11 de setembro de 2010

Um debate interessante: Idelber X Alon

Ainda na seção de comentários desse post no Biscoito, encontrei um debate entre o jornalista Alon Feuerwerker e Idelber Avelar que merece ser replicado, pelas razões que vocês entenderão facilmente:

O Alon, que havia sido criticado por um comentarista pelo próprio Idelber, ainda na caixa de comentários, surgiu por lá com essa opinião:

#81

Imagino que o trecho a que você se refere seja este:

"Qualquer estatística comprovará que a mudança no perfil de renda do brasileiro e da brasileira foi radical nas últimas duas décadas. Tudo bem que tucanos e petistas debatam interminavelmente sobre quem contribuiu mais, talvez na casa do zero vírgula qualquer coisa. Mas um detalhe é consensual: independentemente da paternidade, o Brasil é hoje um país com ampla classe média."

Todos os estudos e estatísticas mostram evolução da renda e da distribuição de renda nas últimas duas décadas. Você tem dados que comprovem o contrário, que a melhora só começou a partir de 2003? Tenho curiosidade de conhecer.

Alon Feuerwerker em setembro 10, 2010 11:45 AM



O Idelber não demorou a responder:


#85

Caro Alon, vamos aos números, todos eles oficiais:

Empregos gerados:
Governo FHC: 5.016.672
Governo Lula: 13.996.953


Salário mínimo real IPCA (reais constantes de maio de 1995)

FHC: R$ 100,00 em 1995, R$123,61 no começo de 2003
Lula: R$ 123,61 no começo de 2003, R$188,49 no começo de 2010

Evolução do poder de compra do salário mínimo em cestas básicas:

Do começo ao fim da era FHC: 1,02 para 1,38
Do começo da era Lula até hoje: 1,38 para 2,17

Coeficiente GINI (medidor da desigualdade):

Do começo ao fim da era FHC: 0,601 a 0,589
Do começo da era Lula até hoje: 0,589 a 0,544

Evolução da renda dos mais pobres (média da renda domiciliar per capita dos indivíduos pertencentes aos 40% mais pobres, em reais por pessoa):

Do começo ao fim da era FHC: R$ 182, 39 a R$ 181,05
Do começo da era Lula até hoje: R$ 181,05 a R$ 264,41

Miséria (percentual de pessoas com renda domiciliar inferior à metade da linha da pobreza):

Do começo ao fim da era FHC: de 20,9% a 21,3% (veja que a miséria aumentou no governo FHC, não em números absolutos mas em percentual da população).
Do começo da era Lula até hoje: de 21,3% a 10,5% (que tal essa diferença?)

PIB per capita, em US$ mil:
Do começo ao fim da era FHC: de 4,85 a 3,48
Do começo da era Lula até hoje: de 3,48 a 10,00

Volume de crédito concedido como porcentagem do PIB:

FHC: De 34% em 1995 a 26% em 2002
Era Lula: De 25% em 2003 a 45% em 2009

Média da inflação:

Governo FHC: 9,1%
Governo Lula: 5,7%

Juros, média:
Governo FHC: 26, 59%
Governo Lula: 14, 77%

No governo Lula, 31 milhões de pessoas entraram à classe média. Quantas foram no governo FHC? Com esses números dá pra começar?
Idelber em setembro 10, 2010 12:41 PM


O Alon reagiu com esse outro comentário:

#114

Caro Idelber, só agora cheguei na frente de um computador.

Obrigado por providenciar os números. Eles comprovam o que venho escrevendo há anos. Que em ambos os governos houve redução da desigualdade (Gini) e elevação do poder de compra do salário-mínimo. FHC foi melhor que Lula no enfrentamento dos nós estruturais da economia (Plano Real, responsabilidade fiscal) e Lula foi melhor que FHC no combate à miséria e na expansão dos programas sociais. Certos dados ancorados em dólar, como o PIB per cápita, não devem ser levados em conta, por mascararem a realidade, com a supervalorização da moeda brasileira.

Claro que os números de Lula são melhores que os de FHC. As taxas de aprovação de Lula não são por acaso. O porquê desses resultados, como digo também desde sempre, é o mote do tal debate interminável.

Os tucanos dizem que Lula colheu os frutos porque teve sorte e porque a casa já estava arrumada. Um erro, que subestima a prioridade dada aos mais pobres pelo governo do PT. E o PT diz que FHC governou para os ricos, concentrou renda, deixou o salário mínimo murchar. O que os números desmentem.

É só blá-blá-blá.

Em resumo, caro Idelber, os petistas têm legitimidade para reivindicar terem governado, como nunca antes neste país, para melhorar a vida dos mais pobres.

Já os tucanos também têm legitimidade para reivindicar suas conquistas e contribuições.

Uma delas é serem os arquitetos e engenheiros do arcabouço institucional que permitiu a Lula conduzir a economia como conduziu. Outra é terem enfrentado definitivamente, com a responsabilidade fiscal, as raízes da inflação crônica, a principal responsável pela grave concentração da renda nacional.

Essa é a História, caro Idelber. E quer um palpite? No dia em que um eventual superfortalecimento do PMDB impelir o PT a uma aproximação com o PSDB, a narrativa oficial do petismo incorporará essas minhas observações. Como sou precavido, vou fazer agora mesmo um copy/paste/save as.

Para talvez cobrar direitos autorais, ainda que isso esteja cada vez mais fora de moda :-))

Grande abraço, é sempre um prazer dialogar com você.

Alon Feuerwerker em setembro 10, 2010 8:37 PM


Aí o Idelber faz uma tréplica:

#124

Caro Idelber, só agora cheguei na frente de um computador.

Obrigado por providenciar os números. Eles comprovam o que venho escrevendo há anos.


Caro Alon:

É aquela história. Você pode dizer o que quiser. O que os números dizem não bate com o que você diz. Você havia me pedido números. Os números são claros:

1. A miséria aumentou no governo FHC e caiu pela metade no governo Lula.

2. O GINI praticamente não caiu no governo FHC. Ou seja, quase não houve redução da desigualdade: 0,60 a 0,59 chega a ser estatisticamente insignificante. Sob Lula, a queda foi de 0,59 a 0,44. Um belo salto.

3. Repito: 31 milhões de pessoas subiram à classe média sob Lula. Reitero a pergunta: quantas foram sob FHC? Deixo que você busque esse número.

FHC foi melhor que Lula no enfrentamento dos nós estruturais da economia

4. Como? Se a inflação e os juros sob FHC foram o dobro do que foram sob Lula?

Isso para não falar das farmácias populares, das Unidades de Pronto Atendimento, dos 124 campi universitários criados, das centenas de escolas técnicas, dos 700 mil jovens pobres que acederam à universidade com o ProUni, do plano de carreira para o magistério das universidades federais e uma longa lista de etecéteras.

O resto é blablablá de quem se equilibra numa retórica que não bate com a realidade. Você havia me pedido números. Até que sustente o que diz com números, com todo o meu respeito, é só papo furado. A equidistância também pode ser uma mentira.

Forte abraço.

Idelber em setembro 11, 2010 2:19 AM

19 comentarios

X-MAN disse...

O fhc governou pros ricos, não tem como rebater isso, está aqui um que morou em cohab e ficou desempregado nos tempos desse tenebroso governo, o salario minimo foi achatado e os aumentos que ele dava eram ridiculos, tanto que até a folha fez uma pergunta pra ele: o que ele poderia comprar com aquele aumento e isso o deixou irritado. Sem esquecer das pessoas que tiveram a sua luz cortada por que passaram da media e tiveram que andar á noite por ruas escuras, só quem tinha que lutar pra sobreviver naqueles tempos sabem como foram dificeis, enquanto a tv mostrava os restaurantes com filas (como se isso fosse prova de punjança economica, do frango a um real e do iorgute na mesa do pobre, como se pobre não soubesse que isso existisse antes), ou seja, enquanto o povo se arrastava nas ruas desempregados ou mal pago nos jornais se vivia um faz de conta, falar com a barriga cheia desse tempos é uma coisa, vive-los no limite é outra bem diferente; não á toa o fhc é o politico mais rejeitado desse país, por que lhe é merecido.

Anônimo disse...

Meu Deus, um verdadeiro tratado de economia para provar o óbvio: o pobre entrou no governo Lula com preços elevadissimos dos alimentos, inflação alta, salarios aviltados, passando o maior sufoco com desemprego e ainda tem gente que tenta creditar a mudança de todo este quadro sinistro a FHC? Vai assombrar porco para não dizer outra coisa.

Anônimo disse...

Caro Miguel,
Para além dos números, creio que uma das principais diferenças entre petistas e tucanos seja quanto à importância maior ou menor do papel do Estado na economia e na sociedade. Enquanto o PSDB aprofundou o desmonte da máquina pública através do arrocho salarial do funcionalismo, da não realização de concursos nem para repor os funcionários que se aposentavam, da terceirização de vários serviços, da privatização (ou privataria) de vários setores e empresas estratégicas, do pêso quase nulo do setor estatal no investimento, o governo Lula fez exatamente o contrário.
Isso tornou possível recuperar a importância estratégica do Estado como indutor do crescimento econômico, na distribuição de renda e na diminuição da desigualdade, como também no enfrentamento de crises.
Em suma, embora apenas os números possam dar a impressão de que os argumentos do Alon são até razoáveis, o que está por trás deles, as decisões de política econômica e social que os tornaram possíveis, é o que realmente importa.
Você já pensou o quanto já poderíamos ter avançado se ainda estivesse nas mãos do Estado tudo o que dado a preço de banana para a iniciativa privada?
Um abraço
Ruy Garcia
Campinas (SP)

Unknown disse...

Nem se fala da infraestrutura e os investimentos nela? O PAC 1 e agora o 2? A telepigao so mostra falta de esgoto com seu urubu (aviaozinho) querendo deprimir e enganar o povo. O PIG nao diz que obras estao em andamento e que leva muito mais do que 8 anos para resgatar uma nacao negligenciada.
Nao tem como cortar, de qualquer forma que se trate, o contraste e gritante.
Lula e o maior estadista que este pais ja teve. E o unico presidente que realmente sabe o que significa viver com migalhas, nos poroes da sociedade com moradia precaria, vendo seus filhos sem poder nada. E dai, do coracao, nao so dos numeros que ele governa e que Dilma governara por 8 anos mais.
E se fosse por mim ja estaria arrumando o Brizolinha para 8 anos apos.

Vera Pereira disse...

"A equidistância também pode ser uma mentira." Pegou no nervo da pretensa objetividade do Alon.

Renato disse...

Gosto do Alon, mas, por ser de esquerda e querer o respeito do "grande jornalismo sério", muitas vezes ele cai exatamente nessa "equidistância" forçada... Ele faz a mesma coisa com a questão do Oriente médio. Mas acho muito louvável a tentativa dele, muito bem sucedida, de fazer um jornalismo muito sério e de boa qualidade informativa.
Mas aqui, acho que o Idelber tem 90% da razão, contra 10% do Alon. Isso pra continuar com os números... ;-)

augusto disse...

Tem uma coisa, miguel e internautas, examinem mais de perto. Nao é central a esta discussao , ela propria nao sendo central.
Gostaria de suas opiniões nisto: Porque razao FHC e seu congresso aprovaram a tal responsabilidade fiscal, que é muito boa apesar dos furos que ostenta?
Me vem sempre a cabeça que, FINDA A INFLAÇAO pesada, os governos perderam sua ancora pra modificar a seu favor os orçamentos (uniao, estados, municipios). Antes ele podiam jogar com a inflaçao, pagar atrasado e sem correçao, ou com correçao MANIPULADA.Em compensaçao arrecadavam com a CORREÇAO monetaria sempre. Nem precisava aumentar impostos naquela base... Depois do Real, tinha que haver um stop na sangria, especialmente dos Estados em cima do orçamento federal!
Nesta nova situaçao, qualquer buraco orçamentario era um buraco efetivo. Tinha que haver um "Freio bom"!!! Foi a responsabilidade fiscal, que nao lembro como foi conseguida no congresso.
Espero correçoes, retificaçoes a esta ideia,please.

augusto disse...

Dizer que o lula tem sorte, e muita sorte, que foge da elite e vai so pra os braços do povo.
Tambem pudera: abria o jornal e lia"ignorante,
demagogo, amigo do Chavez, nove dedo, bolsa esmola". Vai la no interior e pessoa bem simples o abraçam e falam no ouvido"Deus abençoe pra sempre o sr., pres. Lula" , " meu filho agora tem isto etc."
Isso mes após mes, anos a fio. Depois disso,
eles querem que a politica de Lula seja qual?
E a de dilma vá para que lado?
Ora, vão catar coquinho na ladeira!

Anônimo disse...

Quando contrariado, o Idelber não sabe ser menos nervoso, não? E ainda por cima respondeu errado.

Anônimo disse...

Miguel, tb não seria interessante argumentar que enquanto os tucanos pegaram um governo que praticamente foi um continuação de governo Itamar (tanto que eles dizem que o Plano Real foi deles) e Lula sofreu por pelo menos dois anos as consequencias dos desastres tucanos... me lembro muito bem de pensar que se o FMI agisse realmente de forma técnica jamais emprestaria dinheiro pro Brasil, aquilo seria só pra empurrar com a barriga e a coisa estourar nos próximos governos...
Ou seja, os números do Lula são ainda melhores pq além de serem superiores pagaram as contas atrasadas do FHC que fizeram os números dele não parecerem tão ruins...

Marcos

Miguel do Rosário disse...

Este comentário foi removido pelo autor.

Miguel do Rosário disse...

Prezados comentaristas, respondendo a vários de vocês, posso dizer que estamos apenas no terreno dos números e ligados diretamente a questão social. As diferenças entre Lula e FHC davam um tratado de 600 páginas. A dívida pública, por exemplo (isso é incrível, visto que ele aumentou gastos com social) caiu fortemente sob Lula. A carga tributária para a classe média também caiu ou ao menos não aumentou tanto como durante o governo FHC (o imposto de renda caiu para muita gente que odeia Lula e os impostos).

Na política externa, Lula foi o primeiro presidente que pisou na África e isso é outra coisa estarrecedora - que nenhum outro presidente tenha ido a nenhum país africano, um continente ao qual devemos tanto!

Primeiro a se encontrar com reitores! FHC, apesar de acadêmico, jamais tinha feito reunião com reitores! Lula fez várias.

O PSDB governa de cima para baixo, autoritariamente (e a mídia mentirosa tenta inverter as qualidades do PT, embora como não tenha nada de palpável para atribuir-lhe de autoritário, diz que tem "tendências" autoritárias), sem consultar professores, policiais, empresários, estudantes, sindicalistas. Nada. Veja a maneira como Paulo Renato impõe mudanças na educação em São Paulo. Esse é um dos pontos mais graves.

Na agricultura, lembro que durante o governo FHC, a agricultura familiar havia sido condenada como inviável. Hoje está aí, pujante, produzindo 70% do consumo interno brasileiro. O agricultor pobre não tinha financiamento do BB. Hoje tem.

O cinema brasileiro também tinha pouquíssima verba. Na era Lula, o número de editais para cinema aumentou exponencialmente. Meu primo é produtor de cinema em SP e está produzindo um filme de um diretor formado na USP que agora, aos 54 anos, está dirigindo seu primeiro filme. Uma coisa muito emocionante. O filme está ganhando diversos premios na Europa e recebendo críticas ótimas em toda parte.

Enfim, é como eu falei. Dá para escrever um tratado. Eu gostei do debate entre Idelber e o Alon por causa do calor humano que vi ali. O Alon é um cara bem intencionado, mas tem o "defeito" de ser jornalista, o que lhe confere a obrigação de uma equidistância que acaba interferindo negativamente em seu julgamento. O jornalista tornou-se uma ser melancólico que não pode expressar suas paixões políticas sob o risco de nunca mais trabalhar em jornal algum. É muito triste isso. Os jornais falam em liberdade de expressão mas o indíviduo mais oprimido nesse ponto é justamente o jornalista.

Miguel do Rosário disse...

Este comentário foi removido pelo autor.

Geraldo Galvão disse...

Deve ser bem difícil se equilibrar entre sionismo e esquerdismo. Parei de frequentar o blog do sionista Aron, quando ele defendeu o ataque do exercito de Israel, ao navio que transportava ajuda humanitária para a Faixa de Gaza.

O Anão Corcunda disse...

Desculpe a franqueza, mas o Alon sempre foi um cara em cima do muro, e não abre mão de uma moral classe media, que não consegue admitir o fracasso dos governos almofadinhas que estao sendo devidamente esmagados por este governo popular. Acho que nao tem nada a ver com ele ser ou nao jornalista, mas por ser tmb um grande almofadinha.

O Anão Corcunda disse...

E como disse o comentarista acima, sionismo nao dá... ô coisa mais reaça!!

Marola disse...

Alon " as raízes da inflação crônica, a principal responsável pela grave concentração da renda nacional."

De onde êle tirou isso? A queda da inflação possibilitou aumento de renda dos trabalhadores mais pobres, mas tal resultado é mais visto como efeito colateral benéfico do plano. Que a inflação agrave a concentração de renda é até admissível, mas que isso seja tratado como o vetor principal do fenômeno, é perfeitamente debatível. Não sei enumerar os fatores econômicos e a correlação entre êles que dá conta da gritante disparidade entre as rendas que existe no Brasil. Pode ser até que êle tenha um pingo de razão, mas o argumento me parece chutado, pra fazer a conhecida média. Se tiver algum economista lendo estas linhas, uma opinião mais informada, seria bem-vinda.

Como comentador da política externa brasileira em relação ao Oriente Médio, é um desastre de grandes proporções. Esposa cegamente as teses sionistas, propagandeia inverdades como se fossem "received wisdom" em relação aos temas mais candentes do jogo político da região e pratica censura no seu blog, não publicando comentários que ousem discordar de suas excelsas opiniões, escondendo a preguiça de tocar o blog por meio de reduzir a quantidade de comentários publicados.

Anônimo disse...

"Já os tucanos também têm legitimidade para reivindicar suas conquistas e contribuições."

Se essa informação é verdadeira, por que o candidato do PSDB-PFL(DEM) não o utiliza na campanha?

Anônimo disse...

"A equidistância também pode ser uma mentira."
Touchê!
Esta foi fatal. Mas também concordo com a boa intencionalidade do Alon e reconheço seu imenso esforço em parcer equidistante. Ocorre que, em política não existe elemento neutro (já dizia o velho Brizola). Neste terreno, a imparcialidade, via de regra, é enganosa.

Parabéns pelo belíssimo blog!

Valmont.

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