28 de maio de 2011

Esclarecimentos sobre minha ideologia

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(Van Gogh, o mestre)


Nos últimos tempos, tenho sido bastante polêmico, divergindo bastante de muita gente, amigos, de outros blogueiros progressistas, em diversos temas. Como é de praxe na política, as pessoas acabam levando isso para o lado pessoal. Uma vez um comentarista me acusou de fazer polêmica apenas para chamar a atenção. Agora um outro disse estar surpreso pelo meu blog ainda estar linkado aos blogs "de esquerda". Preciso esclarecer algumas coisas.

Não faço polêmica pela polêmica. O que eu afirmo aqui é porque eu acredito. Contudo eu gosto de polêmica. Não tenho medo de ter uma opinião diferente, que contrarie a maioria, ou pelo menos um grupo que se considere (mesmo que não seja) a maioria. O que eu vejo, sempre, são as pessoas tentando ganhar no grito. Não constituem a maioria, mas são os mais barulhentos, e que usam determinada circunstância política para falarem mais alto. Assim que as circunstâncias mudam, são forçados a baixar o volume da voz, e aí vemos outros comentaristas emergirem.

Acredito na social-democracia, ou pelo menos no que isso significava antes do PSDB difamar a expressão. Ou seja, um regime democrático deve ter saúde e educação públicas gratuitas e universais, ponto.

De resto, minha única posição mais radical à esquerda refere-se ao sistema bancário: acho que os bancos privados são uma reminiscência medieval. Se a moeda é única e estatal, o crédito também deveria sê-lo. Os Estados deveriam ter apenas um banco público e estatal. Com isso, evitaríamos esse absurdo que é termos uma crise bancária a cada dez anos, forçando os governos a se endividarem para salvar o mundo de uma bancarrota.

Gosto muito da ideia de autarquias públicas, independentes do governo. Tipo assim, um Instituto Nacional de Educação, onde os diretores das filiais nos estados seriam eleitos pelos próprios professores, com participação da sociedade como um tudo. Eu vi isso funcionar muito bem na Colômbia, com a Federación Nacional de Cafeicultores.

Tenho, porém, opiniões muito próprias e até, diríamos, originais sobre o que seria o socialismo, o capitalismo, direita ou esquerda. Já escrevi muito sobre isso ao longo dos últimos oito anos.

Por exemplo, não acho que o capitalismo exista. Para mim existe um problema conceitual que vem confundindo há séculos as lutas trabalhistas. Neste sentido, sou crítico da filosofia marxista. O capitalismo não é uma ideologia. Quer dizer, existe uma ideologia capitalista, mas não se pode confundi-la com o processo histórico-econômico. Ao dizer que o mundo de hoje é o que é em virtude do capitalismo, a esquerda confere ao capitalismo uma força muito maior do que ele tem na verdade. O mundo hoje é simplesmente mundo, sem adjetivos ideológicos. ELe é o que é em virtude do desenvolvimento natural das forças produtivas, do desenvolvimento da vida. Dizer que a nossa civilização é capitalista é como dizer que os macacos e as aves também são capitalistas. O homem é um animal, e como tal se organiza em função de suas possibilidades cognitivas e existenciais.

Da mesma forma, o conceito de esquerda também não existe. Não existe um conceito definido sobre o que é ser de esquerda. A coisa mais palpável são frases do Norberto Nobbio sobre "estar ao lado dos oprimidos", o que é vago demais. Qualquer evangélico conservador ou político populista alega ser de esquerda pelos mesmos motivos. O presidente do DEM ao assumir, recentemente, declarou-se de esquerda. Roberto Freire repetia que o Serra estava muito mais à esquerda que Lula e Dilma. E durante muito tempo Lula repetiu que não se considerava "de esquerda", mas apenas um torneiro-mecânico; mais tarde sofisticou a informação dizendo que era um homem "com tendências socialistas".

No entanto, a gente consegue sempre, no ambiente concreto da luta política, identificar as forças de esquerda ou direita. As diferenças acentuam-se durante um embate eleitoral, mas sempre haverá confusão.

Eu me considero de esquerda, mas isso não quer dizer que eu ache maravilhoso todos os lugares comuns esquerdistas. Ao contrário, um dos focos do meu trabalho é a - digamos - elevação espiritual da esquerda, no sentido de aprimorar seus conceitos, estratégias e objetivos. Isso é uma luta, no seio da qual seus representantes costumam agredir-se mutuamente.

Eu não agrido ninguém, quer dizer, também dou minhas bordoadas aqui e ali, mas quase sempre em legítima defesa, e sobretudo procuro não julgar os outros como se eu fosse dono da razão.

O fato é que ser de esquerda não nos faz inteligentes. Muito pelo contrário, as pessoas ditas de esquerda costumam abraçar-se facilmente a clichês, jargões ideológicos.

Em "A estrutura ausente", de Umberto Eco, há um capítulo que fala sobre "as interações entre retórica e ideologia".

"Mas se retórica e ideologia estão tão intimamente ligadas, poderão os dois movimentos proceder independentemente um do outro?", pergunta-se Eco.

Segundo Eco, a ideologia é "a conotação final da totalidade das conotações do signo ou do contexto dos signos". Ou seja, a ideologia tem uma substância, um conteúdo, mas também possui uma forma. Não se trata, precisamente, de uma definição acerca de ideologia política. É uma ideologia de forma geral. Mas a ideologia política, hoje e sempre, confunde-se com a ideologia comum das pessoas. Com um pouco de sensibilidade e sorte, consegue-se adivinhar a ideologia da pessoa apenas por alguns gestos e frases. Até mesmo expressões faciais nos permitem intuir (às vezes) a que facção ideológica ela pertence.

É justamente isso que às vezes confunde os meus leitores. Eu combato a necrose ideológica decorrente do uso de lugares comuns. Por exemplo, ser de esquerda não é ser contra os Estados Unidos. Acho isso uma tolice. A pessoa está lá, digitando no Twitter, no Blogspot, usando a Internet, e querendo expulsar o Obama do território brasileiro! Além disso, ao apegar-se somente à frase feita, ao lugar comum, a pessoa perde o poder de análise. Nestes imbróglios sobre o oriente médio, por exemplo, culpa-se os EUA por tudo. Certo, os americanos têm culpa no cartório, mas a culpa principal é das próprias elites árabes, que venderam-se facilmente à ideologia americana, de um lado, ou abraçaram com volúpia sistemas de governo ditatoriais.

Aqui nas Américas, a mesma coisa. A culpa da ditadura militar que vivemos não é dos EUA, embora eles tenham ajudado. É nossa, de nossas elites. Durante muito tempo canalizamos mal a nossa revolta. Tínhamos que focá-la nos verdadeiros culpados pelo golpe de Estado: os donos da mídia, as elites econômicas e a classe média moralista e manipulável.

Um dos grandes avanços propriamente ideológicos trazidos por Lula foi justamente o de pararmos de culpar os países ricos por nossa pobreza e passarmos a olhar de frente nossos próprios defeitos, para corrigi-los. Toda a novidade trazida por Lula veio de sua ideologia original, quase anti-esquerdista. Lula quase não usava jargões esquerdistas, e apenas por isso conseguiu conquistar o povão e, mais tarde, todas as classes sociais. O jargão, o lugar comum, o clichê, só fazem sucesso entre um grupo reduzido de militantes.

Eu queria saber tambem qual a explicação, dentro da ciência política, para a emergência dessa ideologia impaciente, radical, irritadiça, sempre que um governo de esquerda ganha uma eleição. Aconteceu no Chile, lembrou-me Wanderley Guilherme dos Santos. Allende foi emparedado pelo radicalismo. Aconteceu na República de Weimar, na Alemanha do entreguerras. Aconteceu no governo de João Goulart. O resultado sempre foi desastroso.

A defesa do meio ambiente é algo fundamental no mundo de hoje, e no Brasil em particular. Mas não é propriamente uma bandeira da esquerda, ainda mais num país que precisa desesperadamente se desenvolver para superar mazelas sociais. É uma bandeira da civilização. Não pensem que eu ponha o meio-ambiente em segundo plano. Evidentemente sou contra o desmatamento, qualquer um, seja de grandes ou pequenos. Não acho, porém, que este será resolvido com aplicação de multas para 3 ou 4 milhões de proprietários rurais, que era o estava em vias de acontecer. Acho a ideia do Aldo Rebelo bastante sensata, que é forçar o produtor, em troca da anistia, a ingressar num programa de regulamentação ambiental. Em vez do governo tomar um calote, e a floresta continuar desmatada, ele ensinará o produtor o que fazer e como fazer. Também não podemos expulsar os pequenos produtores de suas terras por causa de uma legislação draconiana. O resultado seria desastroso: os pequenos não sairiam, haveria um problema social, e não resolveríamos igualmente o impasse ambiental. A solução, mais uma vez, é monitorar, regulamentar, ensinar o produtor a respeitar o meio ambiente.

Tenho esperança que o Congresso Nacional, depois que o Código Florestal for revisado pelo Senado, passar pelos últimos ajustes na Presidência e voltar à Câmara dos Deputados para se tornar lei, será um Código bastante sensato, que contemple as necessidades do agronegócio, do produtor familiar e do meio ambiente. E se não for perfeito, será melhor do que o anterior, e sempre poder-se-á aprimorá-lo ao longo do tempo. Talvez seja ingenuidade, sim, ou talvez seja simplesmente esperança!

Outro ponto que gerou atrito entre este blog e alguns leitores foi um post sobre Bin Laden. Mais uma vez, acho que as pessoas se deixaram levar pelo lugar-comum de culpar os americanos. Bin Laden era o cabeça de uma organização militar não-convencional. Um julgamento justo para Bin Laden apenas seria possível se a Al Qaeda depusesse as armas, como fez o Ira, na Irlanda. Como aconteceu, tratava-se de uma situação de guerra, onde os soldados americanos que invadiram a casa do terrorista enfrentaram risco e portanto podiam perfeitamente alegar legítima defesa. O Chomsky escreveu um texto falando que seria como um outro país invadisse a Casa Branca, assassinasse o presidente e lançasse seu corpo ao mar. Ora, foi exatamente isso que a Al Qaeda tentou fazer. Um dos aviões sequestrados no 11 de setembro (se não me engano), seria jogado contra a Casa Branca. Acho um erro, enfim, que a esquerda assuma a defesa de Bin Laden, porque isso a afasta do bom senso comum e a põe na marginalidade política. Escrevi já milhões de artigos detonando os EUA, detonando a guerra no Iraque e no Afeganistão. Mas entendo que Bin Laden era o inimigo número 1 dos EUA, e que sua morte foi justificada por ser o homem mais perigoso do mundo, um verdadeiro homem-bomba. A violência sempre existirá entre os homens, mas a ideologia democrática define que esta deva ser monopólio dos governos. No futuro, o combate ao terrorismo deve ser tocado apenas pelo exército da ONU, e não de nenhum país em particular.

Por fim, quero deixar claro que não tenho certeza absoluta de nada. Meu ídolo na filosofia é Sócrates e seu jeito irônico, sua dialética e simplicidade. ἓν οἶδα ὅτι οὐδὲν οἶδα. Só sei que nada sei. (Escrevi em grego só para tirar onda, não sei grego. Ainda. Daqui a uns sessenta anos, talvez aprenda. A frase pronuncia-se assim: hen oída hoti oudén oída). Sou apenas um blogueiro diletante e presunçoso, que gosta de dar pitaco sobre tudo. Não me odeiem, por favor. Pra ser franco, eu sofro à beça quando me vejo obrigado a discordar de meus colegas "de esquerda", mas não posso agir de outra maneira. Tenho que dizer o que penso. De qualquer forma, todos nós morreríamos de tédio se houvesse sempre o consenso. E há um ponto bastante positivo em nossas divergências. A gente está começando a esquecer a grande mídia. Nossos debates tem, aos poucos, escapado da simples crítica ao "PIG" e ganhado independência. Em alguns casos, nem damos mais bola ao que diz a imprensa, e fazemos o debate entre a gente, com informações que colhemos diretamente na realidade, através desse maravilhoso "portal" que é a internet.

Juro que estou disposto a mudar de opinião, sempre que me forem apresentados argumentos convincentes. Nem tenho ideia fixa. Também não tenho nenhuma obrigação com o governo Dilma. Às vezes dá vontade até de falar um palavrão, tipo: quero que o governo se... que a Dilma se... Mas isso seria ridículo. Pode parecer piegas e demagógico, e talvez seja mesmo, mas meu único interesse é o bem do povo brasileiro. A gente que gosta de política parece que tem um gene a mais (ou a menos) e sente na carne o que acontece a nosso redor, na sociedade.

Frequentemente falo besteira, sobretudo no Twitter, onde estou exposto aos repuxos do meu sarcasmo, irritação, desejo de ser "engraçadinho", etc. Tanto que às vezes prometo a mim mesmo que não usarei mais o Twitter. Peço que sejam tolerantes comigo nessa rede social, onde geralmente boto meu bom comportamento de lado e ajo como um verdadeiro delinquente. Estou tentando me cuidar, porque o número de seguidores está crescendo e a responsabilidade aumentando, mas nunca deixarei de ser irreverente (ou tentar sê-lo).

E já que abri os portões da pieguice, seguem os primeiros versos de Tabacaria, um poema batido, mas lindíssimo de Fernando Pessoa, que uso à guisa de conclusão e para resumir como eu me sinto:

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

27 de maio de 2011

Ainda sobre o Código Florestal

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(A ilustração no blog na maioria das vezes não tem nada a ver com o texto. Eu uso o espaço para publicar minhas obras preferidas. Essa aí é do Michelangelo).

Acho democrático que as pessoas protestem contra o código florestal. Só não aprovo que torçam a realidade para que esta caiba em seu discurso. Por exemplo, é preciso que as pessoas observem atentamente a lista de votação, para saber quem votou a favor do código e quem votou contra.

Por acaso o delegado Protógenes Queiróz estaria interessado em destruir o Brasil, beneficiar latifundiários e desmatadores? Manuela D'Ávila vendeu-se aos ruralistas? Vicentinho agora é defensor dos madeireiros assassinos? O sindicalista José Luiz Stédile,  irmão de João Pedro Stédile, fundador do MST, quer devastar as lindas matas nacionais? Claro que não! Todos votaram sim, pelo Código Florestal.

Quem mais votou pelo sim: o lutador Stepan Nercessian, único nome que presta no PPS; Jô Moraes, a querida deputada comunista mineira; no PT, maior partido do Congresso, tivemos 46 votos favoráveis (e 35 contra).

Dentre os que votaram contra, há pessoas de caráter, como Erundina e Brizola Neto. Esses votos contrários foram importantes, até para mostrar que houve, de fato, um debate. Seria estranho ter 100% dos votos de um lado só. Mas uma vitória de 410 a 63, ou seja, uma vitória esmagadora de 80% a 20%, é algo impressionante, e deveria nos fazer pensar se a maioria absoluta do Congresso Nacional, aí incluindo seus melhores quadros, seriam tão loucos de aprovarem uma lei que prejudicasse o povo brasileiro.

Nos últimos dias, o Brasil ficou sabendo da morte de três ambientalistas. É uma coisa realmente triste, mas não se pode culpar os produtores rurais pelo crime de madeireiros mafiosos do Pará! Fazer isso é como culpar um metalúrgico de São Bernardo pela desonestidade de um estivador em Santos! Um pacato cafeicultor do norte do Paraná não pode ser responsabilizado pelo que fazem os bandidos que desmatam ilegalmente em Corumbiara!

Esses crimes sempre aconteceram por lá, por conta do mau caratismo e cobiça dos latifundiários da região amazônica, e também pela ausência do Estado, visto se tratar de unidades federativas de proporções colossais. Não instrumentalizemos a tragédia. Isso desvia energias que devem ser aplicadas para pressionar as autoridades a investigarem e punirem os culpados.

O código florestal, ao contrário dessa interpretação, ajudará a pacificar o Norte, ao impor a legalidade como condição básica para a permanência do homem na floresta.

Quando eu falo no agronegócio, não quero dizer que estou satisfeito com a maneira como a agricultura é conduzida no país. Há problemas graves que devem ser sanados. Há contaminação por agrotóxicos em muitos lugares. Há exploração de trabalhadores. Há uso descuidado de material transgênico. Mas esses problemas não são um problema da atividade em si. São problemas contingentes, pontuais, mesmo que relevantes. Devem ser investigados, tratados e curados. Não joguemos o bebê pra fora junto com a água da banheira!

A esquerda brasileira tem obrigação de defender a atividade produtiva e o crescimento econômico, contra as atividades especulativas predatórias, o desmatamento, a grilagem de terra, o latifúndio improdutivo.

Um ponto que tenho martelado nos últimos dias é sobre a segurança alimentar global. O agronegócio hoje não nos pertence mais. Quer dizer, temos a soberania e tudo, mas a importância dos alimentos produzidos no Brasil para suprir o déficit de calorias e proteínas em grande parte do mundo é algo que está acima de nossas veleidades nacionalistas. Somos responsáveis perante a humanidade. É algo sobre o que devemos refletir  antes de defender, malthusianamente, o fim da produção de soja no Brasil.

Por outro lado, justamente por essa responsabilidade é que devemos cuidar de nossos rios, nascentes, topos de morro, florestas. O desequilíbrio ecológico provoca instabilidades climáticas, hídricas, mudanças na fauna e na flora, que prejudicam a produção agrícola.

A preservação do meio ambiente é crucial para o Brasil também por causa disso.

Além disso, hoje há ferramentas tecnológicas que permitem o monitoramento diário do aumento ou queda das queimadas, do índice de desflorestamento, ou reflorestamento, que nos darão a chance de fazer um combate bastante eficaz contra os inimigos do meio ambiente. Para isso, porém, precisávamos de um Código realista, que não prejudicasse a economia rural, e que não desviasse a atenção das autoridades dos casos realmente graves de agressão à natureza.

PS:

A CUT publicou nota duramente crítica ao Código Florestal. Mas é uma nota apenas política, que não especifica nenhum ponto contra o qual tenha divergência. Pareceu-me por isso um pouco retórica. A entidade ao mesmo tempo divulgou matéria em que destaca reunião de Dilma com a Federação de Trabalhadores na Agricultura, na qual a presidente anuncia medidas de apoio à agricultura familiar.

A Contag, por sua vez, que é filiada à CUT era filiada à CUT até 2009, e mudou para a CTB, divulgou uma nota em que admite que o Código contemplou todas as suas propostas, mas criticou a concessão de benefícios à agricultura patronal que deveriam ser restritos à familiar.

26 de maio de 2011

Código Florestal e chapeuzinho vermelho

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O Brasil é hoje o principal exportador de soja e carne do mundo, e isso numa época em que não há mais abundância de alimentos. Os estoques mundiais de grãos caíram. A demanda global vem subindo a um ritmo crescente, ano a ano, impulsionada pelo rápido processo de industrialização em curso nas economias emergentes. Há pouca terra agricultável disponível na Ásia, onde o problema da segurança alimentar tem se tornado particularmente grave, sobretudo porque se soma ao esgotamento de reservas de água subterrâneas.

As pessoas tem pouca informação acerca da segurança alimentar global. Falta ainda um sentimento humanista verdadeiro. Não basta amar a Palestina, é preciso torcer também para que os chineses não passem fome. A harmonia alimentar do planeta é saudável para todas as nações, e se a soja brasileira tem uma função relevante neste sentido, devemos parabenizá-la. Critica-se a produção de soja no Brasil porque ela seria usada para alimentar porcos na China... como se esses porcos não constituíssem a principal fonte de proteína para bilhões de asiáticos!

Ou então desconhecem que a mesma soja é usada como nutriente fundamental para o fabrico de rações que sustentam as populações de frango, bois e suínos no Brasil, os quais servem ao consumo doméstico e à crescente demanda externa. Por mais que isso machuque a consciência dos adoradores do Green Peace e fanáticos pelo MST, a proteína que dá vida ao povo brasileiro passa pelo cultivo de soja e milho nas grandes propriedades rurais. Não digo que isso é bom, mas é um fato concreto.

E com a receita gerada pela exportação de soja, importamos remédios e produtos manufaturados importantes para nossa sobrevivência e desenvolvimento.

A repercussão do código florestal foi péssima nas redes sociais, por causa de uma visão maniqueísta da questão agrícola brasileira. Os ruralistas não são respeitados enquanto agentes políticos de um setor chave para a economia e para nossa segurança alimentar. Produtores rurais são depreciados, julgados moralmente. Uma conhecida até concordou, nervosa e indignada, quando eu falei, jocosamente, que eles "comiam criancinhas".

A bancada ruralista é formada por parlamentares de centro-direita, mas em nome do pluralismo político e da democracia devemos respeitá-los. Não é coerente falar em favor do pluralismo, e quando se está diante da necesssidade de exercê-lo, virar-lhe a cara. Os ruralistas foram eleitos por brasileiros com tantos direitos políticos quanto nós e você. Eles tem suas razões para serem de centro-direita, e a falta de respeito do militante de esquerda para com a milenar figura do produtor rural é uma delas.

Não se pode confundir ainda os elementos criminosos que existem no seio da classe rural, com a classe inteira. Isso é uma generalização absurda, injusta e antidemocrática. Um clássico preconceito!

E já que não temos planos de transformar a agricultura brasileira em gigantescos kibutz soviéticos, controlados pelo governo federal, precisamos aprender a lidar com os anseios e trejeitos dos produtores rurais, assim como eles tem de suportar o estilo maconheiro-greenpeace dos esquerdistas urbanos. Eles podem ser reacionários, mas a força de trabalho que dispendem em prol do país não vale menos por causa disso.

O agronegócio brasileiro será uma das galinhas de ovos de ouro que, juntamente com o pré-sal e a melhora de nossa infra-estrutura, poderá fazer o Brasil dar um grande salto econômico. É produto básico, mas o processo histórico da divisão internacional do trabalho (como ensinava o bom Adam Smith) tornou a atividade agrícola um setor altamente tecnificado e especializado. E sempre há a possibilidade de elevarmos a exportação de produtos agropecuários já industrializados. Sem esquecer que o aumento da produtividade da agricultura nacional implica em ganho similar ao de agregar valor ao produto.

O governo hoje não perdoa mais dívida de produtor rural. As enormes pendências que existiam originaram-se da terrível confusão cambial que viveu o Brasil nas décadas de 80 e 90. Foram sanadas pelo governo Lula. Hoje o produtor não mais dá calote porque ele perderia o acesso a novos financiamentos do Banco do Brasil.

O código florestal visa trazer o produtor para legalidade. Quase 90% dos produtores (a maioria pequenos) vive como um clandestino em sua própria fazenda, em situação irregular. E o pior, o código não era aplicado na prática. O novo código permitirá ajustar a lei à realidade do campo, liberando as autoridades para focar suas ações no combate ao desmatamento.

Entretanto, o texto não permite que haja desmatamento. Está-se falseando a verdade através de uma grande caricaturização do código. Trata-se de uma das leis florestais mais rigorosas do mundo, que representa um esforço para conciliar os interesses do pequeno agricultor, a grande agricultura comercial e a preservação do meio ambiente. No caso da Amazônia, as restrições ao desmatamento são draconianas. Ninguém poderá derrubar uma árvore sem autorização expressa de várias entidades.


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Gostaria de linkar ainda um artigo do cientista político Fabiano Santos, que por acaso é filho do mestre Wanderley Guilherme dos Santos. Fabiano publicou nesta terça-feira um artigo no Valor fazendo uma crítica aos petistas pela falta de apoio que deram ao Código Florestal.

Fabiano faz considerações sobre a importância do código florestal para liberar as forças produtivas nacionais:

[O código florestal visa] preservar a soberania nacional sobre o solo pátrio, permitindo aos setores do capital e do trabalho boas condições de utilização de nossos recursos na geração de riqueza. A coalizão com os ruralistas vem daí. A rejeição do PT ao acordo, no entanto, é mais complexa e potencialmente explosiva.

A posição do PT, que, ao cabo, orientou sua bancada a dizer sim ao Código, mas que votou dividido, é explicada, por Fabiano, pela necessidade que o partido tem de se aproximar daquela mesma classe média que optou por Marina Silva no primeiro turno das eleições de 2010. Para capturar, enfim, parte do eleitorado paulista de classe média.

A perda da classe média, entretanto, visível nos mapas eleitorais das eleições de 2006 e 2010, não é absorvida pela cúpula partidária, localizada em São Paulo. Não há chance de vitória neste Estado sem seu apoio. Não há chance, sobretudo, de derrotar seu principal inimigo - o PSDB paulista. A questão nacional para o PT pós-Lula transforma-se unicamente na perspectiva de derrotar os tucanos em solo bandeirante. Aqui entra então o endurecimento na negociação do Código Florestal. O que vemos, na verdade, é a tentativa de resgatar para o seio do partido parcelas da classe média perdida e que dão o voto de minerva em eleitorados como o de São Paulo. Se o namoro com os verdes e com os eleitores de Marina Silva adquire agora inteligibilidade, nada mais longe dos interesses envoltos na expansão do capitalismo brasileiro e das possibilidades de aprofundamento de uma agenda trabalhista. Namoro que na ótica da esquerda nacionalista significa tão somente recepcionar uma agenda ecológica de inspiração exógena.

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O fato da direita agrária estar apoiando o código florestal não significa que a esquerda também não pode fazê-lo, como aconteceu. Tenha em mente que foi uma vitória esmagadora: 410 a 63! Não se pode avaliar um fato social tendo apenas em vista a opinião do adversário. Tipo assim: se Ronaldo Caiado festejou, então é porque é ruim. Ora, o código florestal foi defendido por todas as organizações de agricultura familiar, como Contag e Fetag, que participaram da construção do texto. Ainda não vi se estão satisfeitas com o resultado, mas sei que elas lutaram para que o código fosse aprovado.

Observo ainda um descompasso entre o sentimento do povo e as redes sociais. Militantes da web repetem o quanto trabalharam na campanha de Dilma Rousseff, como se a presidenta lhes devesse alguma coisa. Quem elegeu Dilma não foi o Twitter, mas 135 milhões de eleitores! Dilma deve sua vitória a 56 milhões de brasileiros, igualmente, e não a nenhum internauta em particular.

Num sufrágio limpo, transparente e universal, os  brasileiros elegeram seus parlamentares preferidos, e estes aprovaram o Código Florestal, depois de muito debate. Todos os partidos da base, incluindo os de esquerda, como PSB, PT, PDT e PCdoB orientaram suas bancadas para que votassem sim pelo Código Florestal. Não venham culpar a Dilma por isso. Permitam-me ser piegas: se os deputados votaram maciçamente em favor do Código, temos uma legítima manifestação da vontade soberana do povo brasileiro. Você pode não gostar, mas é assim que funciona a democracia. E se todos os partidos de esquerda votaram pelo código, não venham chamar de direitoso quem o defende na internet!

O código poderá ser aperfeiçoado (ou piorado) no Senado e a presidente sempre pode vetar um outro ponto que ela considere inapropriado.

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Eu tenho impressão que se houvesse Twitter em 2005, Lula sofreria um impeachment, com ajuda de tuiteiros e blogueiros do PT. Nunca se viu, a cinco meses do governo, tanta gritaria e agressividade dos próprios "amigos" contra aquela mesmo que, segundo estes, custou tanto sangue, suor e lágrimas. Um blogueiro disse até que gastou muito dinheiro na campanha, e que agora se arrepende de tê-lo feito. Talvez queira a grana de volta?

Aliás, de 2003 a 2005, houve algo parecido, mas graças a Deus não havia rede social. Tem gente que enxerga derrota e vergonha em qualquer pequeno recuo. Passa uma nuvem no céu e parece que viram os sinais do apocalipse! É preciso ver do alto, analisar o conjunto da obra, ter um pouco de calma e paciência! Esperar para ouvir outras versões do fato.

O impressionante é como esse sentimento se espalha. É sempre a mesma classe média, politizada, com seu DNA lacerdista, ainda que avermelhado. O lacerdismo não se caracteriza apenas pelo moralismo, mas também por essa indignação afobada, arrogante, apoplética.

As pesquisas mostram Dilma nadando em popularidade. O povo continua apoiando a presidente que escolheu, sem impaciência ou ansiedade. Sabe que as conquistas são lentas, e que eventuais recuos podem ser compensados com avanços mais adiante. Em 2003, quando Lula era atacado virulentamente por essa mesma esquerda hoje em polvorosa, um instituto fez uma pesquisa para saber a expectativa da população para com o governo. A grande maioria respondeu que daria até dois anos para que Lula promovesse alguma mudança efetiva. Não vamos confundir a opinião volúvel, instável e sempre meio neurastência das redes sociais, com o sonho poderoso, otimista e sereno de 200 milhões de brasileiros!

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É muita manipulação, inclusive no lado oeste. No dia da votação do Código, alguém falou do púlpito sobre o recente assassinato de dois ambientalistas do Pará. Muitos deputados vaiaram. Ora, não vaiaram os ambientalistas! Vaiaram a tentativa de se fazer chantagem emocional. Um blogueiro ainda falou que os parlamentares do PCdoB deveriam ter se retirado do recinto. Muito bonito! Eles deveriam ter abandonado a votação, em vez de ficarem ali e praticarem a luta política?

O fato de termos acesso, diariamente, a milhares de notícias eleva exponencialmente a possibilidade de recebermos uma notícia desagradável. Creio que devemos nos manter, porém, sempre céticos em relação à qualquer informação veiculada pela grande mídia. Os jornais enganam mesmo falando a verdade, através de intrigas, pequenos exageros, sugestões...


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Neste debate, é preciso que as pessoas pensem com suas próprias cabeças. Não adianta distribuir link de fulano como se isso fosse um argumento. Acabo de ler um blogueiro afirmando que a aprovação do Código se deu por causa do Palocci, e que os ruralistas só conseguiram aprová-lo por conta de ameaças contra o ministro. Ué, não foram mais de 400 deputados, inclusive de todos os partidos de esquerda, que votaram pelo Código? Não foram só os ruralistas! Foi o Congresso inteiro! Não se pode torcer a realidade para caber na sua teoria.

E a tese de que Dilma cedeu no caso do "kit gay" também por causa do Palocci é outra forçação de barra. A presidenta pode ter cometido um recuo lamentável e covarde. Ou uma atitude sensata, segundo o Brizola Neto. Mas a principal razão desse recuo é que as bancadas religiosas tem poder e pressionaram. O poder deles é um fato. Mesmo que tenhamos um Estado laico, não se pode subestimar o poder eleitoral e político desse pessoal. Esse é o fator determinante, a força eleitoral da bancada religiosa, não o Palocci.  Se não fosse o ministro, usariam qualquer outro artifício. Não é uma questão de afronta ao laicicismo, e sim uma demonstração de poder, nada espiritual, concretíssimo, por parte dos carolas. Eu antipatizo profundamente com a bancada religiosa, mas sei que a luta política contra eles é um jogo de xadrez tão complicado como a política internacional. Tudo é difícil, irmão.  Dilma tem uma relação delicada com o mundo religioso, como bem vimos nas eleições. As igrejas se posicionaram duramente contra a sua candidatura, tanto a católica quanto a evangélica, as duas maiores do país. Ela está ainda está matutando como vai resolver esse problema, que não é só dela, é um problema da esquerda laica, representada pela Dilma, com as igrejas, reacionárias por natureza. Em 2014 teremos outra eleição, e ela tem de pensar nisso desde já, para não abrir espaço para um salvador da pátria, com benção do papa, entregar a tocha olímpica aos carolas da direita. Não esqueçamos que, na véspera do pleito, bispos católicos conseguiram arrancar do papa uma declaração pró-Serra... Os boatos sobre demônio, imposição de ideologia gay nas escolas, etc,   foram muito pesados. Dilma sabe que tem de olhar isso com cuidado para não atrapalhar, no médio e longo prazo, a própria luta do movimento homossexual.

Lula não tinha problema com religião porque sempre viveu rodeado de padres, freis e bispos. O PT do Lula sempre esteve bem amparado pelas igrejas, tanto que o próprio governo Lula avançou bem pouco, em oito anos, nessa questão. Como querem que Dilma, depois de tudo que passou, vença a bancada religiosa em apenas cinco meses!

Tenho confiança, contudo, que venceremos todos esses obscurantistas. Não sou e nunca serei um derrotista. Não vou choramingar pelos cantos ao primeiro revés. A história e a razão estão do nosso lado. Há pouco tempo queimávamos mulheres vivas na fogueira e tentávamos curar homossexuais com torturas escabrosas. Avançamos um pouco desde então.

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Em relação ao Ministério da Cultura, temos pelo menos uma excelente notícia, que é a presença de Wanderley Guilherme dos Santos na direção da Casa Rui Barbosa!

25 de maio de 2011

Legalizar a maconha?

4 comentarios

(Obama smoking weed)


Não me inteirei muito sobre a tal da Marcha da Liberdade, em São Paulo. Fiquei sabendo somente que, dentre outros temas, tinha a ver com uma campanha pela legalização da maconha. A marcha foi proibida por um juiz conservador da cidade. Mas aconteceu mesmo assim.

Aproveito a deixa e declaro aqui a minha opinião. Tem que legalizar a maconha! É uma vergonha que os Estados Unidos, o país mais conservador do ocidente, já tenha legalizado o uso e plantio de maconha medicinal em vários estados, e aqui a gente continue a criminalizar uma planta que é fumada de norte a sul do país.

Em 1996, a Califórnia se tornou o primeiro estado a legalizar a venda da maconha sob prescrição médica. Os outros estados que permitem algum uso de maconha para fins medicinais são Alaska, Colorado, Havaí, Maine, Maryland, Michigan, Montana, Nevada, Novo México, Oregon, Rhode Island, Vermont e Washington.

(Extraído do site Unieuro, matéria de dezembro de 2009)

O Brasil poderia se tornar um grande produtor e exportador mundial da planta, gerando emprego para milhares de pequenos agricultores.

Legalizando, poderíamos também explicar melhor à juventude os males do vício. Conheço bem essa ervinha danada. Tenho milhares de amigos que fumam um back. Estudei letras na UERJ (antes de me formar em Comunication), frequentava a UFRJ, era tudo um fumacê só. Pra falar a verdade, aqui no Rio, entre a juventude "cult" universitária é difícil achar um elemento que não fume ou não tenha fumado. Os shows no Circo Voador antigo (mas já na Lapa), que eu assisti dos 17 aos 25 anos, mais ou menos, eram uma coisa de louco. Você mal conseguia respirar lá dentro de tanto vapor jamaicano.

Entretanto, a cannabis atrapalha a concentração, dá preguiça, engorda, confunde o cérebro, tira a energia que deveria ser canalizada para o estudo ou trabalho. E há que se cuidar, porque vicia sim. Não é um vício físico como a heróina, a cocaína e o crack, mas é um vício psicológico e cultural, que leva o cara a só se divertir depois de fumar um baseado.

E devemos proteger as crianças, naturalmente. Tive uma namorada que parou de fumar aos nove anos. Isso mesmo que você ouviu, aos nove anos! O pai dela, um hippie mucho crazy que uma vez foi andando do Rio a Porto Alegre, apresentou maconha à filha desde que ela tinha quatro ou cinco anos!

É o mesmo cuidado que temos de ter com o álcool.

Tudo bem que a legislação brasileira avançou bastante no quesito repressão. Não se prende mais usuário, e há uma lei nova segundo a qual a pessoa, se for réu primário, sequer tem que pagar cesta básica ou trabalho comunitário; simplesmente assina um documento se comprometendo a nunca mais fazer aquilo.

Temos que dar agora um passo definitivo, que é liberar e legalizar as drogas. Mas a luta pela legalização da maconha tem de ser construída de baixo, pelo convencimento gradual e progressivo da sociedade. Dando um passo de cada vez, compreendendo o momento político, não desistindo ou desanimando ao primeiro revés. Dirigindo a artilharia contra os verdadeiros adversários, não contra nossos aliados!

E todavia agindo com bravura e assertividade, claro! Também não adianta sermos cerebrais em excesso. Tem que ir para a rua e botar a boca no trombone. A criminalização das drogas só gera prejuízo, constrangimento, e incentiva o crime. As cadeias brasileiras não suportam mais receber pequenos traficantes. E boa parte dos gastos com segurança pública esvaem-se no combate ao uso de entorpecentes.

Acho que deviam primeiro legalizar a maconha e, no médio prazo, todas as drogas.

24 de maio de 2011

Trem-Bala & mais pitacos sobre o caso Palocci

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Duas coisas: quero dar o link para esse artigo do José Valente sobre o trem-bala. Eu sou um entusiasta do trem-bala e me aborrece a muquiranagem que surge sempre que se aventa a hipótese do governo usar o BNDES para financiar a construção do empreendimento. Para mim, nem que fosse 100% público e a fundo perdido, e que custasse R$ 300 bilhões, ainda sim valeria a pena, porque o mundo desenvolvido todo possui trens de alta velocidade. Só o Brasil que não tem, e o trem-bala será o pontapé inicial em nossa indústria ferroviária, hoje ancorada no século XIX. Agora, financiar R$ 30 bilhões? Para fazer um trem que pode durar 200 ou 1.000 anos! Merreca! É o que Brasil gasta em 2 ou 3 dias de juros da dívida pública!

A segunda coisa é esclarecer que não tenho pretensão nenhuma de convencer outras pessoas de que minha opinião é a certa. Quer dizer, até quero convencer sim, porque senão não escrevia, mas não levo as coisas a ferro e fogo como alguns pensam. Podem pensar diferente, podem se manifestar, e não procuro pensar que tal ou qual postura é "fazer o jogo da direita". Não acho. Tudo está na conta. O governo obviamente tem que ser criticado, inclusive por seus aliados, e deve ser cobrado duramente, severamente, sistematicamente.

Acontece que minha especialização tem sido a de identificar articulações midiáticas para impor determinadas agendas ou visões de mundo ao país. É algo que faço instintivamente. Eu sou muito racional, mas minhas motivações são puramente instintivas e passionais (o que é uma forma elegante de admitir que sou meio maluco).

Não acho, porém, que só porque a mídia articula, por exemplo, para derrubar Palocci, que uma pessoa, um blogueiro, não possam se animar a derrubá-lo também.

Entretanto, não aprovo o surfar nas ondas da manipulação midiática. Isso de fato acontece, e as pessoas sequer se apercebem disso. Quando vêem, estão tomadas por aquele mesmo moralismo udenista que criticavam tanto nos outros. Mas isso também faz parte do processo. Não aprovo, mas entendo e sobretudo não julgo ninguém. Se a pessoa está equivocada e não se trata de má-intenção, é porque foi mal informada. Ainda não leu o Óleo...

Lembremos que no decorrer dos últimos oito anos, houve uma quantidade enorme de pessoas bem-intencionadas e até inteligentes que acabaram aderindo ao canto sedutor do moralismo midiático. Até porque o moralismo sempre tem razão, pois sempre haverá deslizes éticos por parte do governo, já que este é composto de políticos de carne e osso, e não de santos. Temos que ser rigorosos mesmo. Mas não teríamos mais quem nos governasse se este rigor for excessivo. Como dizia o Eclesiastes: "Não sejas demasiadamente justo, nem demasiadamente sábio; por que te destruirias a ti mesmo" e "não há homem justo sobre a terra, que faça o bem, e nunca peque".

Enfim, não quero aceitar nenhum vale-tudo, mas existem instituições no país. Se estas entenderem que Palocci cometeu um erro, então que se o demita. O que não me agrada, é jogar no colo do cidadão comum, sem o mínimo embasamento jurídico, sem informação, sem nada, esse peso, essa responsabilidade de ser o juíz ético de outrem. O cidadão faz um juízo político, aí sim. Juízo ético é diferente, só podemos fazer após informações completas sobre os mau-feitos e circunstâncias em que foram cometidos.

Palocci, por exemplo, pode ter contado a Dilma quem são seus clientes, pode ter inclusive apresentado a ela as suas notas fiscais, já que toda a sua atividade foi por ele registrada junto à Receita. Mas não pode revelar a público porque são informações confidenciais, protegidas pelo sigilo próprio à atividade de consultor. O governo Dilma vai terminar e Palocci terá que voltar a ganhar a vida lá fora. Um leitor disse que ele pode ser professor, mas não consultor privado. Ora, ele tem liberdade para fazer o que quiser, não tem? O mesmo leitor disse que esse não costumava ser o perfil do parlamentar petista. Ora, aí entendam-se com o PT. Eu nunca acreditei em nenhuma estória de carochinha sobre o PT. Para mim, é um partido que se distingue dos outros por suas bandeiras políticas e não pela maior honestidade de seus membros. Tem muita gente no PT em quem eu não votaria. Palocci é um deles. Não votaria no Palocci, mas não por odiá-lo. Ao contrário, entendo a importância dele no processo de estabilização econômica dos primeiros anos do governo Lula. Não votaria no Palocci simplesmente porque teria candidatos melhores em vista.

A matéria da Carta Capital desta semana, sobre o Palocci, me desculpem, é fraquíssima. As únicas informações sobre o "escândalo" Palocci vem de citações de reportagens da Folha e do Estadão. E mesmo assim não encontra nada de concreto. Diz apenas: "segundo a Folha" Palocci fez isso, "segundo o Estadão" Palocci fez aquilo. E o título da matéria: "Ele ri de quê", é um pérola do clichê da matéria moralista. Pega-se uma figura sob os holofotes do jornalismo de escândalo e encontra-se uma foto dela sorrindo ou rindo. Aí tasca-se a pergunta capciosa: "tá rindo de quê". Ora, a pessoa, por mais que seja um assassino tarado pode estar rindo, naquele momento, de qualquer ninharia sem sentido. A frase visa apenas a produzir neurastenia, a incendiar o coração lacerdista que existe em todo leitor.

Esquece-se ainda que Palocci, como parlamentar, foi de grande valia para o governo Lula, ajudando-o a levar adiante propostas e reformas que ajudaram a distribuir renda. Ninguém o acusou, até o momento, de ter sido um deputado desleal, que votava com a direita.

Se formos lembrar do caseiro, no entanto, minha opinião é outra. Na época, eu até defendi o Palocci por achar que o caseiro tinha sido subornado. Aquele dinheiro que ele recebeu em cima da hora foi muito estranho. Mas logo depois já passei a pensar diferente. Palocci errou. Nunca deveria ter aceitado fazer aquele jogo de incriminar o caseiro. Por outro lado, eu lembro também o que acontecia naquele momento. Palocci estava sendo acusado diariamente pelo caseiro e pela mídia, de participar de festas com prostitutas e reuniões onde se trocavam malas e malas de dinheiro. Durante semanas, ou meses, Palocci ficou sob os holofotes agressivos da mídia. É balela, portanto, essa historia de que a mídia "blinda" Palocci. Ela o faz somente quando lhe interessa, mas se constatar que pode derrubar o ministro e causar estrago no governo, virá com carga máxima para cima do petista.

Não me espanta, digo mais uma vez, que Palocci tenha resolvido ganhar dinheiro. Quando atingimos um patamar, ficamos também muito mais vulneráveis ao ataque de nossos adversários. Um quadro político importante que não tenha recursos financeiros estará sempre em posição frágil diante de uma armação qualquer. O partido muitas vezes não poderá ajudar. Os amigos desaparecerão. Os clientes evaporar-se-ão. O governo terá de lavar as mãos. A pessoa só poderá contar consigo mesma. É por esse motivo que a maioria das pessoas foge de qualquer resposabilidade pública. Raríssimos jovens hoje ambicionam a vida política. Sabem que o preço a pagar é demasiado alto, mesmo com todas as regalias que o poder proporciona. Eu, por exemplo, prefiro muito mais minha vida pacata de blogueiro pobre do que a turbulência emocional, os eternos dilemas morais e a exposição midiática cruel a que são expostos homens como Palocci. Não estou dizendo que ele é um coitadinho. Muito pelo contrário, é preciso ser forte, cínico, e gostar muito, para encarar de frente o realpolitik brasileiro... É covardia, no entanto, usar Palocci para estabilizar a economia, para ajudar na arrecadação de campanha, e depois lançá-lo às feras na primeira crise, antes mesmo de surgir qualquer prova cabal de algum ato ilícito.

Eu mencionei a saúde frágil da Dilma porque há parlamentares, inclusive muitos petistas, que estão se rebelando contra a presidenta por ela estar "se isolando" no Planalto. Não tem consideração sequer pelo fato de Dilma recuperar-se de uma pneumonia. Aliás, tenho lido várias observações que não levam em conta a recente pneumonia de Dilma, que a forçou a sair de cena por algumas semanas, justamente no momento que estoura a crise Palocci.

22 de maio de 2011

O caso Palocci: ingenuidade, oportunismo e manipulação

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Atacar Palocci seria uma excelente oportunidade para este blogueiro demonstrar sua independência em relação ao governo Dilma. Afinal, de fato, ser blogueiro (blogueiro político, para ser mais exato) tornou-se uma espécie de cargo militar na guerra midiática em curso no Brasil desde a assunção da esquerda ao poder, em 2003. A gente vê os erros em nosso próprio campo, mas a prioridade é defender o nosso lado e atacar o adversário. Não é uma filosofia muito bonita, do ponto-de-vista da ética jornalística, mas é a realidade concreta, como diria Lênin. E os jornais, na verdade, são apenas mais hipócritas, quando negam ter igualmente uma postura orgânica em defesa de uma ideologia e dos partidos políticos que a professam. A gente nunca está totalmente à vontade nessa guerra, todavia, e sonhamos em abandonar a farda e nos tornarmos verdadeiramente imparciais. E aí que se dane Palocci e Dilma. Eles que se virem. Eu sou um blogueiro livre!

A derrota da mídia, neste sentido, nunca é completa, porque seus candidatos podem perder as eleições, mas os periódicos continuam a circular normalmente, e a audiência do Jornal Nacional permanece estável. Além do mais, os vitoriosos, para vencerem, tiveram que assumir alguns valores do adversário, mesmo que disso não tenham consciência.

De qualquer forma, essa é a democracia que temos, e não é correto sermos maniqueístas ou dramáticos. Nem o nosso campo político é composto de santos, nem nossos adversários são demônios ansiosos para destruir o Brasil. Passado o processo eleitoral, temos que buscar a paz; não sou eu que digo; é o que consta no preâmbulo da nossa Constituição:

Nós, representantes do povo brasileiros, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, (....) uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias (...).

Enfim, eu poderia atacar Palocci, e mostrar como eu sou independente. No entanto, não o farei pelos seguintes motivos:

Não sou juiz nem policial. Não gosto desse papel. Não o faço nem com quadros políticos que eu combato. Quem pode definir se fulano cometeu crime ou não é a Justiça, e quem tem a função de investigá-los é a polícia ou o Ministério Público. Poderia citar aqui o "jornalista investigativo", mas essa é uma atividade que tem sido tão vilipendiada por elementos desonestos e parciais que prefiro deixá-la de fora.

Não concordo com a demonização política de Palocci, pintado como um quadro inútil e incompetente. É injusto atribuir o conservadorismo dos primeiros anos do governo Lula apenas à Palocci. Ele soube, sim, corajosamente, assumir o ônus de tudo, para preservar o presidente e o governo, mas Palocci não fez mais do que seguir as diretrizes traçadas por Lula, e Lula, por sua vez, seguiu as diretrizes traçadas pela necessidade e pelas condições políticas e econômicas do momento. Desde então, parte da esquerda estigmatizou Palocci. Todavia, por mais incômodo que seja para a esquerda aceitar, os desdobramentos da história provaram que sua política econômica estava certa. Ele mesclou conservadorismo econômico e ativismo social. Quem pagou a dívida externa com o FMI não foi Guido Mantega; foi Palocci. Quando chegou a crise política, e o governo foi posto no pelourinho da mídia, seus defensores estavam armados com as estatísticas que a gestão Palocci lhes forneceu. Inflação baixa, forte crescimento econômico, acelerado processo de distribuição de renda em marcha, dívida externa paga.

Palocci assumiu todos os ônus, junto à esquerda, pelas políticas conservadoras, deixando que Lula figurasse como um deus olímpico, livre de qualquer peso simbólico das decisões difíceis. Tanto que hoje, os que defendem a queda de Palocci alegam que Dilma deve se realinhar ao "lulismo" para poder governar. Ora, Palocci não foi "lulismo"? Na verdade, o Palocci de hoje é um articulador político, sem nenhuma influência sobre a política econômica, enquanto na gestão anterior era o titular do Ministério da Fazenda!

Tanto é que os agentes do mercado, da vida real, tem a opinião de que a política econômica de Dilma está bem mais à esquerda que a de Lula. Ou seja, uma volta ao lulismo seria um retrocesso conservador...

Confunde-se ainda o último governo de Lula, quando ele estava livre do constrangimento de se reeleger, e o governo vinha na sequência de uma série de vitórias, no campo da popularidade, sobre a mídia corporativa, confunde-se esse último ano com seus oito anos de mandato. Durante quantos anos, nosso querido Paulo Henrique Amorim não chamou Lula de "o presidente que tem medo"? Durante quantos anos, Lula não foi acusado de "neoliberal" e de apenas dar continuidade à gestão anterior?

Voltando a Palocci, nosso combativo e ansioso blogueiro agora acusa o ex-ministro de ter consultado o filho de Roberto Marinho para escrever a Carta aos Brasileiros. Cita uma página do livro do professor Venício Lima, o qual sabe-se lá como teve acesso à íntegra de uma conversa privada, particular, para acusar Palocci de ter recebido "instruções" do líder-máximo das organizações Globo.

Ora, em primeiro lugar, quem assinou a carta aos brasileiros foi o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva. Palocci ligou para empresários, da indústria e da comunicação, e ajudou a redigir, mas quem determinou as diretrizes e apôs seu nome ao final do texto foi Lula. E sem hipocrisia e ingenuidade, a função daquela carta foi justamente acalmar a histeria de empresários e mídia por conta da iminente vitória de Lula.

Então que se culpe Lula, não Palocci. A santificação atual da figura de Lula significa uma apolitização absurda da história. Lula foi grande não apenas por suas decisões em favor dos pobres, mas também em função de sua política de conciliação e diálogo, em relação aos ricos. E isso sem contar os aspectos mais sombrios e questionáveis dessa aliança do lulismo com as elites.

O discurso de que Dilma deveria voltar ao lulismo não tem sentido. Voltar é retroceder. Retroceder é ser retrógrado. O governo Dilma tem de avançar, simplesmente. Para isso, porém, é preciso acertar o ritmo dos passos, saber recuar em alguns momentos, acelerar em outros. Pode ainda fazer como Lula, que alternava momentos de recuo político e avanço nas políticas sociais, com outros de avanço político e recuo no social. E todo esse vai-e-vem não se dá somente em função dos humores da "mídia velha", mas em virtude de análises concretas sobre a atual correlação de forças, a nível mundial, além do puro, singelo e inocente cálculo macro-econômico propriamente dito, o qual, apesar de ser demonizado como vício neoliberal, existe de fato.

Eu acho que o governo Dilma tem força suficiente para aguentar o tranco de uma eventual queda de Palocci. Se houver algo de concreto, ele terá de sair. Não boto a mão no fogo por Palocci assim como não fiz com nenhuma figura do governo Lula.

Quanto às denúncias de enriquecimento, mais uma vez apelo à Justiça. Não vou condenar Palocci simplesmente por ganhar dinheiro. Arminio Fraga comprou o MacDonalds América Latina por 1,5 bilhão de dólares logo após sair do governo FHC. André Lara Resende, de pobre ficou miliardário, com haras até na Inglaterra. Palocci comprou um apartamento de 6 milhões de reais.

Não digo isso para repetir o discurso de que "se eles fazem, nós também podemos fazer", mas para mostrar que o mercado costuma receber ex-integrantes de equipe econômica com muita generosidade. Alguns dizem que a lei é falha, ou que a quarentena imposta é pequena. Não sei. Nesse ponto, prefiro o ceticismo. Se a quarentena fosse excessiva, ou se proibíssemos que ex-membros da equipe econômica ganhassem dinheiro em consultorias, abertamente, declarando ao fisco, estaríamos estimulando que o sujeito ganhasse dinheiro por baixo dos panos. É a lei da oferta e da procura.

A mídia explora a nossa realidade pequeno-burquesa. Apartamento de seis milhões, faturamento de vinte milhões em 2010! Que horror! Por outro lado, analisando bem, é melhor que os políticos faturem de maneira transparente, como fez Palocci, registrando tudo na Receita e pagando devidamente seus impostos, do que ganhem seu dinheiro "por fora", como fez aquele governador do Distrito Federal, de triste memória. Em nossa vida de simples mortais, esses valores são fora-do-comum, mas lembremos que no alto do pirâmide social, respira-se outro oxigênio. Apresentadores de TV ganham milhões por mês, jogadores de futebol ganham milhões por mês, donos de agências de publicidade ganham milhões por mês, banqueiros ganham BILHÕES por mês.

Falemos de ética. Muitos questionam a ética nas ações de Palocci. Que segredos de Estado ele vendeu? Bem, esse é um ponto realmente difícil de ponderar. Ele poderia ter vendido secretamente, se quisesse, com grana depositada em contas no exterior (se é que não o fez).

A solução talvez só venha quando tivermos computadores regendo o governo, programados para não divulgarem nenhuma informação. Até porque nem sabemos que tipos de informação existem cujos segredos não podem ser divulgados de maneira nenhuma, nem sabemos que Palocci os divulgou. Não sabemos de nada. Em tese, Palocci pode ter vendido por milhões supostos segredos, mas não os mais importantes. Pode ter ganho dinheiro vendendo informação anódina ou mesmo falsa. Se são segredos, nem os empresários saberão. Ou então, pode sim, ter vendido informação importante, sigilosa. A única maneira de estarmos seguros com nossas equipes econômicas, seria tomar alguma medida drástica, à la Pérsia Antiga, como mandar degolar todos seus integrantes assim que terminasse sua gestão.

A única bóia à qual podemos nos agarrar volta sempre a ser a inevitável confiança que temos em nosso presidente da república. É ele ou ela, ao cabo, que tem a posição privilegiada de ver o quadro completo. Sabe os segredos de Estado. Tem o controle dos serviços de inteligência. Tem muito mais poder do que nós, portanto, de averiguar os eventuais mau-feitos do senhor Antonio Palocci. Não digo que devemos confiar cegamente em nossa presidente. Não estou dizendo isso. Digo que há situações em que não há outra saída. Temos que confiar ou não. Se não confiamos, então vamos afirmar honestamente. Não confio na Dilma. O fato de não confiarmos, porém, não significa que nós estamos certos e ela errada. Às vezes não confiamos e ela está certa. Neste caso, há um problema de comunicação, e o governo sempre terá um problema de comunicação, na medida em que a mídia brasileira é notoriamente uma mídia de oposição, partidária e, frequentemente, desonesta.

O que não podemos fazer, enquanto cidadãos, é deixar de acreditar no sistema democrático brasileiro. Que é falho, como em todo mundo. Deficiente, cheio de brechas por onde escapolem os poderosos. Mas é o que temos, e não existe sistema infalível. A democracia brasileira está em construção, como aliás a democracia no mundo inteiro. Está se fortalecendo ano a ano. Nosso Ministério Público hoje é muito mais forte, competente, jovem e idealista do que há vinte anos. O mesmo vale para o Judiciário. Não farei elogios ao Legislativo, mas lembrarei mais uma vez o pensamento de Wanderley Guilherme dos Santos: a massa votante hoje no Brasil é infinitamente maior do que em qualquer época passada. Temos mais eleitores e um percentual maior de eleitores sobre a população total do que em qualquer época. Se o Legislativo é bom ou ruim, é uma questão do voto popular, e as distorções decorrentes do financiamento de campanha estão sendo igualmente discutidas democraticamente pelos próprios congressistas, para que seja aprimorada.

Enfim, se Palocci cometeu um crime, compete ao Ministério Público, à Polícia Federal, ao Judiciário, ao Legislativo, decidirem. O que nunca aprovarei é o justiçamento midiático. Da mesma forma não aprovo que setores da blogosfera surfem nesse justiçamento para acertar contas com um quadro com o qual não nutrem afinidade política.

Se achamos que o governo Lula foi bom, temos que aceitar a função de Palocci no processo. E se temos alguma coisa a criticar acerca da Carta aos Brasileiros e da política econômica dos primeiros anos do governo Lula, não é justo crucificar Palocci. Não acho lógica interpretação de que o governo Lula foi bom apesar de Palocci.

Saindo do terreno das suposições, do passado e das suspeitas, Antonio Palocci é quadro político importante para o governo, por causa de seu diálogo com o grande empresariado e com as forças de centro-direita. Seria uma indesculpável ingenuidade da esquerda achar que o governo Dilma não deve dialogar com esses setores, ou que deveria tratá-los com truculência. São esses setores que pagam as campanhas políticas. São esses setores que fazem investimentos no país. São esses setores que tem o poder de derrubar presidentes. A grande mídia é aliada desses setores, e bate no governo para enfraquecê-lo e torná-lo (o governo) ainda mais dependente dos grandes empresários. A ideia de que um governo de esquerda deve amparar-se apenas nos movimentos sociais é arriscada. O governo Chávez vive em crise desde sua posse por conta disso, o que tem se refletido severamente na economia venezuelana, que só cresce quando o preço do petróleo sobe, e sofreu um brutal processo de desindustrialização e fuga de investimentos produtivos nos últimos anos.

O sucesso de Lula foi justamente, ao contrário de Chávez, estabelecer um pacto social entre o trabalho e o capital. Em seus momentos mais difíceis, Lula sempre apelou para as massas, mas nunca deixou de dialogar com a elite econômica. Mesmo fazendo uma política econômica mais à esquerda do que Lula, a atual presidenta não tem a experiência do velho sindicalista para discursos inflamados contra as elites e em favor do povo. Ela não tem nem saúde física para isso. Lula era forte como um touro, um fenônemo da natureza que só a brutal seleção genética do Nordeste miserável pode produzir. Dilma tem saúde frágil, ainda mais depois do câncer com o qual teve de lutar há poucos anos. Temos que avaliar também esses aspectos reais, físicos, porque a nossa democracia é feita de gente de carne e osso, e não de heróis ou símbolos. As perseguições da mídia destroem não apenas reputações, mas também a saúde e a psicologia de suas vítimas (mesmo que essas vítimas sejam culpados na justiça). Dificilmente veremos Dilma a vociferar em comícios para centenas de milhares de pessoas. Ela nunca foi uma sindicalista de massa. Experimentou apenas a eleição majoritária de um partido já consolidado, com recursos, que podia lhe dar todo o conforto necessário.

Mas é uma mulher corajosa, astuta, culta, e incorruptível. Saberá enfrentar com serenidade o teste de sua primeira crise política. O que não podemos exigir é que ela lance um ministro importante como o chefe da Casa Civil aos leões ao primeiro toque de corneta dos adversários. Palocci pode cair, mas só depois de muita luta, e defendido galhardamente por Dilma, por seu partido e aliados. Quanto à questão ética, é na verdade uma questão de Justiça. Se não fez nada proibido ou ilegal, não faz sentido condenar Palocci por ganhar dinheiro num país selvagemente capitalista como o Brasil, onde ou você ganha muito dinheiro ou é tragado e triturado pelo sistema. Em se tratando de um político, essa regra ainda é mais válida, porque ele tem de possuir recursos suficientes para, ao menos, pagar seus advogados, visto que é raro que um quadro partidário relevante atravesse sua carreira sem enfrentar duros embates jurídicos. Vide o caso do diretor do FMI, Dominique Strauss-Kahn. Se por acaso ele for inocentado (e imagine, apenas hipoteticamente, que ele seja inocente), terá sido pelos milhões de euros que conseguiu acumular ao longo de sua vida, pois é o que vem gastando e gastará para bancar advogados, fiança, assessores de comunicação e a própria prisão domiciliar (que custa até 200 mil dólares por mês). Claro que esses riscos não justificam que alguém cometa qualquer ilegalidade. Cito-os apenas para mostrar que o dinheiro ajuda bastante um político a se livrar de problemas, e Palocci já enfrentou graves questões na justiça. Sabe o que é estar na linha de tiro, abandonado por aliados, tratado como pária da sociedade, tendo como amigos apenas advogados de taxímetro estourado. Não me espanta que tenha decidido ganhar dinheiro. Se passou dos limites da lei, no entanto, aí é um caso para o Ministério Público investigar... Minha função, como blogueiro, não é julgar a ética pessoal de Palocci, nem me arvorar especialista em questões jurídicas. Eu faço uma análise política da conjuntura e dou minha opinião. Claro que posso estar errado, mas na minha humilde opinião Palocci é a bola da vez. Caindo Palocci, a mídia virá em cima do próximo quadro, e assim sucessivamente, até o fim dos tempos. Esse filme a gente já viu. A grande imprensa morde fundo, sem piedade, aplainando o terreno para a chegada de seu novo herói, ou para vender caro uma trégua mais adiante. Política (no Brasil e no resto do mundo), definitivamente, não é aconselhada para ingênuos.

19 de maio de 2011

O livro "maldito"

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“Não tenho sabença,
pois nunca estudei,
apenas eu sei
o meu nome assiná.
Meu pai, coitadinho,
vivia sem cobre
e o fio do pobre
não pode estudá”
(Patativa do Assaré)


Li o capítulo do livro amaldiçoado pela mídia e por todos que tropeçaram na pegadinha.

Merval Pereira afirma hoje em sua coluna que o livro irá prejudicar a produtividade da economia brasileira!

Esse escândalo, obviamente, tem o objetivo de horrorizar setores da classe média, que até hoje se recuperam do trauma de ter um presidente da república que não falava segundo a "norma culta" da língua.

É interessante como há segmentos da sociedade vulneráveis ao discurso da mídia. A procuradora federal Janice Ascari, provocada pelos jornalistas do Globo, interpretou o fato não como algo que merecia ser debatido pela sociedade e pelos especialistas (o livro foi indicado e aprovado por uma comissão de notáveis acadêmicos), mas como um caso de polícia! E ameaçou acionar o Ministério Público! Mereceu, como era de se esperar, uma grande homenagem do pasquim kamelista, uma foto gigante na página 3, em seu melhor ângulo fotogênico.

Ora, o que Janice Ascari entende de pedagogia, linguística, ensino de português? Com que poder ela vem ameaçar uma comissão de acadêmicos que estuda o tema há décadas, uma autora que foi professora da rede estadual por mais tempo que ela tem de vida, e um ministério cujos funcionários estudam o assunto sistematicamente, frequentando periodicamente seminários aqui e no exterior?

O livro não ensina o adolescente a falar errado! Ao contrário, é uma abordagem inteligente para mostrar ao estudante que a língua que aprendeu de seus pais pobres, e que foi a única que ouviu em toda parte antes de entrar na escola, não é para se jogar no lixo. É uma língua viva, popular, mas que também tem regras. Com isso, evita-se que o estudante despreze o seu próprio patrimônio linguístico. No Nordeste, temos centenas de poetas de grande talento que produzem literatura de incrível beleza usando a vertente "popular" da língua. É "errado" o que eles fazem? A poesia de Patativa do Assaré e de Luiz Gonzaga estão cheias de desvios da norma culta. Estão "erradas"?

O escândalo da mídia nada mais é do que explorar o preconceito da classe média, emergente ou tradicional, em relação à sintaxe popular.

Leiam o livro! Ele não ensina o estudante a falar errado. Ele não contemporiza. Trata-se simplesmente de uma interpretação carinhosa, pedagógica, acerca do uso popular da fala. É importantíssimo fazer isso!

Saliente-se que os livros didáticos de português há anos, desde o tempo de FHC, tem capítulos dedicados à fala popular, mais ou menos nos mesmos termos. Não se trata, portanto, de uma nova ideologia do "governo do PT", como sugerem neo-sabichões que dão a tudo um viés partidário.

Só agora, por um oportunismo barato (com fins políticos), a mídia resolveu escandalizar.

O professor precisa dar uma explicação ao jovem porque o povo fala de um jeito "diferente", e seria uma péssima didática se ele se restringisse a dizer que o povo fala "errado". Não é isso que aprendemos na faculdade de letras, quando aprendemos linguística! Na faculdade, aprendemos justamente isso, que não existe o falar "errado". Aliás, em linguística se vai ainda mais longe: afirma-se que sequer há uma gramática "certa" ou "errada", e sim uma gramática "normativa", ou seja, voltada para o aprendizado da língua escrita. Se um estudante universitário, que em tese já superou eventuais traumas decorrentes do uso, por seus pais e amigos, de uso de um português "popular", "não-culto", aprende que não existe falar "errado", porque cargas d'água seria certo traumatizar o adolescente dizendo a ele que tudo que ele aprendeu de seus pais e ambiente é "errado"?

Na verdade, existe sim um falar "errado" em linguística. É a fala que não atinge seu objetivo, que não consegue se fazer entender, não consegue estabelecer a comunicação. Esse é único erro, o erro fundamental, de uma fala: não se comunicar, confundir.

Repito, leiam o livro e confiram. Não se ensina a falar errado. Apenas se procura incorporar, ao ensino do português, o uso popular da língua. É uma maneira inteligente de interessar o jovem, de atingir positivamente a sua auto-estima.

O livro mostra que mesmo o uso "popular" da língua segue regras sintáticas similares à da norma culta. Em geral, o uso popular simplifica a língua. "Os peixe", por exemplo. A norma culta comete a redundância de repetir o plural. A norma popular entende que basta apontar o plural no artigo. Essa é a evolução da língua.

Naturalmente, temos aqui uma luta constante entre as tradições, cujos interesses são representados por instituições como a Academia Brasileira de Letras, e a evolução do idioma, que não pára. O objetivo do livro, e de todos os linguistas, não é soltar as rédeas do ensino da língua. É importante que tenhamos máxima uniformidade linguística. Que haja um ensino rigoroso do português normativo. Que todos os brasileiros dominem o português com máxima perfeição.

A evolução da língua acontece ao longo dos séculos, temperada no fogo desta luta entra a tradição e a força popular.

Para ensinar um jovem a falar o português culto, porém, em primeiro lugar temos que lhes mostrar que a língua segue uma lógica. As normas sintáticas têm uma lógica. O livro mostra que mesmo o português "popular" falado nas ruas também pode ser sistematizado sintaticamente. E que ele não é exatamente "errado". Ele é, sim, inadequado. O livro enfatiza a necessidade de usarmos a norma culta para nos dirigirmos a uma autoridade, como, por exemplo, numa entrevista de emprego. Isso é o suficiente para dar a entender ao jovem, com a delicadeza que o tema merece, que ele tem de aprender a falar de forma o mais culta possível, para que suas chances profissionais sejam as maiores possíveis!

Ao mesmo tempo, o livro mostra ao estudante que ele não deve deixar de respeitar e estimar seus pais apenas porque estes usam o português de forma "não culta", além de sinalizar que ele (o estudante) não deve sair por aí corrigindo, esnobando e depreciando as pessoas que não usam a norma culta da língua. Muitas vezes, um parente mais velho do aluno, um avô ou avó, detêm conhecimentos morais que serão muito importantes para o desenvolvimento da personalidade daquele adolescente. Ele não deverá desprezá-los apenas porque o avô não usa a norma "culta" da língua. Se o professor souber aplicar eficazmente o que ensina o livro em questão, o aluno compreenderá que seus parentes usam uma "vertente" popular da língua, mas que isso não invalida a legimitidade de seu discuso e de seus ensinamentos. Ao mesmo tempo, o aluno entenderá que precisa aprender a norma culta para arranjar um bom emprego e para ascencer socialmente. Está tudo ali no livro, muito bem explicadinho.

Claro que o livro não é perfeito. Os especialistas já encontraram erros até na obra de Cervantes. A autora pode modificar alguma coisa na edição do ano que vem. Ou não. O que é injusto é dizer que o livro ensina o jovem a falar errado, ou então afirmar, como fez Janice Ascari (que eu tantas vezes chamei brincando de "heroína" da blogosfera, mas que também, como qualquer um de nós, é sujeita a erros) que se trata de "um crime contra nossos jovens". Crime, a meu ver, é desrespeitar a classe científica que estuda o assunto, e que aprovou esse livro, e tratar o tema como um caso de polícia e não como um tema importante a ser debatido, tranquila e democraticamente, pela sociedade brasileira!

Produção agrícola vai gerar R$ 195 bilhões este ano

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Publico a tabela abaixo para vocês terem uma ideia da importancia da agricultura para a economia brasileira. O valor bruto da produção agrícola brasileira este ano será de R$ 196 bilhões, alta de 8% sobre o ano anterior. Apenas a produção de soja deve gerar R$ 54,39 bilhões; a soja é o produto agrícola que mais gera valor no Brasil. É dinheiro que entra no país e transforma-se em investimento, comércio e impostos. Se todos, à direita e à esquerda, concordamos que a melhor maneira de resolvermos nossos problemas é fazer a economia crescer, com a esquerda forçando políticas públicas de distribuição de renda e a direita pressionando por menos impostos, então precisamos olhar a agricultura como uma de nossas galinhas dos ovos de ouro. Na primeira metade do século XX, os EUA consolidaram-se como potência econômica mundial exportando produtos agrícolas. Até a década de 60, os EUA respondiam por quase 90% das exportações mundiais de soja! Hoje o Brasil lidera o ranking.

O Brasil precisa construir escolas, hospitais, estradas, pontes, portos e aeroportos. Tudo isso custa dinheiro. E dinheiro não cai do céu. Dinheiro vem da terra, com dificuldade. O fato do cultivo de soja ser mecanizado não o torna fácil. É preciso fazer a terraplanagem e controlar constantemente a acidez do solo. Dar a medida certa de fertilizante. Fazer a manutenção de tratores, colheitadoras, secadores. Limpar os silos. Controlar as finanças e estar sempre atento a novas tecnologias de produção. Aprimorar o gerenciamento e estudar as diferentes maneiras de comercializar o produto, usando as bolsas de mercadorias com prudência e sagacidade.

Uma boa notícia é que os fazendeiros descobriram que manter uma reserva natural em suas propriedades ajuda a controlar as pragas, já que os insetos sempre vão preferir seu habitat natural a uma lavoura de soja seca e sem graça.

Entretanto, o governo precisa fiscalizar rigorosamente o uso de pesticidas e agrotóxicos, porque pode haver contaminação de lençóis de água. Há relatos de que alguns deles já estariam corrompidos. O Ministério Público, o governo federal e a sociedade civil organizada devem se unir para resolver esse problema, que só tende a aumentar, ainda mais considerando-se que o Brasil é um único lugar no mundo com disponibilidade de terra suficiente para dar conta do aumento da demanda global, que está acontecendo de maneira muito acelerada.

Os países em desenvolvimento tem conseguido vencer desafios sociais e melhorar o poder aquisitivo de seus povos. Resultado: a humanidade está comendo mais, muito mais. O processo de migração do campo para as cidades continua acontecendo na China e em outras economias emergentes; essas pessoas, que antes viviam de uma agricultura de subsistência, agora trabalham com serviços e indústria, e compram seu alimento no mercado, pressionando a demanda.

Esses números, porém, não incluem outra grande fonte de recursos para a economia nacional: a pecuária. O Brasil é hoje o maior exportador de carne do planeta, dominando especialmente o mercado de carnes de frango. Depois eu pego alguns dados sobre isso também e publico por aqui.

A tabela (clique nela para ampliar):




PS: Segundo a CNA (Confederação Nacional de Agricultura), o valor bruto da produção agropecuária deve chegar a quase 272 bilhões de reais este ano, o que representaria um crescimento superior a 7% sobre 2010.

Escritores tiram sarro do farisaísmo sintático da velha mídia

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Muito bom esse post publicado no blog do Deputado Rosinha, ainda sobre o caso do "livro maldito". Detalhe: ambos são ganhadores do prêmio Jabuti, o mais importante do país. O Tezza, sobretudo, já arrematou repetidamente todos os prêmios literários existentes no Brasil. Leia abaixo:

*

Livro didático x língua popular: Tese da velha mídia é motivo de riso para escritores, ao vivo na Globo News

Os escritores Marcelino Freire e Cristovão Tezza participaram nesta semana do programa "Entre aspas", apresentado por Mônica Waldvogel na GloboNews. Com bom humor, os dois escritores rechaçaram a tese da Globo (e da velha mídia), que, a partir de trechos retirados do contexto, ataca o livro "Por uma vida melhor", adotado pelo Ministério da Educação para turmas de jovens e adultos.



Quando a apresentadora fala em "regra errada do português", imediatamente Tezza, professor aposentado da UFPR, a interrompe e a corrige: "Variedades não padrão".

Mônica responde: "Estamos tucanando aqui". Ao que Tezza rebate: "É um conceito linguístico esse. Todas as línguas do mundo funcionam assim, são variedades. [...] A diferença entre dialeto e uma língua é que uma tem exército, e a outra não. É a história das línguas."

Marcelino Freire cita o poeta Sérgio Vaz: "Quando a gente diz nós vai, é porque nós vamos".

Tezza explica:

"Quando você constrói uma gramática escrita, você escolhe formas, passa a escrever essa formas, passa a defendê-las. E elas passam a ser o certo. E aí se começa a estigmatizar o que não está daquela forma. Isso é construção histórica das línguas padrões [...].

O conceito de variedade linguistica é fundamental, não há mal nenhum em mostrar aos alunos, mesmo dos primeiros anos, que a língua é um conjunto de variedades, inclusive para trabalhar com a diferença e a importância da norma culta. O que não precisa é humilhar ninguém para fazer isso.. é um processo esmagador, a escola tem muito poder, o aluno chega lá, só fala a variedade dele, o professor vai olha, você é burro, senta ali no milho… não. Vamos trabalhar de outra forma. É uma questão didática."

"Que conselho vocês dão aos que estão tão preocupados?", questiona a apresentadora, ao final do programa.

É a deixa para Freire arrematar:

"Vão de Adoniram Barbosa: "Arnesto nos convidou / prum samba ele mora no Brás / Nóis fumo, num encontremo ninguém…" [mais risos]

O programa na íntegra (24 minutos) pode ser assistido aqui.

18 de maio de 2011

Arquivo: A luz irrompe onde nenhum sol brilha

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Tô resgatando uns posts (nem tão) antigos, publicados no meu outro blog, o Hell Bar. Faço isso de vez em quando para concentrar todos os textos no Óleo. Esse aí, de 2006, recebeu um comentário hoje, então me lembrei dele e resolvi publicá-lo aqui. Naquela época, eu tinha dois blogs, um mais literário, o Hell, e outro mais político, o Óleo. Mas foi ficando meio esquizofrênico, como se eu tivesse duas personalidades, então resolvi focar num blog só, mesmo sabendo que poderia perder alguns leitores, que estranhariam os textos políticos.


Esse cara é o Dylan Thomas, poeta britânico nascido em 1914. Não me lembro direito como o conheci. Acho que foi através do conto O Perseguidor, de Cortázar, no qual o personagem principal, o saxofonista Johnny Walker - inspirado no músico realíssimo Charlie Parker - é leitor assíduo de Dylan. Ou então foi através de alguma biografia de Robert Allen Zimmerman, nosso querido Bob Dylan, que homenageou seu ídolo tomando-lhe emprestado o sobrenome. Vale dizer que o músico Dylan fez jus ao empréstimo. Quem sabe um dia eu, enchendo o saco do meu próprio sobrenome, não resolvo me chamar Miguel Dylan? Não, melhor não.

Na época em que eu lia Dylan pela primeira vez, no início dos 90's, aconteceu uma coisa chata. Meu pai teve um infarte e foi hospitalizado. Eu estava fora de casa, acho que em outra cidade. Voltando ao Rio, peguei um ônibus para visitá-lo no CTI. Consegui a proeza de escrever um poema no próprio ônibus. Um poema inspirado em Dylan Thomas, no texto intitulado A morte perderá seu domínio. Lembro que foi uma poesia muito forte, ou pelo menos me pareceu assim (infelizmente, perdi esse poema), que tinha o objetivo bem ambicioso de salvar a vida do meu pai. Minha poesia falava algo como não se deixar levar pelo caminho mais fácil, não se deixar seduzir pelo canto sedutor da morte. Não pude vê-lo naquele dia, mas entreguei o poema ao médico, para que repassasse a meu pai após a operação de safena. Quando retornei ao hospital, no dia seguinte, seus olhos brilhavam, febris, vivíssimos. Disse-me que tinha amado o poema. Aquilo foi importante pra mim. Tive a impressão de que o poema ajudou-lhe num momento difícil. Ele viveu, depois disso, muitos anos. Ainda pôde trabalhar muito e consumir muitos litros de uísque.

José Barbosa do Rosário, meu pai, foi um grande sujeito. Exagerava na bebida, mas sempre foi muito trabalhador e absolutamente íntegro. Chegou do sertão mineiro com 21 anos de idade e algumas notas escondidas na cueca. Nada ver com aquele infeliz assessor do irmão do Genoíno, pego com cem mil dólares no cuecão. Meu pai carregava seus parcos recursos num bolso costurado na roupa de baixo porque minha avó achava - com razão - que o Rio tava cheio de ladrão.

O velho teve dois grandes sofrimentos na vida. Um foi a destruição mental do irmão Cirilo, internado aos vinte anos numa clínica psiquiátrica obscurantista que torrou seus neurônios de tanto choque elétrico. O tio Cirilo ainda está vivo. Eu e meu pai fomos visitá-lo em vários hospícios dos arredores do Rio.

O segundo trauma foi a morte bárbara de seu outro irmão, Francisco, torturado medievalmente por policiais da nona DP do Rio de Janeiro, no finalzinho da ditadura, 1981, o que motivou meu pai a escrever seu único livro, Quando a polícia mata.

Dia desses conto mais histórias do meu pai e dos meus famíliares do Triângulo Mineiro. Adianto só que um tio avô meu era jagunço autônomo, cobrava para matar e colecionava orelhas de suas vítimas numa bolsa de couro que levava sempre consigo, à guisa de curriculum vitae.

É isso, deixo vocês agora, com 2 poemas do Dylan Thomas, tirados de um site com excelentes traduções de Ivan Junqueira e Fernando Guimarães. Para os feras do inglês, pode-se ler originais do poeta por aqui.
**

A luz irrompe onde nenhum sol brilha;
onde não se agita qualquer mar, as águas do coração
impelem as suas marés;
e, destruídos fantasmas com o fulgor dos vermes nos cabelos,
os objectos da luz
atravessam a carne onde nenhuma carne reveste os ossos.

Nas coxas, uma candeia
aquece as sementes da juventude e queima as da velhice;
onde não vibra qualquer semente,
arredonda-se com o seu esplendor e junto das estrelas
o fruto do homem;
onde a cera já não existe, apenas vemos o pavio de uma candeia.

A manhã irrompe atrás dos olhos;
e da cabeça aos pés desliza tempestuoso o sangue
como se fosse um mar;
sem ter defesa ou protecção, as nascentes do céu
ultrapassam os seus limites
ao pressagiar num sorriso o óleo das lágrimas.

A noite, como uma lua de asfalto,
cerca na sua órbita os limites dos mundos;
o dia brilha nos ossos;
onde não existe o frio, vem a tempestade desoladora abrir
as vestes do inverno;
a teia da primavera desprende-se nas pálpebras.

A luz irrompe em lugares estranhos,
nos espinhos do pensamento onde o seu aroma paira sob a chuva;
quando a lógica morre,
o segredo da terra cresce em cada olhar
e o sangue precipita-se no sol;
sobre os campos mais desolados, detém-se o amanhecer.

( tradução: Fernando Guimarães)

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E A MORTE PERDERÁ O SEU DOMÍNIO

E a morte perderá o seu domínio.
Nus, os homens mortos irão confundir-se
com o homem no vento e na lua do poente;
quando, descarnados e limpos, desaparecerem os ossos
hão-de nos seus braços e pés brilhar as estrelas.
Mesmo que se tornem loucos permanecerá o espírito lúcido;
mesmo que sejam submersos pelo mar, eles hão-de ressurgir;
mesmo que os amantes se percam, continuará o amor;
e a morte perderá o seu domínio.

E a morte perderá o seu domínio.
Aqueles que há muito repousam sobre as ondas do mar
não morrerão com a chegada do vento;
ainda que, na roda da tortura, comecem
os tendões a ceder, jamais se partirão;
entre as suas mãos será destruída a fé
e, como unicórnios, virá atravessá-los o sofrimento;
embora sejam divididos eles manterão a sua unidade;
e a morte perderá o seu domínio.

E a morte perderá o seu domínio.
Não hão-de gritar mais as gaivotas aos seus ouvidos
nem as vagas romper tumultuosamente nas praias;
onde se abriu uma flor não poderá nenhuma flor
erguer a sua corola em direcção à força das chuvas;
ainda que estejam mortas e loucas, hão-de descer
como pregos as suas cabeças pelas margaridas;
é no sol que irrompem até que o sol se extinga,
e a morte perderá o seu domínio.


( tradução: Fernando Guimarães)



PS: Por último, pero not least, dêem um chego no site do Claudinei, para ler o texto do Mirisola sobre a Flip.

17 de maio de 2011

A esquerda e o preconceito contra o empresário rural

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Há muitos anos que denuncio o preconceito das esquerdas contra a agricultura. O termo agrobusiness ou agronegócio tornou-se sinônimo de palavrão. Um rapaz deixou comentário num post recente, com a entrevista de Aldo Rebelo para o Paulo Henrique Amorim, xingando o parlamentar de "amigo do agrobusiness". Ora, estritamente falando, toda agricultura é agrobusiness. A divisão entre agricultura familiar ou pequena agricultura e o agrobusiness é arbitrária e falha. Existe, por um lado, uma agricultura de subsistência, hoje totalmente marginal no país, e que não conta. E temos uma grandiosa agricultura familiar, responsável pela maior parte da produção de alimentos para o consumo interno brasileiro, e uma poderosa agricultura voltada para a exportação. Ambas são negócio. Ambas usam ferramentas de trabalho complexas. E se a agricultura familiar é mais atrasada, usa menos máquinas, menos fertilizantes, isso não é uma qualidade sua, é um defeito. Os agricultores mais diligentes, ou mais sortudos, ou mais organizados, tem conseguido obter financiamentos e estão tentando se modernizar. O governo tem muitas linhas de crédito para eles, o difícil é, como sempre, vencer a burocracia e a ignorância das agências rurais.

Entretanto, é preciso entender que o pequeno agricultor ambiciona se tornar médio, e o médio quer se tornar grande. Não podemos folclorizar a agricultura familiar. Não podemos fetichizá-la. É um trabalho insano, que envolve quase sempre a exploração de mão-de-obra infantil, os filhos do proprietário. Em todo Brasil, a renda média da agricultura familiar oscila de 1 a 2 salários mínimos, em média. No nordeste, a renda média é inferior a um salário. O pequeno agricultor só vive bem na Europa porque se beneficia de pesados subsídios do governo. Aqui, não; nem há planos para tê-los, já que a luta do Brasil é justamente para que a Europa acabe com esses subsídios, para que nossos produtos agrícolas possam competir com os de lá em pé de igualdade.

O esforço da sociedade tem de ser no sentido de fazer com que este pequeno produtor ganhe escala, aumente sua produtividade, compre um pouco mais de terra, e possa melhorar o seu poder aquisitivo, de maneira a ter os mesmos direitos de consumo que tem o homem da cidade. Se hoje um garçom na cidade do Rio de Janeiro pode ter um celular, um laptop e uma boa televisão, é justo que o homem do campo, que não tem fim de semana nem férias, também goze das novas tecnologias que o mundo oferece, e não apenas por prazer, mas para ampliar seus conhecimentos e aprimorar a sua atividade.

Há problemas graves na grande agricultura, como o uso indiscriminado de agrotóxicos, mas esse é um problema de governo e do congresso, que não regulamentaram o tema com a severidade que ele merece.

O que eu vejo é uma demonização política e moralista da figura do produtor rural; explicável historicamente, contudo. A evolução econômica do Brasil foi marcada pelo antagonismo de uma classe urbana progressista versus uma classe agrária conservadora. Essa oposição ainda existe, mas grande parte de seus fundamentos ruíram, em virtude do próprio desenvolvimento histórico. Não existe mais escravidão no campo, por exemplo. Há casos isolados, que são combatidos duramente pelo Ministério Público. Há exploração do trabalhador, o que também é combatido, pelos sindicatos de trabalhadores rurais, presentes e atuantes em todas as cidades brasileiras. Hoje em dia é mais raro um fazendeiro contratar um trabalhador sem carteira assinada, em função dos riscos em que ele incorre. Os financiamentos públicos estão cada vez mais republicanos. Antigamente, bastava ser amigo do gerente do Banco do Brasil para obtê-los, hoje são necessários trâmites burocráticos que excluem essas facilidades.

Pense que a pequeno agricultura é tão "business" quanto a grande. Precisa dos mesmos serviços comerciais, dos mesmos insumos, das mesmas máquinas (apenas menores), da mesma infra-estrutura.

A produção de soja também é vítima de preconceito. É demonizada como se fosse algo maligno, e se os fazendeiros fossem pessoas más. Tolice. Um fazendeiro de soja é um capitalista tão bom ou mau quanto um fabricante de sapatos ou o dono de um mercado médio (ou grande, não importa) na periferia de Recife. É lenda também a história de que a soja não gera empregos. A produção mecanizada gera menos empregos na fazenda, mas os gera nas atividades subsidiárias, como nas fábricas que produzem as máquinas, para mencionar apenas um segmento beneficiado pela mecanização. A maioria das máquinas usadas na agricultura brasileira são produzidas no Brasil.

O mais importante a ressaltar, porém, é que a soja não é uma commodity de função meramente especulativa, um produto abstrato cuja venda beneficia somente nababos de Goiás e corretores de São Paulo ou Nova York. Tanto a soja quanto o milho são as principais matérias usadas na fabricação de rações para alimentar bois, porcos e aves. Ou seja, a soja hoje tem importância capital na segurança alimentar do mundo. É contraditório que as mesmas figuras que demonstram indignação ao ver tanta fome na África não compreendam que a soja brasileira evita que o mesmo se passe na China.

Quanto ao uso de soja e milho para produção de etanol, aí é uma imbecilidade criada pelos americanos. No Brasil, usa-se a cana-de-açúcar, que tem muito mais produtividade e cujo preço não afeta tão diretamente o custo dos cereais no mundo. De qualquer forma, o "combustível verde", que parecia uma ideia genial, tanto que Lula passou a fazer propaganda dela em todo planeta, hoje já não empolga tanto. Pode ser uma alternativa, mas sempre será parcial, e deve ser muito bem regulada e controlada, para que não ocupe terras dedicadas ao cultivo de alimentos.

O fato é que o mundo cresceu muito nos últimos anos, e bilhões de seres humanos subiram um pouquinho na escala social, sobretudo nos países emergentes. Lula não foi o único presidente que logrou melhorar a vida dos pobres. Outros também conseguiram, e todas essas pessoas estão querendo comer mais e melhor. A exportação de carne pelo Brasil vem crescendo exponencialmente por causa disso. Em visita a China, a presidente Dilma conseguiu fechar acordos para que o Brasil possa exportar carne suína ao gigante asiático. O chinês come basicamente carne de porco, bastante frango, mas pouquíssimo carne bovina. As perspectivas são muito promissoras.

Em todo esse imbróglio, o Brasil está magnificamente posicionado. Tem tudo para se tornar, de fato, o grande celeiro do mundo. Para tal, precisa ter preocupações rigorosas com o meio ambiente, com suas reservas subterrâneas de água, com seus rios. Não podemos, contudo, alimentar preconceitos contra os empresários rurais. Desde que haja fiscalização ambiental e social eficazes, ou seja, desde que eles paguem salários dignos a seus trabalhadores e cuidem do meio ambiente, devem ser vistos com respeito e admiração pela sociedade brasileira.

Em relação à reforma agrária, ela é um problema social ainda premente no Brasil, mas não é de responsabilidade dos agricultores; a estes cabe produzir, e o estão fazendo muito bem. A produtividade agrícola no país tem crescido a taxas extraordinárias e já está entre as mais altas do mundo, de maneira que a área plantada nacional tem se mantido estável ou mesmo em declínio, embora a quantidade produzida tenha se multiplicado em várias vezes. Com isso, desmata-se menos. Há representantes políticos dos produtores que são reacionários e contra a reforma agrária, mas a esquerda tem parte da culpa porque, ao destilar sua ignorância e preconceito contra os empresários rurais, ajuda os representantes políticos mais conservadores ligados ao agronegócio a se elegerem. Entretanto, mesmo essa acusação não é muito justa, pois é a cidade e sobretudo seus setores médios que tem elegido os representantes mais retrógrados, como Bolsonaro, Indio e Maluf. E o número de representantes eleitos ligados à agricultura familiar tem crescido muito nos últimos anos. Muitos prefeitos hoje tem políticas agrícolas bastante progressistas e atenciosas em relação à pequena propriedade familiar, e temos atualmente um bom número de parlamentares vinculados ao segmento.

Os interesses da pequena agricultura familiar e da grande agricultura comercial, no entanto, não são antagônicos. Ao contrário, coincidem em muitos aspectos. Ambos precisam de boas estradas, de insumos a preços baixos, de uma política inteligente para os preços, de seguro agrícola. Além do mais, o homem da cidade muitas vezes não sabem sequer diferenciar um agricultor familiar de um empresário agrícola. A diferença é profunda entre um capiau analfabeto e um grande empresário rural que mora em São Paulo, mas há agricultores que são donos de razoável extensão de terra e trabalham com grande diligência e esforço junto a seus familiares; é a agricultura familiar E empresarial. Se você pensar bem, todavia, verá que a agricultura familiar tem um quê de autoritário e antidemocrático, ao impor ao filho que siga os passos do pai... Não podemos impor isso à juventude rural. Vivemos um país (em tese, ao menos) livre. Mais uma razão para não fetichizarmos a agricultura familiar. O importante é termos uma agricultura economica, ambiental e socialmente saudável, ponto, independente se é familiar ou não.

Há diferenças ainda entre os diversos produtos agrícolas. A produção da soja em pequena escala é inviável economicamente. Para alterar isso, ou mudamos o regime político do Brasil, instalando gigantes cooperativas soviéticas no campo, ou proibimos a produção de soja. E qualquer queda na produção brasileira de soja, hoje, provocaria uma catástrofe alimentar no planeta. Seja qual for a ideia que tiverem, tenham senso de responsabilidade.

A reforma agrária deve acontecer em harmonia com o desenvolvimento dos fatores econômicos, estruturais e tecnológicos ligados à agricultura. É a velha história: não adianta dar terra lá no interior da Amazônia, onde não há estradas para o sujeito escoar sua produção. Agricultura hoje é um negócio que requer alta especialização e uso de tecnologia específico, mesmo no âmbito da agricultura familiar.

Nos últimos anos, a agricultura familiar no Brasil fortificou-se de maneira impressionante, em virtude de seu esforço para se modernizar e, claro, graças também a programas de financiamento como o Pronaf, que eram pífios antes do governo Lula. Com os preços de produtos agrícolas em alta, não só no Brasil, como no mundo inteiro, a economia rural brasileira vai experimentar um novo ciclo de crescimento e geração de emprego. Pequenos poderão se tornar médios e médios poderão se tornar grandes. Não há nada de mal nisso. É a lei da vida. O agricultor também é filho de Deus e tem tanto direito de querer melhorar de vida como tem o dono de um restaurante no ABC paulista. A esquerda deve usar a luta política para trazer o agricultor para o seu campo, porque ele também é um trabalhador, e precisa de políticas públicas especiais, mais do que qualquer outro empresário, pois pertence a uma atividade primária, que é ao mesmo tempo de importância estratégica e de alto risco, com baixa remuneração; e não afastá-lo, satanizando políticos como Aldo Rebelo, como sendo "amigo do agronegócio". Aldo viajou o Brasil todo, conversando com pequenos produtores em toda parte. É amigo do agronegócio sim, porque o agronegócio não é nenhuma atividade do mal, da qual devemos ser inimigos. A comida na sua mesa vem do agrobusiness, porque mesmo que tenha sido um pequeno que a tenha produzido, e nem sempre o é, isso também foi um "business". Toda carne que você ingere vem de frangos, bois ou porcos alimentados pelo milho e soja do agronegócio...

Então vamos tentar olhar para a classe rural com mais compreensão, e nos esforçamos para tirá-la das garras da direita partidária. A segurança alimentar do mundo está em risco e o Brasil é um dos raros países que pode ampliar substancialmente a oferta agrícola no médio prazo. O governo e a sociedade, portanto, devem ampliar o apoio que dão à agricultura, e tentar trazer ainda mais gente para o campo, através de reforma agrária que aumente o acesso à terra. Nosso inimigo é o capital especulativo, não o fazendeiro diligente, seja pequeno ou grande, que alimenta o Brasil e o mundo.