23 de março de 2010

A volta dos mortos-vivos

Queridos leitores, perdão por lhes fazer beber deste cálice amargo. Mas andei ciscando para cá, para lá e não pensei em nada melhor para comentar. Não quero meter o bedelho no caso Nardoni. De tragédias já bastam minhas lamúrias constantes. Falemos de política. Não é um assunto sempre agradável, mas é sempre útil, e com um pouco de criatividade a gente até consegue fazer alguma graça.

O cálice amargo é este artigo do venerável Bresser-Pereira. Perdão outra vez por fazê-los passar por isso. Dêem ao menos uma passada de vista. Em seguida explico porque escolhi esse texto como objeto de análise.


Resgate da política
Folha de S. Paulo - 22/03/2010

Sempre afirmo que a política é a mais nobre e a mais importante das profissões. É a mais nobre porque apenas homens e mulheres dotados da capacidade de tomar decisões e de qualidade moral são capazes de exercê-la bem. É a mais importante porque a política influencia nossas vidas para o bem ou para o mal, porque é por meio dela que somos governados.

Essa afirmação sobre a nobreza da política sempre causa surpresa em meus interlocutores, porque leem todos os dias notícias sobre a corrupção dos políticos. Assim, a política não estaria associada à virtude da nobreza, e sim ao vício da corrupção.

Foi, portanto, com alegria que li no "Estado de S. Paulo" (14/3) uma entrevista de José Serra a Dora Kramer na qual ele defende "uma prática transformadora na política brasileira, começando pelo repúdio ao mote fatalista e reacionário de que a desonestidade é inerente à vida pública, que o poder necessariamente corrompe o homem".

Terá razão o governador paulista ao rejeitar a visão reacionária da política? Estarei eu correto quando defendo a política apesar dos constantes deslizes dos políticos? Para responder a essas questões, devemos considerar dois conceitos básicos.

O Estado é o sistema constitucional-legal e o aparelho público que o garante; é o instrumento por excelência de ação coletiva da nação; é a lei e a administração pública; é a expressão maior da nossa racionalidade coletiva.

A política, por sua vez, é a prática de argumentar e fazer concessões mútuas para alcançar o poder político e é a arte de governar o Estado moderno que foi inicialmente liberal e depois se tornou democrático. É por meio da política que reformamos permanentemente a sociedade e o Estado para que esse cumpra seu papel contribuindo de forma efetiva para os grandes objetivos políticos das sociedades modernas: segurança, autonomia nacional, desenvolvimento econômico, liberdade, justiça social e proteção do ambiente. Podemos obter algum sucesso na busca individual de nossa felicidade e segurança econômica. Entretanto, os demais objetivos políticos, e mesmo esses dois que acabei de citar,somente poderão ser atingidos por meio da construção política do Estado.

Não podemos esquecer que, conforme ensinou Max Weber, a ética na política é diferente da ética pessoal: é uma ética da responsabilidade, não da convicção. Para governar e promover o bem público, o político deve buscar a maioria e, para isso, é obrigado a fazer acordos ou compromissos que um indivíduo não precisa fazer. Não devemos, porém, confundir com a corrupção essa ética baseada na responsabilidade do político em alcançar bons resultados para a sociedade que governa.

Não se justifica, portanto, a tese do caráter intrinsecamente corrupto da política. A política é o grande instrumento de que dispõe a sociedade para reformar seu Estado. Só por meio da lei e da administração pública que a garante progrediremos na busca da segurança, da liberdade e da justiça. A identificação da política com busca exclusiva do poder pessoal e da riqueza é uma tese neoliberal e autoritária que desmoraliza a política para, assim, legitimar o governo das elites.

Precisamos ser implacáveis em relação à corrupção, mas não é por meio do moralismo negativista que lograremos atingir nossos grandes objetivos políticos. Para isso, não temos alternativa senão pensar a política em termos republicanos de virtude cívica e busca do bem comum.

Só assim estaremos fortalecendo nosso grande instrumento de ação coletiva que é o Estado.

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LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA, 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Globalização e Competição".

É um artigo impecável, não? A mesma estética "Rottary Club" do artigo de Serra publicado semana passada e analisado aqui no blog.

Esse tipo de texto, contudo, me apavora. Porque poderia ser publicado há cinquenta anos, ou mesmo há cem anos. É atemporal.

Cara... (esse texto me dá vontade de falar gíria...) mas como é insípido! Não diz absolutamente nada!

E sabe porque me apavora? Porque tem um magnetismo estranho, paternal. Inspira confiança. A vontade que dá é de entregar tudo prum cara desses e botar o Led Zepellin no máximo. Digo, entregar o poder político a quem é de direito, a esses sisudos e respeitáveis juristas & economistas de São Paulo, com seus discursos e ternos e penteados impecáveis, e voltar ao botequim ideológico e oposicionista de onde nunca deveríamos ter saído!

Deixe-me explicar melhor. A subversão é um charme! Ainda é e sempre será a última moda da juventude cult. Mas a subversão só tem graça se os governantes forem parecidos com Bresser-Pereira. Circunspectos, previsíveis, caretas. Há uma atração entre os contrários.

Esse é o lado irônico do texto. Fala em "resgate da política", mas depois de ler um texto assim, deseja-se tudo, menos fazer ou interessar-se por política. Qual a boa de hoje?

Espanta-me cada vez mais o vazio retórico que vem caracterizando o tucanato paulista. Será que eles sempre foram assim e eu que não tinha reparado? Não, acho que é mais grave agora. E inclusive suspeito porque. É o gabeirismo, que contaminou tudo.

Antes os caras se sentiam mais soltos. Podiam falar com mais desenvoltura em privatização, Estado mínimo. Eram mais felizes, enfim. Hoje estão retraídos. As derrotas eleitorais e a maior conscientização do povo brasileiro, deixaram-nos tímidos. Com medo de perder votos à esquerda e à direita, discorrem apenas sobre platitudes em tom enigmático, esotérico. Vejam essa frase de Bresser:

A identificação da política com busca exclusiva do poder pessoal e da riqueza é uma tese neoliberal e autoritária que desmoraliza a política para, assim, legitimar o governo das elites.


???????????????????????

O que significa essa frase? Também nada. Não tem sujeito, predicado, adjetivo. É uma frase que só faz sentido se vista de longe. Tipo leitura dinâmica.

Prefereria nem entender. Mas entendo. Ele arrumou um jeito de colocar o neoliberalismo de um lado, e o tucanos de outro. O gancho principal do artigo talvez seja justamente essa frase, cuja falta de sentido, todavia, é reveladora de sua insinceridade.

Na verdade, o texto todo é repleto de pérolas similares. Falar em clichê seria até um elogio. São conceitos toscos, confusos, óbvios, esclerosados.

Alguém poderia me pedir para não pegar tanto no pé do Bresser-Pereira, um homem digno que nunca foi escritor e, portanto, não tem obrigação de alinhavar direito as frases. Nada disso. Não caio nessa falsa piedade. As ruas estão cheias de velhos desgraçados, maltrapilhos, passando fome, sede e frio, enquanto essas múmias emplumadas ludibriam a opinião pública com artigos emborolados e incompreensíveis.

Agora chega de Bresser. Depois dessa deixem-me escutar um pouco de rock, para descansar a alma. Ainda quero ler uns artigos da imprensa francesa sobre a vitória esmagadora dos socialistas na terra do Beaujoulais. A classe trabalhadora mundial voltou a ouvir a Marselhesa.

5 comentarios

Ruivo disse...

Não esquenta a cabeça.
Ninguém lê esses caras.

jozahfa disse...

Qual será o resultado da equação :

Arthur Virgílio 3% + Tasso tenho jatinho porque posso + Heráclito Fortes + Roberto energúmeno freire + alguns outros traíras + a marselhesa = ?

sugestão: madame guilhotin

Adriano Matos disse...

Pra mim também ao ler esse artigo pensei: Ora, é o óbvio, eu concordo com tudo isso...

No entanto, pulei dessa altura quando ele pôs o neoliberalismo como instrumento de confusão política. Ora, ele não era neoliberal?

Enfim, voce matou a charada. O objetivo só pode ser mesmo esse de tentar desvincular os tucanos da alcunha neoliberal, senão teria sido um desperdício de papel.

Agora, que tal os tucanos apoiarem o projeto que prevê penas mais duras para crime de corrupção contra o tesouro público em gestação pelo governo Lula? Vamos ver se são capazes de algo a mais que palavras vazias.

Luiz disse...

Bresser Pereira foi o tesoureiro tucano na campanha da reeleição do FHC, depois ele foi "demitido" (porque?. Nem os tucanos o suportam !

Luiz disse...

Bresser Pereira foi o tesoureiro tucano na campanha da reeleição do FHC, depois ele foi "demitido" (porque?). Nem os tucanos o suportam !

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