"Livre das velhas fanfarras do heroísmo - que ainda nos atacam cabeça e coração - longe dos velhos assassinos. Oh! A bandeira em carne viva sobre a seda dos oceanos e flores árticas", Rimbaud.
Que a arte é absolutamente necessária, acho que isso está claro para todos. E o final da frase de Jean Cocteau: "se ao menos eu soubesse para quê...", já ficou obsoleto. A arte serve para educar e para perturbar o espírito. Quer dizer, educa no sentido de oferecer-lhe um tema de reflexão, exercitar os sentidos e estimular a imaginação. Perturba porque nada há mais perturbador que uma insinuante beleza a propor verdades profanas, misteriosas, que negam insistentemente a validade de um sistema moral em cujo altar os homens sacrificam a liberdade.
Após um doloroso período de crise, durante os anos 80 e 90, a arte parece estar novamente encontrando seu sentido, seu caminho, seu destino. De Tókio a Nova Iorque, de Londres a São Paulo, ouve-se um clamor ganhar vida e ecoar cada vez mais alto nos meios de comunicação: "a arte não morreu!". E não morreu porque só agora tenham surgido novos van goghs, novos picassos - na verdade, eles surgiram e estão aí, mas não é por isso. A arte não morreu pela mesma razão pela qual o amor e o desespero não morreram. Quer dizer, o amor pela arte, com todo o seu desespero implícito, está vivo. Talvez curadores e críticos realmente tenham medo de expressar sua opinião sincera sobre muita coisa conhecida como arte conceitual, pós-moderna, instalações. Mas, graças a deus, eles não são os donos do mundo. O público faz ouvir sua voz através de centenas de escritores e jornalistas que interpretam o repúdio global pela arte medíocre, preguiçosa e sem-graça que tomou conta de bienais e galerias.
Entretanto, ao movimento negativo de repúdio faltava sua sequência dialética. À esta antí-tese faltava a síntese. E é nisto que o chamado movimento maximalista moderno pode vir a dar grande contribuição, trazendo à luz novos artistas que tragam esperança a um mundo torturado por guerras, miséria e pós-modernismo.
O maximalismo não é exatamente um estilo de pintura. É mais um grau de intensidade. Uma marca humana e trágica. Um toque dionisíaco. Um transbordamento de beleza. A marca maximalista não confere, necessariamente, um atributo estético à obra de arte. Cada artista tem seu estilo. Cada estilo, sua coleção de trabalhos. Cada trabalho tem seu efeito estético diferenciado.
Entretanto, o maximalismo está como que mergulhado em nossa contemporaneidade de maneira ainda mais profunda que a chamada arte conceitual se pretende estar. Porque o maximalismo é a expressão suprema da carência de imagens fortes, contundentes, sensuais, violentas, plenas, que caracterizam o homem moderno. Apesar de poder adquirir estes mesmos estímulos através da televisão, do cinema, das revistas e da publicidade em geral - justamente por ser bombardeado por imagens a todo instante, o homem moderno precisa da arte maximalista para compreender a enxurrada de formas e cores com as quais seus desejos e sonhos são manipulados e transformados em lucro.
O enfado crescente do público para com obras esvaziadas de conteúdo estético, mesquinhas em sua oferta de prazer, é explicado porque elas não tocam as mais íntimas cordas da alma artística que todo o ser humano traz dentro de si. As pessoas querem ação, movimento, vida. Não no sentido vulgar. Mas no mesmo sentido com que os renascentistas passaram a retratar santos e figuras divinas com traços marcadamente realistas, humanos, chocando os acadêmicos, mas agradando ao público. No mesmo sentido com que os expressionistas alemães queriam colocar a própria vida em seus quadros. Podemos admitir que esta intenção possa estar presente, ou sugerida, em alguns trabalhos conceituais. O que distingue, porém, o maximalismo, não é tanto a intenção de transportar a vida, com todos seus excessos, para as telas, mas a forma com que faz isso.
Além disso, diferentemente do conceitualismo pós-moderno, o maximalismo não tem vergonha de ser clássico. Neste sentido, é conservador. Um conservadorismo que está posicionado hoje na margem revolucionária da história da arte. O maximalismo traz assim de volta o respeito pela tradição. O respeito, não a submissão. O respeito pelo conhecimento, pelo estudo, pelo trabalho, pelo esforço. Respeito pela inteligência. Respeito pela subversão inteligente.
O maximalismo representa o retorno da generosidade do artista perante o público. Tudo bem, o artista não pode se curvar à ditadura da opinião pública, mas precisa querer fazer algo que toque o coração das pessoas. Que as faça rir, chorar, amar e gozar. E quando o faz, elas gostam, e vão às galerias e se divertem, se educam, se perturbam. A arte maximalista hoje é um dos principais movimentos integrados a uma corrente maior, histórica, abrangente, que corresponde ao renascimento, em grande estilo, das artes plásticas contemporâneas no Brasil e na América Latina. Isso para ficarmos só por estas plagas. Uma arte não conceitual. Uma arte que atinge mais a espiritualidade do que a razão. O mistério. E terminamos como começamos, com este intrigante poeta francês: "Será possível que Ela me faça perdoar as ambições continuamente esmagadas - que um final feliz compense os anos de indigência, - que um dia de sucesso nos adormeça sobre o vexame de nossa fatal incompetência?".
8 de julho de 2007
O maximalismo hoje (arquivo)
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