Aconteceu o seguinte. Para explicar como vim parar aqui é preciso contar um pouco da história de Priscila Miranda, minha mulher. Uma jovem carioca de 29 anos nascida e criada na Penha, zona norte do Rio.
A gente já conhece Clermont-Ferrand, capital da Auvergne, linda cidadezinha universitária encravada bem no meio da França. A Priscila estudou quase um ano aqui em 2001. O avô dela (ela foi criada pelos avós) havia perdido a casa num leilão e, com parte do dinheiro que restou, mandou a neta fazer o curso no exterior com o qual sempre havia sonhado. O avô dela é outro personagem cuja história dava um belo e comovente romance sobre bondade e estoicismo.
É o tipo de coisa que muda a vida de um jovem, quando este agarra a oportunidade com as duas mãos. Este curso em Clermont é subsidiado pelo governo francês, então é relativamente barato e vem gente do mundo inteiro estudar na cidade. Ela não falava uma palavra de francês. Depois de dez meses de curso, voltou falando fluentemente, o que lhe abriu diversas portas.
Eu reencontrei a Pri depois de sua volta de Clermont. A gente foi morar junto. Casou-se. Ela virou guia de turismo em língua francesa. Nós dois sempre cinéfilos, e sempre na corda bamba. Daquele jeito. Dá-lhe que ela recebeu dois turistas da Ilha da Reunião, território francês na África, e os dois gostaram da Pri e a chamaram para lhes ajudar a levar uns 20 artistas brasileiros para esta ilha. Ela levou. Eu fui junto. Tudo isso em 2006. Lembro que nem pude votar no segundo turno das eleições. Levamos o Mundo Livre, o Eryk Rocha, um amigo meu fotógrafo Felipe Varanda, mais uns sambistas, uns capoeiristas, etc. O evento foi uma droga. Era uma feira comercial, sem público qualificado, e que foi um fracasso naquele ano. A ilha ainda estava bem vazia, por causa de uma espécie de dengue que ocorrera lá no ano anterior.
Mas todo mundo foi pago, relativamente bem pago. E na volta, que passava por Paris, eu e a Pri resolvemos fazer uma loucura e ficamos em Paris, memo perdendo a passagem (que não era do tipo reembolsável). Ficamos em Paris por dois meses. Alugamos um studio de um persa, perto do parque Luxemburgo. A Pri arrumou emprego numa loja do amigo desse persa. Eu ainda trabalhava para um site americano de café, e escrevia minhas notas para lá diariamente. A gente ficou muito apertado de grana, mas deu para curtir um pouco, ainda com o dinheiro que havíamos ganhado na ilha.
E aí fomos à Clermont-Ferrand, não só participar do Festival de Curta-Metragens, como aproveitar o fato de que a Pri ainda tinha amigos na cidade e um deles nos emprestou um lugar para morar, um moquifo nos fundos de um prédio. Ficamos mais dois meses por ali. Eu sempre trabalhando pro americano, mas com muito tempo livre. Escrevi várias matérias aquele ano sobre os curtas que assisti, inclusive para a Agência Carta Maior. E enfiava-me nas bibliotecas da cidade, como sempre faço. Lembro que li Faulkner, o Light in August, no original. Por isso evoluí tão pouco no francês falado: passava a tarde na França lendo em inglês.
Passamos por outras aventuras na Europa. Fomos à Itália, já ilegais. A Pri trabalhou um restaurante em Florença. Mas encurto a história. Retornamos ao Brasil. E agora voltamos à Clermont-Ferrand, novamente para participar do Festival Internacional de curta-metragens. A Pri conseguiu passagens e alojamento para gente e mais duas amigas. E dessa vez, além de cobrir o festival, viemos organizar uma mostra paralela de curtas latino-americanos.
A gente não ganha nada ainda com isso, mas é que montamos uma empresa de distribuição de filmes latino-americanos e o evento serve como uma iniciativa do projeto. Dezenas de cineastas de todas as partes do continente enviaram filmes, que estamos exibindo em dois lugares aqui em Clermont. É o off-Clermont - Amérique Latine a la select.
Nos próximos dias, irei escrever mais sobre essa experiência. E sobre os curtas, e sobre curta-metragismo. Sobre o Festival Internacional de Curta-Metragens de Clermont-Ferrand, que é o maior do mundo, e sobre a pequena mostra que organizamos (quer dizer, a Pri organizou, eu ajudei em algumas coisas).
Ah, e hoje haverá palestra. Eheh, eu darei uma palestra sobre "política latino-americana" e a Pri sobre cinema. E estamos quase morrendo de frio por aqui. A viagem também me renderá algumas observações sobre política e economia e cultura européia.
Mas continuo monitorando atentamente a política brasileira, claro. Minha cabeça continua aí no Brasil.
4 de fevereiro de 2010
O blogueiro em Clermont-Ferrand
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# Escrito por
Miguel do Rosário
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quinta-feira, fevereiro 04, 2010
# Etichette: Cinema, Clermont-Ferrand
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Beleza, Miguel. Desejo sucesso na vossa empreitada.
Parabéns, Miguel. Boa sorte!
esse miguel é um danado.
vá em frente, cumpadi.
tenho certeza que essa dupla "bronzeada vai mostrar seu valor"
abçs
carlos anselmo-fort-ce
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