2 de dezembro de 2008

Escovando os dentes

Ai ai, o dia está tão bonito hoje, aqui no Rio. O céu azul de doer os olhos. Um sol puro, translúcido, bom. Espreguiço-me e vou escovar os dentes, minha nova metáfora que significa reagir às porcarias publicadas pelo Globo. Ontem nem me dispus a ler a matéria, que é nojenta, mas hoje vejo diversas cartinhas de leitores cortando a bola que o Globo, malandramente, levantou. Então voltei à edição de segunda-feira e, tampando o nariz, conferi seu conteúdo.

A manchete de primeira página diz que o Estado pagou até R$ 100 mil por imóvel desapropriado, no projeto que o governo estadual e federal realizam em favelas cariocas, dentro do PAC. Trata-se de um projeto de grande porte, que, se tudo der certo, representará um grande avanço na qualidade de vida nos três maiores conjuntos de favelas do Rio de Janeiro: Complexo do Alemão, Pavão-Pavãozinho e Rocinha.

Depois esses caras são sequestrados e não sabem porque. R$ 100 mil foi o preço pago por um prédio inteiro. O Globo acha muito? Os leitores (escolhidos a dedo, claro) acham muito? Porra! Onde estão os consultores imobiliários do Globo? Queria que o Estado pagasse quanto por um prédio na favela? A matéria diz que o Estado pagou R$ 56,7 mil "dos cofres públicos" (expressão usada apenas para despertar a raivinha dos lacerdistas) por uma casa de três pavimentos. R$ 56 mil por uma casa com três pavimentos? Isso é alto pro Globo? Isso é o "valioso m2 das favelas"?. Meu apartamento aqui no centro, numa área decadente, abandonada há décadas pela prefeitura, um quarto-sala mixuruca, num prédio vagabundo, foi comprado por R$ 58 mil, e isso não foi indenização. O jornal e seus leitores acham que imóveis na favela valem lixo?

Se o Globo, na mesma página, colocasse o valor dos imóveis em qualquer outra zona da cidade, estaria claro que o Estado pagou, nada mais nada menos, que preços de mercado. A matéria informa ainda que pagou-se R$ 62 mil por uma residência de 160 metros quadrados. Ãh? O Globo e seus leitores-poodle sem cérebro acham muito?

O texto da matéria começa assim: "Os primeiros números das indenizações pagas pelo estado e União aos moradores de imóveis afetados pelas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em favelas cariocas dão uma idéia de como o mercado imobiliário pode ser rentável nessas favelas."

Os jornalistas do Globo não pensaram que se trata de INDENIZAÇÃO, e não de mercado imobiliário? Que esses moradores terão custos de mudança? Que não pediram para ser removidos?

Na verdade, os valores são até baixos. Sempre ouvi falar que a família Marinho possuía dezenas de milhares de imóveis no Rio de Janeiro. E agora seu jornal pratica esse crime mesquinho, de tentar denegrir politicamente o PAC nas favelas, por causa desses valores? E ainda publica cartinhas de leitores que protestam contra valores absolutamente normais?

Antigamente, quando as favelas eram reformadas, o Estado praticava a desapropriação usando de violência, sem pagar nada aos moradores. Assim fez Carlos Lacerda, e tantos outros, sempre com apoio entusiástico do Globo. Quando as autoridades resolvem agir de maneira justa, dialogando com as comunidades e indenizando os moradores deslocados, o Globo mostra os dentes, insatisfeito. É incrível. Não existe nada que beneficie o trabalhador, as pessoas humildes, que não seja imediatamente atacado pelo jornal dos Marinho.

Realmente, não consigo entender. A única explicação é mesquinhez. Muquiranagem no mais alto grau. No afã de despertar indignação dos lacerdistas, o Globo cometeu uma grave injustiça contra as sofridas comunidades cariocas. Que Deus tenha piedade.

*

E o Globo prossegue sua campanha de desinformação sobre a importância de nossos vizinhos latinos para o Brasil e sobre como a nova política externa permitiu que as exportações brasileiras para Equador, Colômbia, Venezuela, Bolívia, registrassem um crescimento impressionante. Impressiona-me que o Globo se recuse a informar a verdade estatística! Considerando que esses países compram, sobretudo, produtos industrializados, de alto valor agregado, a sua contribuição para o desenvolvimento brasileiro tem sido estratégica. Enquanto EUA e Europa importam, principalmente, matérias-primas de baixo valor, nossos vizinhos compram auto-peças, aviões, aço, alimentos industrializados. Caso não acredite, confira a tabela abaixo, que atualizei hoje. Repare que o preço médio das exportações brasileiras, nos últimos 12 meses, foi de US$ 411 por tonelada, enquanto as vendas para a América Latina renderam US$ 1.412 por tonelada.

Observe o Equador. As exportações brasileiras para o Equador não apenas cresceram 35% em 12 meses e 125% em seis anos, como o preço médio das compras equatorianas saltou de US$ 1.211 para US$ 2.829 por tonelada!

Ou seja, o Brasil está ganhando muito dinheiro com seus vizinhos, porque ampliou suas relações comerciais. Conflitos diplomáticos são normais, ainda mais em países que vivem situações de extrema injustiça social, que geram, em seus governos, necessidade de mudanças às vezes mais aceleradas do que em outros.

Num cenário em que os EUA, nosso maior comprador individual, vive uma forte recessão econômica, a importância da América Latina torna-se ainda mais estratégica. Não podemos brigar com nossos vizinhos agora! O Globo, e a oposição que dança ao som do coro global, não podem ser irresponsáveis! Rediscutir dívidas sempre foi normal. Faz parte da relação devedor X credor a discussão de dívidas, ainda mais nesses casos, onde existe uma profunda disparidade financeira entre a pujança do Brasil e a debilidade econômica dessas nações. O Brasil deve continuar sendo generoso e tolerante com seus vizinhos, primeiro porque tem uma monstruosa superioridade industrial e agrícola, e segundo porque sua economia, agora mais que nunca, precisará deles para manter o bom ritmo de nossas exportações. Clique para ampliar.




*

Uma cartinha do Globo, na seção "Ajuda à Petrobás" encerra assim:
"E o pré-sal, era só uma falácia para a promoção de alguns?"

O tolo escreve isso, naturalmente, porque foi confundido, pelo jornal, sobre a operação de empréstimo da Caixa para a Petrobrás. Qualquer empresa, mesmo tendo lucros, recorre a bancos para ampliar seu capital de giro. Aliás, um leitor, em outra carta ao Globo, admite: "perfeitamente normal a Petrobrás fazer empréstimos na CEF e no BB, devido ao fechamento dos canais internacionais." Mas ressalva: "o que tem de ser questionado é o inchaço da folha de pagamentos da Petrobrás. Parece que foi criado um cabide de emprego para os correligionários do PT, análogo ao governo Lula, que montou um monstro de 38 ministérios, enquanto os EUA só têm 12!"

O leitor também é outro iludido pelas maquinações do Globo. Primeiro, a Petrobrás não inchou de "petistas". As contratações da Petrobrás, todos sabem, ocorrem por meio de concursos públicos dificílimos. As nomeações políticas ocorrem só no alto escalão e tem uma participação irrisória na composição total da folha de pagamentos. Sobre a diferença no número de ministérios, temos outra confusão. Os EUA têm apenas 12 ministérios, porque possuem centenas de agências federais e milhares de institutos públicos, relativas aos diversos segmentos da economia americana. A grande confusão, criada pelo Globo, faz os leitores pensarem que o Brasil tem mais funcionários públicos que os EUA, quando é o contrário. A quantidade de funcionários públicos, per capita, nos EUA, é muito maior que no Brasil. Um estudo recente feito pelo Ministério do Planejamento levantou que os EUA possuem 1,856 milhão de servidores públicos civis federais na ativa, com uma média de idade de 46,9 anos, para uma população de 295 milhões de habitantes. O Brasil, por seu lado, tem cerca de 573 mil servidores (da União) civis na ativa concursados, com média de idade de 47 anos, para uma população total de 188 milhões de habitantes. Isso quer dizer que os EUA, a grande pátria do liberalismo, têm 1 funcionário público para cada 158 habitantes, enquanto o Brasil tem 1 funcionário para cada 328. Os EUA, onde não há petismo, têm mais funcionários públicos que no Brasil. Os leitores do Globo, obviamente, não sabem disso.

Outra coisa que os leitores do Globo não sabem é que boa parte das contratações feitas pelo governo Lula deu-se por determinação do Tribunal de Contas da União, que considerou inconstitucional a terceirização maciça promovida pelo governo FHC. O Tribunal de Contas percebeu que o governo vinha gastando mais com terceirização do que se contratasse funcionários diretamente. Os tucanos gostam de terceirizar, porque podem "presentear" amigos com contratos milionários, onde o dono de uma cooperativa ganha muito e milhares de trabalhadores recebem empregos instáveis e mal remunerados. Além disso, o governo contratou médicos, professores, técnicos do Ibama, investigadores, enfim, recompôs parte da estrutura humana do Estado brasileiro, que fora sucateada durante os oito anos de pesadelo neo-liberal vividos pelo Brasil durante a gestão do PSDB.

5 comentarios

RLocatelli Digital disse...

Com essa mídia golpista, só nos resta a informação de boa qualidade que encontramos na internet.
Os dados que o Miguel do Rosário posta aqui sobre balança comercial são preciosos, valem ouro em pó.
Por isso fico preocupado com o projeto do Senador Eduardo Azeredo de "regulamentar" (leia-se censurar) a internet. A demotucanalha já percebeu que a blogosfera representa um quinto poder, cada vez crescendo mais.

Anônimo disse...

Olá, chamo-me Pedro Pinto e ando a seleccionar pessoas com uma boa presença on-line par convidar para meus afiliados
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Miguel do Rosário disse...

oi pedro, não me convenço tão fácil, e estou ocupado demais escrevendo e lendo para me informar sobre isso. não me tornei blogueiro para ganhar dinheiro. poderia faze-lo de outra forma. estou aqui para divulgar minhas idéias. se voce assinar minha revista, comprar livros no meu sebo virtual ou fazer uma doação para o blog, aceito de bom grado. Boa sorte.

Anônimo disse...

Muito bom, Miguel! Seus textos são excelentes. Combinam harmoniosamente a sensibilidade e a intuição do artista com a exatidão e o conhecimento do cientista.

carlos disse...

grande miguel,

mais uma vez a lucidez prevalece nos textos do blogueiro.
parabéns!

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