Nós, brasileiros, queríamos testemunhar uma oportunidade, apenas uma, em que a imprensa brasileira, diante de qualquer impasse entre Brasil e Estados Unidos, ficasse ao lado de seu próprio país.
Agora viraram todos mocinhos de recado das alas mais conservadoras da Casa Branca e Pentágono. O Irã não é flor que se cheire. Já falei e repito aqui que não gosto do Irã, não gosto de sua cultura chauvinista, teocrática, violenta. Mas é evidente que o Irã precisa da energia nuclear. Ele não tem rios para fazer hidrelétrica. Quando seu petróleo acabar, e uma dia vai acabar, com certeza, como o país irá se desenvolver?
Alguém já parou para pensar que o Irã é um dos poucos países do oriente médio que não é uma odiosa monarquia teocrática? Que possui sufrágio universal? A mídia brasileira e os eternos #forasarney da sociedade civil (a turminha que considera Marcelo Tas o seu guru político) continuam comprando acriticamente todas as teses dos falcões do Pentágono.
Neste quesito, aliás, vale salientar que a imprensa européia é igualmente previsível. O mundo árabe e africano é assolado por ditaduras corruptas e cruéis, mas aliadas do ocidente. Em todos essas nações há ditaduras abertas ou disfarçadas. Mas o vilão é apenas o Irã. Vários tradutores especializados já mostraram que as declarações do líder iraniano são sistematicamente distorcidas nas traduções ocidentais. Se ele fala que o Irã irá se defender duramente de um ataque israelense, eles traduzem que Ahmadinejad afirmou que o Irã quer destruir Israel.
Eu não gosto do Ahmadinejad, um camponês bruto e preconceituoso. Mas está claro para mim que não é sufocando o Irã, nem inventando uma oposição, que o ocidente irá impor uma abertura política ao regime dos aiatolás.
No filme Syriana, do George Clooney, há uma denúncia constante, a de que os grupos de oposição ao governo iraniano são financiados pela CIA. Há inclusive uma cena onde um grupo se reúne com a diretoria da agência, e inicia um relato de otimismo exagerado sobre a debilidade do regime. O personagem de Clooney não resiste e desmascara a mentira. Afirma que o regime ainda é forte. É posto na geladeira por causa disso. A oposição ao regime iraniano costuma aumentar sua importância para ganhar mais recursos internacionais.
É sabido, inclusive, que o movimento estudantil iraniano recebe dinheiro da CIA.
Claro que há oposição legítima ao regime iraniano. Por isso mesmo a interferência estrangeira é tão nociva, por tirar legitimidade de grupos que poderiam, por si mesmos, tornarem-se uma força autêntica no país.
Além disso, a cobertura da mídia sobre o Irã sempre omite o histórico dos crimes ocidentais contra o país. O Irã foi a principal cobaia das armas químicas e biológicas pesquisadas e produzidas nos EUA e Inglaterra. Saddam Hussein recebeu toneladas dessas armas para usar na guerra que travava contra o Irã.
Lula age muito bem em procurar não queimar as pontes do mundo ocidental com o Irã. Hoje é criticado, mas amanhã pode levar até o Prêmio Nobel da Paz por isso. A guerra ainda é o mais lucrativo dos negócios, e os falcões da guerra, na maioria homens com mais de 70 anos, não estão preocupados com o futuro da humanidade. Entopem-se de Viagra, drogas, e querem aproveitar o máximo a vida suntuosa que a histeria bélica americana lhes proporciona.
Para as lideranças européias, é igualmente útil a satanização do Irã, ainda mais agora, em que se vêem atrapalhadas com uma grave recessão econômica. A indústria bélica é poderosa em todo planeta. Transmite-se ao mundo que o Irã é liderado por insanos dispostos a destruir o planeta. Por que os iranianos seriam mais loucos que outros povos do mundo? As próprias manifestações políticas no país são uma mostra de vitalidade democrática. Você vê algo parecido na Arábia Saudita? Na China? Em algum país africano?
As últimas ameaças de Washington, alertando o Brasil a não estabelecer relações com o Irã acontecem porque eles tem medo que Lula atrapalhe a sua estratégia de fazer a mesma satanização do Irã e de suas lideranças como fizeram com o Iraque. O triste é ver a nossa imprensa se posicionar, invariavelmente, do lado oposto ao interesse brasileiro. O Irã é um país importantíssimo no oriente médio e com o qual o Brasil mantém relações comerciais cada vez mais intensas. Por que vocês acham que as exportações brasileiras quase triplicaram nos últimos seis anos? Por causa de países como o Irã.
Export.Brasileiras para o Irã (Sistema Alice) | |||||||||
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As exportações brasileiras para o Irã totalizaram 1,26 bilhões de dólares nos últimos 12 meses (até janeiro de 2010), um aumento de 296% sobre o valor registrado em 2000/01. O Irã é um dos principais compradores de carnes brasileiras. Se fôssemos seguir a cartilha da Casa Branca, todavia, na esteira da diplomacia pusilânime, sem personalidade, submissa, da era fernandista, nunca teríamos números exuberantes assim. Qual o interesse do Brasil, portanto, em participar de sanções ao Irã? É ridículo. Quero ver o Lampreia bancar o salário dos desempregados que uma recessão econômica forçada do Irã criaria no Brasil.
O Irã tem aceitado inspeções da comunidade internacional às suas instalações nucleares. O aitolá supremo do país acaba de declarar que o Alcorão proíbe o uso de armas nucleares. Queriam declaração mais importante que essa? Resta ao mundo continuar vigiando o país para que não consiga armas nucleares, mas sem tentar sufocá-lo economicamente, o que só dificulta a abertura política do regime e enfurece suas lideranças. Ah, o Irã desenvolve mísseis de longa distância? Ahaha. Coitado do Irã. Tem um ou dois mísseis mal ajambrados que mal chegam a Israel, além de, lógico, procurar exagerar ao máximo suas conquistas, na tentativa de intimidar Israel e seus vizinhos, e o mundo acha que o Irã é que representa o maior perigo mundial? Impressiona-me diplomatas teoricamente bem informados deixarem-se levar por esse papo furado.
Parabéns pelo seu artigo, é de uma clareza.
O Irã é gato escaldado há muito tempo, lembram o apoio americano a dinastia do Xá Reza Pahlavi, sem falar no Sadan Husein na guerra Iraque contra o Irã, com a utilização de armas químicas. E as frequentes ameaças de invasão por americanos e israelenses. Quem conhece um pouco da história do Irã, sabe que o Irã tem mais é que ficar com um pé atrás.
O Irã não é um país árabe, é apenas muçulmano. Mas isso não altera em nada a correção do texto.
Eu falei que era árabe? O sentido era que está numa região árabe.
O Lula já deu um "chega pra lá" no governo americano:
-Eu não digo onde eles devem ir, eles não podem dizer onde eu devo ir- disse sobre sua próxima visita ao Irã.
O Lula sabe muito bem se posicionar sem criar atrito, é isso que chamamos "politica do bom relacionamento".
Ele se desloca tranquilamente entre a esquerda radical e o conservadorismo direitista, e é sempre bem recebido por todas as tendencias.
Quem detesta isso é o PIG e a direita brasileira, na sua maior parte composta de gente com pensamento arcaico e burro.
Claro, há exceções...
O Paquistão possui armas nucleares, e aí vamos sufocá-lo economicamente? Ah, esqueci, o Paquistão é aliado dos EUA então pode.
Excelente análise. E o Irã têm boas razões para ser um "gato escaldado", pois faz algum tempo que vive sob ameaça de invasão, antes era a URSS e agora os EUA. Quanto aos diplomatas, eles são bastante espertos, muito "espertos". Só que obedecem ordens de cima, por esta razão que agem como agem
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