(foto tirada da Marina, da Glória)
Honduras voltou a chamar atenção da mídia internacional. E por uma razão. Zelaya regressou ao país e agora se encontra na embaixada brasileira de Tegucigalpa, capital. O que ocorre hoje em Honduras é, de longe, o fato político e geopolítico mais importante nas Américas. Todos os elementos que caracterizam as lutas políticas nos países latino-americanos encontram-se em Honduras em estado bruto e radicalizado. Imprensa e elite associadas, mafiosamente, em atitude golpista. Povo acuado e desorganizado, de outro. Políticos no meio, ao sabor do vento. Um presidente sendo empurrado cada vez mais para a esquerda.
A história é uma mulher triste e chorando, mas sempre linda. O golpe em Honduras desmoralizou a direita, e pôs em cheque a honestidade da Sociedade Interamericana de Imprensa e demais organizações sindicais midiáticas do continente. O que a imprensa fez e está fazendo em Honduras é tortura psicológica inconcebível. Acompanho, no RSS aí do lado, dois blogs hondurenhos, de luta antigolpista, os quais também estão no Twitter, e o protesto principal que vejo por lá é a desonestidade sem limite da mídia nacional, que procura distorcer absolutamente tudo que acontece no país.
Como é um país pobre, com baixo uso de internet, a influência da mídia convencional é muito forte. A mídia hondurenha criou uma realidade virtual, com apoio dos intelectuais midiáticos (as mesmas repugnantes espécies que temos por aqui), que justificam o golpe juridica e politicamente.
Uma das coisas que realmente me impressionam foi a maneira repentina e inexplicável como Honduras sumiu da pauta midiática brasileira por várias semanas. Depois da cobertura dos primeiros dias, a mídia iniciou uma cobertura cada vez mais hesitante. Ontem, ouvi o Boris Casoy falar em governo "de fato" em Honduras, substituindo o termo que havia se generalizado antes, "governo golpista".
A verdade é que houve uma campanha da extrema-direita no Brasil, liderada por Reinaldo Azevedo, editorialista da revista Veja, para que a cobertura do golpe em Honduras fosse radicalmente modificada. Como não podia inverter a posição editorial que, embora hesitantemente e pressionada pela reação internacional, havia assumido de início, a mídia brasileira optou pelo silêncio sepulcral. Semanas e semanas sem uma linha, uma notinha, uma palavra sequer sobre Honduras.
Agora, repito, o fato político impõe-se, derrubando o pacto de silêncio, porque o Brasil abrigou Zelaya na embaixada brasileira. Reações negativas midiáticas começam a pipocar, como a entrevista com o embaixador Rubens Barbosa, que é incompetente (patrocinou o plano de retenção de café em 2001, que deu prejuízo superior a 400 milhões de dólares ao Brasil), invejoso e colonizado, quase afirmando que o Zelaya deveria estar na embaixada americana e não na brasileira; e o Estadão dando manchete alarmista sobre os riscos de "fratura social" que a volta de Zelaya traz ao país.
Pesquisadores, historiadores, jornalistas, cientistas políticos, ativistas, parlamentares, cidadãos, observem atentamente o que acontece em Honduras. O destino da democracia da América Latina reside neste pequeno e sofrido país centro-americano. O golpe vai fracassar, disso eu tenho certeza. O que devemos observar é todo o contexto político, a reação das mídias latinas ao pós-golpe. Depois que Zelaya retornar ao poder, deverá ocorrer, uma hora ou outra, um julgamento interno sobre os responsáveis por esse tenebroso atentado contra o espírito democrático das Américas. É muito pior que qualquer atentado terrorista, porque mexe com nossos traumas mais profundos. Milhões de latino-americanos que sofreram, na pele, as consequências nefastas de ditaduras militares, seguramente sentiram um horrível frio na espinha quando chegaram notícias de Tegucigalpa. Esse progressismo latino, forjado nas lutas sangrentas anti-totalitárias, revelou-se na condenação veemente e absoluta, pela classe política de todo o continente. O golpe em Honduras pendurou-se, então, no apoio midiático interno, no silêncio dos sindicatos internacionais de imprensa, além da participação histérica de figuras isoladas, mas barulhentas, da extrema-direita no continente, do Brasil aos Estados Unidos.
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Um leitor pediu-me que falasse alguma coisa sobre a entrevista de Ciro Gomes à rede Bandeirantes, no último domingo. Pois é, por coincidência, eu assisti. Tenho a dizer o seguinte: valeu Ciro! A entrevista lavou-me a alma. Assisti-a pontuando de palmas. Ciro Gomes não fugiu de nenhum tema político. Ao contrário, trouxe-os à baila: Chávez, corrupção, mensalão, Lula, mídia, golpismo midiático, golpismo de setores da elite. Não gaguejou uma vez. Não tergiversou. Mais uma vez cito aquela moça triste, sempre chorando, e contudo tão absurdamente linda, a História. O radicalismo midiático produziu um fenômeno interessante: a esquerda brasileira, mesmo estando no poder, tem à sua disposição um eficaz e necessário discurso de oposição. Isso é ótimo, porque a esquerda pode bater em seus adversários por todos os lados. Bate no Congresso, onde tem maioria; bate no Executivo, onde tem o controle, através de Lula, Dilma Roussef e Tarso Genro; e bate na mídia, através do debate político que começa a esquentar agora; e o melhor, bate aqui na blogosfera, onde nossa diversão, nos últimos anos, não tem sido outra. Eu quero mais é que a direita se dane. A direita já matou e torturou centenas de milhões de latino-americanos desde o início da colonização e não merece, por isso, nenhuma compaixão em nome de uma hipócrita e interessada "diversidade" ideológica.
Quando analisamos a história das civilizações, observamos que sempre houve uma dialética entre esta grande clivagem política que divide a humanidade desde seus primórdios em "conservadores" e "progressistas". A Roma Antiga experimentou lutas acirradas entre as forças populares e conservadoras, e ambas obtiveram vitórias memoráveis. Roma não foi apenas a sociedade dos patrícios e dos escravos, foi também onde os plebeus exerceram o poder através de seus tribunos sagrados. Os plebeus romanos experimentaram diversos momentos emocionantes de vitória, com Mario, com os irmãos Graco e, enfim, com Júlio César. Da Grécia, então, nem se fala, porque foi uma civilização notoriamente de esquerda, democrática, em oposição à Ásia conservadora, mística e totalitária.
Na Europa, tivemos a revolução francesa e as repercussões ideológicas que até hoje se desdobram em todo o continente. Nos EUA, a revolução americana da independência, foi um movimento de cunho fortemente progressista. Presidentes como Roosevelt, a própria continuidade democrática e a estabilidade econômica, que permitiu à cultura se organizar de maneira que o cinema e a literatura norte-americanos desenvolveram uma sólida musculatura ideológica, com capacidade de resistir e combater os governos mais odiosamente conservadores.
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Enfim, a América Latina precisa aprender a praticar o debate ideológico com a ferocidade e a determinação que ele merece, por constituir a base da civilização e da cultura. No Brasil, o processo de Anistia não pode significar a distorção da História. Nossas crianças e adolescentes devem saber que forças apoiaram o golpe de Estado de 1964, e quais foram os métodos usados: moralismo hipócrita, mentira sistemática, terrorismo ideológico, denúncias de corrupção seletivas. Por exemplo, o golpe militar foi patrocinado com desvio de recursos públicos do Adhemar de Barros, governador de São Paulo. Esses desvios não eram denunciados pela imprensa nacional, que focava suas denúncias na esquerda, como faz até hoje. E a imprensa teve uma participação central na preparação do golpe, inventando factóides, mentiras, fazendo terrorismo (dizia-se que o Brasil se tornaria algo parecido com Cuba ou União Soviética), envenenando sistematicamente a opinião pública e incitando - quase ameaçando - militares e empresários a se radicalizarem contra o governo.
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Todos os assuntos abordados no post de hoje estiveram presentes na entrevista de Ciro Gomes à Bandeirantes, e por aí podemos ver como um debate político franco e corajoso será útil para esclarecer a nação brasileira sobre sua história e seu destino. A participação de Ciro na campanha eleitoral de 2010, seja na presidencial, seja para o Estado de São Paulo, será valiosa, porque ele sentiu de onde vem o cheiro ruim que infesta a política nacional e tem a coragem de dar nome aos bois. Sua presença é particularmente importante em função da atitude frágil de Marina Silva. A força de Ciro Gomes, pode-se notar, é física, concreta. Para enfrentar os setores golpistas da imprensa e da elite, precisa-se de uma coragem física. É triste que tantos parlamentares do PT, por exemplo, deixem tanto a desejar nesse quesito; mesmo apanhando feio no lombo não se resolvem a assumir uma postura mais combativa e orgulhosa, que é o que os brasileiros desejam. Sempre que um parlamentar abaixa a cabeça para a mídia no debate político, os milhões de brasileiros que não querem a volta da direita ao poder, e intuem, com razão, que a vitória, ou derrota, se contrói nessas pequenas lutas cotidianas, sentem-se impotentes, humilhados e, por fim, revoltados e indignados. A humilhação, convertida em revolta, torna-se uma força. A mídia anseia continuamente em produzir um exército de indignados, mas é frustrada pela ação política concreta do governo Lula, de um lado, e pela argumentação ideológica inovadora produzida na internet, de outro.
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Registro também que setores importantes da Academia e da classe artística estão antenados na crescente polarização entre as forças políticas do continente americano, com uma mídia corporativa inclinando-se cada vez mais para uma postura reacionária e neoliberal, e classes políticas, pressionadas pelo voto popular, indo para o lado oposto, para ampliação do papel do Estado, adotando políticas públicas de redistribuição de renda. Debate ocorrido no Centro Cultural Banco do Brasil no último final de semana falou sobre a nova lei de mídia da Argentina.
Em todo continente, começa-se a discutir novos marcos regulatórios para a imprensa. Essa é a razão de ser da democracia: um regime político dinâmico, com parlamentares eleitos pelo povo para estar sempre atualizando as leis aos novos tempos, às novas forças sociais que emergem. A liberdade não pertence aos proprietário de meios de comunicação. A liberdade, assim como o poder, pertence ao povo. E quando falo em povo, não refiro-me à massa ignara, e sim ao povo compreendido diacronicamente, ou seja, o povo na história, organizado, com suas vanguardas intelectuais e artísticas.
O futuro da humanidade é a união dos povos. É a criação de uma moeda única. É ser governada por organizações internacionais centralizadas, democráticas, que garantam a liberdade das nações e dos indivíduos. Mas isso é outra história. Por enquanto, o destino do mundo reside em Honduras. Prestemos atenção.
Meu caro, custo a crer que você ainda não pode se dar conta de que há uma CONSPIRAÇÃO CAPITANEADA pela NOVA ORDEM MUNDIAL ANGLOAMERICANASIONISTA em curso para implantação do 4ºReich NO PLANETA e já em estado avançado... Honduras, 7 bases na Colombia, 4ª Frota no sudeste brasileiro, uma "guerra nas estrelas agora em nova embalagem" contra a Russia e Iran com o apoio da UE e o silêncio Chinês... Hillary CLINTONs e Obamas, avançam como "Hidras" sobre o mundo... Não há nem haverá "democracia" a não ser a que eles querem que seja para perpetuar seu poder de escravizar, explorar e exterminar a humanidade de acordo com suas conveniências... E então? Caiu a ficha? Sinto muito, sou grato!
prezado aldo,
isso é paranóia, sinto muito.
Grato,
Miguel
salve, miguel,
sem tirar nem pôr, meu caro!
análise lúcida, equilibrada e pontuada pela emoção histórica, que não sei nem se existo tal coisa.
o amigo está certo, tem mais que radicalizar a democracia que nesse instante é ameaçada pelos trogloditas de honduras com apoio da mídia truculenta do continente americano.
parabéns
E aí Miguel blz cara ! Rapaz acompanho seu blog faz um tempão, desde os anos 05/06 e curto muito! Faço este comentário e ao msm tempo um pedido. Tem como vc explicar melhor 'o plano de retenção de café em 2001' com participação do Rubens Barbosa ?!? Tenhos familiares cafeicultores e nunca entendi a tamanha desvalorização da saca de café neste começo de século.
Um abração e tudo d bom !
Oi Dindo, o plano de retenção foi uma tentativa canhestra e extemporânea de recuperar o preço do café, mas só fez o mesmo cair e outros países ganharem mercado. O preço de café raramente é bom, porque o custo é muito alto. Mas já esteve muito pior, em 2001. Hoje em dia, o problema é a explosão do custo, gerada pelas exigências ambientais e sociais que o mundo consumidor tem feito cada vez mais. E também pelo custo alto de fertilizantes e defensivos, usados em grande quantidade na produção de café. Mas as perspectivas de preço para os próximos anos são boas, segundo tenho ouvido falar, porque a produção não cresceu e o consumo atravessou muito bem a crise econômica, sem perder volume.
Querido Miguel, sabe que sou seu admirador,mas... Ainda bem que Filípides não achou que Milcíades estava paranóico. Muita paz e luz para você e todos nós! Sou grato! Continuo seu fã!
Prezado Aldo, não quis ofendê-lo. Não disse que você era paranóico. Disse que a teoria citada por você é que era paranóica. Aliás, não entendi nada de sua teoria, mas mesmo sem entender dá para ver que é paranóia. Primeiro, quem vai dominar o mundo, num futuro próximo, é a China, e não nenhuma anglo-americanismo, por razões financeiras, industriais e populacionais. A China tem mais de 1 trilhão de dólares em títulos públicos americanos e, se quisesse, quebrava os EUA. A Inglaterra, em poucos anos, terá um PIB menor que do Brasil. Segundo alguns cálculos, já é menor. Por isso, que digo que sua teoria é paranóica.
Bela imagem, suas imagens tem o poder de acalmar
Miguel,
Tinha certeza de que iria mencionar os irmãos Graco, desde aquele outro post em que afirmou que a dualidade esquerda/direita é anterior à Revolução Francesa.
Mas acho complicado classificar genericamente a Grécia antiga como uma civilização 'de esquerda democrática', visto que cada pólis grega tinha sua própria organização sócio-política.
É evidentemente uma simplificação. Mas todas tinham um espírito democrático que os uniam em torno de alguns valores comuns, e que os diferenciavam, no Mundo Antigo, do conservadorismo asiático.
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