23 de fevereiro de 2007

carnavais

me lembram latinhas de cerveja
homens vestidos de mulher
eu mesmo comprei um bustiê
virei piranha

me lembram doses de conhaque
vômitos no mato à beira da piscina
mulheres de que não me lembro

transas rápidas em barcos abandonados
(na ilha grande, em 1999)

claro, os shows na lapa
os grandes mestres
milhões de camelôs
império das latinhas
skol gelada a dois reais
todos os sabores de caipirinhas

me lembram baseados
na joaquim silva
entre amigos do peito
momentos em que parecíamos
realmente irmãos
para sempre

no rio, porém, é preciso estar sempre atento
testemunhei na lapa um assalto internacional
dois caras, um gigante negro e outro magro com cara de mau:
give me the money, give me the money!
para duas turistas de saias coloridas, chinelos de dedo
e bolsinhas de cordão, leves como seus espíritos
aquilo me doeu, cara, me fez sentir covarde

me lembram chances perdidas
como a paulista fantasiada de mendiga
linda linda, que dançou comigo
dançou para mim
às seis hora da manhã
em frentes aos Arcos
e tirou os panos que cobriam suas pernas
de shortinho, era mais que uma deusa
era minha, minha, minha, até aparecer uma outra conhecida
que desviou-me a atenção
levou-me para outra rua, entrou em seu carro
e partiu sozinha
na verdade, com outra garota.
era sapata, a danada
deixando-me sozinho, sem paulista

sem nada


o carnaval me lembram bailes em cidades
pequenas no interior do estado
amor efêmero com provincianas
carinhosas e imorais

em salvador, o carnaval comercial
me deu náuseas
assim como sempre achei idiota
os desfiles na sapucaí

o carnaval é uma espécie
de festa desesperada
que bom beber uma cerveja
numa tarde quente de carnaval
sentindo o calor que emana
das multidões que passam
contemplando aquela garota
vestida de índia
ou melindrosa

já me fantasiei de árabe, presidiário,
sempre tive queda pela estética marginal
tradição aliás da poesia carioca
antes mesmo que torquato neto
trouxesse seu casaco de general
e oiticica posasse
de herói-bandido-parangolé

quantas vidas seriam necessárias
para viver tantos carnavais e suas paixões?
se uma vida parece insuficiente
para viver a loucura de um só amor?

quantos carnavais seriam necessários
para que esqueçamos a vida,
a morte, as tribulações,
a mesma cara no espelho, todas as manhãs?

ah, outros carnavais...
lembro-me daquele com a amiga de brasília e seu namorado,
que tinha o hábito curioso de andar com os baseados
já apertados – devia ser a primeira coisa que fazia pela manhã

passeamos pelas ruas festivas, fumando no meio
das festas, e não pensem que o samba tem monopólio:
o carnaval da lapa tem rock, hip hop, reagge...

mas é certo que às vezes,
a lapa tem um ar decadente
que deprime, angustia
e não deixa lembranças boas no dia seguinte

e hoje acordei,
no exílio,
merda,
sem sequer me lembrar
que era dia de festa

que tristes são
os países
que não conhecem o carnaval!