5 de dezembro de 2008
O que acontece com o Real
Por João Villaverde
O assunto da vez é a taxa de câmbio no Brasil. Foi a principal manchete dos telejornais noturnos, dos jornais de hoje e o acompanhamento do mercado está permanentemente nos sites de notícias. Ontem, o dólar alcançou R$ 2,53. Há três meses valia R$ 1,55. O salto, enorme, é o único fato. De resto, o campo está aberto para interpretações mil e uma série de interesses em jogo. Como sempre, com crises, abre-se uma oportunidade única de mudança. E a boquinha da turma da bufunfa está aberta.
Há pouca liquidez nos mercados emergentes (especial: Brasil, China, Índia e Rússia). Havia muita antes da crise, com os grandes fundos de investimentos dos países ricos vindo aproveitar as "oportunidades" brasileiras. Durante muitos anos, no Brasil, ganhou-se muito dinheiro sem o mínimo esforço.
Os juros eram (são) altos. A taxa de câmbio era estável - o que tira o risco das operações - e descendente. Peguemos o exemplo de 2007. No ano passado, no dia 1º de janeiro, o dólar valia R$ 2,14. Em maio caiu abaixo dos R$ 2,00. E fechou o ano valendo R$ 1,80. Para os investidores isso é ótimo. Ele pega uma quantia de dólares e transforma em reais em janeiro. Quando, em dezembro, ele troca os reais por dólares e leva para casa, apenas o movimento de valorização cambial já dá para ele um lucro enorme. Porque com a mesma quantidade de reais ele compra mais dólares. E além disso havia a remuneração pela nossa taxa de juros obscena.
Uma farra.
Veio a crise, muitos dólares especulativos saíram dos emergentes e houve desvalorização cambial. Normal. A questão aí é que, passado o estresse geral de setembro/outubro - não que as coisas estejam tranquilas agora, mas o choque diminuiu - os especuladores voltaram. Agora o jogo é diferente. A tendência de aposta é de desvalorizar o real para lucrar. E do lado destes, o parceiro continua o mesmo: o governo, por meio do Banco Central.
O que está acontecendo agora?
O movimento do mercado de dólares ontem foi sintomático para exemplificar esse novo jogo. Temos o mercado à vista - onde os bancos trocam moedas entre si, os exportadores e importadores saldam suas operações de comércio exterior, financiamento externos aos investimentos internos, etc. E temos os mercados futuros (a BM&F, aqui em São Paulo). Lá o campo é totalmente aberto para a ação dos especuladores. Por que não há fiscalização? Sim. Mas principalmente porque o maior fiscalizador, o Banco Central, é ator principal do cassino.
Ontem, quinta-feira, o BC passou o dia todo assistindo o câmbio subir. No início das negociações, o dólar valia 2,47 reais e foi subindo. No fim do dia, quando cessam as operações no mercado à vista, o BC entrou em jogo fazendo o que os especuladores ansiavam: vendeu contratos de swap cambial.
Nos mercados futuros existem duas posições: aqueles que compram e aqueles que vendem. Todos negociam contratos que só serão liquidados em algum tempo no futuro (pode ser daqui a 30 dias, dois meses ou mais). São "apostas". Mas, como estamos no Brasil, estão mais para "certezas". Para cada um "comprado", existe um "vendido".
Quando, até a crise, o real se valorizava (indo dos quase 4 reais de 2002 para os R$ 1,55 de agosto último) os especuladores "vendiam" e o Banco Central fazia o papel do "comprador". Ao operar "vendido", o especulador aposta que o real continuará caindo. Ele ganhou sempre, por mais de cinco anos. Quem opera "comprado" aposta que o real subirá, ou seja, vem ganhando desde que a crise explodiu.
Quer dizer, desde que a crise estourou, houve inversão de papéis na BM&F. Os especuladores estão agora fortemente "comprados" (apostando que o real continuará se desvalorizando) e o Banco Central entra em campo com seus contratos de swap, apostando na posição "vendida". Os especuladores, em sua maioria, fundos estrangeiros, estão em posições compradas de nada menos que US$ 13,1 bilhões. Isso mesmo, mais de 13 bilhões de dólares. Eles, apenas ontem, compraram 6.320 dos 10 mil contratos de swap que o BC colocou a venda, depois do fechamento das operações à vista. Todos com vencimento de fevereiro de 2009 - uma aposta razoavelmente segura em tempos de crise. Por meio deles, o BC vendeu no futuro quase US$ 315 milhões de nossas reservas.
E não pára aí. Esses especuladores fazem uma série de operações cruzadas, investindo em títulos públicos - que rendem esses juros absurdos brasileiros - e não pagam Imposto de Renda. O lucro, como se vê, é imbatível.
Agora uma coisa precisa ser entendida. Antes de qualquer terrorismo, a mídia poderia informar que não há nada de errado com o Brasil. Todos os países que receberam investimentos - financeiros ou não - nos últimos anos estão vendo os dólares sendo sacados dos mercados. As multinacionais estão mandando todos seus lucros nos emergentes para cobrir os rombos que estão tendo nos Estados Unidos e na União Européia. Todos os países estão sofrendo desvalorizações cambiais. Só não acontece em países que controlam suas taxas, como o Chile, a China e a Argentina. Como aqui não se controla, é inevitável o que ocorre agora.
Entendido isso, outro mantra ridículo que é batido sem discussões é que a subida do real vai gerar inflação. Há muita ignorância nessa análise. Mas há muito interesse em ganhar esse discurso. É preciso inteligência nessa hora, saber sacar que os movimentos são inevitáveis e passageiros.
Agora uma coisa não se discute. Com ou sem crise, no Brasil liberal, especulação é o que não falta. E é isso que deve ser controlado.
Tweet Enviar por e-mailPostar no blog!Compartilhar no XCompartilhar no FacebookCompartilhar com o Pinterest
# Escrito por
João Villaverde
#
sexta-feira, dezembro 05, 2008
# Etichette: Artigo, Economia, Joao Villaverde
# Etichette: Artigo, Economia, Joao Villaverde
Gostou deste artigo? Então assine nosso Feed.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
05/12/2008 - 10:15
Balaio do Kotscho
Só más notícias, e Lula bate novo recorde
Juro que eu também fiquei surpreso com a manchete da Folha de hoje, mostrando que o presidente Lula bateu novo recorde de aprovação, atingindo 70% de ótimo e bom no final do seu sexto ano de governo, quando a tendência histórica é de queda nos índices das pesquisas após a reeleição (vide FHC, Bush, Menem, etc).
Depois de tudo o que lemos, vimos e ouvimos na imprensa brasileira nos últimos dias, esperava o contrário, que Lula perdesse pontos em função da crise econômica mundial e, principalmente, da cobertura jornalística desta mesma crise. Teve até líder da oposição reclamando da demora da divulgação de novas pesquisas, achando que desta vez o presidente levaria um tombo.
Lula bate seu próprio recorde anterior, que era de 64% em setembro, justamente numa semana só de más notícias, em que ele foi responsabilizado em redes nacionais de TV e nas principais colunas de política e economia dos jornais por todas as desgraças do mundo, da tragédia das chuvas em Santa Catarina a todos os efeitos perversos da crise econômica importada dos Estados Unidos na vida dos brasileiros.
Não se trata de uma pesquisa qualquer. O índice de 70% de aprovação foi apurado pelo Datafolha, o respeitado instituto do maior jornal do país, que é um crítico ácido de Lula desde antes mesmo do seu governo começar, em 2003, e que tem se esmerado em destacar apenas notícias negativas em sua primeira página.
Fico imaginando a cara dos seus editores e colunistas diante da manchete do jornal de hoje. Que se passa com este povo?, devem estar se perguntando agora, incrédulos e inconformados.
Ao abrir o laptop e ver a manchete do iG nesta manhã de sexta-feira (os jornais ainda não chegaram aqui na fazenda em Igaratá, onde estou), tomei um susto ao ver meu amigo Lula atingindo o maior patamar de aprovação já registrado por um presidente desde a redemocratização do país.
Restam apenas 7% de brasileiros que consideram o governo Lula ruim ou péssimo, incluindo aí certamente muitos colegas jornalistas, que sentem saudades do seu antecesor, Fernando Henrique Cardoso, cujo maior indice de aprovação não passou de 47%, em dezembro de 1996.
DATAFOLHA também fez pesquisa eleitoral, mas não divulga
fonte: Portal Vermelho.Org
O relatório do instituto Datafolha sobre a pesquisa divulgada nesta sexta-feira (5) faz uma referência indireta indicando que foi indagada a intenção de voto dos cidadãos brasileiros nas próximas eleições presidenciais.
No entanto, o jornal Folha de S.Paulo, do mesmo grupo empresarial, omitiu a informação ao divulgar a pesquisa, que ocupa a manchete e duas páginas internas, atestando que a popularidade do governo Lula subiu mais seis pontos e é a maior que um presidente já atingiu desde o fim da ditadura.
Já o relatório do Datafolha sobre a pesquisa coletada entre 25 e 28 de novembro, menciona, de passagem: "Entre os brasileiros que têm intenção de votar em Dilma Rousseff para presidente, possível candidata do partido do presidente (PT) em 2010, a taxa dos que aprovam Lula chega a 89%.
Entre os que pretendem votar no provável candidato do PSDB, José Serra, essa taxa é de 65%. O relatório está disponível no site do instituto.
A julgar pelo comportamento-padrão do Grupo Folha, é possível que a parte da pesquisa que se refere a 2010 esteja sendo guardada para outra edição da Folha, talvez no próximo domingo.
Além de permitir que se tire duas manchetes de uma mesma pesquisa, o procedimento se harmonizaria com a preferência eleitoral do Grupo dos Frias, evidentemente engajado, embora não o confesse, na campanha Serra 2010.
Caso o hoje governador de São Paulo permaneça, como em outras sondagens, como o depositário de maior intenção de voto, isso permitiria reduzir a contaminação da "boa notícia" (para os tucanos) com o recorde de popularidade de Lula.
Caro amigo Miguel houve algum problema com a RSS Feed do meu blogue? Estive olhando e acho que sim,pois meu blogue não está mais aparecendo em seu blogue na parte PARCEIROS, provavelmente deve ter ocorrido algum probleminah de ferramenta.
Um grande abraço meu amigo!!!
John Cutrim JP http://www.jornalpequeno.com.br/Blog/JohnCutrim/
Postar um comentário