Ainda não engoli a respostinha que os editores da Folha deram aos professores Fabio Comparato e Maria Benevides. Eles os acusaram de cínicos e mentirosos por nunca terem denunciado a ditadura cubana. Sem considerar a abominável e covarde grosseria (anônima, ainda por cima) praticada por um jornal cuja tiragem chega 300 mil exemplares, eu fico pensando de onde vieram esses editores, que não sabem que a democracia cubana não foi derrubada por Fidel Castro, mas por Fulgêncio Batista, num movimento patrocinado pelos Estados Unidos.
Queria saber também de que maneira os cubanos poderiam acreditar em democracia se todas as democracias latino-americanas estavam sendo derrubadas por golpes de Estado comprovadamente patrocinados pelos Estados Unidos, em conluio com as elites reacionárias de cada país. Em 1975, já nenhum país latino-americano podia escolher livremente seus governantes e a esquerda era perseguida de maneira implacável e homicida. Os editores da Folha acham que os cubanos, mesmo assim, deveriam acreditar no regime democrático? Alguém acha que se os cubanos elegessem um presidente de esquerda, Cuba, situada a 200 kg dos EUA, seria o único país ao sul do Rio Grande, a não sofrer um golpe militar direitista? Lembrando o saudoso Bussunda: fala sério!
Olha que estou me referindo apenas à resposta desrespeitosa e ignorante dos editores, e não ao infame eufemismo anti-histórico de matéria publicada no dia anterior, chamando a ditadura brasileira de "ditabranda". Aliás, a comparação dos regimes militares latino-americanos, com seus expurgos em massa de intelectuais, artistas, cientistas e dirigentes sindicais, a prática sistemática de tortura, assassinato, censura dos meios de comunicação, anulação dos direitos civis, coibição dos partidos políticos, extinção de qualquer forma de eleição direta, a comparação desses regimes com os governos democráticos de Venezuela e Bolívia, é absolutamente ridícula, e, não apenas ofende a inteligência do cidadão, como constitui uma desinformação tão grave, tão nociva ao entendimento do significado histórico dos regimes militares, e do significado de democracia, que deveria ser combatida severamente pela intelectualidade brasileira - embora eu suspeite que o grau de desmoralização dos setores mais reacionários da imprensa é tão grande que a opção por um desprezo silencioso é perfeitamente válida.
A história de um povo, sobretudo a história recente, permanece na cultura deste, de forma viva, dialética, vibrante. O aspecto dialético refere-se às lutas no interior dos conceitos; a luta entre significantes e significados que dá vida e sentido aos conceitos. No caso da ditadura, é como se a luta contra a mesma não tivesse terminado. Ela se estendeu até aqui, convertida em luta ideológica e conceitual. Ótimo. Se não faltaram brasileiros para lutar contra a ditadura militar, quando fazê-lo implicava não apenas em renunciar a qualquer estabilidade financeira ou profissional, mas em grande risco da própria vida, e temos o exemplo da ultra-jovem Dilma Roussef, não é agora, que a democracia dá legitimidade e segurança aos atores políticos, que fugiremos ao bom combate. A Folha et caterva não perdem por esperar.
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Em tempo, nosso combativo blogueiro Eduardo Guimarães, presidente do Movimento dos Sem Mídia, está organizando uma manifestação em frente ao jornal Folha de São Paulo, para protestar contra este lamentável episódio. Apóio integralmente a iniciativa e, se pudesse, estaria lá. E temos um abaixo-assinado rolando na internet.
Link da ilustração.
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E faço aqui uma breve reunião de textos sobre o tema:
No OI, temos dois, um do Luiz Antonio Magalhães, outro do Celso Lungaretti. Temos um ótimo do Maringoni, na Agência Carta Maior. Uma denúncia forte e corajosa do Idelber Avelar. E a cada momento, lemos textos melhores e mais fortes contra a covardia imperdoável da Folha.
23 de fevereiro de 2009
Um osso preso na garganta (e chamada para manifestação em SP)
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# Escrito por
Miguel do Rosário
#
segunda-feira, fevereiro 23, 2009
# Etichette: Ditabranda, Mídia, Política
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Assistindo ontem a noite ao desfile da Beija Flor, na Globo, eu sabia que Lula estava presente num camarote a convite do governador, prefeito do Rio e outras autoridades. Fiquei intrigado, pois a Globo não mostrou em nenhum momento o presidente. De repente aparece uma imagem de Lula, a Globo ficou de plantão para escolher uma imagem a qual pudesse ser usada para passar outra mensagem. A imagem que a Globo mostrou foi quando Lula bocejou e olhou para cima. Mediante truque, filmou de baixo prá cima, a impressão que se tem é a de que Lula estaria bêbado quando na verdade bocejou. Foi exatamente esta imagem que a apresentadora Ana Maria Braga usou para dizer, sob gargalhadas:"olha aí o nosso presidente!!!". Claro que a Dona Ana quis pasar e passou a mensagem "olha aí o noss presidente bêbabado!!!", o que não é verdade. Assim é difícil tirar este País do atraso, com gente como Ana Maria Braga tendo o monopólio da fala.A esta gente interessa não o fato mas aquilo que eles podem distorcer
Uma pergunta: a ditadura argentina não foi imposta e estabelecida em 1976?
Para saber o que é a Folha, hoje em dia, basta acompanhar as opiniões sobre ela vindas do Nassif. O blogueiro está muito longe de ser petista, lulista, sequer se diz de esquerda. Já foi editor do jornal, e admirador do Serra. Só mesmo um debilóide como o Mainardi para taxá-lo como chapa-branca. Para o Nassif a Folha virou tão neocon quanto a Veja. Isso é muito preocupante, pois mostra que fará uso dos meios mais sórdidos para tomar de assalto o poder, junto com seu candidato. O que fazer? O Eduardo Guimarães propôs uma manifestação na porta do jornal. Eu sou a favor de uma ação popular em conjunto com o Tortura Nunca Mais. Pois a memória dos torturados e mortos pela ditadura militar foi agredida e ofendida por esse ridículo e cínico editorial
Você censurou o meu comentário, com a pergunta que fiz a você, sobre a ditadura na argentina ?
claro que não, porque o faria? é que não fico o dia inteiro liberando comentários. só posso fazê-lo quando volto para casa. quanto à data da ditadura argentina, ela começou em 1966. Abraço, Miguel
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ditadura_argentina
Valeu a força, Miguel
Abs,
Eduardo Guimarães
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