20 de fevereiro de 2009
Ponderações sobre o desemprego
(Atualizado às 13:18 - confira os gráficos do IBGE, ao final do post)
Os jornais hoje amanheceram "daquele jeito", embora eu desconfie que o prazer inicial em divulgar e ampliar a crise econômica já arrefeceu, sobretudo depois que observaram a queda violenta em suas carteiras de publicidade. Enfim, ontem foi divulgado o Caged de janeiro, o Cadastro Geral de Empregos, acompanhamento estatístico do Ministério do Trabalho, e os números apresentaram um balanço nada agradável. O saldo de emprego no mês ficou negativo em 101 mil empregos.
O que me incomodou, porém, foi a superficialidade com que o Globo deu a notícia, sem trazer nenhum histórico, nenhuma tabela, nenhum comparativo. Seria importante saber, por exemplo, que o número de empregos gerados em janeiro totalizou 1,21 milhão, o segundo maior da história, menor apenas que em janeiro de 2008.
Creio que este é um dado importante para contextualizar a notícia, porque mostra que, apesar da crise, há setores econômicos que continuam ampliando a oferta de empregos. O jornal O Globo confere enorme destaque (manchete de primeira página) ao fato da Embraer ter decidido demitir 4 mil trabalhadores. Bem, a tabela do Caged revela que as admissões com carteira assinada em janeiro último, conforme já informei, superaram 1 milhão de vagas, de maneira que aqueles 4 mil postos, embora seguramente importantes para cada família em si, representam apenas 0,33% dos postos gerados no mês. Tudo bem que falamos da Embraer, empresa estratégica para o país e a notícia, portanto, é relevante. Em termos de emprego, todavia, o número não representa um baque para a economia nacional, de maneira que talvez não merecesse uma manchete tão grande na capa.
Também não posso deixar de ressaltar que a crise atingiu horizontalmente todos os estados brasileiros. Não dá para culpar São Paulo ou Minas Gerais, que foram os que registraram maior número de demissões, porque eles igualmente se destacaram na quantidade de empregos gerados e, de qualquer forma, seus números permanecem dentro da média histórica. Isso não me impede, contudo, de criticar os governadores José Serra e Aécio Neves por não terem adotado, em tempo, nenhuma política anti-cíclica, para ajudar o país, como um todo, a manter o nível de emprego, nem procuraram, através dos meios de comunicação em massa, pressionar os grandes empresários de seus respectivos estados a não demitirem.
Outro ângulo importante com que se deve observar os números do Caged é o período acumulado em 12 meses (Fev08 a Jan09), onde o saldo de empregos ficou positivo em 1,20 milhão de empregos, contra 1,65 milhão de empregos no período anterior (Fev07 a Jan08). Comparando com qualquer ano do governo passado, o resultado de janeiro de 2009 continua muito superior. Em Fev00 a Jan01, por exemplo, o saldo de empregos ficou em apenas 675 mil, e em Fev99 a Jan00, o país registrou saldo negativo de 123,5 mil empregos! Não lembro de manchetes estrondosas na época...
Qualquer análise econômica que se preze nunca se pode prender exclusivamente a comparativos mensais. É uma obrigação do jornalista econômico, ou do economista, usar o período acumulado, evitando assim hiper-valorizar efeitos e mudanças sazonais ou temporários, que são normais em qualquer atividade e em qualquer país. É importante analisar os dados mensais, mas não se deve omitir a análise sobre os números acumulados.
Confira abaixo algumas tabelas organizadas e editadas por mim, com números do Caged, por estado. Clique sobre as imagens para ampliar. Observação: você pode montar a sua própria tabela do Caged, ou conferir as publicadas neste post, clicando aqui.
*
Fui lá no site do IBGE e recolhi os dados sobre o desemprego em janeiro, atualizados hoje. Confiram quatro pontos:
1) Os gráficos têm altos e baixos, demonstrando uma oscilação periódica normal, quiçá sazonal, ligada a fatores sazonais como declínio do preço de commodities, quebra de safra, realização ou não de grandes obras públicas, etc.
2) Em dezembro, o desemprego havia atingido o menor índice de toda a série histórica. Mesmo com a alta de janeiro, portanto, o desemprego permanece, historicamente, baixo, se comparado com anos anteriores.
3) O desemprego, historicamente, cresce no primeiro semestre, mas começando em dezembro, quando geralmente há grande número de demissões, e estendendo-se até junho ou julho quando tem início um movimento contrário, de queda no desemprego.
4) Em janeiro de 2008, o desemprego estava em 8%. Em janeiro deste ano, subiu para 8,2%. Ou seja, depois de 4 meses da "maior crise financeira mundial desde 1929", o desemprego no Brasil cresceu apenas 0,2%.
Você pode conferir os dados diretamente no site do IBGE, aqui.
Clique nas imagens para ampliar.
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Guilherme, não é o caso de ser ruim ou não. É uma base estatística online, fácil de ser usada e, no caso da prática midiática, abusada. A pesquisa mensal de emprego, por acaso, tem essas facilidades? A fonte é o Ministério do Trabalho, portanto, uma fonte oficial, idônea, porque usa métodos transparentes. abraço.
Prezado Miguel,
Realmente os numeros, quando analisados comparativamente, não são tão negativos quanto aparentam.
Renovo meus cumprimentos pelo seu trabalho de buscar aprofundar a analises dos dados estatisticos.
Mas, pra não perder o costume de lhe irritar, discordo da critica aos Jornais e especialmente à televisão.
Esses veiculos, por natureza e destinação, não devem descer a detalhes que podem ser trazidos por revista, por jornais especializados, ou por blogs de especialistas.
Veja, não estou me refirindo ao "vies" da noticia, se positivo ou negativo. Falo do descabimento de um Jornal Nacional ( ou da Band, da record, etc..)trazer Tabelas e graficos comparativos a este nivel.
Em todos caso, e mais uma vez, parabens pelo trabalho.
Entendi, Miguel do Rosario:
uma notícia solta, sem estar contextualizada, mesmo grosso modo,
constitui, além de má fé, uma desinformação. Grata por suas análises esclarecedoras.
Pronto, Guilherme, peguei os números do IBGE. Dá uma olhada. Eles também estão disponíveis online e possuem uma série histórica, além de serem bem mais abrangentes e complexos.
Não é desculpa, Emanuel. O jornal poderia contextualizar um pouco mais. Deveria contextualizar. Do jeito que está, mais desinforma do que outra coisa.
COURAÇA EM PORTO ALEGRE
TÁ TUDO DOMINADO!!!!
ZERO HORA:
Sem provas, PSOL acusa governo Yeda
FOLHA: Sem provas, PSOL acusa Yeda de prática de caixa 2 e desvios
ESTADÃO: Yeda é acusada de comprar casa com caixa 2 / PSOL faz denúncias contra governadora e ex-auxiliares, sem mostrar provas
O GLOBO: simplesmente é um túmulo. Para o jornal não está acontecendo nada no Rio Grande. É tudo fofoca do Psol. E qdo é fofoca não damos uma linha!
Comentário feito pelo Luciano - no Blog do Nassif
Oi, Miguel. Primeiramente, acho que você busca fazer um trabalho sério e limpo, parabéns. Ótimo blog, que tem conteúdo.
Também entendo que a grande mídia necessita, sim, fundamentar suas afirmativas em estatísticas, fatos e dados. Eles devem isso à sua audiência, isso seria, simplesmente, respeito com a audiência.
Eles poderiam, por exemplo, disponilizar os estudos que fundamentaram notícias nos sites respectivos. É o mínimo que nós merecemos.
Infelizmente, acredito que ainda pode demorar muito para a grande mídia cair na real.
Se a grande mídia impressa e televisa não melhorarem sua densidade de conteúdo, vão perder cada vez mais audiência e credibilidade, num horizonte de alguns anos. Prevejo queda nas receias e dificuldades financeiras crescentes.
Um abraço
falou guilherme. agora que vi que a pesquisa do ibge tb é fácil de acessar, vou me concentrar mais nela.
abs
Sob qualquer base de análise, apenas usando a percepção do mundo que nos cerca que também é um caminho de conhecimento, é possível perceber que o número de postos de trabalho realmente vai cair. A economia não é uma ciência exata: ela é definida pelas escolhas das pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas. Há muitas pessoas mais cautelosas, e até mesmo com medo de tomar decisões devido à forma como a mídia vem tratando a decorrocada do modelo neoliberal capitaneado pelos EUA e Inglaterra há quase 30 anos. No fundo, para grande parte das pessoas que não sabem o que realmente está acontecendo o pensamento é: e agora, o que fazer? Nessa esteira, os capitalistas, que sabem muito bem o que está ocorrendo, reesruturam seus planos de modo a manterem lucros. Quer um exemplo clássico? A Embraer recebeu do governo federal recursos, subsídios para otimizar seu caixa, ou seja, ter dinheiro para pagamento das despesas de curto prazo (despesas que variam conforme a produção). Conforme as novas normas contábeis, estes recursos enviados pelo Governo são capitalizados como PATRIMÔNIO PRÓPRIO da empresa e não como RECURSOS DE TERCEIROS, que via de regra, são devolvidos aos donos. Portanto, porque as demissões? Aliás, porque 4.000 demitidos ( cerca de 1/4 da força de trabalho total da empresa)? A resposta é simples: não há mais como ganhar dinheiro no mercado especulativo. Acabou a farra do dinehiro que fazia dinheiro. A maioria das empresas, nacionais e internacionais estava "sentada em cima" deste paradigma que, de forma explosiva, acabou. Mas os lucros? Ora, o penasmento empresarial é mantê-los a qualquer custo, ou meljor, reduzindo os custos. Logo, demitam-se os trabalhadores sem qualquer consideração com o ser humano e a própria dinâmica econômica. Se a renda cai, cai a demanda, cai a produção. Isso é lógico. No mais, Miguel, parabéns pelo seu trabalho.
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