(Abaixo assinado pelo impeachment de Gilmar Mendes já tem mais de 11 mil assinaturas. Assine você também, clicando aqui.)
Foi a primeira manifestação que vou em, sei lá, dez anos. A última que eu participei e, mesmo assim, de forma bem lateral, quase por acaso, foi no dia D da privatização da Vale. Era um belo dia de sol, como ontem e eu me vi, de repente, numa praça XV tomada por tanques do exército e por uma multidão de manifestantes furiosos. Cercaram totalmente a praça, que deixou de ser do povo por um dia. Percencia ao exército e aos financistas que arrecadaram a Vale por 1 bilhão de reais em moedas podres. Detalhe: a Vale é hoje avaliada em mais de 300 bilhões de reais. Para vocês terem uma idéia da "idoneidade" daquela venda. De vez em quando eu falo sobre isso aqui. Não sou contra a privatização em si, e sim contra maneira com que o processo foi conduzido, sem respeitar o clamor popular e sem promover o debate público sobre o tema. O minério de ferro estava com o preço mais baixo da historia, em torno de 15 dólares a tonelada. Por isso a Vale dava pouco lucro (e isso segundo a Miriam Leitão). Mas qualquer analista mais sagaz sabia que as cotaçoes do ferro iriam explodir a qualquer momento, em virtude dos preparativos do governo chinês para promover um grandioso salto de desenvolvimento. Foi o que ocorreu. Pouco tempo depois da venda da Vale, as cotações do ferro dispararam, e continuam subindo até hoje, por causa da crescente demanda asiática.
Mas eu vinha aqui falar da manifestação carioca pelo impeachment do Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, que concedeu dois habeas corpus para Daniel Dantas & corja. O evento juntou 21 pessoas na Candelária, portando faixas e megafone. Os brancaleones depois seguiram pela Avenida Rio Branco, vociferando pelo megafone e portando as faixas, até a Cinelândia. As pessoas que passavam apoiavam entusiasticamente. Chegamos à Cinelândia e nos instalamos no alto da escadaria do Palácio da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, e os discursos prosseguiram. Este escriba foi um dos que mais falou ao megafone. Disse o que a mídia não vem informando: que mais de 400 magistrados assinaram um abaixo assinado contra o Gilmar Mendes, que as associações de classe do Judiciário e do Ministério Público se manifestaram veementemente contra a decisão de Mendes. Falei sobre a frustração da sociedade brasileira em assistir a um membro da mais alta corte do país desprestigiar sistematicamente as instituições que combatem a corrupção e a lavagem de dinheiro. Falei sobre a mídia, que vem blindando qualquer referência negativa a Gilmar Mendes.
Enfim, fizemos a manifestação. Com pouca gente mas com muita fé. As pessoas presentes demonstravam segurança e tranquilidade quanto à importância cívica de nosso ato. Interessante notar a diversidade etárias dos participantes. Em rápida deliberação, combinanos outro ato na quarta-feira, ao meio-dia, em frente ao Fórum do Rio de Janeiro. A escolha do local deu-se após um debate intenso, onde concluímos que ali não só é um lugar que reúne magistrados e advogados, segmentos que devem ser pressionados para que a ordem jurídica nacional não volte a ser violentada em benefício de estelionatários poderosos, mas onde também circula gente de todas as classes sociais.
Depois do evento, alguns de nós fomos ao verdinho, restaurante ao lado do cinema Odeon e, no mais clássico estilo carioca, fizemos uma alegre confraternização, regada a chop, aipim frito e uma agradável e produtiva troca de idéias.
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Em São Paulo, a manifestação juntou mais de 200 pessoas e foi coberta por vários meios de comunicação. Veja fotos no blog do Eduardo Guimarães e matérias nos portais IG , Zero Hora , Agência Brasil , e UOL
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Bem, agora vamos a outros assuntos, muito importantes. Prossegue a celeuma em torno do delegado Protógenes. O jornal O Globo, que leio diariamente, está blindando totalmente Gilmar Mendes e Daniel Dantas, e focando apenas na suposta ou real divisão da Polícia Federal. A seção de Carta dos Leitores do Globo não traz nenhuma mensagem sobre o episódio que mais vem mexendo com a blogosfera brasileira. No sábado, auge da expectativa em torno das investigações, a seção Pais, do Globo, vinha com matéria sobre os camelôs da Lapa! Matéria que, diga-se de passagem, é mais uma das agressões fascistas do Globo contra os vendedores ambulantes.
Tenho notado, com apreensão, que a alquimia midíatica deu certo. O mérito da operação que prendeu Dantas & corja não é atribuído à Polícia Federal ou ao governo. Tornou-se obra exclusiva do delegado Protógenes. Tem gente pregando a construção de estátua de bronze em homenagem ao homem. A mídia conseguiu enganar, mais uma vez, a esquerda ingênua, que voltou a desfilar com sua máscara de "decepcionado", "impotente", "frustrado" e outros epítetos melancólicos. Todo mundo esquece o principal. Quem paga o salário de Protógenes? Quem paga o salário de seus assistentes (que prosseguem no caso)? Daniel Dantas & corja foram indiciados judicialmente. Isso é o que importa. Não é crucificar Dantas que importa. O país tem lei. Se Dantas é solto, se o processo criminal é lento, é porque o Brasil é uma democracia onde os cidadãos (sobretudo os que podem pagar bons advogados) têm amplo direito de defesa. Há um sadismo tolo no ar, como se a justiça só existisse quando o sujeito é lançado numa cela. Não, a justiça permeia todo o processo. Quando a PF iniciou a investigação dos ilícitos de Dantas, ali já estava a Justiça operando, existindo, combatendo o crime. Quando a investigação teve continuidade e se aprofundou, a Justiça também estava ali, acontecendo. Quando o delegado recusa a oferta de 1 milhão de dólares, temos um belíssimo ato de probidade e mais uma prova de existência da Justiça.
É preciso atentar para dois pontos. Ou respeitamos o trabalho da PF ou não respeitamos. Se respeitamos, se achamos que a PF fez um bom trabalho ao prender Dantas, então deixemos a PF nomear quem lhe parecer mais apropriado para dar continuidade às investigações. Qual o direito da mídia, ou mesmo nós, leigos, em decidir se é melhor ou não Protógenes ficar?
Certo que houve uma estupidez política colossal. O anúncio da saída do delegado foi terrivelmente desastrado. Dizer que ele iria fazer um "curso", foi ridículo. O Tarso Genro cometeu um erro crasso. Desculpe, Tarso, mas foste burro, muito burro. Barbaridade, che. Podiam esperar alguns dias para fazer o anúncio. O Protógenes entregavam o relatório e dava seu trabalho por terminado. Simples, limpo e honesto. Entretanto, é mais uma lição para o governo aprender que a mídia, definitivamente, não está do seu lado e, por isso, faz-se necessária uma prudência incomensurável nos assuntos que sensibilizam a opinião pública. Chega de "relaxa e goza".
A sociedade está desorientada. Uns lamentam, em tom derrotista, a possibilidade do caso ir para o STF. Ora, se for, que vá. O importante é que ele continua sendo investigado pela PF e pelo Ministério Público. O que interessa é combater a corrupção. O fim da corrupção, a prisão de todos os corruptos é uma consequência ulterior ao trabalho duro dos orgãos de segurança.
Observei que o caso Dantas fez emergir, de maneira muito forte e visível, o complexo de inferioridade nos brasileiros. Incapazes de acreditar que, finalmente, a PF prendeu um banqueiro poderoso, muitos brasileiros estão se deixando levar por um desalento incongruente com o fato de que Dantas foi indiciado judicialmente há somente dois dias. Não é mais um investigado, mas um réu, e um baita réu, acusado por dezenas de crimes barra pesada, inclusive o de tentar subornar um delegado com 1 milhão de dólares - o dinheiro foi apreendido e o responsável pelo suborno confessou o crime.
O julgamento nem começou, os materiais apreendidos pela PF ainda nem foram analisados; as novas equipes designadas para analisar o caso ainda nem começaram a trabalhar; ainda nem se sabe direito quem é e como é o delegado que substituirá Protógenes; e já se alevanta uma grande onda de "desalento" e "sentimento de impotência". Ora, sinceramente, não acho que o governo possa resolver problemas de impotência. Se for este o caso, melhor tomar um Viagra, e deixar a PF trabalhar em paz. Todo mundo que contribui para a celeuma em torno do Protógenes está ajudando a mídia dantesca a desviar o foco do que é o principal: os negócios escusos do banco Opportunity e suas ligações com o mundo político.
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Existe um documento provando que Daniel Dantas foi sócio da filha do governador José Serra. Como cidadão brasileiro, gostaria de mais esclarecimentos sobre este caso, visto que Serra é pré-candidato à presidência da República e, por enquanto, o favorito para ganhar as eleições em 2010. A mídia, no entanto, blinda o Serra de um jeito que ele pode sair a rua pelado, gritando frases obscenas: não sairá nada em jornal ou TV. O PSDB fica muito confortável diante dessa situação. Mas o conforto também debilita e corrompe. Enquanto isso, o PT e o Lula, tomando porrada diariamente, são obrigados a suar a camisa para não sucumbirem à enxurrada de calúnias e intrigas, e ficam mais fortes e mais prudentes. Essa é uma das belezas da história: a dialética que move os seres e a vida.
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Ah, o juiz Fausto de Sanctis sai de férias por 30 dias. É o tempo certo para os peritos da PF, do Ministério Público e da Receita Federal, analisarem meticulosamente as toneladas de documentos apreendidos. Sanctis já declarou que retoma a análise das provas após sua volta. Ele merece o descanso.
As investigações até agora realizadas apresentam indícios de que o caso do banqueiro Daniel Dantas é o maior escândalo já ocorrido na História do nosso País. E as coisas estão apenas começando. Pelo parco noticiário até agora divulgado, percebe-se que foram apreendidos pela PF toneladas de papéis, Hds, CDs e DVDs contendo dados das operações financeiras desenvolvidas pelo Grupo.
Talvez não assistamos, em vida, a conclusão do caso. Mas, o inquérito em andamento na PF,pode ter freado a continuação das atividades do grupo. E isto já é uma grande vitória da Justiça.
Miguel, te acho o máximo pela capacidade de realçar com clareza e simplicidade o que importa. E cumprimento também o Carlão pelo comentário. Infelizmente não pude ir, mas na próxima eu vou. Vera Pereira
Gilmar Mendes precisou de mobilização tucana para ter nome aprovado
Folha de São Paulo - DA SUCURSAL DE BRASÍLIA - 21/07/08
Dos 11 ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) em atividade, Gilmar Mendes foi o que mais sofreu contestação para assumir o cargo. Foram 15 votos contrários durante a análise de sua indicação pelo plenário do Senado -o triplo de rejeição que sofreu o segundo colocado, ministro Eros Grau, com cinco reprovações.
A indicação do nome de Mendes pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) foi avaliada em maio de 2002 pelo Senado. Na presidência do STF no período, Marco Aurélio Mello declarou que Mendes teria de "superar o desafio".
Registros do Senado mostram que a base de apoio ao governo tucano se mobilizou para garantir aprovação do de Mendes para o cargo. Diferente do usual no caso de indicação de autoridades, o quórum da sessão foi alto, com 72 dos 81 senadores presentes. Os governistas garantiram 57 votos favoráveis contra os 15 contrários.
Na época, o senador Eduardo Suplicy (SP) chegou a chamá-lo de "jurista de extração conservadora" em discurso no plenário, mas, semana passada, elogiou o encontro de Mendes com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. (ADRIANO CEOLIN)
DANTAS DÁ AS CARTAS
Wálter Fanganiello Maierovitch
Especial para Terra Magazine
21 de julho de 2008, 13h57
Com o delegado Protógenes Queiroz afastado, Daniel Dantas ganhou a terceira cartada. As duas anteriores foram os habeas-corpus liberatórios.
Agora, Dantas joga em duas frentes. Precisa afastar o juiz Fausto De Sanctis e, para isso, já argüiu no processo criminal o seu impedimento por falta de imparcialidade. Se o juiz recusar a exceção de suspeição, caberá ao Tribunal Regional Federal apreciar essa matéria.
A outra cartada já foi dada. Ao apreciar o pedido do senador Heráclito Fortes (DEM-PI) de acesso às apurações (habeas-datas), o ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), considerou-o investigado.
Como Heráclito é investigado, haverá, em breve, avocação dos inquéritos e do processo criminal ao STF, pois o senador tem foro privilegiado. Aí, De Sanctis estará definitivamente afastado.
Para arrematar, a força-tarefa instituída para apurações, com grande número de envolvidos, poderá se transformar em fonte permanente de vazamentos.
PANO RÁPIDO. Dantas continua com o jogo na mão. E a dar as cartas.
Wálter Fanganiello Maierovitch é colunista da revista CartaCapital e presidente do Instituto Giovanni Falcone (www.ibgf.org.br).
FONTE: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI3021185-EI6578,00.html
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