Eu realmente gosto de pesquisas de opinião, que nos permitem enxergar o Brasil além de nossas idiossincracias, além do mundinho que nos rodeia. Por mais que a pessoa tenha um círculo amplo de relações sociais, sempre será um universo estreito que não corresponde à comunidade maior em que estamos inseridos. Uma vez Ferreira Gullar disse numa entrevista que o Brasil, para ele, compunha-se de vinte e poucas pessoas, os seus amigos. Compreendi porque ele se tornara tão limitado em suas crônicas políticas para a Folha de São Paulo.
Por isso sempre fugi de rodinhas. Grupos de amigos que reproduzem, ad infinitum, a psicologia big brother da pós-modernidade. Ninguém deve se sobressair. Ninguém pode ser original. Vive-se uma eterna competição em busca do cálice da mediocridade.
Os colunistas de jornal escrevem sobretudo para seus próprios pares, para seus chefes e para um leitor específico, um leitor imaginário - provavelmente alguém com os traços de Abílio Diniz.
Existe uma "rodinha" invisível, criada pela mídia, e não estou sendo conspirativo aqui, pelo amor de Deus; isso é um fato corriqueiro. A gente lê os jornais e sente essa homogeneidade. Esse espírito coletivo. Podemos quase ver todos de mãos dadas.
Sejamos claros. A rodinha tem seus líderes. Globo, Folha, Estadão, os três patetas do apocalipse. Compartilham as mesmas ideias, os mesmos candidatos, os mesmos colunistas. A gente lê um artigo do Gaspari no Globo e, quando vai à Folha, ei-lo novamente a nos "tungar" a paciência! Não contente de torturar os leitores cariocas, Roberto Da Matta também cultiva abrobrinhas de Harvard no encharcado chão paulistano.
Há pouco tempo, um amigo acusou os blogueiros de sermos pretensiosos. É verdade. Essa liberdade destrambelhada com a qual lidamos produz efeitos colaterais. Não prestamos conta a ninguém. Não dependemos de ninguém. Nossa opinião, mesmo as aparentemente mais embasadas em argumentos, soa como o grito de um índio. Aquele grito do qual falava Darcy Ribeiro. Sem sentido, livre, puro, inocente (o grito é puro e inocente, não a corda vocal que o produz...). Pretensioso.
Daí que flertamos, naturalmente, com o ridículo, pois as cartas de amor, já dizia Pessoa, são sempre ridículas.
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Eu vim aqui, porém, para comentar a pesquisa CNT/Sensus. A Vox Populi, héin, passou como um vento, invisível, mas certamente provocou arrepios, de medo em alguns, de alegria em outros. Os grande jornais, dentro daquele comovente espírito de "unidos venceremos" não publicaram uma linha sobre a Vox Populi. Em todo país, parece que somente a Zero Hora deu uma notinha, e mesmo assim bastante atrasada.
O que eu acho engraçado é que, hoje, cinco dias depois, alguns colunistas citam, aqui e ali, a pesquisa da Vox Populi . Como se os leitores estivessem cientes dela. Quer dizer, até estão, mas não pelo jornal do colunista. Mas deixemos de lado a Vox Populi, esse poeta maldito cujos trabalhos somente são publicados na web, porque a Sensus chegou para brilhar. Trata-se de uma pesquisa bem mais consistente, acompanhada de relatórios completos e com detalhes.
Aliás, era sobre a pesquisa da Sensus que eu me referia no início do post. A pesquisa ajuda a lançar um pouco de luz sobre esse povo moreno, exótico, original, escondido sob a penumbra de comezinhas e diárias manipulações midiáticas. Por isso escolhi, para abrir o texto, a tabela que fala sobre a autoestima nacional. É preciso contudo ler os números com um pouco de imaginação.
Em setembro de 1998, apenas 26% falavam que seu "orgulho de ser brasileiro" estava em alta. Em janeiro de 2010, esse número salta para 53%! O que significa isso? Quem julgar a opinião pública pelas cartinhas publicadas na grande imprensa dificilmente acreditará nessa pesquisa. A mesma coisa vale para aqueles cuja visão do povo brasileiro restringe-se ao comentário de sua manicure...
A tabela revela, além disso, que, em 1998, apenas 2% dos brasileiros afirmavam não ter orgulho pátrio. Esse índice desabou para 0,6% hoje. Ou seja, os mentecaptos travestidos de missivistas, que repetem bordões antibrasileiros na imprensa, correspondem hoje (e correspondiam ontem) à uma fatia insignificante da sociedade.
Entretanto, uma outra tabela do Sensus me chamou a atenção:
No mesmo quadro, encontro outros números extremamente positivos à democracia. Afinal, não basta melhorarmos as instituições. Talvez mais importante ainda seja melhorarmos a cidadania, e os números do Sensus, se verdadeiros, revelam nada mais do que um tremendo avanço da consciência política! Os cidadãos estão pensando com suas próprias cabeças! Em vez de ouvir parentes, TV, jornais, propaganda eleitoral, os brasileiros parecem ter descoberto o melhor meio de informação do planeta: o cérebro. Ou o bestunto, como diz minha mãe.
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Agora passemos para os aspectos eleitorais da pesquisa. Separei duas tabelas que, a meu ver, merecem comentários:
O fortalecimento de Dilma nas pesquisas mostra um processo gradual de transferência de votos, de Lula para sua candidata. Em pesquisas anteriores, Dilma possuía mais força entre os mais escolarizados e mais ricos do que entre o povaréu sofrido e iletrado. Isso já mudou, e de forma bastante acentuada. Os pobres descobriram Dilma, e os gráficos se inverteram. A força de Dilma passa, a partir de agora, a se assentar no eleitorado pobre. Isso é, naturalmente, positivo para a ministra, já que a eleição é decidida pelo voto das classes baixas.
Impressiona, além disso, o fenômeno oposto por parte de Serra. O governador concentra seu eleitorado cada vez mais junto às classes mais altas. Entre as famílias que ganham mais de 20 salários (ou seja, mais de 10 mil reais por mês), Serra exibe seus melhores números, 50% das intenções de voto; e registra sua pior performance junto aos barnabés cujas famílias auferem até um salário mínimo.
Por fim, destaco um outro número, de certa forma preocupante (e misterioso) para a candidatura Dilma. Por que a ministra tem desempenho tão fraco entre as mulheres? A pesquisa Sensus não é a primeira a mostrar que Dilma tem bem mais força entre o eleitorado masculino do que entre o feminino. Desta vez, Dilma recebeu 32,4% dos votos masculinos, e apenas 24% do voto feminino. Serra registra equilíbrio, com 41% entre os homens e 40,5% entre as mulheres.
A explicação, a meu ver, é que as mulheres são menos informadas politicamente. Há um fator cultural aí. Um percentual pequeno das mulheres se interessa por política. Por isso, na pesquisa do Sensus, enquanto 7,2% dos homens disseram que não sabiam ou não responderam a pesquisa, esse número pulou para 12,6% entre as mulheres.
Assumindo o risco de ser injusta, mas baseada em minha experiência de coordenar trabalho com mulheres e homens, diria que mulheres não confiam na liderança de outras mulheres. Não se trata de "machismo" invertido, mas de identificação com outra pelo lado da experiência ancestral da condição de subordinada. E pela ancestral competição que gera inveja. Somos até solidárias umas com as outras, mas como bem disse o Zé Alencar, com sua lucidez, solidariedade não se transforma necessariamente em voto. Mas estamos melhorando.
Pois eu sou otimista, você mesmo falou que agora é que o povão está identificando a Dilma como a indicada pelo Lula. Logo a mulheres estão inseridas neste povão, ou seja, parte da população sem muito interesse por política. Mas a partir do momento que elas identificarem Dilma como a indicada por Lula para sucedê-lo. Bye-Bye Serra. elas vão votar em peso nela. Já que elas são as grande beneficiadas pelos programas sociais tocados pelo Lula. Sim, porque são elas é que recebem o repasses dos programas sociais. Acho que está faltando a Dilcéia e o Patrus reforçarem esta imagem da Dilma, como a sucessora do Lula, em suas políticas das mulheres e sociais, respectivamente.
Eu sei lá, mas acho que as brasileiras não são lá muito amigas entre si. Discordo da solidariedade a que a Vera se refere. As brasileiras competem, como no bbb. Hoje mesmo uma professora lá da escola ficou o tempo todo repetindo a tese que não vota na Dilma porque ela é "arrogante". Fiz a leitura da inveja pelo orgulho próprio e firmeza conquistados pela outra.
Mas Dilma seré eleita. Anyway, anyhow, anywhere.
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