ainda não me acostumei a isso. A solução é esperar a crise (a minha) passar. Logo agora, que eu ia espinafrar o Gilmar Mendes... Acompanhem o caso pelo excelente blog do Idelber Avelar.
http://www.idelberavelar.com/
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9 de julho de 2008
Cortaram a cabeça da Medusa?
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Medusa nem sempre foi baranga. Antes de se transformar num monstro de olhar petrificador e cabelos escobreados, havia sido uma ninfa marítima, a mais linda. Seu erro foi se deixar seduzir por Poseidon, soberano das águas, e transar com ele no sagrado templo da bela e agressiva deusa de olhos brilhantes. Atenas irrita-se profundamente com a profanação e converte Medusa na aberração a que já nos referimos.
Daniel Dantas, o jovem e bem sucedido banqueiro, herói da privatização, é a nossa Medusa. Quem foi seu Poseidon? Quem o convenceu a profanar o templo de Atenas? Poseidon talvez tenha sido FHC? O templo de Atenas seria a nação brasileira?
O poder de nossa Medusa assustava a todos. Jornalistas, promotores, juízes, que ousavam investigá-la, convertiam-se em párias da sociedade, com a ajuda prestimosa da revista Veja & Cia. Ninguém podia falar nada. Ninguém podia sequer olhar para Dantas.
Sua prisão pode significar o corte da cabeça da Medusa. Nosso Perseus: a Polícia Federal.
Está sendo divertido assistir ao alvoroço da mídia em tentar minimizar a ganho político que o governo pode auferir com a prisão de Dantas, através da insistência em conectá-la somente ao caso do mensalão, do qual o empresário teria sido o principal patrocinador. É divertido por várias razões:
1) As investigações que levaram à prisão de Dantas iniciaram antes da existência do mensalão. Os jornalistas mais sérios do país, entre eles Bob Fernandes, do portal Terra, estão irritados com mais essa tentativa de manipulação da realidade, até porque os valores movimentados ilegalmente por Dantas são infinitivamente superiores aos caraminguás que os barnabés do mensalão sacavam na caixa do Banco Rural, no Shopping Brasília. Entretanto, Dantas envolveu-se, de fato, com o mensalão, e aí saltamos para a segunda razão.
2) Dantas foi um dos principais patrocinadores do mensalão. Mesmo que sua prisão, portanto, se relacionasse exclusivamente ao suposto pagamento de propina a parlamentares, o que não é o caso, mesmo que assim o fosse, ela ajuda a responder a muitas perguntas. Não deixa de ser irônico que os mesmos que vociferaram furiosamente contra o escândalo do mensalão, não se rejubilem que o quebra-cabeças esteja sendo reconstituído. Até parece que não lhes interessa saber a verdade e sim manter acesa a fúria santa contra os abomináveis petistas.
De resto, a prisão de Dantas é apenas mais um episódio (talvez o clímax) de uma série de ações contra o crime de colarinho branco. Mais alguns anos de combate à corrupção e teremos feito uma verdadeira limpeza ética no país. Daniel Dantas era um dos mais poderosos chantagistas do Brasil e, aparentemente, havia coptado, através de suborno ou ameaça, até áreas do governo federal.
O que nos deixa perplexos e apreensivos é ver o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, vir a público e, em vez de parabenizar o trabalho da PF, criticá-la levianamente como "espetáculo". É como se o Supremo americano, ao assistir na tv a prisão de Al Capone, desacreditasse-a como "espetacular". Ora, é claro que foi um espetáculo. A PF agiu sob ordens da Justiça. O espetáculo fica por conta da mídia, que vive de espetáculo. O juiz confunde as coisas: é pertinente criticar a sociedade do espetáculo, mas no âmbito acadêmico. Não é saudável criticar uma instituição valiosa, e bem no momento em que realiza uma operação importante. É claro que a PF tem seus erros, tem seus quadros duvidosos, é claro que ela, como qualquer instituição - incluindo o Judiciário - precisa ser aperfeiçoada, mas há que se medir o momento das críticas. As proferidas por Mendes atingem o próprio cerne moral da PF e isso não é legal: é autoritário, é golpista.
*
Eliane Cantanhede disse o seguinte outro dia: "muito se fala em esquerdização da América Latina, mas quem tá bombando mesmo é o Alvaro Uribe". Pois é, temos mais de vinte países latino-americanos com presidentes de esquerda, alguns muito mais populosos e ricos que a Colômbia, como Argentina e Brasil, mas, para a colunista da Folha, Uribe vale mais que todos. Repete-se a todo momento que ele tem 80% de boa avaliação. Cantanhede insinua que pode chegar a 90%. É patético. Não se dá nenhuma informação sobre a fonte desses dados. Qual o instituto? Quantas pessoas entrevistou? Qual foi a metodologia? A colunista, que foi enviada à Colômbia, também poderia nos fornecer mais dados sobre a situação econômica e social do país para que pudéssemos, com base em informações confiáveis, saber se Uribe, a despeito de ser um direitista aliado aos EUA, faz um bom governo ou não.
*
Outro fato que me deixou chateado foi o abafamento do programa de fomento à agricultura empresarial e familiar, lançado semana passada pelo governo. Serão alocados, ainda este ano, mais de R$ 78 bilhões, com foco no aumento da produtividade, melhora da infra-estrutura e apoio aos pequenos produtores. O financiamento governamental à agricultura familiar cresceu de menos de R$ 2 bilhões por ano para mais de R$ 11 bilhões este ano, com expectativa de ultrapassar R$ 25 bilhões por ano até 2010.
Esse programa é a resposta mais inteliente e concreta ao problema da inflação, que vem sendo causada sobretudo pela alta no preço dos alimentos.
Muitos analistas precipitados acreditam que a inflação irá corroer popularidade de Lula, omitindo que a alta no preço dos produtos agrícolas tem seu lado positivo: beneficia dezenas e dezenas de milhões de trabalhadores rurais, assim como suas cidades. O alarmismo em torno da inflação de alguns alimentos também omite que o pobre, diante do aumento excessivo do preço de um produto, pode sempre substituí-lo por outro de preço mais competitivo. Em vez de comprar feijão, compra lentilha. Em vez de comprar carne vermelha, compra frango. Em vez de comprar frango, vira vegetariano temporariamente. Impulsionada pelo bom momento para os preços dos produtos agropecuários, a produção brasileira vem crescendo vigorosamente nos últimos anos, e deverá bater recordes sucessivos nos próximos dez anos.
A estabilidade do plano Real, tão importante para o país, por exemplo, deu-se às custas do produtor rural. Lembro que se falava na "âncora verde". A inflação foi debelada juntamente com a renda do produtor, sobretudo o pequeno, responsável por mais de dois terços da produção nacional de gêneros alimentícios, que não recebia recursos governamentais. A agricultura empresarial foi igualmente prejudicada, por uma política cambial rígida, intervencionista, artificial, que mantinha o Real paritário ao dólar.
Os jornalões mandam repórteres ao Japão, para cobrir o G8, aos EUA, para cobrir a campanha presidencial americana, à Colômbia, para saber sobre as Farc, mas não mandam ninguém para as áreas rurais, apurar as condições de vida dos produtores rurais, responsáveis por grande parte do Produto Interno Bruto e, neste momento, protagonistas dessa suposta "espiral" inflacionária. Se fossem ao campo, poderiam apurar informações mais precisas sobre a realidade do campo e, inclusive, ajudar as autoridades a encontrarem políticas mais justas para combater a alta dos preços.
Daniel Dantas, o jovem e bem sucedido banqueiro, herói da privatização, é a nossa Medusa. Quem foi seu Poseidon? Quem o convenceu a profanar o templo de Atenas? Poseidon talvez tenha sido FHC? O templo de Atenas seria a nação brasileira?
O poder de nossa Medusa assustava a todos. Jornalistas, promotores, juízes, que ousavam investigá-la, convertiam-se em párias da sociedade, com a ajuda prestimosa da revista Veja & Cia. Ninguém podia falar nada. Ninguém podia sequer olhar para Dantas.
Sua prisão pode significar o corte da cabeça da Medusa. Nosso Perseus: a Polícia Federal.
Está sendo divertido assistir ao alvoroço da mídia em tentar minimizar a ganho político que o governo pode auferir com a prisão de Dantas, através da insistência em conectá-la somente ao caso do mensalão, do qual o empresário teria sido o principal patrocinador. É divertido por várias razões:
1) As investigações que levaram à prisão de Dantas iniciaram antes da existência do mensalão. Os jornalistas mais sérios do país, entre eles Bob Fernandes, do portal Terra, estão irritados com mais essa tentativa de manipulação da realidade, até porque os valores movimentados ilegalmente por Dantas são infinitivamente superiores aos caraminguás que os barnabés do mensalão sacavam na caixa do Banco Rural, no Shopping Brasília. Entretanto, Dantas envolveu-se, de fato, com o mensalão, e aí saltamos para a segunda razão.
2) Dantas foi um dos principais patrocinadores do mensalão. Mesmo que sua prisão, portanto, se relacionasse exclusivamente ao suposto pagamento de propina a parlamentares, o que não é o caso, mesmo que assim o fosse, ela ajuda a responder a muitas perguntas. Não deixa de ser irônico que os mesmos que vociferaram furiosamente contra o escândalo do mensalão, não se rejubilem que o quebra-cabeças esteja sendo reconstituído. Até parece que não lhes interessa saber a verdade e sim manter acesa a fúria santa contra os abomináveis petistas.
De resto, a prisão de Dantas é apenas mais um episódio (talvez o clímax) de uma série de ações contra o crime de colarinho branco. Mais alguns anos de combate à corrupção e teremos feito uma verdadeira limpeza ética no país. Daniel Dantas era um dos mais poderosos chantagistas do Brasil e, aparentemente, havia coptado, através de suborno ou ameaça, até áreas do governo federal.
O que nos deixa perplexos e apreensivos é ver o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, vir a público e, em vez de parabenizar o trabalho da PF, criticá-la levianamente como "espetáculo". É como se o Supremo americano, ao assistir na tv a prisão de Al Capone, desacreditasse-a como "espetacular". Ora, é claro que foi um espetáculo. A PF agiu sob ordens da Justiça. O espetáculo fica por conta da mídia, que vive de espetáculo. O juiz confunde as coisas: é pertinente criticar a sociedade do espetáculo, mas no âmbito acadêmico. Não é saudável criticar uma instituição valiosa, e bem no momento em que realiza uma operação importante. É claro que a PF tem seus erros, tem seus quadros duvidosos, é claro que ela, como qualquer instituição - incluindo o Judiciário - precisa ser aperfeiçoada, mas há que se medir o momento das críticas. As proferidas por Mendes atingem o próprio cerne moral da PF e isso não é legal: é autoritário, é golpista.
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Eliane Cantanhede disse o seguinte outro dia: "muito se fala em esquerdização da América Latina, mas quem tá bombando mesmo é o Alvaro Uribe". Pois é, temos mais de vinte países latino-americanos com presidentes de esquerda, alguns muito mais populosos e ricos que a Colômbia, como Argentina e Brasil, mas, para a colunista da Folha, Uribe vale mais que todos. Repete-se a todo momento que ele tem 80% de boa avaliação. Cantanhede insinua que pode chegar a 90%. É patético. Não se dá nenhuma informação sobre a fonte desses dados. Qual o instituto? Quantas pessoas entrevistou? Qual foi a metodologia? A colunista, que foi enviada à Colômbia, também poderia nos fornecer mais dados sobre a situação econômica e social do país para que pudéssemos, com base em informações confiáveis, saber se Uribe, a despeito de ser um direitista aliado aos EUA, faz um bom governo ou não.
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Outro fato que me deixou chateado foi o abafamento do programa de fomento à agricultura empresarial e familiar, lançado semana passada pelo governo. Serão alocados, ainda este ano, mais de R$ 78 bilhões, com foco no aumento da produtividade, melhora da infra-estrutura e apoio aos pequenos produtores. O financiamento governamental à agricultura familiar cresceu de menos de R$ 2 bilhões por ano para mais de R$ 11 bilhões este ano, com expectativa de ultrapassar R$ 25 bilhões por ano até 2010.
Esse programa é a resposta mais inteliente e concreta ao problema da inflação, que vem sendo causada sobretudo pela alta no preço dos alimentos.
Muitos analistas precipitados acreditam que a inflação irá corroer popularidade de Lula, omitindo que a alta no preço dos produtos agrícolas tem seu lado positivo: beneficia dezenas e dezenas de milhões de trabalhadores rurais, assim como suas cidades. O alarmismo em torno da inflação de alguns alimentos também omite que o pobre, diante do aumento excessivo do preço de um produto, pode sempre substituí-lo por outro de preço mais competitivo. Em vez de comprar feijão, compra lentilha. Em vez de comprar carne vermelha, compra frango. Em vez de comprar frango, vira vegetariano temporariamente. Impulsionada pelo bom momento para os preços dos produtos agropecuários, a produção brasileira vem crescendo vigorosamente nos últimos anos, e deverá bater recordes sucessivos nos próximos dez anos.
A estabilidade do plano Real, tão importante para o país, por exemplo, deu-se às custas do produtor rural. Lembro que se falava na "âncora verde". A inflação foi debelada juntamente com a renda do produtor, sobretudo o pequeno, responsável por mais de dois terços da produção nacional de gêneros alimentícios, que não recebia recursos governamentais. A agricultura empresarial foi igualmente prejudicada, por uma política cambial rígida, intervencionista, artificial, que mantinha o Real paritário ao dólar.
Os jornalões mandam repórteres ao Japão, para cobrir o G8, aos EUA, para cobrir a campanha presidencial americana, à Colômbia, para saber sobre as Farc, mas não mandam ninguém para as áreas rurais, apurar as condições de vida dos produtores rurais, responsáveis por grande parte do Produto Interno Bruto e, neste momento, protagonistas dessa suposta "espiral" inflacionária. Se fossem ao campo, poderiam apurar informações mais precisas sobre a realidade do campo e, inclusive, ajudar as autoridades a encontrarem políticas mais justas para combater a alta dos preços.
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Miguel do Rosário
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quarta-feira, julho 09, 2008
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6 de julho de 2008
Horácio, Odes XI
1 comentário
Tu ne quaesieris, scire nefas, quem mihi, quem tibi
finem di dederint, Leuconoe, nec Babylonios
temptaris numeros. ut melius, quidquid erit, pati.
seu pluris hiemes seu tribuit Iuppiter ultimam,
quae nunc oppositis debilitat pumicibus mare
Tyrrhenum: sapias, uina liques, et spatio breui
spem longam reseces. dum loquimur, fugerit inuida
aetas: carpe diem quam minimum credula postero.
Não sondes o destino, amiga, que os deuses
nos reservaram, nem interrogues
os astrólogos da babilônia.
Enfrentemos o que vier, seja o que for.
Quer Júpiter te conceda muitos invernos
quer seja este o último
em que as ondas do Tirreno
castigam os rochedos,
sê sábia e prova teus vinhos.
A vida é breve,
não alimentes longas esperanças.
Enquanto falamos,
o tempo, invejoso, foge:
vive o presente,
o menos crédula possível
no dia seguinte.
(tradução Miguel do Rosário, com influència de M.B.R)
finem di dederint, Leuconoe, nec Babylonios
temptaris numeros. ut melius, quidquid erit, pati.
seu pluris hiemes seu tribuit Iuppiter ultimam,
quae nunc oppositis debilitat pumicibus mare
Tyrrhenum: sapias, uina liques, et spatio breui
spem longam reseces. dum loquimur, fugerit inuida
aetas: carpe diem quam minimum credula postero.
Não sondes o destino, amiga, que os deuses
nos reservaram, nem interrogues
os astrólogos da babilônia.
Enfrentemos o que vier, seja o que for.
Quer Júpiter te conceda muitos invernos
quer seja este o último
em que as ondas do Tirreno
castigam os rochedos,
sê sábia e prova teus vinhos.
A vida é breve,
não alimentes longas esperanças.
Enquanto falamos,
o tempo, invejoso, foge:
vive o presente,
o menos crédula possível
no dia seguinte.
(tradução Miguel do Rosário, com influència de M.B.R)
5 de julho de 2008
efervescência
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Esse frenesi, angustiado, eufórico, desesperado, apoteótico, duvido que exista, com tanta intensidade, em outro país, em outra cidade. Acompanhem a vibração dessa rapaziada e me digam. O legal também é a volúpia e a inteligência com que a galera está usando a rede para divulgar sua arte, sua força, suas idéias. É uma galera que não faz arte para aparecer, mas para extravasar, deixar rolar, desembaçar o mundo.
http://www.myspace.com/verboscurtos
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# Escrito por
Miguel do Rosário
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sábado, julho 05, 2008
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Bortolotto no Rio
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Uma rodada de peças do dramaturgo , escritor, roteirista e, sobretudo, hábil sinuqueiro, Mario Bortolotto, estréia hoje no teatro Ziembiski, na Tijuca. A 2ª Mostra do grupo Cemitério de Automóveis ajuda o Rio a combater o provincianismo de seu teatro, dominado por títulos como "não-sou-feliz-mas-tenho-marido". O sinuqueiro & poeta londrinense radicado em São Paulo, mais especificamente na Praça Roosevelt, terá peças exibidas durante todo o mês de julho. Serão quatro peças, uma em cada fim de semana. Bem vindo, brother.
# Escrito por
Miguel do Rosário
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sexta-feira, julho 04, 2008
Seja o primeiro a comentar! # Etichette: Teatro
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Conversando sobre filmes
2 comentarios
Um dos problemas da crítica é que ela, na ânsia de se mostrar séria e profissional, esquece que é também uma simples opinião. O que não a diminui. Ao contrário. Uma opinião sincera vale mais que dez críticas. Outro problema é que ainda se superestima a erudição. Pior, as pessoas se acham eruditas muito facilmente. À sombra da internet, desenvolveu-se toda uma geração de nerds pedantes que acreditam piamente na sua superioridade cultural perante o comum dos mortais. No entanto, só a experiência produz verdadeiro conhecimento. Não falo de encher a cara, transar com meninos e meninas, arrumar briga no maracanã. A experiência que me refiro é VIVER a cultura. De que adianta ler um livro se não se o VIVENCIA. De que adianta ler Henry Miller como quem estuda o manual do Page Maker? Qual o sentido de ler Rimbaud se não for para perder os sentidos?
Por isso a ignorância é tão comum entre letrados. Eruditos, acadêmicos, especialistas, doutores, jornalistas, advogados, são títulos vazios. A cultura é algo muito superior, mais subjetivo, sacana, delicado, angustiante, estranho. Experiente.
Dito isto, queria dar minha opinião sobre Batismo de Sangue, dirigido por Helvécio Ratón e inspirado no livro homônimo, do Frei Betto. Trata-se de um filme horrível, que nega as regras mais básicas da ficção, como desenvolver o aspecto humano dos personagens. Não há personagens. São todos marionetes de um diretor preocupado exclusivamente em contar uma história convencional. É triste ver que os bravos religiosos que lutaram contra a ditadura tenham sido transformados em espantalhos de óculos, figuras óbvias, artificiais, que agem como franksteins desfibrados e sonsos.
Eu gosto de filmes políticos. Mas de filme bom. Eles não usam black tie, por exemplo, do Gianfracesco Guarnieri, é um dos mais belos filmes brasileiros. É um filme político do começo ao fim, a começar pelo tema, que é a greve entre os operários de uma fábrica do ABC paulista. Mas é, acima de tudo, um filme humano. Um filme universal. Onde os traidores e os covardes são tão humanos quanto os mocinhos. Batismo de Sangue, com seu maniqueísmo tosco, fradecos santos contra os demônios da ditadura, agride a complexidade moral do homem, da história, da política.
Semanas atrás, vi outro filme muito ruim. Brasília 18%. Clichê oportunista, barato. O diretor é um grande nome do cinema, o Nelson Pereira dos Santos, que possui trabalhos admiráveis. Não precisava desse filme para manchar sua carreira. Enfim, coisas da vida.
Bom mesmo é Ao Sul do Meu Corpo, um filme raro de se encontrar em locadoras e passar na tv, do grande Paulo Cesar Saraceni. Nuno Leal Maia faz o aluno, Paulo Cesar Pereio faz o professor. É um filme que também possui certo apelo político (foi um dos mais censurados durante a ditadura), mas é sobretudo poético, humanista e universal. O filme foi regravado em 2001, com o nome Duas Vezes com Helena, com Fábio Assunção no papel do aluno, e não possui 1% da graça e força dramática da primeira versão.
Por isso a ignorância é tão comum entre letrados. Eruditos, acadêmicos, especialistas, doutores, jornalistas, advogados, são títulos vazios. A cultura é algo muito superior, mais subjetivo, sacana, delicado, angustiante, estranho. Experiente.
Dito isto, queria dar minha opinião sobre Batismo de Sangue, dirigido por Helvécio Ratón e inspirado no livro homônimo, do Frei Betto. Trata-se de um filme horrível, que nega as regras mais básicas da ficção, como desenvolver o aspecto humano dos personagens. Não há personagens. São todos marionetes de um diretor preocupado exclusivamente em contar uma história convencional. É triste ver que os bravos religiosos que lutaram contra a ditadura tenham sido transformados em espantalhos de óculos, figuras óbvias, artificiais, que agem como franksteins desfibrados e sonsos.
Eu gosto de filmes políticos. Mas de filme bom. Eles não usam black tie, por exemplo, do Gianfracesco Guarnieri, é um dos mais belos filmes brasileiros. É um filme político do começo ao fim, a começar pelo tema, que é a greve entre os operários de uma fábrica do ABC paulista. Mas é, acima de tudo, um filme humano. Um filme universal. Onde os traidores e os covardes são tão humanos quanto os mocinhos. Batismo de Sangue, com seu maniqueísmo tosco, fradecos santos contra os demônios da ditadura, agride a complexidade moral do homem, da história, da política.
Semanas atrás, vi outro filme muito ruim. Brasília 18%. Clichê oportunista, barato. O diretor é um grande nome do cinema, o Nelson Pereira dos Santos, que possui trabalhos admiráveis. Não precisava desse filme para manchar sua carreira. Enfim, coisas da vida.
Bom mesmo é Ao Sul do Meu Corpo, um filme raro de se encontrar em locadoras e passar na tv, do grande Paulo Cesar Saraceni. Nuno Leal Maia faz o aluno, Paulo Cesar Pereio faz o professor. É um filme que também possui certo apelo político (foi um dos mais censurados durante a ditadura), mas é sobretudo poético, humanista e universal. O filme foi regravado em 2001, com o nome Duas Vezes com Helena, com Fábio Assunção no papel do aluno, e não possui 1% da graça e força dramática da primeira versão.
3 de julho de 2008
Artigo meu na Inteligência
3 comentarios
O Wanderley Guilherme dos Santos me convidou e eu aceitei. Eis aí o resultado. É um artigo sobre a blogosfera brasileira. Fiz comparações, juntei dados, tirei conclusões. Leiam e digam o que vocês acham.
O título do artigo é "Quem tem blog vai a Roma".
http://www.insightnet.com.br/inteligencia/41/
O título do artigo é "Quem tem blog vai a Roma".
http://www.insightnet.com.br/inteligencia/41/
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Miguel do Rosário
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quinta-feira, julho 03, 2008
3 comentarios # Etichette: Artigo, blogosfera
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1 de julho de 2008
O maior clássico da literatura universal
4 comentarios
Ás vezes acho que a Ilíada é o maior clássico da literatura universal. Todos os elementos de um romance moderno estão presentes. Mais que isso, os germes da cultura ocidental, esse caldo de orgulho, caos, ambição, generosidade, fervilham nas páginas dessa obra - cuja força dramática e estrutura formal harmonizam-se de forma tão sofisticada que chego a duvidar se houve alguma que jamais se lhe igualou.
O livro narra a famosa guerra de Tróia, e sua veracidade histórica hoje, depois de altos e baixos (anos de adventismo absoluto seguidos de ceticismo total), é bastante respeitada. Mas isso não importa tanto, já que, havendo ou não deturpado fatos reais, o glorioso relato de Homero tornou-se a primeira grande coluna da civilização grega, feita de material muito mais duradouro que o mármore.
Não há escritor ocidental que não seja herdeiro direto da tradição homérica. Eu amo tanto esse livro que estou estudando grego antigo para lê-lo no original. Antigamente, o ensino de grego, assim como latim, era obrigatório em escolas públicas. Parece uma excentricidade, e é mesmo - provavelmente eu desista desse empreendimento dentro de alguns dias, como eu fiz com o árabe, o chinês e o alemão. Até o início do século XX, quase todos os grandes escritores tinham bom conhecimento da língua de Sócrates. Seja como for, já consegui ler os primeiros versos.
Abaixo uma transliteração fonética dos primeiros versos da Ilíada:
menin aeide thea Peleiadeo Achileos
oulomenen, he muri' Achaiois alge' etheke
Os mesmos versos no original:
μῆνιν ἄειδε θεὰ Πηληϊάδεω Ἀχιλῆος
οὐλομένην, ἣ μυρί' Ἀχαιοῖς ἄλγε' ἔθηκεν
Que significam:
Canta, deusa, a ira de Aquiles, filho de Peleus, a terrível ira que trouxe incontáveis desgraças aos Aqueus
A sua tradução literal é assim:
Ira canta deusa filho-de-Peleus Aquiles
Terrível, que incontáveis Aqueus aflições causaram
A primeira palavra da Ilíada - μῆνιν - é pronunciada "menin" e significa "ira". Mênin. A primeira letra é nossa conhecida. É um m. A segunda é uma letra exclusivamente grega, o ῆ, o êta, que corresponde a nosso "ê". O ν deles é nosso n. Em seguida, outra velha conhecida, a letra i, ou ι. Menin. A palavra está declinada no acusativo, ou objeto direto. Em sua forma nominativa, escreve-se μῆνις e pronuncia-se Mênis. O ς grego tem sempre o som de s. A ira de Aquiles. μῆνιν Ἀχιλῆος. Menin Aquileos.
Na internet, há diversos sites com audios da Iliada no original. O melhor, para mim, é esse, de Stanley Lombardo.
Além da beleza poética, a Ilíada apresenta qualidades insuperáveis de estrutura romanesca, com diálogos extremamente divertidos. A história inicia, como se sabe, com uma briga entre Aquiles e Agamenon. Aquiles é um príncipe e chefe militar, mas de um reino relativamente pobre. Sua fama advém de suas inigualáveis habilidades marciais. É o maior guerreiro da história antiga. Tem uma personalidade irascível e soberba. Agamenon, por sua vez, é o chefe supremo dos exércitos reunidos às praias de Tróia e, de longe, o mais rico e poderoso de todos os monarcas gregos. Obrigado a restituir Criseis, sua escrava e amante, capturada durante as primeiras escaramuças em cidades vizinhas de Ílion (como Tróia é chamada pelos gregos), e irritado contra Aquiles, que o provoca constantemente, em público, Agamenon decide apossar-se da garota de Aquiles, Briseis, também uma cativa de guerra. Trata-se de uma afronta deliberada, um gesto que visa humilhar e desmoralizar Aquiles, que a suporta, todavia, sem reagir, em virtude da imensa superioridade militar de Agamenon. Atenas, a formosa deusa da inteligência e da guerra, aconselha-o a ser prudente e desafogar-se apenas verbalmente. O guerreiro, então, vocifera sua indizível cólera contra Agamenón, através do seguinte discurso (observem a liberdade com que Aquiles se dirige ao rei mais poderoso entre os gregos):
- Miserável! Bêbado! Tens a cara e a sem-vergonhice de um cachorro e o coração mais frouxo que de um bezerro! Covarde, que jamais teve a coragem de empunhar armas à frente de teus exércitos! (...) Rei tirano de teu povo, que se não mandasse em homens tão vis, seria este o último ultraje que fazes!
Sua arenga raivosa vai longe. Reproduzi apenas um pequeno trecho. O episódio revela que os gregos, na sua antiguidade (a Iliada é escrita 800 anos antes de Cristo e a guerra de Tróia havia ocorrido uns 500 ou 600 anos antes), já eram um povo que cultivava uma enorme liberdade de expressão e onde os reis, assim como os deuses, eram tratados como homens, igualitariamente.
Gosto de especular com a história antiga. Observo, por exemplo, que a Palestina, onde nasceu Jesus, é bastante próxima dos gregos e das nações onde afloraram os maiores gênios da arte e da filosofia, como o próprio Homero. Teriam os livros gregos chegado à Palestina daquela época? Teria Jesus lido os gregos? É possível. A Palestina era colonizada pelos romanos, os quais rendiam constante tributo à cultura e à lingua grega. Todos os homens cultos de Roma sabiam grego. O Novo Testamento, aliás, segundo muitos estudiosos, foi escrito em grego, e somente depois traduzido para o Latim.
*
Assim meu tempo escorre, tranquilamante, entre a Ilíada e Nine Stories, de J.D.Salinger. Os cães prosseguem latindo na pradaria. Eu os ouço pela manhã, quando leio jornais e colho meu balaio diário de café. O país vai bem e a mídia vai mal, graças a Atenas. A felicidade, enquanto isso, a gente cata na rua, nos bares, entre uma frase e uma risada, nos livros, nos discos de Charlie Parker.
*
Aliás, por falar em Parker, que tal ler o conto O Perseguidor, de Julio Cortazar, uma deliciosa ficção em torno do louco jazzista negro americano?
*
Grande Sertão Veredas, diz Alexei Bueno, e eu assino embaixo, é nossa Ilíada.
*
Quer viajar um pouco no grego antigo? Curte esse site. (Primeiro tem que instalar, se não o tiver feito, o Quick Time).
*
Quem se interessar por estudar a Iliada no original, sugiro esses três sites:
1) http://www.library.northwestern.edu/homer/html/application.html
2) http://www.perseus.tufts.edu/hopper/text.jsp?doc=Perseus:text:1999.01.0133
3) http://www.utexas.edu/cola/centers/lrc/eieol/grkol-2-X.html
O livro narra a famosa guerra de Tróia, e sua veracidade histórica hoje, depois de altos e baixos (anos de adventismo absoluto seguidos de ceticismo total), é bastante respeitada. Mas isso não importa tanto, já que, havendo ou não deturpado fatos reais, o glorioso relato de Homero tornou-se a primeira grande coluna da civilização grega, feita de material muito mais duradouro que o mármore.
Não há escritor ocidental que não seja herdeiro direto da tradição homérica. Eu amo tanto esse livro que estou estudando grego antigo para lê-lo no original. Antigamente, o ensino de grego, assim como latim, era obrigatório em escolas públicas. Parece uma excentricidade, e é mesmo - provavelmente eu desista desse empreendimento dentro de alguns dias, como eu fiz com o árabe, o chinês e o alemão. Até o início do século XX, quase todos os grandes escritores tinham bom conhecimento da língua de Sócrates. Seja como for, já consegui ler os primeiros versos.
Abaixo uma transliteração fonética dos primeiros versos da Ilíada:
menin aeide thea Peleiadeo Achileos
oulomenen, he muri' Achaiois alge' etheke
Os mesmos versos no original:
μῆνιν ἄειδε θεὰ Πηληϊάδεω Ἀχιλῆος
οὐλομένην, ἣ μυρί' Ἀχαιοῖς ἄλγε' ἔθηκεν
Que significam:
Canta, deusa, a ira de Aquiles, filho de Peleus, a terrível ira que trouxe incontáveis desgraças aos Aqueus
A sua tradução literal é assim:
Ira canta deusa filho-de-Peleus Aquiles
Terrível, que incontáveis Aqueus aflições causaram
A primeira palavra da Ilíada - μῆνιν - é pronunciada "menin" e significa "ira". Mênin. A primeira letra é nossa conhecida. É um m. A segunda é uma letra exclusivamente grega, o ῆ, o êta, que corresponde a nosso "ê". O ν deles é nosso n. Em seguida, outra velha conhecida, a letra i, ou ι. Menin. A palavra está declinada no acusativo, ou objeto direto. Em sua forma nominativa, escreve-se μῆνις e pronuncia-se Mênis. O ς grego tem sempre o som de s. A ira de Aquiles. μῆνιν Ἀχιλῆος. Menin Aquileos.
Na internet, há diversos sites com audios da Iliada no original. O melhor, para mim, é esse, de Stanley Lombardo.
Além da beleza poética, a Ilíada apresenta qualidades insuperáveis de estrutura romanesca, com diálogos extremamente divertidos. A história inicia, como se sabe, com uma briga entre Aquiles e Agamenon. Aquiles é um príncipe e chefe militar, mas de um reino relativamente pobre. Sua fama advém de suas inigualáveis habilidades marciais. É o maior guerreiro da história antiga. Tem uma personalidade irascível e soberba. Agamenon, por sua vez, é o chefe supremo dos exércitos reunidos às praias de Tróia e, de longe, o mais rico e poderoso de todos os monarcas gregos. Obrigado a restituir Criseis, sua escrava e amante, capturada durante as primeiras escaramuças em cidades vizinhas de Ílion (como Tróia é chamada pelos gregos), e irritado contra Aquiles, que o provoca constantemente, em público, Agamenon decide apossar-se da garota de Aquiles, Briseis, também uma cativa de guerra. Trata-se de uma afronta deliberada, um gesto que visa humilhar e desmoralizar Aquiles, que a suporta, todavia, sem reagir, em virtude da imensa superioridade militar de Agamenon. Atenas, a formosa deusa da inteligência e da guerra, aconselha-o a ser prudente e desafogar-se apenas verbalmente. O guerreiro, então, vocifera sua indizível cólera contra Agamenón, através do seguinte discurso (observem a liberdade com que Aquiles se dirige ao rei mais poderoso entre os gregos):
- Miserável! Bêbado! Tens a cara e a sem-vergonhice de um cachorro e o coração mais frouxo que de um bezerro! Covarde, que jamais teve a coragem de empunhar armas à frente de teus exércitos! (...) Rei tirano de teu povo, que se não mandasse em homens tão vis, seria este o último ultraje que fazes!
Sua arenga raivosa vai longe. Reproduzi apenas um pequeno trecho. O episódio revela que os gregos, na sua antiguidade (a Iliada é escrita 800 anos antes de Cristo e a guerra de Tróia havia ocorrido uns 500 ou 600 anos antes), já eram um povo que cultivava uma enorme liberdade de expressão e onde os reis, assim como os deuses, eram tratados como homens, igualitariamente.
Gosto de especular com a história antiga. Observo, por exemplo, que a Palestina, onde nasceu Jesus, é bastante próxima dos gregos e das nações onde afloraram os maiores gênios da arte e da filosofia, como o próprio Homero. Teriam os livros gregos chegado à Palestina daquela época? Teria Jesus lido os gregos? É possível. A Palestina era colonizada pelos romanos, os quais rendiam constante tributo à cultura e à lingua grega. Todos os homens cultos de Roma sabiam grego. O Novo Testamento, aliás, segundo muitos estudiosos, foi escrito em grego, e somente depois traduzido para o Latim.
*
Assim meu tempo escorre, tranquilamante, entre a Ilíada e Nine Stories, de J.D.Salinger. Os cães prosseguem latindo na pradaria. Eu os ouço pela manhã, quando leio jornais e colho meu balaio diário de café. O país vai bem e a mídia vai mal, graças a Atenas. A felicidade, enquanto isso, a gente cata na rua, nos bares, entre uma frase e uma risada, nos livros, nos discos de Charlie Parker.
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Aliás, por falar em Parker, que tal ler o conto O Perseguidor, de Julio Cortazar, uma deliciosa ficção em torno do louco jazzista negro americano?
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Grande Sertão Veredas, diz Alexei Bueno, e eu assino embaixo, é nossa Ilíada.
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Quer viajar um pouco no grego antigo? Curte esse site. (Primeiro tem que instalar, se não o tiver feito, o Quick Time).
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Quem se interessar por estudar a Iliada no original, sugiro esses três sites:
1) http://www.library.northwestern.edu/homer/html/application.html
2) http://www.perseus.tufts.edu/hopper/text.jsp?doc=Perseus:text:1999.01.0133
3) http://www.utexas.edu/cola/centers/lrc/eieol/grkol-2-X.html
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Miguel do Rosário
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terça-feira, julho 01, 2008
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