Cartas de amor são ridículas; se não o fossem não seriam cartas de amor, dizia Fernando Pessoa. A afirmação vale para muitas outras coisas. Fazer literatura tem sua cota de ridículo, e a política... muitas vezes parece ser a atividade mais ridícula de todas. Diria que há mesmo uma grande cafonice intrínseca à política. Mas e daí? Se não fôssemos todos um pouco ridículos e cafonas seríamos o quê? Investigadores do FBI? Executivos da IBM? Leitores de prêmios nobels? Marketeiros moderninhos e sabichões que moram em São Paulo e votam no PSDB?
O Brasil é um país cafona, de fato. Mas nossos vizinhos latinos são mais, se é que isso serve de consolo. Bolívia, Peru, Colômbia, Equador, Paraguai, Uruguai, Argentina exibem uma cafonice insuperável. O racismo exibido, descarado, institucional, das regiões ricas da Bolívia é tão grotesco que para mim, de longe, me causa apenas uma perplexidade confusa.
Atacar Lula ou defender Lula, são duas faces da mesma moeda ridícula. Mas fazer politica é como escrever cartas de amor, não seria fazer política se não fosse ridículo.
Mas eu vim aqui mesmo para falar sobre as eleições americanas. Eu torço pro Obama, é claro. E não concordo com os que dizem que tanto faz Obama e McCain. Que Obama não representaria, na prática, mudança nenhuma. As mudanças virão, é claro. O fenômeno Obama está mobilizando as novas gerações e segmentos sociais antes totalmente excluídos do processo eleitoral, como os hispânicos e mesmo os negros, que apesar de barulhentos são minoria nos EUA. A postura de Obama frente à política externa também é radicalmente oposta à dos republicanos. Obama defende diplomacia em vez de guerra, fortalecimento da ONU, saída do Iraque. Internamente, defende a recuperação do sistema público de saúde e dos programas federais de combate à pobreza. Quer diferença maior? É uma diferença tão grande quanto a da cor da pele.
Outro dia, a Mônica Bergamo, colunista social da Folha, afirmou (citando fontes anônimas) que Lula seria a favor de McCain. Intriguinha besta, tentando desgastar Lula junto aos moderninhos de São Paulo - progressistas nos EUA, apoiando Obama, onde não votam, mas retrógrados no Brasil. É claro que Lula apóia Obama. Lula é amigo de Fidel, de Chávez, foi o primeiro presidente brasileiro a fazer visitas de verdade à África, o primeiro a nomear diversos ministros negros e repete sempre a importância de termos mais negros no poder. Obama é o Lula americano. Até o mote de campanha dele é igual ao do Lula, e talvez tenha sido deliberadamente copiado: a esperança vencerá o medo.
Voltando ao Obama, acho que ele representará uma grande mudança e sua vitória será mais uma pá de cal sobre a cova que os direitistas tupiniquins vem cavando para si mesmos. E aí comento uma das notícias principais do caderno de economia do Globo de hoje: EUA pretendem estatizar gigantes hipotecárias. A notícia prova a minha tese de que o capitalismo não existe. É um engodo de mafiosos para mamar nas tetas do governo. Os capitalistas mais capitalistas dos EUA são os que mamam nas tetas do Estado, como os grandes agricultores subsidiados e os lobbies armamentistas. Os verdadeiros capitalistas, como Bill Gates e os donos do Google, são caras de esquerda, democratas liberais, que apóiam fervorosamente a eleição de Barack Obama.
Continuo acreditando, portanto, que não só o capitalismo não existe como o direitismo é, no fundo, muito mais estatista que o esquerdismo. A diferença é que o direitista prefere viver de juros pagos pelo governo, enquanto o esquerdista prefere um emprego público.
Eu era anarquista durante a adolescência e nos primeiros anos da juventude. Hoje sou um capitalista de esquerda, ou social-democrata, como preferirem, e acredito na importância do Estado. Uma das principais críticas de nossa imprensa ao governo é a criação de cargos públicos, mas se omite vários pontos. O Tribunal de Contas da União declarou ilegal um contingente enorme de empregos terceirizados criados na era FHC, obrigando o governo a criar vagas para se adequar à orientação legal. As pessoas esquecem que, com emprego ou sem emprego público, o Estado tem que pagar gente para fazer os serviços. A terceirização é uma estratégia mafiosa, porque contrata gente sem preparo, enriquece poucas empresas, cujos donos em geral são amigos dos políticos, resultando em empregos precários e serviços mal feitos.
Bem, voltando as eleições americanas, vocês viram o vexame mundial que os republicanos pagaram? O McCain chamou uma ultra-reacionária para ser sua vice. A mulher é o cão. Defende o criacionismo, é contra o aborto e contra a educação sexual nas escolas, pensa que o único método anti-concepcional deve ser a abstinência sexual e que o sexo só deve vir depois do casamento.
Pois é. Os EUA, com toda aquela bagagem cinematográfica e literária e musical, pode ter uma presidenta deste naipe. Os EUA, com toda sua grana, conseguem ser ainda mais cafona que Brasil e a América Latina. Acho que, no mundo, só se salva a França, ou melhor, Paris. Paris devia virar uma cidade-Estado e ser reproduzida em todos os países do mundo, como uma franquia.
Aí aconteceu uma coisa realmente muito engraçada, que me fez rir sozinho toda vez que eu lembrava disso. Poucos dias após McCain escolher a tal mulher (me recuso a registrar o nome dela) para vice, a grande nação americana é informada que a sua filha de dezessete anos, solteira, está grávida! AHAHAHAAHAH! São uns hipócritas. Esses moralistas castos direitistas são todos pervertidos, pederastas, sado-masoquistas, necrófilos e pedófilos. É muito engraçado. Foi feita a convenção republicana e a tal moça fez um discurso - dizem - contundente, que fez grande sucesso nos EUA. Disse que é uma pitbull e não sei mais o quê. Mas, para mim, essa mulher está desmoralizada.
6 de setembro de 2008
Peruadas internacionais
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Para completar, Miguel, ela é do lobby das armas, que é um dos lobbies mais barra-pesada do Congresso.
Seu hobby preferido é matar animais indefesos por diversão, ou seja, caçar.
Acho que os republicanos, desesperados, resolveram ir para o tudo-ou-nada, pois com essa vice não há meio termo. Quem estiver em cima do muro está, agora, fortemente instigado a decidir-se.
Em minha opinião, deram um tiro no pé.
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