29 de janeiro de 2009

A contradecepção de Vik Muniz



Confesso que fui com um pé atrás. Sou um cara cheio de preconceitos contra alguns aspectos da arte contemporânea e antes de ir à exposição de Vik Muniz esperava encontrar uns trabalhos bonitinhos, interessantes, mas sem grande consistência artística.

Experimentei, todavia, uma agradável decepção ao contrário. Embora Muniz seja o protótipo, quase um estereótipo, do artista contemporâneo pop, ele consegue sê-lo com assombrosa originalidade e inegável competência estética. Feitos com técnicas esdrúxulas, como dispor objetos sobre desenhos gigantes, de forma a obter reproduções não-convencionais de clássicos das artes plásticas, seus trabalhos são, antes de você entendê-los, extremamente bonitos, com forte densidade visual.

Com obra eclética e numerosa, é claro que nem todos os trabalhos mantêm a mesma força, mas boa parte das obras em exposição no Museu de Arte Moderna me causou uma excelente impressão. O cara é bom. Não porque usa lixões para fazer seus trabalhos, mas porque, fazendo-o, obtém bons resultados, alcançando contrastes, profundidades, linhas e contornos que me proporcionaram momentos de legítimo prazer estético, aquele velho e milenar prazer que somente Kant conseguiu explicar, fazendo-me recordar dos belos versos de Leopardi:

"Cosí tra questa
immensità s'annega il pienser mio:
e il naufragar m'é dolce in questo mare"

*

Por falar em arte, o link Gallery Flickr, no alto, está recebendo contribuições novas de arte contemporânea. Quem quiser dar uma espiada, está ficando bem legal.

12 comentarios

José Carlos Lima disse...

Cara, mas gostei mais da Galeria Óleo do Diabo na Flick do que a arte Tuti-Fruti de Vick Muniz,
questão de forma, densidade, luz, não me interessam tanto, e sim o discurso, o que a obra consegue me passar,
você me passou muito mais do que o Vick

Juliano Guilherme disse...

O Vik Muniz é um artista controverso. Eu tenho um sentimento ambíguo em relação ao seu trabalho. Não há como negar sua força visual. Mesmo porque suas imagens são exuberantes e arrebatadoras. Seduz o olhar e proporciona prazer estético. Mas há um que de superficialidade que me incomoda. Tem uma aproximação perigosa com a publicidade e com a ilustração. Sua obra é maneirista, e como tal dá uma sensação de vazio por de trás da beleza. Mas talvez seja um problema meu, romântico incurável que sou. Peço sempre densidade humana, e o maneirismo não é por aí

Miguel do Rosário disse...

Gostei muito dos seus comentários, dos dois. Eles me fizeram pensar se eu não, inconscientemente, estou pagando uma espécie de tributo para adentrar no suntuoso palácio da pós-modernidade. Também percebo essa falta de densidade política - o uso de pessoas do lixão para realizar o trabalho não me comove, pois se torna puro marketing, e falo de densidade no resultado do trabalho e não no processo de feitura, que não me interessa. Enfim, pode-se pintar um vaso de flores, como fazia o holandês louco, e ter densidade política, e pode-se pintar um homem carregando lixo e não ter nenhum. O debate ficou bom. Acho que ainda vai dar pano pra manga.

José Carlos Lima disse...

Muito legal o debate, já aprendi algumas coisas por aqui.
Você tem razão ao referir-se à feiura da arte feita com lixão.
Mas depende né.
Depende de quem faz, como faz, porque faz, em que contexto faz.
O problema não é tanto o lixão mas a feiura, o vazio e a gratuidade de algumas obras feita com este material que os artistas geralmente usam em suas assemblages, i.e, amontados disso ou daquilo.
Um exemplo de quem foi craque na apropriação do lixo e da sucata para a construação da sua bela poética, do seu discurso visual, foi Arthur Bispo do Rosário, um louco que viveu durante toda a vida num hospício e cujas obras já rodaram o mundo e foram expostas nas maiores bienais do mundo.
Enfim, o artista vai se apropriando do que ele acha pela frente, do que povoa seus sonhos, seu imaginário, com sua percepção que o faz vez coisas que para muitos de nós passa despercebido.
Um artista que faz isso muito bem é Nelson Leirner, ontem assisti um documentário dele no canal de tv fechado SESCTV.
Aqui o link

http://www.sesctv.com.br/tema.cfm?id=8195&destaque_id=6

José Carlos Lima disse...

Eu quis dizer sua percepção que o faz ver coisas

Juliano Guilherme disse...

Caro Jose Carlos, concordo com você. Bispo do Rosário e Nelson Leirner são ótimos. Mas dê uma olhada no trabalho do artista carioca Nilton Pinho. Para mim, e creio que para o Miguel também, é um dos que melhor trabalham com sucata

José Carlos Lima disse...

Juliano, eu não havia visto falar de Nilton Pinho.

Fiz uma busca na web, por sinal com o nome Nilton Pinheiro, e gostei do que vi.

Obrigado pela informação, aqui os links para quem quiser conferir
Nilton Pinheiro e Nilton Pinho são a mesma pessoa?

Aqui como Nilton Pinheiro

http://noticiasrio.rio.rj.gov.br/index2.cfm?sqncl_publicacao=5572

Aqui como Nilton Pinho
http://niltonpinho1960.blogspot.com/

Gostei dos "dois", uma bela poesia, belo discurso visual, o feio ficou bonito.

José Carlos Lima disse...

Ah sim, joguei tudo para meu blog e deu prá sacar que Nilton Pinho e Nilton Pinheiro são a mesma pessoa, a mídia tem destas coisas, uma blefe destacar que o cara é flamenguista para comentar a assemblage com coisas do flamengo, o que tem a ver uma coisa com a outra, ele poderia ter-se interessado apenas pelas cores do time para fazer seu discurso visual.

Aqui as obras dele reunidas tudo num de meus blogs
http://josecarloslima32.blogspot.com/

José Carlos Lima disse...

Ao afirmar "...uma bela poesia, belo discurso visual, o feio ficou bonito"
não estou me referindo somente à beleza em si, aquilo que usualmente entendemos como belo.
A pichadora Caroline Pivetta da Mota, aquela que foi presa por pichar o vazio da Bienal de SP disse que sua arte não visa agradar, segundo ela, o que ela faz não é para ser visto.
Como se vê, estamos falando de um outro tipo de arte, intervenção, discurso apenas.
Como se sabe, o gesto de Carol foi um discurso forte e provocou muita reflexão no meio artístico brasileiro, sem a menor sombra de dúvida terminou sendo a obra mais rica da 28a. bienal de SP.
Sei lá, a arte é um grande enigma, ainda mais quando ela é produzida não pelo pensamento mas pela sensibilidade.

José Carlos Lima disse...

Quando disse acreditar mais na sensiblidade do que no pensamento posso ter cometido uma injustiça para com grandes artistas que fizeram do raciocínio seu meio de expressão.
Na verdade eu quis dizer o quanto é maléfico o uso de receitas na arte, o atual maneirismo, por sinal presente na arte de Vick Muniz, como bem apontou o Juliano.
Receita só pega bem na arte culinária.

Juliano Guilherme disse...

Caro José Carlos, o nome correto é Nilton Pinho. Quanto à obra do Vik Muniz, ela, gosta-se ou não, é importante, exatamente por ser exemplar para se discutir a arte no mundo de hoje. Mundo que se convencionou chamar de pós-moderno. O maneirismo, para mim, principal característica da arte pós-moderna, segundo os historiadores é típico de períodos de decadência, de crise de valores. Embora ache que o maneirismo faz muito sentido em uma sociedade como a nossa, não estou convencido de que não haja mais espaço para o humanismo na arte contemporânea. A obra do Nilton e do Bispo é um exemplo disso

Pablo Picasso disse...

Humanidade é tudo o que falta na arte. Vic Muniz é apenas um esteriótipo que se aprende via crítica de jornais, justo pq jornalistas não entendem coisa alguma de arte, é fácil enaltecer lugares comuns e fazer dos mesmos verdadeiros carnavais pra gringo do universo das artes ver.

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