9 de outubro de 2008

Garganta sem rios

Além das águas, as lágrimas, sem química
ou álcool, lágrimas somente, tristeza destilada,
pura como a chuva fria, espessa como o tempo
que escorre, rápido, viscoso,
entre os dedos, entre amores, entre países
em guerra - além das águas,
os rios correm por fora das gargantas,
fora das órbitas, sem olhos,
lágrimas puras,
um pouco ácidas enquanto escorrem
pelo rosto maquiado.

Daí o salto
impudente no abismo
sem água ou lágrimas
o negro sem fim,
insondável buraco
das vésperas,
e feriados insones,
abismo sem alma,
apenas esperança
e medo, e a coragem
que supera o medo.

Daí a vertigem,
sorridente e esperta,
crianças enfermas
convalescendo no quarto,
seios inchados de leite,
pênis intumescidos
e o alívio da boca
mamando.

Nada mais, além das sombras
de vergonha e guerra
as feridas esverdeadas
que guardamos na geladeira
esquecemos entre os livros
ou sob as roupas não lavadas
que se acumulam no banheiro.

Comente!