A Vale e a política
FOLHA DE SÃO PAULO - 21/10/09
BRASÍLIA - A Vale ganha dinheiro explorando minério de ferro. Não há notícia de ameaça ao seu poderio em solo brasileiro. Ainda assim, a empresa se lançou com volúpia ao mercado publicitário.
Nos últimos 12 meses terminados em setembro, a Vale torrou R$ 178,8 milhões em propaganda. No mesmo período, a marca de sabão em pó Omo consumiu R$ 141,7 milhões. Os dados são do Ibope Monitor - não consideram descontos, mas são elevados em todos os cálculos e comparações possíveis.
Mineradoras pelo planeta afora praticamente não fazem propaganda. Seria jogar dinheiro pela janela. Nenhum consumidor leva em conta ao comprar um carro se o aço foi produzido com o minério de ferro da Vale. Tanto faz.
A atitude da Vale ao fazer propaganda como se fosse uma estatal destrambelhada obedece a motivações diferentes da lógica do mercado. Há componentes políticos e empresariais envolvidos.
O aspecto empresarial é obscuro. A Vale pode argumentar com a clássica necessidade de fixar a marca.
Seria um sofisma inaplicável, pois inexiste conexão capitalista entre o lucro da empresa e as propagandas na TV. A não ser que o componente político esteja presente.
Aí vem o lado curioso. Uma empresa privada com despesas publicitárias acima de R$ 100 milhões segue as normas básicas de governança corporativa. Uma conta assim só é entregue a uma ou várias agências depois de um duro e competitivo processo de escolha. Não se conhece a forma pela qual a Vale concluiu ser conveniente dar sua conta milionária ao publicitário Nizan Guanaes. Mas sabe-se muito bem que o nome Nizan Guanaes causa pesadelos no PT.
Nizan foi o marqueteiro preferido de tucanos, de FHC a José Serra. Todos conhecem no Brasil os vasos comunicantes entre publicidade e política. E os custos altíssimos da campanha eleitoral de 2010.
Infelizmente, esse é um tipo de denúncia que não deverá ter repercussão, porque não ataca o PT. Quer dizer, não terá repercussão na mídia convencional. Por isso mesmo devemos destacá-la por aqui, na blogosfera.
O famigerado mensalão, para quem não se lembra, nasceu numa empresa de publicidade, e os recursos vieram de empresas, na forma de verba para propaganda. O dinheiro movimentado pelo mensalão girou em torno de 200 milhões de reais. Apenas nos últimos 12 meses, a Vale gastou 179 milhões de reais em propaganda, usando a agência de Nizan Guanaes, ligado ao PSDB.
Já que falamos em mensalão, a ministra Dilma Roussef depôs por esses dias sobre o caso. Parte da opinião publicada comprou a idéia do mensalão como uma espécie de dogma ideológico. Inclusive já vi, por diversas vezes, julgamentos sumários de personalidades, por parte de blogueiros e colunistas, com afirmações do tipo: "fulano não acredita no mensalão", querendo dizer algo como: "não acredita no Holocausto".
Dilma declarou que o mensalão não existiu, o que é a opinião predominante do alto escalão do governo, da maioria dos parlamentares e jornalistas. Até hoje, não apareceu nenhum parlamentar que tenha confessado receber dinheiro para votar a favor do governo, à diferença do que houve nos tempos de FHC, quando dois parlamentares declararam em juízo que haviam, positivamente, recebido propina para votar em favor da emenda da reeleição. Os deputados que admitiram receber dinheiro do esquema do empresário Marcos Valério afirmaram que se tratava das sobras de campanha. E quem conhece o sistema de financiamento de campanha no Brasil sabe que é assim mesmo. O boquirroto Arthur Virgílio (ler aqui uma excelente compilação sobre a vida desse senador feita pelo Desabafo Brasil), antes de se tornar o paladino ético-midiático de hoje, confessou, sem pedir desculpas, o uso de caixa 2 em sua campanha no Amazonas.
Caixa 2 em campanha é crime, mas é também um costume político, derivado dos graves problemas enfrentados pelos partidos para financiarem suas campanhas. O moralismo mais hipócrita impera quando se analisa a gritaria feita durante o escândalo do mensalão, que foi uma repetição bastante competente de campanhas pré-golpistas que antecederam todas as derrubadas de governo na América Latina dos últimos 50 anos. Agora mesmo, em Honduras, a mídia realizou uma terrível campanha moralista contra Zelaya, inventando todo o tipo de calúnia contra o presidente, com o fim de preparar a opinião pública para o golpe de Estado. No caso do Brasil, houve a tentativa de um golpe branco, que só não foi adiante em função das enormes manifestações dos movimentos sociais, que inclusive reuniram-se numa associação: CUT, UNE, MST, Contag, sindicatos, as grandes organizações sociais, que haviam sido sempre críticas ao governo Lula, em virtude da política econômica conservadora dos primeiros anos, detectaram rapidamente a ação da direita política por trás daquela espiral de escândalos, muitos dos quais totalmente desconectados entre si, apenas ligados em seus objetivos de demonizar o PT e a esquerda em geral, e assustaram as forças conservadoras com sua capacidade real de tomar as ruas. Lembro até hoje de uma assembléia sindical numa cidade do ABC, uma das raras que foi exibida na TV, onde o presidente do sindicato dos metalúrgicos fala ao microfone com uma voz cheia de autoridade e ameaça, algo como: "que não ousem apear o senhor Lula da presidencia! Não ousem!". Essas manifestações, conforme o deputado Ciro Gomes admitiu em entrevista recente, foram a verdadeira razão pela qual a direita "amarelou" e decidiu mudar para uma estratégia mais prudente, para eles: sangrar Lula até 2006, e surrá-lo eleitoralmente. Os fatos, porém, foram outros. Naquele momento, a opinião pública brasileira registrou uma das maiores viradas de sua história recente. A popularidade de Lula, que havia declinado fortemente em meados de 2006, voltou a subir. A maior novidade, todavia, foi o surgimento, em escala grandiosa, de uma massa crítica de cidadãos descontentes com a cobertura política realizada pelos jornalões. A blogosfera política brasileira nasce ali. Já existia antes, mas o seu nascimento enquanto força política relevante na conjuntura nacional, tem início naquele momento. Desde então, vem crescendo sem parar, tanto que já causou diversas manifestações histéricas (e idiotas) por parte de colunistas convencionais.
Em 2008, eu publiquei uma matéria para a Revista Inteligência analisando a possível influência da blogosfera sobre as eleições, particularmente sobre a opinião pública da classe média. A análise que eu fiz, de que a maioria da classe média estaria, até 2010, conectada à blogosfera, permanece válida.
Por isso é tão importante esse projeto de levar banda larga para todo o país a baixo custo, a 9,90 reais por mês.
Boa Tade Miguel.
sei que não tem nada a ver com o post, mas estava agora pouco lendo esta matéria no portal do Luis Nassif (http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2009/10/21/guerras-urbanas-realidade-e-politica/) sobre os problemas que o Rio de Janeiro vem enfrentando. Sei que a situação não é facil mas tem certas sensações e dúvidas tem passado por minha cabeça nesse momento (gostaria muito de compartilhar essa sensação):
- A sensação de confusão, pois cada vez que abro um portal ou vejo na TV, as informações vão sendo colocadas uma em cima da outra. Um exemplo: começou com o helicóptero abatido, e foi evoluindo, e na medida que cada coisa acontece, sempre tem como base um acontecimento anterior;
- a sensação de que existe uma mega exploração, de um problema que se arrasta há anos e que o nosso querido PIG para colocar a culpa no governo federal e azedar as olimpíadas de 2016;
- a sensação de que existe um consenso que todo o mundo se acha expert num assunto só porque ele leu e "deduziu" algo, sem ao menos ter pensado um pouco.
- A sensação de que o senso comum (digo, as pessoas) defendem a nossa mídia a unhas e dentes, com a descula de que "estamos defendendo o Lula" ou "vc é um Alienado"
Gostaria que você pudesse me ajudar a pensar melhor nisso.
Att.
Guilherme
Imagina só se Lula tivesse doado a Vale e ainda por cima ter colocado em sua diretoria somente petistas.
Como se sabe, FHC foi presenteado com cargos para seus privilegiados na direção da Vale.
Também pudera, com o presentão que receberam.
A Vale é uma bomba a ser explodida nas mãos dos tucanos-demos, só espero que a abertura desta caixa preta demore tanto.
Ah sim, já que os tucanos-demos abrem CPI todo dia, porque não abriram ainda a da privataria ou, pelo menos a da privataria da Vale?
Interessante se notar que apesar de fundos de pensão estatais serem donos de quase a maioria das ações da Vale, os mesmos não podem, por imposição de lei da privataria de FHC, indicar qualquer diretoria ou tomar qualquer decisão, isto é um escárnio.
Quer dizer que usam nosso dinheiro com este vergonhoso mensalão tucano-demo e ninguém faz nada.
Com tanta grana da Vale jorrando para os bolsos de Serra as eleições de 2010 estarão comprometidas.
Que democracia é essa?
André Rezende
pô, miguel, e a gente que aplicou na vale através do fgts, vamos nos queixar a quem? ao bispo?
não sei, não, mas esse tal de agnelli ainda vai aprontar muita coisa na vale antes de cair fora.
desde que ele demitiu os funcionários no auge da marolinha que envio e-mails pra vale e eles, solenemente, fazem ouvidos de mercador. são uns canalhas!
abçs
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